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Psicol. Argum. 2014 jan./mar., 32(76), 161-172 doi: 10.7213/psicol.argum.32.076.AO11 ISSN 0103-7013 Psicol. Argum., Curitiba, v. 32, n. 76, p. 161-172, jan./mar. 2014 PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO [T] [A] Sandra Adriana Neves Nunes [a] , Marcos Gimenes Fernandes [b] , Arsenio José Carmona Gutierrez [c] [R] Abstract Vygotsky’s contributions to research in Psychology seem undeniable today, but remained silenced for some time. The reasons to continue attracting the interest of researchers worldwide are es- sentially in its methodological rigor and the characteristics of its open and dialectical conceptual system, which allowed in-depth understanding of the nature and development of psychological processes. This article focuses on the discussion of general epistemological aspects of Vygotsky’s Historical-Cultural Theory and its implications for the Child Development Psychology. We start with the classic debate of the Philosophy of Science about the relationship between subject and object, which underlies the crisis of psychology regarding the choice of its object of study. Then we present the Marxist Philosophical System that provides to the Historical-Cultural Psychology Fundamentos teórico-epistemológicos da Teoria Histórico-Cultural: implicações para a psicologia do desenvolvimento infantil [I] Theoretical-epistemological fundamentals of Cultural-Historical Theory: Implications for child development psychology [R] Resumo As contribuições de Vygotsky para a pesquisa em psicologia parecem inegáveis na atualidade, mas permaneceram por algum tempo silenciadas. As razões para que continuem despertan- do o interesse de pesquisadores no mundo inteiro estão, essencialmente, no seu rigor meto- dológico e nas características de seu sistema conceitual aberto e dialético, que permitiram a compreensão aprofundada da natureza e do desenvolvimento dos processos psicológicos hu- manos. O presente artigo centra-se na discussão de aspectos epistemológicos gerais da Teoria Histórico-Cultural de Vygotsky e nas suas implicações para a Psicologia do Desenvolvimento Infantil. Parte-se do debate clássico da Filosofia da Ciência acerca da relação entre sujeito e ob- jeto, que fundamenta a crise da Psicologia referente à escolha do seu objeto de estudo. Em se- guida, apresenta-se o Sistema Filosófico Marxista que fornece à Psicologia Histórico-Cultural uma concepção a respeito de mundo e de humanidade, das leis de seu desenvolvimento e das vias de acesso e de produção do conhecimento. Uma vez discutida as bases filosóficas da Teoria Vygotskyana, identificam-se e explicitam-se os seus princípios fundamentais: o princí- pio da unidade da consciência e da atividade e o princípio da unidade do biológico e do social. Conclui-se com um debate acerca das implicações dessa perspectiva teórico-epistemólogica para a compreensão do desenvolvimento psicológico infantil. [#]] Palavras-chave: Psicologia. Epistemologia. Desenvolvimento infantil. [#] [a] Doutora em Psicologia , Professora Adjunta da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e-mail: [email protected] [b] Doutor em Educação Física, professor do Departamento de Ciências da Saúde da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus, BA – Brasil, e-mail: [email protected] [c] Doutor em Educação, professor do Departamento de Ciências da Educação da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhéus, BA – Brasil, e-mail: pcarmonauniversiabrasil@ hotmail.com Recebido: 14/02/2012 Received: 02/14/2012 Aprovado: 11/06/2012 Approved: 06/11/2012

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As contribuições de Vygotsky para a pesquisa em psicologia parecem inegáveis na atualidade,mas permaneceram por algum tempo silenciadas. As razões para que continuem despertandoo interesse de pesquisadores no mundo inteiro estão, essencialmente, no seu rigor metodológicoe nas características de seu sistema conceitual aberto e dialético, que permitiram acompreensão aprofundada da natureza e do desenvolvimento dos processos psicológicos humanos.O presente artigo centra-se na discussão de aspectos epistemológicos gerais da TeoriaHistórico-Cultural de Vygotsky e nas suas implicações para a Psicologia do DesenvolvimentoInfantil. Parte-se do debate clássico da Filosofia da Ciência acerca da relação entre sujeito e objeto,que fundamenta a crise da Psicologia referente à escolha do seu objeto de estudo. Em seguida,apresenta-se o Sistema Filosófico Marxista que fornece à Psicologia Histórico-Culturaluma concepção a respeito de mundo e de humanidade, das leis de seu desenvolvimento edas vias de acesso e de produção do conhecimento. Uma vez discutida as bases filosóficas daTeoria Vygotskyana, identificam-se e explicitam-se os seus princípios fundamentais: o princípioda unidade da consciência e da atividade e o princípio da unidade do biológico e do social.Conclui-se com um debate acerca das implicações dessa perspectiva teórico-epistemólogicapara a compreensão do desenvolvimento psicológico infantil.

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  • Psicol. Argum. 2014 jan./mar., 32(76), 161-172

    doi: 10.7213/psicol.argum.32.076.AO11 ISSN 0103-7013Psicol. Argum., Curitiba, v. 32, n. 76, p. 161-172, jan./mar. 2014

    PSICOLOGIA ARGUMENTO ARTIGO

    [T]

    [A]Sandra Adriana Neves Nunes[a], Marcos Gimenes Fernandes[b], Arsenio Jos Carmona Gutierrez[c]

    [R]

    Abstract

    Vygotskys contributions to research in Psychology seem undeniable today, but remained silenced

    for some time. The reasons to continue attracting the interest of researchers worldwide are es-

    sentially in its methodological rigor and the characteristics of its open and dialectical conceptual

    system, which allowed in-depth understanding of the nature and development of psychological

    processes. This article focuses on the discussion of general epistemological aspects of Vygotskys

    Historical-Cultural Theory and its implications for the Child Development Psychology. We start

    with the classic debate of the Philosophy of Science about the relationship between subject and

    object, which underlies the crisis of psychology regarding the choice of its object of study. Then

    we present the Marxist Philosophical System that provides to the Historical-Cultural Psychology

    Fundamentos terico-epistemolgicos da Teoria Histrico-Cultural: implicaes para a psicologia do desenvolvimento infantil[I]Theoretical-epistemological fundamentals of Cultural-Historical Theory: Implications for child development psychology

    [R]

    Resumo

    As contribuies de Vygotsky para a pesquisa em psicologia parecem inegveis na atualidade, mas permaneceram por algum tempo silenciadas. As razes para que continuem despertan-do o interesse de pesquisadores no mundo inteiro esto, essencialmente, no seu rigor meto-dolgico e nas caractersticas de seu sistema conceitual aberto e dialtico, que permitiram a compreenso aprofundada da natureza e do desenvolvimento dos processos psicolgicos hu-manos. O presente artigo centra-se na discusso de aspectos epistemolgicos gerais da Teoria Histrico-Cultural de Vygotsky e nas suas implicaes para a Psicologia do Desenvolvimento Infantil. Parte-se do debate clssico da Filosofia da Cincia acerca da relao entre sujeito e ob-jeto, que fundamenta a crise da Psicologia referente escolha do seu objeto de estudo. Em se-guida, apresenta-se o Sistema Filosfico Marxista que fornece Psicologia Histrico-Cultural uma concepo a respeito de mundo e de humanidade, das leis de seu desenvolvimento e das vias de acesso e de produo do conhecimento. Uma vez discutida as bases filosficas da Teoria Vygotskyana, identificam-se e explicitam-se os seus princpios fundamentais: o princ-pio da unidade da conscincia e da atividade e o princpio da unidade do biolgico e do social. Conclui-se com um debate acerca das implicaes dessa perspectiva terico-epistemlogica para a compreenso do desenvolvimento psicolgico infantil. [#]]

    Palavras-chave: Psicologia. Epistemologia. Desenvolvimento infantil. [#]

    [a] Doutora em Psicologia , Professora Adjunta da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) e-mail: [email protected]

    [b] Doutor em Educao Fsica, professor do Departamento de Cincias da Sade da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhus, BA Brasil, e-mail: [email protected]

    [c] Doutor em Educao, professor do Departamento de Cincias da Educao da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), Ilhus, BA Brasil, e-mail: [email protected]

    Recebido: 14/02/2012Received: 02/14/2012

    Aprovado: 11/06/2012Approved: 06/11/2012

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    a conception about world and humankind, the laws of its development and access and produc-

    tion routes of knowledge. Once discussed the philosophical basis of Vygotskys theory, we identify

    and explain its fundamental principles: the principle of unity of consciousness and activity and

    the principle of unity of biological and social. We conclude with a discussion of the implications

    of this theoretical-epistemological perspective to understand the psychological development of

    children. [K]

    Keywords: Psychology Knowledge Child development. . #]

    Introduo

    Desde que a Psicologia adquiriu o status de ci-ncia independente, a delimitao de seu objeto de estudo tem sido um de seus problemas fundamen-tais. Sustentada sobre os pilares filosficos do po-sitivismo, empirismo e materialismo, a Psicologia moderna elegeu um objeto de estudo passvel de observao, mensurao e quantificao. Assim, a alma relegada a objeto de especulao filosfica e a mente, em oposio ao corpo, assume lugar cen-tral na sua trama conceitual. Seguindo a tradio cartesiana, assume-se que o corpo seja regido por leis fsicas e mecnicas, a exemplo do mundo ma-terial a sua volta. A mente, por outro lado, teria sua forma peculiar de organizao e funcionamento, que poderia ser compreendida por meio da razo. Inauguram-se, assim, os plos da objetividade e da subjetividade que norteiam os debates epistemo-lgicos na Psicologia, at os dias atuais.

    A busca pela superao dessa dicotomia no cor-po terico da Psicologia permaneceu no campo ideolgico e no cientfico desde o sculo XIX. Lev Semionovich Vygotsky (1996-1934) reconhecido mundialmente por ter realizado uma anlise rigoro-sa da situao de fragmentao da psicologia de seu tempo e por ter proposto uma sntese superadora da Crise, lanando mo, para isso, do mtodo mate-rialista dialtico de Marx e Engels.

    O tema que ser desenvolvido nesse artigo ver-sa sobre alguns aspectos epistemolgicos gerais do horizonte terico-metodolgico da Psicologia Histrico-Cultural de Vygotsky e suas implicaes para a Psicologia do Desenvolvimento Infantil. Ele est organizado em trs partes. Na primeira ser re-acendido o debate clssico da Filosofia da Cincia acerca da delimitao do objeto de estudo e do modo como abord-lo, o que remete ao problema da relao entre sujeito e objeto na produo do conhecimento cientfico (Gutierrez, 2002). Ser

    tomada como base a obra de Vygotsky denomina-da O significado histrico da crise na Psicologia, escrita entre 1925 e 1927, mas publicada somente em 1982 (Vygotsky, 1990/1927). Em seguida, ser apresentado, em linhas gerais, o Sistema Filosfico Marxista que concede Psicologia Histrico-Cultural uma concepo a respeito de mundo e de homem, das leis de seu desenvolvimento e das vias de acesso e de produo do conhecimento. A partir da sero elucidados os dois princpios fundamen-tais dessa abordagem terico-metodolgica: o prin-cpio da unidade da conscincia e da atividade e o princpio da unidade do biolgico e do social, apli-cados explicao do desenvolvimento ontogen-tico humano. Finalmente, so apresentadas as im-plicaes dessa perspectiva terico-epistemolgica para a compreenso do desenvolvimento psicolgi-co infantil. Objetiva-se com esse artigo oferecer aos pesquisadores do desenvolvimento humano, em geral, e infantil, em particular, um ponto de partida para auxiliar na definio e discusso metodolgica de suas pesquisas.

    Crtica metodolgica Psicologia

    A disputa inconcilivel entre o objetivismo e o subjetivismo, instaurada na cincia psicolgica des-de o seu desmembramento da Filosofia, ficou co-nhecida na dcada de 20 como a crise da Psicologia. Em seu clssico artigo O Significado Histrico da Crise da Psicologia, escrito entre 1925 e 1927 e publicado somente em 1982, Vygotsky realiza uma anlise extensiva e profunda da Crise e aponta a ne-cessidade de unificao de seu mtodo para que a Psicologia pudesse tornar-se positiva, isto , ascen-der a um estado cientfico de fato.

    Em sua anlise, Vygotsky (1990/1927) inicia a discusso demonstrando que os conhecimentos psi-colgicos elaborados na segunda metade do sculo

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    XIX unificaram-se no sistema terico da Psicologia Mentalista ou Idealista. A Psicologia Idealista ou Mentalista compreende os processos psicolgicos de forma relativamente autnoma em relao base biolgica e ao ambiente. Entendido como uma instncia psicolgica estruturada por imagens e smbolos que no apresentam uma relao lgica e temporal com o contexto social e cultural do indiv-duo, o psiquismo seria responsvel por gerar seus prprios contedos.

    Na Psicologia Idealista, o meio de o pesquisa-dor acessar os contedos mentais o racionalista--emprico, que tem como premissa epistemolgica a crena de que a capacidade que o sujeito teria de ter conscincia dos estados subjetivos poderia ser treinada para fins de produo de conhecimento acerca da prpria conscincia. A Fenomenologia de Husserl (1859-1938) e o Introspeccionismo de Wundt (1832-1920) so exemplos que representam o idealismo na Psicologia da poca.

    Nas primeiras dcadas do sculo XX so produ-zidas profundas crticas contra essa postura meto-dolgica subjetivista, introspectiva e interpretativa. Alm do carter especulativo do mtodo, os men-talistas, de acordo com Vygotsky (1990/1927), ao realizar seus estudos com homens adultos e sos, assumiam que esse seria o tipo de funcionamento psicolgico humano que servia de parmetro para estabelecer o que seriam as variaes desse tipo. Partindo de uma viso adultocntrica e sexista, as crianas e mulheres adultas seriam as variaes. As funes mentais das crianas, por exemplo, eram tomadas como qualitativamente semelhantes s dos adultos, mas quantitativamente inferiores.

    Para se contrapor aos idealistas, erguiam-se no-vos sistemas tericos em diferentes continentes. As novas correntes tericas passaram a defender a transformao da Psicologia em uma cincia natu-ral, positiva, a exemplo da Biologia e da Fsica. Para esse grupo, a Psicologia deveria ser objetiva e mate-rialista, na qual a experincia direta (empiria) seria fundamental na pesquisa cientfica. Por essa razo, escolas como a Reflexologia de Pavlov (1849-1936) e o Comportamentalismo de Watson eliminaram os fenmenos que no eram diretamente observ-veis ou de questionvel verificao emprica de seu programa cientfico. Resultaram de seus empreen-dimentos experimentais, descobertas parciais que supervalorizavam os fatores orgnicos e ambientais para a compreenso do comportamento humano e

    que negavam os aspectos subjetivos humanos no campo da pesquisa em Psicologia.

    Vygotsky (1990/1927) afirma que os novos sistemas psicolgicos acabaram por produzir uma inverso da noo do que era considerado, pela Psicologia Clssica, como tipo e variao. A Reflexologia e o Comportamentalismo, por exem-plo, adotaram como tipo o animal, ao passo que a variao seria o homem. A Psicanlise prope que a mulher histrica seria o tipo, enquanto que to-dos os demais seriam variaes do funcionamento neurtico. A Psicopatologia segue a mesma direo, propondo variaes normais de tipos de caracteres patolgicos.

    Para o autor, tanto as teorias de base subjetivista como as de base objetivista estavam produzindo co-nhecimentos parciais, porque empregavam lentes unidimensionais para apreender o objeto. O proble-ma epistemolgico de base gerava explicaes redu-cionistas da realidade e propagava posturas dogm-ticas entre os pesquisadores. O Introspeccionismo, por exemplo, somente interessava-se pela consci-ncia e ignorava a conduta e as manifestaes in-conscientes. O Comportamentalismo de Watson, por sua vez, apenas reconhecia o comportamento, ignorando a conscincia, e a Psicanlise interessa-va-se, fundamentalmente, pelo conceito de incons-ciente em suas mltiplas manifestaes. De fato, segundo Vygotsky (1990/1927), cada um desses sistemas buscava construir uma psicologia positiva, atribuindo indiscriminadamente as suas descober-tas cientficas o status de conceito terico geral. A Reflexologia, ao estabelecer a noo de reflexo, ex-trapolava essa noo para explicar toda a conduta animal e humana; a Psicanlise, ao desvendar os impulsos inconscientes, assume-os como princpio da motivao e ato humano.

    O erro metodolgico da Psicologia Positivista consistia em empregar somente o enfoque de bai-xo para cima (que parte do fato emprico, particu-lar e o transforma em conceito cientfico). O autor identifica um padro uniforme decorrente desse erro: Primeiro se chegava a uma descoberta inicial (reflexo condicionado salivar, neurose histrica, por exemplo). Em seguida, apresentava-se a conceitua-o e elaborava-se um sistema explicativo (Conduta reflexos; ICS libido). Num terceiro momento, era realizada a generalizao do conceito ou sis-tema explicativo a todas as classes de fenmenos (conduta soma de reflexos; desenvolvimento

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    transformao da libido). Finalmente, o conheci-mento cientfico desvinculava-se da realidade prti-ca que o havia gerado e era transformado em viso de mundo (ontologia).

    Assim, o que Vygotsky sugere que a fragmenta-o da Psicologia em escolas e correntes no apenas gerava discordncias em termos de concluses a respeito dos fatos psicolgicos, mas, sim, que os pr-prios fatos psicolgicos no coincidiam na Cincia Psicolgica. Mltiplas abordagens, sobre mltiplos fatos, que geram verdades mltiplas. Nas palavras do autor, um fato qualquer, expressado sucessiva-mente mediante os conceitos de cada um desses trs sistemas [Introspeccionismo, Reflexologia e Psicanlise], adota trs formas completamente dis-tintas; mais exatamente, trs aspectos diferentes do mesmo fato; ou ainda melhor, trs fatos distintos (1990/1927, p. 299).

    O autor prossegue deduzindo que o que cada uma dessas escolas pretendia era possuir um sis-tema explicativo que serviria de base para uma Psicologia Geral. A divergncia metodolgica gera-va, assim, ontologias distintas que eram incomuni-cveis entre si e apontava a necessidade prtica de se sistematizar uma disciplina metaterica, capaz de reunir um conjunto de conceitos e princpios ex-plicativos comuns para unificar Psicologia.

    A falta de princpios tericos gerais, explicativos, unificadores dentro da Psicologia, levava ao redu-cionismo, ou ao seu oposto, o ecletismo (Gonzlez, 2003). Enquanto o enfoque reducionista na Psicologia movido pelo dogmatismo e orienta-se para o estudo de apenas um aspecto da realidade, a postura ecltica aceita e une fragmentos opostos entre si, advindos de distintas teorias e enfoques epistemolgicos, sem preocupar-se em realizar uma anlise concreta que leve em considerao as relaes, o lugar e o momento em que uma determi-nada afirmao verdadeira e a contrria no o .

    Para Vygotsky (1990/1927), as respostas produ-zidas para superar a crise: negar a crise, oferecida pelo ecletismo, ou tomar um partido entre posies polarizadas e reducionistas (minha teoria versus as teorias erradas), no haviam sido satisfatrias. Na sua viso, ambos os posicionamentos desconsidera-vam a essncia dialtica e histrica dos fenmenos psicolgicos e sociais. Vygotsky (1990/1927) opta pelo mtodo positivo, explicativo e cientfico, mas expressa suas reservas. Para ele a Psicologia, alm de materialista e cientfica, deveria ser dialtica e

    histrica. A postura dialtica busca descobrir a uni-dade real e o carter concreto e multidimensional dos fatos e o historicismo considerado um aspecto essencial na explicao dos fatos e fenmenos do desenvolvimento do homem como ser social.

    Sistema Filosfico do Materialismo Histrico e Dialtico

    De um ponto de vista materialista histrico e dialtico, o mundo natural, fsico das coisas distinto do mundo social e histrico dos homens. Ainda que todos os fenmenos da realidade mante-nham uma relao de interdependncia (ou de rela-o mtua entre si), as leis que regem as relaes de dependncia entre os objetos do mundo fsico so naturais, frutos de investigao de diferentes ra-mos das cincias naturais, como a fsica e a qumica (Marx & Engels, 2002/1845).

    Os fenmenos de natureza histrico-social, por sua vez, tm leis prprias inerentes a essa natureza. Nessa perspectiva filosfica, as leis das cincias na-turais no dariam conta da elucidao dos proble-mas humanos. Para Vygotsky (1990/1927), o mto-do materialista dialtico seria o nico mtodo capaz de oferecer as leis gerais que buscam compreender e explicar os fenmenos psicossociais.

    As leis do materialismo dialtico baseiam-se na lgica dialtica hegeliana, substituda a sua base idealista por uma perspectiva material da realidade. A dialtica hegeliana dita idealista porque exclui elementos histricos e materiais de sua anlise da realidade (Marx & Engels, 2002/1845). Para Marx e Engels (2002/1845) a dialtica idealista de Hegel produz uma histria de natureza mnemnica, isto , que se fundamenta na conscincia da conscincia. De acordo com a viso marxista, o erro da dialtica hegeliana est em pressupor que a conscincia ex-plica o ser, quando em realidade deveria ser o ser social, em suas condies concretas de vida, que de-terminaria a conscincia. Assim, enquanto que para Hegel o mundo se constitui a partir do pensamento, para Marx e Engels (2002/1845) o pensamento que se constitui a partir da realidade, pois as idias nada mais so do que coisas materiais transpostas e traduzidas na cabea dos homens (p. 203).

    A partir dessa perspectiva, o mundo no visto como um conjunto de coisas perfeitas e acabadas, mas sim como um complexo de processos. As

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    fases do processo so a tese, anttese e sntese. O confronto da tese com a anttese gera uma sntese, qualitativamente diferentes do estgio anterior de desenvolvimento. O desenvolvimento dos proces-sos no segue um movimento linear e necessrio captar seu movimento e as foras que promovem os saltos.

    Todo fenmeno psicolgico, nesse sentido, so-mente pode ser compreendido em sua dinamici-dade, dentro das condies sociais e histricas em que produzido. Compreender o fenmeno psico-lgico e social implica desvendar sua estrutura e processo, situ-lo no espao e tempo. Qualquer in-vestigao que toma o homem fora de seu contexto histrico leva ao conhecimento parcial e ideologi-zado (Marx & Engels, 2002/1845). Assim, a viso de mundo e de ser (ontologia) do materialismo histrico e dialtico implica um olhar e uma com-preenso do mundo (epistemologia) e de homem (antropologia).

    Alm disso, o mtodo dialtico se expressaria concretamente na integrao de diferentes tcnicas e prticas profissionais da Psicologia que estavam se desenvolvendo desconectadas da psicologia te-rica. Para Vygotsky (1990/1927), a prtica teria um papel fundamental no desenvolvimento da cincia psicolgica. De fato, ao confrontar-se com os pro-blemas prticos observados na clnica, na escola e na indstria, a Psicologia se veria obrigada a rever seus prprios princpios. O autor conclui, com base nesse raciocnio, que a epistemologia e a prtica formam uma unidade que d origem e impulsiona a Crise e, em si mesma, a fonte de sua superao.

    Teoria histrico-cultural

    A Teoria histrico-cultural de Vygotsky nasceu como um projeto cientfico ambicioso que buscava construir uma Psicologia verdadeiramente cient-fica, assentada sob o mtodo materialista histri-co e dialtico. De fato esse foi um projeto indito, ainda que na Rssia ps-revoluo (1917) toda a Psicologia de linha marxista estivesse empe-nhada em construir uma Psicologia positiva. Isso porque o momento histrico ps-revolucionrio imprimia uma nova organizao social na Rssia, que visava instaurar o comunismo como modo de produo. Com a Revoluo Socialista, uma srie de demandas foram impostas s diferentes reas

    de conhecimento. Como resposta a essas deman-das, surgiam tentativas de construir uma Biologia Marxista, uma Fsica Marxista, uma Cincia Agrcola Marxista (Kozulin, 1994; Rubinstein, 1964).

    Vygotsky (1990/1927) afirmava que a Psicologia Marxista podia ser to dogmtica, reducionista e falsedora da realidade quanto qualquer outra cor-rente na Psicologia. No seu texto Sobre Mtodo de Investigao Reflexolgica em Psicologia (Vygotsky, 1984/1930) o autor analisa os traba-lhos de alguns pesquisadores russos da poca como Blonski (1884-1941), Kornilov (1879-1957), Bekhterev(1857-1927) e Pavlov (1849-1927) que aboliram a conscincia e processos psicolgicos su-periores e mostra-se contrrio a essa postura dog-mtica: No quero descobrir [a natureza da] psi-que de graa, recolhendo algumas citaes. Quero aprender, a partir do conjunto do mtodo de Marx como construir uma cincia, como abordar a inves-tigao da psique (Vygotsky, 1991/1925, p. 421).

    No artigo A Conscincia como Problema da Psicologia do Comportamento (1991/1925), con-trapondo-se ao pensamento hegemnico mecani-cista, Vygotsky defende a ideia de que a Psicologia como cincia particular deveria dirigir seus esforos pesquisa da conscincia e da conduta do homem, como ser histrico, social, trabalhador e consciente. O autor partia da premissa de que os fenmenos psi-colgicos tipicamente humanos, aqueles mediados pelos signos, como a ateno voluntria, a memria episdica e semntica e o pensamento verbal, se-riam qualitativamente diferentes dos processos psi-colgicos elementares, observados numa variedade de espcies animais. Orientado pela ideias de Marx, Vygotsky apontava que o mtodo de cima para bai-xo poderia ser til na Psicologia, assim como fora na anlise econmica e social da sociedade capita-lista produzida em O Capital.

    O desenvolvimento dos processos psicolgicos superiores

    Os processos psicolgicos superiores dizem res-peito s capacidades psicolgicas especificamente humanas, como o pensamento conceitual, a mem-ria semntica e a imaginao que se formam pela mediao cultural e se desenvolvem com a ajuda dos procedimentos sociais de produo intelectual, dos quais se apropria o indivduo. Consequentemente, sua estrutura e o mecanismo de sua realizao tm

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    uma origem social e se desenvolvem sob a influn-cia da educao informal e formal na maioria das culturas humanas (Vygotsky, 1995/1931).

    Os processos psicolgicos elementares, por sua vez, presentes tambm em outras espcies animais, deveriam ser explicados mediante a complexifica-o de estruturas e do funcionamento de seu siste-ma nervoso, pela ao das leis biolgicas da evolu-o propostas por Darwin (1859). Entretanto, para explicar o psiquismo humano, o autor enfatizava que as leis da evoluo biolgica deveriam ceder lugar ao das leis de natureza histrico-social (Vygotsky & Luria, 1996; Vygotsky, 1995/1931). Para o autor, na realidade, as duas linhas de desen-volvimento (a natural e a histrico-cultural) esto presentes na ontognese formando um processo nico e complexo que se interpenetram, dando ori-gem a um indivduo de natureza biolgico-social.

    Essa diferenciao entre as linhas de desenvol-vimento foi posteriormente alvo de crticas de seus seguidores, como Davidov, que a entendia como desnecessria, haja vista que as funes psicolgi-cas do ser humano, desde seu nascimento, so so-cialmente determinadas (Davidov, 1988). Leontiev e Luria (1968) defenderam, entretanto, que tal di-viso dos processos em linhas de desenvolvimento constitua somente um artifcio metodolgico. Nas palavras de Vygotsky (1987, p. 40):

    El desarrollo cultural del nio se caracteriza preci-samente, en primer lugar porque se realiza con un cambio dinmico del tipo orgnico. Se apoya sobre los procesos de crecimiento, maduracin y progre-so orgnico del nio y forma con l un todo nico. Solamente mediante la abstraccin podemos separar estos procesos.

    Como possvel deduzir, dentro da lgica mate-rialista histrica e dialtica, a anlise do psiquismo deveria partir daquelas formas da conduta que di-ferenciam a conduta do homem da conduta dos de-mais animais. Nos animais, o processo que envolve as relaes de regulao entre o organismo e seu meio fundamenta-se tanto nas mudanas adaptati-vas que acontecem no organismo (e rgos) como no psiquismo; desde sua forma mais elementar, encontrada em seres vivos bastante simples, at as formas mais complexas, encontradas em smios e, em grande extenso, no homo sapiens (Leontiev, 1978b).

    Diferentemente dos demais animais, peculiar ao homem a capacidade de intervir transformando radicalmente o meio em que vive. Ao transformar a realidade, o homem transforma a si mesmo (Leontiev, 1978b). Os meios e os processos envolvidos na trans-formao da natureza so, ao mesmo tempo, objetivos (instrumentos externos) e subjetivos (instrumentos internos, ou psicolgicos). A atividade a categoria que explicita a dialtica do sujeito e objeto. Assim, a relao do homem com a realidade que o rodeia definida como uma inter-relao ativa (Rubinstein, 1962; Kossakowski, 1987; Leontiev, 1978a).

    Essa viso sustenta um dos mais importantes princpios da Psicologia Vygotskyana: o princpio da unidade da conscincia e da atividade. Aqui a conscincia adquire materialidade/objetividade e sai do campo da metafsica, deixando de ser uma entidade abstrata (Kossakowski, 1987; Abuljanova-Slavskaia, 1987; Colectivo de Autores, 1989).

    Princpio da unidade da conscincia e da atividade

    O princpio da unidade da conscincia e da ati-vidade explicita o carter dialtico e materialista dessa abordagem. A categoria atividade foi desen-volvida inicialmente por Rubinstein e Leontiev, a partir da dcada de 1930 (Rubinstein, 1962, 1964). Enquanto Leontiev tomou como objeto central da Psicologia a atividade externa, prtica do sujeito, Rubinstein centrava seus esforos para elucidar o problema da atividade interna da personalidade.

    Para Leontiev (1978a) a atividade tipicamente humana movida por necessidades ou interesses de um sujeito para uma finalidade. O sujeito ati-vo e atua sobre os objetos da realidade, mas a sua atuao no biologicamente programada, mas sim impulsionada por motivos. A atividade humana , por isso, sempre orientada para algo ou algum, como um movimento resultante das necessidades (ou interesses) internas e externas dos sujeitos.

    Rubinstein (1962), por sua vez, enfatizou a im-portncia central da categoria personalidade para a teoria psicolgica de orientao filosfica mar-xista. Para o autor, o psiquismo humano surge e se manifesta na atividade externa (na transforma-o do mundo e de si mesmo), como um reflexo do mundo social e natural que existe fora do sujeito. Entretanto, a conscincia humana e a personalidade tm um papel ativo e criador na atividade humana

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    de transformao do mundo e de si mesma. Esse pa-pel pode ser percebido na regulao intencional de toda atividade externa (falar, ler, andar etc.).

    Pesquisadores atuais dessa escola terica enten-dem que a abordagem das diversas funes psquicas superiores, a partir da categoria atividade, necessita considerar suas duas caractersticas fundamentais: sua objetividade e sua subjetividade (Gonzlez, 2003). A atividade no s objetiva no sentido de que est determinada pelo mundo material objetivo, mas tambm no sentido de que o mundo material atua sobre o homem por meio de sua atividade e no diretamente. Surge, assim, uma interao recproca entre o objeto e o sujeito da atividade: por um lado, o objeto aparece em uma relao com a atividade e, por outro, o sujeito se dirige ao objeto como objeto de uma necessidade (Gutierrez, 2002).

    A unidade do biolgico e do social

    O segundo princpio fundamental da teoria his-trica o princpio da unidade entre o biolgico e o social. A relao entre a biologia e a cultura um tema historicamente controverso na histria da Psicologia, revelando posicionamentos irredutveis e inconciliveis. Segundo Zaporozhets (1987), a oposio do biolgico e do social deve ser conside-rada como relativa, haja vista que as particularida-des morfofisiolgicas do homem se desenvolveram e fixaram hereditariamente no perodo da antropo-gnese primitiva, sob a influncia das prticas so-cioprodutivas do homem na sociedade primitiva e, tambm, de sua comunicao lingustica.

    A viso de Zaporozhets (1987) representativa da Psicologia Histrico-Cultural que enfatiza a de-pendncia da conscincia humana nas condies educativas e vitais da sociedade, mas no nega as propriedades orgnicas do indivduo para seu de-senvolvimento psicolgico (Luria, 1978). Um ser vivo tem que nascer com particularidades morfofuncio-nais herdadas, especificamente humanas, para que possa produzir-se um processo de desenvolvimento psquico especificamente humano (Luria, 1978).

    Experimentos realizados com primatas (Kellogg & Kellogg, 1933; Ladygina-Kohts, 2002 e Gardner & Gardner, 1994) constatam que se eles so colocados em condies de vida e educao similares as de uma criana, adquirem uma srie de comportamen-tos no usuais para sua espcie, mas, apesar disso,

    no alcanam as qualidades psquicas caractersti-cas dos homens. Essas constataes corroboram a hiptese de que sejam necessrias caractersticas genticas e funcionais de um crebro humano para que seja possvel o processo especfico da ontogne-se do psiquismo humano (Zaporozhets, 1987).

    As diferenas qualitativas entre os animas e hu-manos, sustentadas pelas bases orgnicas, tambm podem ser observadas entre o desenvolvimento on-togentico e o desenvolvimento filogentico do psi-quismo humano (Vygotsky, 1991/1925). Enquanto a filognese da conscincia humana se desenvolve sem mudanas relevantes nas propriedades morfo-lgicas do homem da transio do paleoltico m-dio para o superior (Vygotsky, 1991/1925; Mithen, 1998), a ontognese do psiquismo na criana ocorre no processo de amadurecimento de um organismo infantil (Vygotsky, 1995/1931; Luria, 1978). Assim, o crebro de um recm-nascido se diferencia do c-rebro adulto quanto ao seu tamanho e sua estru-tura interna, assim como quanto s suas possibili-dades funcionais (Luria, 1988). Antes de atingir seu amadurecimento, experimenta mudanas essenciais e, nos diferentes perodos de desenvolvimento, ge-ram-se possibilidades diferenciadas para a apropria-o de novas experincias e formao de novos pro-cessos (Vygotsky, 1995/1931; Luria, 1988). A esse respeito, existe a hiptese de que a aprendizagem, que estimula o desenvolvimento de determinadas funes psicofisiolgicas, seja particularmente efe-tiva nos primeiros anos de vida, quando acontecem os perodos mais intensos de amadurecimento dos mecanismos nervosos correspondentes (Vygotsky, 1995/1931; Luria, 1988). A partir dessa perspectiva terica, a aprendizagem no s conduziria a mudan-as funcionais, mas poderia ter tambm influncia direta na formao do substrato cerebral da ativida-de psquica. Em contrapartida, as particularidades morfofisiolgicas, como um processo de amadure-cimento normal na infncia, so condies no s importantes, mas necessrias, para um desenvolvi-mento psicolgico satisfatrio.

    O desenvolvimento infantil sob o ponto de vista da Psicologia Histrico-Cultural na atualidade: Implicaes para a pesquisa

    A psicologia Vygotskyana atual aborda o desen-volvimento psicolgico como um processo dinmico

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    que conduz a mudanas quantitativas e qualitativas do conjunto de funes e atividades, assim como dos elementos particulares do comportamento humano (Galperin, 1987; Davidov, 1988; Colectivo de Autores, 1989; Przetacznikowa, 1987). A mudana no desenvol-vimento psicolgico tem carter progressivo e orien-tado realizao de formas cada vez mais efetivas de regulao da inter-relao entre o indivduo e o meio (Zaporozhets, 1987; Galperin, 1987; Davidov, 1988; Colectivo de Autores, 1989; Przetacznicowa, 1987).

    As mudanas qualitativas, mais importantes, ou seja, as transformaes essenciais na conduta dos indivduos e na sua conscincia, determinam o passo fase seguinte de desenvolvimento, a uma nova fase da vida, diferenciada das precedentes. Parte-se de uma concepo de desenvolvimento por estgios, por sequncia de fases (Leontiev, 1978b; Vygotsky, 1995/1931; Zaporozhets, 1987). Os per-odos ou etapas e dentro deles as fases, delimitadas por mudanas especficas de menor abrangncia, constituem fatos psicolgicos reais. Em outras pa-lavras, essa caracterstica de constituio em etapas (a regularidade da sucesso das mudanas no de-senvolvimento) considerada uma propriedade es-trutural do processo de desenvolvimento e, ao mes-mo tempo, um elemento essencial da organizao psquica (Leontiev, 1978b; Vygotsky, 1995/1931; Zaporozhets, 1987).

    Naturalmente, os limites dos estgios no so fixos e dependem da dinmica e do ritmo individu-al de desenvolvimento. Mas, em cada etapa surge um complexo peculiar de qualidades que em cada criana se manifesta de maneira individual e nica. A delimitao e aproximao dos estgios a respeito de determinados anos da vida (delimitao crono-lgica) tem lugar sobre a base de trs critrios: 1) O tipo e o nvel de conhecimento e conscincia da rea-lidade que circunda a criana; 2) A atividade predo-minante na criana; 3) As formas e mtodos espe-cficos de influncia educacional (Leontiev, 1978b; Zaporozhets, 1987).

    O primeiro critrio significa que em cada um dos perodos mencionados se verificam mudanas es-senciais no tipo de compreenso dos objetos e fen-menos do mundo circundante, mudanas no tipo de conhecimento da realidade (nas formas da percep-o, memria, pensamento etc.). O segundo critrio assinala que em cada perodo ocorrem importantes mudanas na atividade da criana, mostrando no-vas formas de ao e de atividades que modificam

    sua conduta. Com o terceiro critrio se explicita que cada perodo exige suas prprias formas e mtodos de influncia educativa sobre a criana. Com a influ-ncia constante do meio educacional e com a ida-de, muda o volume e o carter das informaes que estimulam o desenvolvimento dos conhecimentos e se diferenciam os meios de educao de crianas e jovens (Zaporozhets, 1987). Vale ressaltar que os trs critrios mencionados so abordados na sua relao mtua: as mudanas na conscincia se rea-lizam sob a influncia da educao e se expressam nas mudanas de atividade e ao da criana.

    Sobre a anlise condicional e causal do desenvolvimento

    Para Przetacznikowa (1987), o problema das condies e dos fatores do desenvolvimento ps-quico ao mesmo tempo o problema de seus me-canismos, das foras motrizes de sua dinmica. A anlise condicional e causal do desenvolvimento ontogentico pode contribuir soluo do proble-ma (Przetacznikowa, 1987). A primeira (a anlise condicional) procura a pesquisa das condies nas quais se realiza o desenvolvimento do homem; a ou-tra (a anlise causal) procura identificar e explicar os nexos entre causas e efeitos neste processo.

    Ao diferenciar as condies das causas, a auto-ra prope que o desenvolvimento psicofsico de um organismo um processo que se efetua em determi-nadas condies. Das condies de desenvolvimen-to depende a apario e continuidade de um deter-minado fenmeno, ou a permanncia de um estado de coisas. As causas, por sua vez, so um tipo parti-cular de condies. Entretanto, elas somente podem ser identificadas quando um determinado fenme-no ocorre, necessariamente, a partir de outro, numa relao irreversvel (Przetacznikowa, 1987).

    Frequentemente, na Psicologia do Desenvolvimento, tanto as condies externas (meio) como as internas do desenvolvimento psico-lgico (fatores orgnicos) so chamadas fatores de desenvolvimento. As causas, nesse contexto, so ao mesmo tempo os mecanismos e as foras motrizes do desenvolvimento, sendo que as foras motrizes esto inter-relacionadas por uma rede de causas e efeitos com as mudanas e efeitos evolutivos.

    A partir da anlise condicional e causal pro-posta por Przetacznikowa (1987), estabelecida uma abordagem alternativa que estabelece uma

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    delimitao entre as condies em que acontece o desenvolvimento psicolgico e as determinantes, ou causas, do dito desenvolvimento. No grupo dos con-dicionantes, encontramos as condies genticas e ecolgicas do desenvolvimento psicolgico, que cor-respondem aos fatores tradicionalmente chamados de orgnicos e meio na psicologia do desenvolvi-mento. No segundo grupo, das causas, esto a ati-vidade e a educao, ou seja, aqueles fatores que influenciam diretamente nas mudanas evolutivas.

    Dentre as condies orgnicas, destacam-se aquelas relacionadas com a dotao gentica do in-divduo, com seu gentipo. Como estabelece a gen-tica atual, os chamados modos de desenvolvimento dependem de diferenas genotpicas, e os fatores genticos aportam predisposies para o desen-volvimento individual (Wolanski, 1970; Alexander, 1989; Keller, 2002). A influncia dos genes sobre as caractersticas psicolgicas mediada e no mec-nica e, portanto, muda em dependncia de diversas condies relacionadas ao ambiente. Da mesma forma, a influncia do meio sobre as caractersticas psicolgicas depende das condies herdadas dos indivduos. Para Przetacznikowa (1987) os fatores ecolgicos, tais como a pertena a uma determina-da classe social, a situao econmica da famlia, a formao e profisso dos pais e outras, funcionam de modo distinto em diversas culturas e, por essa razo, o alcance de sua influncia no pode ser de-terminada de modo geral.

    Na explicao das causas, Przetacznikowa (1987) considera os fatores necessrios e impres-cindveis no desenvolvimento dos processos psqui-cos e das formas de ao do indivduo. Na anlise causal dinmica dos determinantes do desenvolvi-mento que influenciam as diversas etapas da onto-gnese, podem ser determinados os mecanismos de alguns fenmenos que se expressam em mudanas e caractersticas do desenvolvimento psicolgico. Entre os determinantes mais importantes do desen-volvimento infantil, a autora destaca a atividade, indispensvel para o desenvolvimento e a educa-o que dirige o desenvolvimento da conscincia e da personalidade da criana mediante mecanismos supraordenados de regulao e adaptao.

    Assim, a anlise condicional do desenvolvimento apresentada tem por objetivo identificar e explicar o conjunto de condies externas e internas onde se produz o desenvolvimento psicolgico da crian-a, enquanto a anlise causal tenta dar resposta,

    primariamente, por que ou de que modo e por que meio acontecem as mudanas evolutivas.

    Sobre o papel da atividade da criana

    A atividade da criana possui uma qualidade particular: uma determinante do seu desenvol-vimento psquico e, ao mesmo tempo, est sujeita a ela mesma, na medida em que avana a idade, ao desenvolvimento e ao aperfeioamento (Leontiev, 1978b; Zaporozhets, 1987). O carter progressivo da atividade humana consiste, precisamente, no fato de que no curso de vida se diversificam e am-pliam seus campos de ao, as diversas ocupaes se aperfeioam e, alm disso, devido ao fato de que o homem, em um meio cada vez mais complexo, mudar o repertrio de suas atividades e aes, pos-sibilita-se uma regulao eficiente de suas relaes com o meio (Leontiev, 1978b; Zaporozhets, 1987). Finalmente, vale ressaltar que a plasticidade da ati-vidade prpria dos humanos, que implica a capaci-dade de desenvolver novas formas de atividades e aes, transformar as j desenvolvidas, ou dar-lhes outra direo, inversamente proporcional idade do indivduo; ou seja, maior na infncia e na juven-tude que nas etapas posteriores do desenvolvimen-to (Leontiev, 1978a; Zaporozhets, 1987).

    Sobre o papel da educao

    A formao do psiquismo na ontognese no se apoia somente nos contatos casuais da criana com os diversos elementos do meio, numa intera-o acidental entre o indivduo, os acontecimentos e fenmenos que so um produto da vida social. A interao social conduzida de forma consequente pelos educadores da criana e pelas diversas ins-tituies sociais que se ocupam especialmente da organizao e execuo do processo de educao e prestam ajuda aos pais no desempenho das funes educativas (Vygotsky, 1994). O meio educacional, seja na famlia, na pr-escola, na escola etc., pode ser considerado como um elemento das condies de vida da criana no sentido amplo, ou seja, dos fatores ecolgicos do desenvolvimento (Vygotsky, 1994; Zaporozhets, 1987).

    Por outro lado, os processos de educao que tm lugar nesse meio constituem, junto

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    atividade, o segundo determinante indispens-vel do desenvolvimento ontogentico (Vygotsky, 1994; Zaporozhets, 1987). A essncia desse pro-cesso consiste em produzir, na psique da criana em desenvolvimento, mudanas relativamente permanentes por meio das influncias educativas, aquelas que tm sentido progressivo, ou seja, con-tribuem com o desenvolvimento social e individu-al da pessoa e correspondem a objetivos educacio-nais e sociais. Dependendo do tipo de educao, as influncias tero um carter mais ou menos intencional, consciente, planificado e organizado (Galperin, 1959).

    Essa viso tem implicaes para a anlise psico-lgica da prtica educativa atual, na qual os objeti-vos, os mtodos e os meios de educao esto habi-tualmente adaptados s idades das crianas e suas etapas de desenvolvimento, assim como s qualida-des individuais da pessoa em desenvolvimento. De acordo com a perspectiva Vygotskyana, as exign-cias educacionais devem superar o nvel atual de desenvolvimento psquico do indivduo. A educao s efetiva afirmava Vygotsky (1994), quando se antecipa ao desenvolvimento e se dirige quelas qualidades que se encontram ainda nos seus rudi-mentos, que no esto ainda amadurecidas.

    A fora da educao como determinante do de-senvolvimento est, sobretudo, no fato de que ela um processo social. Ela se configura como um pro-cesso organizado e executado por toda a sociedade. Diferentes instituies da vida social se implicam na realizao e nos efeitos e resultados deste processo, desde a famlia e a comunidade, at amplos crculos da sociedade; todos eles participam de forma mais ou menos direta na educao das novas geraes. Ambos, os determinantes do desenvolvimento--educao e a atividade prpria, esto intimamente vinculados. A educao que a sociedade e os outros proporcionam se transforma, progressivamente, durante o desenvolvimento individual, em autoe-ducao e autoformao, existindo entre ambos os fatores uma estreita interdependncia.

    Consideraes finais

    A compreenso das bases filosficas e episte-molgicas de um determinado aporte terico faz--se premente quando ingressamos no campo da pesquisa em Psicologia. O problema da delimitao

    do objeto de estudo tem sido abordado pelas dife-rentes disciplinas cientficas e constitui o mtodo de uma cincia particular. Falar de mtodo, por-tanto, implica abordar o processo de produo de conhecimento desde um ponto de vista filosfico, explicitando uma concepo de mundo e do ser (ontologia), uma teoria geral acerca do modo como conhec-los (epistemologia) o que necessariamente depende do estabelecimento da relao entre o ob-jeto e o sujeito, e uma viso sistematizada das vias e dos meios (instrumentos e procedimentos, ou da tecnologia) para acessar e/intervir sobre o objeto de estudo (metodologia).

    No mbito das cincias humanas, interessa uma classe particular de fenmenos os fenmenos psi-cossociais. O homem, em suas mais variadas ativi-dades no mundo (atividades nas quais estabelece relao com os objetos do mundo, com outros ho-mens e consigo mesmo) o objeto de estudo das cincias humanas. Por essa razo, de um ponto de vista metodolgico, interessa tambm ao pesquisa-dor explicitar a sua antropologia, ou, dito de outra forma, a viso de homem da qual parte para explicar os fenmenos humanos.

    Diferentemente dos fenmenos naturais, os fe-nmenos de natureza psicossocial so objetos de difcil delimitao e apreenso. A dificuldade deve--se a dois fatores essenciais: de um lado, prpria natureza complexa, processual e multidimensional dos fenmenos psicossociais; de outro, aos meios disponveis para acess-los e compreend-los. Acessamos e desvendamos a realidade humana por meio das capacidades humanas do pensamento, como a de raciocinar, analisar, abstrair, sintetizar e generalizar. A discusso do mtodo , portanto, de natureza filosfica, e fundamenta o processo de produo de conhecimento, nas mais diversas re-as do conhecimento, mas tem relevncia particular para as cincias humanas. Da a necessidade de promover debates dessa natureza no contexto de formao de pesquisadores e professores universi-trios brasileiros.

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