Acordao Nulidade Da Sentença

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  • 8/16/2019 Acordao Nulidade Da Sentença

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    Acórdãos STA  Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo Processo:  0173/09 

    Data do Acordão:  01-07-2009 

    Tribunal: 

    2 SECÇÃO 

    Relator:  JORGE DE SOUSA 

    Descritores:  NULIDADE DE SENTENÇAOMISSÃO DE PRONÚNCIA 

    Sumário:  I – A nulidade de sentença por omissão de pronúncia

    verifica-se quando o Tribunal deixe de se pronunciar sobrequestões sobre as quais deveria pronunciar-se - arts. 125.º

    do CPPT. 

    II – O Tribunal tem o dever de se pronunciar sobre todasas questões suscitadas pelas partes cujo conhecimento nãofique prejudicado pela solução dada a outras questões [art.

    660.º, n.º 2, do CPC, subsidiariamente aplicável, por força

    do disposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT]. 

    Nº Convencional:  JSTA000P10656 Nº do Documento:  SA2200907010173 Recorrente:  A... Recorrido 1:  CM DE LISBOA E OUTRO 

    Votação:  UNANIMIDADE 

    Aditamento: 

    Texto Integral Texto Integral:  Acordam na Secção do Contencioso Tributário do

    Supremo Tribunal Administrativo: 1 – A…, impugnou no Tribunal Administrativo eFiscal de Sintra uma liquidação de taxas deocupação da via pública, Aquele Tribunal julgou a impugnação improcedente. Inconformada, a Impugnante interpôs o presenterecurso para este Supremo Tribunal Administrativo,apresentando alegações com as seguintesconclusões: 1. A Sentença recorrida incorre em omissão de

    pronúncia pelo que deve ser considerada nula;2. Em termos tributários, pode definir-se a taxa como

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    uma prestação pecuniária, imposta coactiva ouautoritariamente pelo Estado ou outro ente público;sem carácter sancionatório; ligada à utilizaçãoindividualizada, pelo contribuinte, solicitada ou não;de bens públicos ou semi-públicos; comcontrapartida numa actividade do credorespecialmente dirigida ao mesmo contribuinte. (verdefinição adoptada pelo Ac. STA de 16.06.99 tiradono âmbito do Recurso n.º 23175);3. Aplicando ao caso em apreço a definição exposta,conclui-se que não estamos perante uma taxa umavez que a mesma pressupõe uma utilizaçãoindividualizada dos bens semipúblicos, que nãoocorre no mesmo;

    4. Ainda que se conclua, o que se por mero dever depatrocínio, que existe a dita individualização omesmo nunca poderá ser dito quanto à divisibilidadedo benefício levando à impossibilidade de liquidaçãodo tributo;5. Não estamos perante uma utilização de bensdominiais para satisfação de necessidadesindividuais da Recorrente mas sim, perante umaocupação e utilização de bens dominiais parainstalação e funcionamento de um serviço público;  6. Trata-se de bens públicos utilizados na suafunção própria de satisfação de necessidadescolectivas, sem que se possa individualizar quem, eem que medida, pode individualmente usufruir dasutilidades dessa ocupação;7. Não existindo uma contrapartida individualizadapara a Recorrente do pagamento daquelas "taxas",as quantias que a CMA pretende cobrar a esse títuloextravasam claramente os limites legais daquela

    figura, tratando-se de um imposto dissimulado einadmissível na nossa ordem jurídica na medida emque se encontra vedado aos municípios face àConstituição e à lei criar impostos, sendo de seconsiderar nulas as liquidações efectuadas;8. Ainda que se viesse a entender que o tributo emcausa constitui uma taxa, o que se admite semconceder por mera cautela de patrocínio, sempre sediria que a mesma seria nula;9. Conforme foi alegado na Petição Inicial de

    Impugnação, a ilegalidade do tributo admitindo queseja uma taxa - e consequente nulidade, resulta da

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    desconformidade do mesmo e das normas que oinstituem com o contrato de concessão celebradoentre o Estado e a Recorrente e, bem assim com aLei de Bases em que o mesmo assentou;10. As Bases da Concessão aprovadas peloDecreto-Lei n.o 33/91, consagram na nossa ordemurídica a assunção pelo Estado da responsabilidadepela instalação e funcionamento do serviço públicode distribuição de Gás Natural;11. O Estado para prosseguir as atribuições a seucargo dispõe da prerrogativa de usar os bens dodomínio público, já que por definição estecompreende os bens afectos, por lei, a fins deinteresse público, mormente o subsolo que subjaz às

    vias públicas municipais;12. Tendo o Estado optado pela concessão doserviço público de distribuição de gás natural a umaentidade privada, transferiu para esta não só umconjunto de direitos e de obrigações, como tambémum conjunto de prerrogativas de autoridade de quedispõe para prosseguir essa atribuição - cfr. art. 23.º,al. c) do Decreto-Lei n,? 374/89, de Outubro,alterado pelo Decreto-Lei n.º 8/2000, de 8 deFevereiro;13. Com efeito, de acordo com a Base XVII dasBases anexas ao Decreto-Lei n.º 33/91, "aconcessionária terá direito de utilizar o domíniopúblico para efeitos de implantação e exploraçãodas infra-estruturas da concessão, nos termos dalegislação aplicável";14. O Estado transferiu para a concessionária, oraRecorrente, a prerrogativa de utilização de bens dodomínio público [tout court] - ou seja, quer tais bens

    sejam do Estado, quer sejam do município -, namedida em que tal seja necessário para aimplantação e exploração do serviço público de gásnatural;15. Em virtude do contrato de concessão e daaprovação do traçado e do projecto da rede de gásnatural, a CMA ficou privada dos poderes deadministração e disposição sobre a porção dosubsolo da via pública considerada necessária àinstalação das infra-estruturas adequadas ao

    estabelecimento da concessão, uma vez que aquelaficou afecta a um uso público que se enquadra nas

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    atribuições do Estado;16. Apenas o Estado, enquanto entidadeconcedente, pode definir, por força da lei queaprovou as Bases da Concessão, as condições emque o concessionário poderá exercer o direito quelhe é atribuído por aquelas bases de implantar nodomínio público, qualquer que ele seja, a rede degás natural;17. Pelo exposto, não pode a CMA, sob pena deinvasão das atribuições do Estado-concedente,pretender regular as condições do uso peloconcessionário do subsolo das vias públicasmunicipais considerado necessário à implantação degás natural de Lisboa;  

    18. Caso se entenda insuficiente o quanto fica dito apropósito da nulidade do acto de liquidação dastaxas impugnadas, sempre se dirá ainda que nãopodem ter a natureza de taxas os tributos exigidospela CMA, porquanto não cabendo a esta o poder dedispor sobre a porção do seu domínio na medida donecessário à instalação da concessionária (emvirtude da celebração do contrato de concessão e daaprovação do traçado e do projecto da rede), faltaaqui para além do supra mencionado requisito daindividualização da contrapartida a própria naturezade contrapartida que seria essencial para que sepudesse falar de uma verdadeira e própria taxa;19. Quando muito a CMA teria direito, atendendo àdesafectação do uso dominial – ainda que limitada aum uso específico – a alguma compensação, namedida em que por força do Decreto-Lei n.º 33/91,complementado pelos despachos que aprovam otraçado da rede, possa ter sido lesada na sua

    capacidade de afectar os bens em causa a outrosusos e de assim os poder empregar para satisfazeras atribuições a seu cargo, mas nunca poderiapretender cobrar regularmente uma taxa, razão porque estamos, assim, perante um tributo que não éexigível, nem devido por ser nulo.Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis,deverá o presente recurso ser acatado e julgadoprocedente, sendo, em consequência, revogada adouta sentença recorrida. 

    Não foram apresentadas contra-alegações. O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto emitiu

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    douto parecer nos seguintes termos: Questão preliminar: alega a recorrente que adecisão recorrida padece de nulidade por omissãode pronúncia um vez que não se pronunciou sobreas seguintes questões suscitadas pela recorrente napetição inicial  - Improcedência do tributo em causa por ausênciade divisibilidade do benefício gozado;  - A violação do p. da igualdade e daproporcionalidade;  - A natureza da concessão levando à transferênciadas prerrogativas de autoridade para oconcessionário;  - A natureza de serviço público subjacente à

    actividade prestada afectando bens públicos à suafunção própria;  - A (prevista) extensão de competências presente naLei do Orçamento de Estado de 2004 (LOE) -A violação das atribuições do Estado Concedente. Afigura-se-nos que o recurso merece provimentonesta parte, pelo menos quanto à alegada omissãode pronúncia relativa à violação dos princípios daproporcionalidade e da igualdade. Com efeito, resulta do artigo 125.º nº 1 do Código deProcedimento e de Processo Tributário queconstituem causas de nulidade da sentença a faltade assinatura do juiz, a não especificação dosfundamentos de facto e de direito da decisão, aoposição dos fundamentos com a decisão, a falta depronúncia sobre questões que o juiz deva apreciarou a pronúncia sobre questões que não devaconhecer. Dispõe, por sua vez, o art. 660º nº 2 do Código de

    Processo Civil que o juiz deve resolver todas asquestões que as partes tenham submetido à suaapreciação, exceptuadas aquelas cuja decisãoesteja prejudicada pela solução dada a outras. Como este Supremo Tribunal Administrativo vementendendo, haverá omissão de pronúncia sempreque o tribunal, pura e simplesmente, não tomeposição sobre qualquer questão que devesseconhecer, inclusivamente, não decidindoexplicitamente que não pode dela tomar

    conhecimento - cf. neste sentido Acórdãos de09.04.2008, recurso 756/07, e de 23.04.2008,

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    recurso 964/06, i www.dgsi.pt. Ora a recorrente havia suscitado na petição inicial areferida questão, relacionada com a questão danatureza sinalagmática da taxa, argumentando queos actos de liquidação impugnados se encontravamferidos de nulidade, por violação dos princípiosconstitucionais da igualdade e da proporcionalidade. Como se constata de fls. 270 e segs. a sentençarecorrida não se pronuncia sobre esta questão, deque deveria conhecer. Assim sendo e atento o disposto nos citados artº660º, n.º 2 e 668º, nº 1, al. d) do CPC e 125a doCPPT há que concluir pela nulidade da sentença,por omissão de pronúncia, pelo que somos de

    parecer que o recurso merece provimento. As partes foram notificadas deste douto parecer enada vieram dizer. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. 2 – Na sentença recorrida deu-se como assente aseguinte matéria de facto:A) A "A….", é concessionária do serviço público darede de distribuição regional de gás natural daamadora, nos termos do Decreto-Lei n.º 33/91, de 1de Janeiro, tendo sucedido em todos os direitos eobrigações à "B…" (cfr. art. 1º e 2º da petição iniciale documento nº 1 junto com a petição inicial);  B) A impugnante foi notificada pela CâmaraMunicipal da Amadora para proceder ao pagamentodo montante global de € 4.830,30, relativa a taxasdevidas pela ocupação/utilização do subsolomunicipal, prevista no ponto 32. do Regulamento eTabela de Taxas e Licenças do Município daAmadora (cfr. fls. 85 e 86). 

    C) Em 16/03/2007, por despacho proferido pelopresidente da Câmara Municipal da Amadora foiindeferida a reclamação deduzida pela impugnantecontra a liquidação referida na al. B) do probatório,(doc. n.º 3 junto à p.i.) D) A presente impugnação foi deduzida em17/05/2007 (conforme carimbo aposto a fls. 3 dosautos). 3 – Importa apreciar, em primeiro lugar a questão danulidade da sentença, por omissão de pronúncia, já

    que o seu conhecimento precede, logicamente, odas restantes questões. 

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    A nulidade de sentença por omissão de pronúnciaverifica-se quando o Tribunal deixe de se pronunciarsobre questões sobre as quais deveria ter-sepronunciado [art. 125.º do CPPT]. Esta nulidade está conexionada com os deveres decognição do Tribunal, previstos no artigo 660.º, n.º 2,do CPC, subsidiariamente aplicável por força dodisposto no art. 2.º, alínea e), do CPPT, em que seestabelece que o juiz tem o dever de conhecer detodas as questões que as partes tenham submetidoà sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisãoesteja prejudicada pela solução dada a outras. No caso em apreço, a Recorrente defende aexistência de nulidade por omissão de pronúncia

    relativamente as seguintes questões: – A improcedência do tributo em causa por ausênciade divisibilidade do benefício gozado;– A violação do princípio da igualdade e daproporcionalidade;  – A natureza da concessão levando à transferênciadas prerrogativas de autoridade para oconcessionário;– A natureza de serviço público subjacente àactividade prestada afectando bens públicos à suafunção própria;– A (prevista) extensão de competências presentena Lei do Orçamento de Estado de 2004 (LOE);– A violação das atribuições do Estado Concedente. No que concerne à questão da ausência dedivisibilidade do benefício gozado trata-se deargumentação visando caracterizar o tributo cobradocomo um imposto, não integrando uma questãoautónoma, distinta da apreciação da natureza do

    tributo, não constituindo um fundamento autónomode impugnação. De qualquer forma, na sentençaaprecia-se a questão de saber se se está peranteuma utilização individualizada do domínio público embenefício dos interesses da Impugnante, comoempresa comercial privada, que têm ínsita umatomada de posição sobre aquela. Por outro lado, como se vem entendendouniformemente, com apoio no texto do referido art.660.º do CPC, a violação do dever de pronúncia

    apenas ocorre quando o Tribunal deixe de apreciarquestões colocadas e não argumentos invocados

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    pelas partes. Quanto à questão da natureza do domínio público esua função, trata-se também de argumentaçãoatinente à questão de saber se podia ser cobrado otributo em causa pela utilização do domínio público.A sentença recorrida pronunciou-se sobre estaquestão, entendendo, em suma, que havendo umautilização individualizada no interesse da própriaimpugnante, uma empresa privada cujo fim é aobtenção de lucro, o facto de desenvolver umaactividade destinada a satisfazer o interesse públiconão afastava a possibilidade de cobrança do tributodestinado a «pagar a vantagem patrimonial que estaobtém derivada da utilização desse bem do domínio

    público ».Quanto à violação dos princípios da igualdade e daproporcionalidade, trata-se de imputação de víciosque não se confunde com a questão da natureza dotributo, pelo que, efectivamente, deveria ter sidoapreciada essa alegada violação, uma vez que aImpugnante colocou a questão nos arts. 30.º e 58.ºda petição inicial. O mesmo se passa com a questão da falta deatribuições do Município da Amadora, colocada nosarts. 66.º a 72.º da petição. Estas questões não foram apreciadas na sentençarecorrida pelo que, tendo sido suscitadas, ocorre ainvocada nulidade por omissão de pronúncia. Assim, não se tratando de um caso em que deva oSupremo suprir a nulidade (arts 762.º, n.º 3, e 731.º,n.º 1, do CPC, aplicáveis por força do disposto noart. 281.º do CPPT), impõe-se a anulação dadecisão recorrida, ficando prejudicado o

    conhecimento das restantes questões que sãoobjecto do presente recurso jurisdicional. Termos em que acordam em

     – conceder provimento ao recurso jurisdicional;  – anular a sentença recorrida. Sem custas, por não terem sido apresentadascontra-alegações [art. 2.º, n.º 1, alínea g), do CCJ). Lisboa, 1 de Julho de 2009. – Jorge de Sousa(relator) – António Calhau – Isabel Marques da Silva.