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Universidade Federal de Pernambuco Centro de Ciências Sociais Aplicadas Departamento de Ciências Administrativas Programa de Pós-graduação em Administração - PROPAD Priscilla Galindo França de Oliveira Situando o Espaço Físico na Formação de Impressões em Organizações de Varejo: instrumentalidade, estética e simbolismo sob a perspectiva dramatúrgica Recife, 2008

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  • Universidade Federal de Pernambuco Centro de Cincias Sociais Aplicadas

    Departamento de Cincias Administrativas Programa de Ps-graduao em Administrao - PROPAD

    Priscilla Galindo Frana de Oliveira

    Situando o Espao Fsico na Formao de Impresses em Organizaes de Varejo:

    instrumentalidade, esttica e simbolismo sob a perspectiva dramatrgica

    Recife, 2008

  • Priscilla Galindo Frana de Oliveira

    Situando o Espao Fsico na Formao de Impresses em Organizaes de Varejo:

    instrumentalidade, esttica e simbolismo, sob a perspectiva dramatrgica

    Orientador: Prof. Dr. Jos Ricardo Costa de Mendona.

    Dissertao apresentada como requisito complementar a obteno do grau de Mestre em Administrao, do Programa de Ps-Graduao em Administrao da Universidade Federal de Pernambuco (PROPAD/ UFPE).

    Recife, 2008

  • Oliveira, Priscilla Galindo Frana de Situando o espao fsico na formao de impresses em Organizaes de Varejo / Priscilla Galindo Frana de Oliveira. Recife : O Autor, 2008. 87 folhas : fig. e tabela.

    Dissertao (Mestrado) Universidade Federal de Pernambuco. CCSA. Administrao, 2008.

    Inclui bibliografia e apndice.

    1. Administrao de instalaes. 2. Ambiente de trabalho. 3. Cultura material. 4. Esttica. 5. Desenvolvimento organizacional. I. Ttulo.

    658.27 CDU (1997) UFPE 658 CDD (22.ed.) CSA2007-060

  • Resumo

    Essa dissertao constitui-se como resultado de uma pesquisa qualitativa, mais especificamente um estudo de trs casos que foram selecionados entre as lojas de varejo de moda instaladas no Centro de Compras Pao Alfndega, situado no centro histrico da cidade do Recife, estado de Pernambuco. Este estudo busca explorar o tema gerenciamento de impresses, sob a perspectiva dramatrgica seminalmente desenvolvida por Erving Goffman, com o intuito de contribuir para ampliar os conhecimentos sobre o tema, e mais especificamente, para o aprofundamento de um aspecto deste fenmeno complexo que a influncia dos cenrios (artefatos e espao fsico) na formao das impresses sobre as organizaes. Considera-se que o varejo um dos setores mais promissores da economia mundial e passa por um perodo de transformaes, no qual as lojas tornam-se locais onde se oferecem alm de produtos, servios e experincias visuais excitantes e atrativas. Dessa maneira, considera-se importante investigar qual o papel do espao fsico na formao das impresses sobre as organizaes de varejo de moda. Para atingir tal objetivo foi elaborada uma reviso bibliogrfica sobre os temas gerenciamento de impresses, percepo, cultura organizacional e sobre as dimenses do espao fsico (instrumentalidade, esttica e simbolismo). De posse destas informaes buscou-se dar voz queles que embora no fossem clientes, pudessem avaliar os espaos fsicos com o olhar semelhante ao do cliente quando est prestes a adentrar no espao da organizao, mas com o afastamento de quem no experimentou os servios da mesma. Essa avaliao foi possvel graas ao uso de mtodos visuais tal como a foto-elicitao que ocorreu durante o grupo focal. Tambm foram ouvidos os proprietrios, os funcionrios e os clientes, que representam respectivamente os papis de diretores, atores e audincia do espetculo da interao por meio de entrevistas em profundidade. Ao final das anlises concluiu-se que os espaos organizacionais so considerados importantes por proprietrios, funcionrios e clientes, que as dimenses (instrumentalidade, esttica e simbolismo), no so identificadas individualmente, que a dimenso simbolismo apresenta-se como uma materializao dos valores organizacionais e no como uma estratgia gerenciamento de impresses e que h uma inteno clara em transmitir impresses favorveis por meio do espao fsico, utilizando-o como carto de visitas da organizao.

    Palavras Chave: Gerenciamento de impresses, perspectiva dramatrgica, espao fsico, cultura material, instrumentalidade, esttica, simbolismo.

  • Abstract

    This dissertation was a result of a qualitative research, more specifically a three cases' study selected between the store fashion retail located in Pao Alfndega Customs Center, in the city of Recife's historic center, Pernambuco. This study is to explore the impressions management topic, based on a dramaturgical perspective seminally developed by Erving Goffman, so as to contribute to expanding its knowledge, and more specifically, to emphasize upon one aspect of this complex phenomenon that is the influence of the scenes (artifacts and physical space) in the formation of the impressions on the organizations. Retailing is considered one of the world's most promising economic sectors, and goes through a period of transformations where stores become places to receive products, services, exciting and attractive visual experiments, as well. Thus, it's critical to determine the role of the physical space in the formation of the impressions on retail fashion organizations and, a bibliographical review on topics such as impressions management, perception, organizational culture and physical space dimensions (instrumentality, aesthetic and symbolism) were elaborated. These informations provided us with feedbacks from non customers who could evaluate physical spaces with the same look as the customer's upon exploring the

    organizational space, but with a different approach. Visual methods such as the focal group photo-elicitation made this evaluation possible, while employers, employees and customers representing directors, actors and customers were also heard of following thorough interviews. So, organizational spaces are important to employers, employees and clients. The sizes (instrumentality, aesthetic and symbolism) aren't individually identified and the symbolism appears like a manifestation of organizational values rather than a strategy monitoring impressions. There's a genuine desire to show favorable impressions through physical space and use it as the organization's business cards.

    Keywords : Impression management, dramaturgical perspective, physical setting, material culture, instrumentality, aesthetics, symbolism.

  • Lista de Figuras

    Figura 1: Nveis da Cultura Organizacional .............................................................................21 Figura 2: Modelo dramatrgico da relao gesto do espao e das impresses nas organizaes. ............................................................................................................................32 Figura 3: Desenho da Metodologia da pesquisa.......................................................................43 Figura 4: Fachada do Centro de Compras Pao Alfndega......................................................50 Figura 5: Corredores do Centro de Compras Pao Alfndega. ................................................51 Figura 6: Corredores do Centro de Compras Pao Alfndega. ................................................51 Figura 7: trio central do Centro de Compras Pao Alfndega...............................................52 Figura 8: trio central do Centro de Compras Pao Alfndega (detalhe do piso). ..................52 Figura 9: Vista da lateral esquerda da Loja 01. ........................................................................56 Figura 10: Vista da entrada da Loja 01.....................................................................................56 Figura 11: Vista da entrada da Loja 02 (lado esquerdo)...........................................................58 Figura 12: Vista da entrada da Loja 02 (lado direito)...............................................................58 Figura 13: Vista da entrada da Loja 03 (lado esquerdo)...........................................................59 Figura 14: Vista frontal da entrada da Loja 03.........................................................................59

  • Sumrio

    1 Introduo 7 1.1 Objetivos 9 1.1.1 Objetivo Geral 9 1.1.2 Objetivos Especficos 9 1.2 Justificativas Terica e Prtica 10

    2 Fundamentao Terica 12 2.1 Gerenciamento de Impresses 12 2.2 O Processo de Percepo e os Estmulos Fsicos 16 2.3 Cultura objetiva: os artefatos e o ambiente organizacional 18 2.4 Espao fsico: instrumentalidade, esttica e simbolismo 21 2.4.1 Instrumentalidade 24 2.4.2 Esttica 26 2.4.3 Simbolismo 27 2.4.4 A Gesto do Espao e das Impresses nas Organizaes: uma viso integradora 29

    3 Metodologia da Pesquisa 32 3.1 Delineamento da Pesquisa 32 3.2 Unidades de Pesquisa 33 3.3 Trabalho de Campo 34 3.4 Limitaes 41

    4 Apresentao e Anlise dos Resultados 43 4.1 Centro de Compras Pao Alfndega: delimitando o contexto 48 4.2 Fotografias: transportando artefatos e captando sutilezas 52 4.3 Conjunto Ambiental: definindo a situao e formando impresses 58 4.4 Dirigindo o Espetculo: o cenrio moldado para impressionar 67 4.5 Planejando Espaos, Materializando Valores 69 4.6 Impresses Criadas X Dimenses do Espao 74

    5 Concluses e Recomendaes 78

    Referncias 80

    APNDICE A 83 APNDICE B 84 APNDICE C 85 APNDICE D 86 APNDICE E 87

  • 1 Introduo

    O estudo sistemtico do Gerenciamento de Impresses (GI) foi iniciado por Goffman, um socilogo e antroplogo americano, em sua obra The Presentation of Self in Everiday Life, publicada em 1959 (CARVALHO; GRISCI, 2003). Goffman (1959) adotou uma perspectiva dramatrgica, que considera as interaes sociais como uma cena teatral, e utiliza os elementos da dramaturgia como ferramenta analtica para estudar tais interaes, considerando pessoas como atores engajados em performances encenadas em variados cenrios diante de audincias.

    Para Schlenker (1980) pessoas so seres sociais cujas existncias esto entrelaadas s vidas dos que se encontram a sua volta. Quando um indivduo est na presena de outro, as impresses criadas interferem nas interaes no importando se o outro um estranho, um amigo ou um familiar. Por outro lado, mesmo quando o indivduo no se encontra na presena do outro afetado pelas impresses que tem de experincias anteriores e planeja futuras interaes decidindo o que vai dizer e como vai dizer tentando antecipar o comportamento dos outros (SCHLENKER, 1980).

    Segundo Baumeister (1982), o gerenciamento de impresses diz respeito ao uso de comportamentos para comunicar aos outros indivduos, alguma informao sobre si mesmo. O uso destes comportamentos de gerenciamento de impresses motivado pelo desejo de agradar a audincia e de construir (criar, manter e modificar) uma imagem pblica congruente com a imagem considerada ideal pelo ator (BAUMEISTER, 1982).

    De acordo com Gardner e Martinko (1998) o ambiente onde ocorrem as interaes constitudo pelo cenrio e pelo contexto no qual atores atuam para uma audincia. Dessa maneira, as caractersticas e os comportamentos do ator e da audincia combinam-se com evidncias do ambiente para servir como estmulos. Estes estmulos so seletivamente percebidos e interpretados por meio de variados processos cognitivos, motivacionais e afetivos que produziro em cada parte uma definio da situao. Segundo Gardner e Martinko (1998) a definio da situao formada por estmulos gerados pelas caractersticas e comportamentos do ator e da audincia, combinados com sugestes do ambiente. Ainda conforme os autores a definio da situao guiar o comportamento dos indivduos, nas interaes sociais. Vale salientar que a personalidade tambm tem papel moderador neste processo.

    De acordo com Mendona et al. (1999), o gerenciamento de impresses deve ser percebido como um processo desenvolvido para controlar as impresses sobre um indivduo,

  • e, alm disso, como comportamentos desenvolvidos por grupos e organizaes com a inteno de provocar impresses positivas a seu respeito. Ainda conforme os autores, muitos tm abordado os processos de gerenciamento de impresses, entretanto com um foco maior nas aes e interaes entre os atores (MENDONA et al.,1999). Neste estudo, mesmo reconhecendo a complexidade do fenmeno, pretende-se dar uma nfase maior aos cenrios (artefatos e espaos fsicos organizacionais) onde ocorrem as interaes, como meio utilizado para transmisso e formao de impresses das organizaes. importante ressaltar que os artefatos sero analisados como dotados de significados dinmicos, que so resignificados ao longo das interaes, transformando, dessa maneira, os atores e os objetos.

    O visual dos espaos fsicos das organizaes bem como outros artefatos fsicos (como o fardamento) sinaliza aos funcionrios e aos clientes o que a empresa valoriza e como eles devem se comportar (ROBBINS, 2005). O controle organizacional, a implantao de mudanas, bem como a transmisso dos valores culturais da organizao, pode ser efetuada com o auxlio de artefatos tangveis como arquitetura, layout, sinalizaes, cores, aparncia externa do edifcio e materiais utilizados por meio dos seus significados implcitos e da interao de seus significados com a atividade social e sua re-significao ao longo do tempo, sendo incorporados subjetividade dos indivduos que interagem nestes espaos (MORGAN, 1996; DALE, 2005). Conforme Dale (2005), as intervenes no espao por quem detm o poder, no podem ser pensadas considerando o espao como matria inerte, que pode ser manipulada sem a interferncia do social. H a uma negociao entre o ser e a materialidade, como mutuamente construdos. Por meio do espao fsico das organizaes, valores, idias que podem no estar evidentes no discurso, mas so expressos no dia a dia dos funcionrios, tornam-se parte da sua subjetividade incorporada (DALE, 2005). Outro fator importante a percepo das diferenas entre os significados dados aos artefatos a partir das percepes dos atores e da audincia (ELSBACH, 2004).

    Dessa maneira, percebe-se que o espao fsico constitui o cenrio onde ocorrem as interaes nas organizaes e que as intervenes e decises tomadas em relao ao espao fsico precisariam ser baseadas em estudos aprofundados. Como forma de avanar com os conhecimentos sobre o fenmeno pode-se analis-lo sob a perspectiva dramatrgica, tomando como estmulo chave o conjunto ambiental que abrange o cenrio, a cultura, o contexto e a natureza da tarefa. O cenrio onde ocorrem as interaes nas organizaes, conforme argumenta Vilnay-Yavetz et al. (2005), compreende trs dimenses: instrumentalidade, esttica e simbolismo.

  • Com o objetivo de gerar informaes sobre os aspectos acima citados foi selecionado como lcus de pesquisa lojas de varejo de moda do Centro de Compras Pao Alfndega, localizado na cidade do Recife. A pesquisa foi inicialmente autorizada pela gerncia de marketing do shopping e posteriormente por cada proprietrio de loja em particular.

    Diante do exposto, essa pesquisa procurou responder a seguinte pergunta: qual a

    relao das dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo na construo dos cenrios e na formao das impresses de organizaes de varejo de moda?

    1.1 Objetivos

    Neste tpico sero apresentados o objetivo geral e os objetivos especficos deste estudo.

    1.1.1 Objetivo Geral

    O objetivo geral deste estudo identificar qual a relao das dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo na construo dos cenrios e na formao das impresses de organizaes de varejo de moda.

    1.1.2 Objetivos Especficos

    Para alcanar o objetivo geral proposto foram definidos os seguintes objetivos especficos:

    1. Identificar qual o papel do conjunto ambiental na definio da situao, pelos atores e pela audincia, no gerenciamento de impresses e como ocorre a formao das impresses sobre as organizaes de varejo a partir deste conjunto ambiental; 2. Identificar se h intencionalidade em transmitir impresses favorveis por meio dos espaos fsicos organizacionais e quais so as impresses consideradas favorveis pela organizao;

    3. Analisar como se desenvolve a materializao, ou objetivao, de valores da organizao por meio dos artefatos e dos espaos fsicos e como se d o planejamento destes espaos por parte dos proprietrios, gerentes e arquitetos; e

  • 4. Identificar qual a impresso gerada na audincia (funcionrios e/ou clientes) em relao ao ambiente fsico relacionando-a as dimenses instrumentalidade esttica e simbolismo do espao fsico.

    1.2 Justificativas Terica e Prtica

    O varejo considerado um dos maiores setores da economia mundial e passa por um perodo de grandes transformaes. Os novos consumidores pertencem a famlias nas quais duas pessoas so responsveis pela obteno de renda e, portanto tm pouco tempo para compras. Como conseqncia os varejistas tm buscado meios de auxiliar os consumidores, para que os mesmos encontrem o que querem mais rapidamente. As lojas tm se tornado mais que locais aonde se compram produtos, e passam a oferecer experincias visuais excitantes e atrativas. Ademais, alm da venda de produtos o varejo envolve a venda de servios (LEVY; WEITZ, 2000).

    Segundo Fitzsimmons e Fitzsimmons (2000) fazer a diferenciao entre um produto e um servio uma tarefa difcil j que a compra de um produto normalmente acompanhada de um servio e a compra de um servio muitas vezes inclui a obteno de mercadorias. O conjunto de mercadorias e servios oferecidos em um ambiente denominado pacote de servios, no caso dos restaurantes, por exemplo, a refeio to importante quanto o ambiente, pois muitos clientes aproveitam a oportunidade para reunir-se com amigos.

    As chamadas lojas de produtos diferenciados que oferecem aos clientes alm produtos, ateno pessoal e uma atmosfera de loja mais ntima tm sido substitudas por um novo conceito chamado de varejo de estilo de vida que ajusta a mercadoria a um estilo de vida de um determinado grupo consumidor, criando atmosferas de lojas de acordo com o estilo destes grupos, nestes casos se aproximam mais do varejo de servios e, diante da intangibilidade caracterstica dos servios os varejistas buscam utilizar smbolos tangveis que informem aos clientes sobre a qualidade de seus produtos e servios (LEVY; WEITZ, 2000).

    Nestas organizaes o cliente participante do processo e dessa maneira requerida uma ateno especial na definio das instalaes que devem ser projetadas sob a perspectiva do cliente, mantendo-se cuidados especiais com a decorao interior, moblia, layout, nvel de rudo e at nas cores (FITZSIMMONS; FITZSIMMONS, 2000). Essa preocupao com a

  • impresso que formada nos clientes, neste trabalho denominados audincia, chamada pelos pesquisadores do comportamento organizacional de gerenciamento de impresses.

    O tema gerenciamento de impresses, embora tenha sido abordado pela primeira vez em 1959 por Erving Goffman, permanece atual e amplamente explorado na literatura estrangeira. No entanto, ainda pouco conhecido e pesquisado no Brasil. Est pesquisa poder contribuir, no apenas para ampliao dos conhecimentos sobre o tema gerenciamento de impresses, mas tambm para o aprofundamento de um aspecto deste fenmeno complexo que a influencia dos cenrios (artefatos e espao fsico) na formao das impresses sobre as organizaes.

    Sabendo da influncia que o cenrio tem na percepo dos indivduos e percebendo a concorrncia e independncia das dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo do ambiente organizacional na formao das impresses, as organizaes podero tornar-se capazes de utilizar, de forma mais estratgica, tais ferramentas de comunicao no seu esforo em gerir a formao das impresses desejadas, nas mentes de seus clientes e funcionrios.

    De forma prtica esse estudo visa munir pesquisadores e gestores de conhecimentos sobre a repercusso dos espaos criados na formao das impresses auxiliando na implementao dos ajustes necessrios, bem como no planejamento de novos espaos que devero, a partir do uso destes conhecimentos, contemplar os aspectos instrumentais, simblicos e estticos, permitindo uma melhor utilizao dos recursos, cada vez mais escassos, diante de uma avaliao de custo benefcio embasada.

    Diante do exposto acredita-se que o tema relevante para academia, na medida em que fornecer conhecimentos para o ensino e pesquisa dos estudos organizacionais, mais especificamente na rea do comportamento organizacional, e para a sociedade como um todo quando auxilia no aprofundamento sobre temas que podem favorecer as organizaes de varejo e de servios, que hoje so responsveis pela absoro de grande quantidade de mo de obra, a utilizarem mais eficazmente seus espaos fsicos, podendo facilitar as interaes, evitar a transmisso inconsciente de mensagens negativas sobre seus valores e objetivos, e a elaborar projetos mais eficientes em uma poca que os espaos nos centros urbanos tm se tornado um bem muito valioso, dessa maneira criando vantagens competitivas. Nos prximos captulos ser exposto o referencial terico que baseou este trabalho, seguindo uma ordem lgica de conhecimentos no intuito de fornecer ao leitor a compreenso deste fenmeno.

  • 2 Fundamentao Terica

    Para levar adiante este trabalho sobre o papel do espao fsico na formao das impresses sobre as organizaes, segue-se uma discusso sobre o gerenciamento de impresses, a percepo de estmulos materiais e as dimenses dos espao fsico nas organizaes.

    2.1 Gerenciamento de Impresses

    Goffman (1959) argumenta que o gerenciamento de impresses envolve esforos para estabelecer significados ou propsitos de interaes sociais, guiar aes e auxiliar a definir o que esperar dos outros. O autor tambm analisa a maneira como o indivduo apresenta a si prprio e s suas atividades em situaes comuns de trabalho e as formas como molda a impresso que os outros formam a seu respeito.

    Para Deaux e Wrightman (1988) gerenciamento de impresses o nome dado ao processo pelo qual as pessoas, no intuito de criar imagens sociais desejadas, moldam seu comportamento. Por meio deste processo os indivduos procuram controlar as impresses dos outros sobre seus comportamentos, motivaes, moralidade, confiabilidade e inteligncia, entre outros (ROSENFELD, 1997). O interesse pelo processo de gerenciamento de impresses vem da necessidade de controlar a percepo que os outros fazem no intuito de obter impresses positivas a seu respeito (MENDONA; AMANTINO-DE.ANDRADE, 2003).

    Segundo Schlenker (1980), os pensamentos das pessoas so guiados por significados sociais, portanto, seus valores, atitudes e crenas so influenciados pelo outro mais do que se costuma admitir. As roupas que o indivduo veste, a forma como decora sua sala, o modo como caminha e como se senta tudo enfim, comunica coisas sobre ele ou ela, comunica uma identidade social e define o que se deseja e o que se pode esperar da outra pessoa. Cada ao tem um significado social que demonstra o que o indivduo e como deve ser tratado (SCHLENKER, 1980; ROSENFELD et al., 2002). De acordo com Rosenfeld et al. (2002) o gerenciamento de impresses um ritual mtuo que pode facilitar e controlar relaes sociais, evitando constrangimentos.

  • Embora o gerenciamento de impresses freqentemente evoque imagens de cinismo, no h nada de intrnseco no conceito de GI que dite que ele deve envolver dissimulao. Na verdade, a apresentao autentica a que provoca maior satisfao pessoal e aprovao interpessoal (SCHLENKER, 1980). No presente trabalho, adotou-se uma viso definida como expansiva por Rosenfeld et al. (2002), que considera o gerenciamento de impresses uma caracterstica universal do comportamento humano, por meio da qual as pessoas, constantemente se esforam em criar uma embalagem ou fachada que comunique uma impresso desejada e identidades significantes para os outros.

    A interao social um importante aspecto da vida do ser humano. Os indivduos interagem em diversos nveis da vida social com a famlia, os amigos, nas igrejas, no trabalho. Em cada interao percebe-se a importncia da avaliao que se faz a respeito do outro. Esse processo de avaliao conhecido como percepo social (MENDONA, 2003). Schlenker (1980) define percepo social como um processo pelo qual, na tentativa de entender aes e decises, as pessoas fazem atribuies sobre as causas que geraram tais eventos, bem como formulam construtos que do significados ao que ocorre no mundo a sua volta.

    Conforme Gardner e Martinko (1988) ao interpretar uma interao, tanto ator como audincias procuram definir a situao por meio de processos cognitivos, motivacionais e afetivos, nos quais os estmulos so seletivamente percebidos e interpretados e produzem em cada parte tal definio. Utilizando a sua definio da situao como guia, atores selecionam aqueles comportamentos por meio dos quais eles esperam obter a impresso mais desejada. O sucesso de uma apresentao influenciado pelo grau em que a performance do ator percebida como sendo congruente com a definio da situao pela audincia (GARDNER; MARTINKO, 1988).

    A performance do ator compreende todas as atividades dos indivduos, ou atores diante de um ou de vrios observadores, que podem ser denominados audincia (GROVE; FISK, 1989). Quando a congruncia entre a performance do ator e a definio da situao feita pela audincia alta, mais provvel para o ator criar as impresses desejadas e incitar respostas favorveis. Inversamente, quando a audincia percebe a apresentao do ator como inapropriada, impresses negativas e indesejveis reaes da audincia so mais provveis. Alm disso, em uma troca social em andamento cada parte pode alternadamente e/ou simultaneamente ocupar papis de ator e audincia (GARDNER; MARTINKO, 1988).

    Para Goffman (1959), durante as interaes cotidianas os indivduos no se utilizam de mtodos cientficos para a tomada de decises. Vive-se de inferncias. Os observadores

  • procuraro no curto espao de tempo da interao, perceber se existe alguma incongruncia entre a apresentao do ator e o que ele deseja ocultar. Nessa verificao de congruncia sero observados, portanto, a fachada pessoal e o cenrio. O autor argumenta que o controle do cenrio uma vantagem durante a interao. Em sentido estrito, este controle permite ao ator introduzir dispositivos estratgicos que determinaro a informao que o publico ir adquirir. Mais amplamente, o controle do cenrio pode dar ao ator um sentimento de segurana. Quando o indivduo desconhecido, os observadores tentaro obter, a partir de seu comportamento e de sua aparncia, informaes sobre ele baseando-se em experincias anteriores. Da mesma maneira, utilizaro o cenrio social como fonte de informaes j que o fato de estar em um determinado cenrio social pode determinar o tipo de indivduo que tem a permisso de ali estar. O cenrio e os suportes do palco onde a referida ao pode ser executada diante, dentro ou acima, constituem o pano de fundo para o desenrolar da ao humana (GOFFMAN, 1959).

    Segundo Ornstein (1989) os indivduos ocupam muitos palcos enquanto atuam em seus variados papis sociais. O conjunto de padres comportamentais esperados e atribudos ao indivduo que ocupa uma determinada funo em uma unidade social constitui o que se designa por papel social, entretanto, os indivduos desempenham papis diversos e o desafio perceber qual o papel que uma pessoa est desempenhando ao se definir a situao, como forma de compreender seus comportamentos (ROBBINS, 2005).

    As variedades de caractersticas ambientais, do ator e da audincia servem como estmulos que moldam as definies da situao. Os estmulos interagem entre si de forma a gerar no ator e na audincia uma definio da situao que moldar ento os comportamentos de ambos (SCHLENKER, 1980). Para os fins desta pesquisa, como foi exposto anteriormente, a ateno foi focada prioritariamente nas caractersticas ambientais. Os estmulos ambientais considerados sero: o cenrio; a cultura e a natureza da tarefa (GARDNER; MARTINKO, 1988).

    Goffman (1959) analisa o ambiente como provendo um conjunto que inclui a moblia, decorao, layout fsico, e outros menos importantes itens que fornecem o cenrio e o palco proposto para o GI. Davis (1984) identificou elementos das organizaes que influenciam a quantidade e a qualidade dos estmulos recebidos pelos atores: (a) a estrutura fsica (ex: arquitetura e layout), (b) estmulos fsicos (ex: horrio no relgio, toque do telefone), e (c) artefatos simblicos (ex: certificados, estilo do mobilirio, cores). Assim como nos palcos teatrais, os espaos organizacionais tambm possuem artefatos cnicos que so: plantas, objetos de arte, emblemas, fotografias, diplomas e prmios. Nas organizaes, os palcos onde

  • ocorrem as interaes so definidos pelo tamanho do escritrio, posio relativa a outras pessoas ou organizaes, estilo, moblia e acabamentos (ex: carpetes, tratamento das paredes, revestimentos) e cores utilizadas. Tambm a iluminao dar pistas de como deve ser o comportamento adequado aquele espao organizacional, e, como no teatro, definindo como dever se desenrolar a apresentao dos atores (ORNSTEIN, 1989).

    A evidncia fsica considerada por Bitner (1992), na literatura de marketing de servios, como um fator de impacto sobre as percepes dos clientes e funcionrios, comunicando atributos de qualidade em relao aos servios e criando expectativas nestes clientes e funcionrios, podendo inclusive, afetar a produtividade, a motivao e a satisfao dos funcionrios. O cenrio de servios pode atrair ou barrar o acesso, pode influenciar na eficcia com que funcionrios e clientes executam suas tarefas, tambm pode influenciar na natureza e na qualidade das interaes sociais. Por outro lado o cenrio pode causar reaes internas, podendo ter efeito sobre crenas das pessoas acerca do lugar e das pessoas que se encontram naquele lugar, comunicando significados. Da mesma forma pode auxiliar as pessoas a qualificar a organizao e pode gerar reaes emocionais, que por sua vez geram comportamentos (BITNER, 1992).

    O impacto dos estmulos fsicos nas emoes humanas e seu efeito nos comportamentos, performance e interaes so tambm consideradas na psicologia ambiental. Mehrabian e Russell (1974), no livro considerado um clssico An approach to environmental psychology, definem a psicologia ambiental como o estudo do impacto direto dos estmulos fsicos nas emoes humanas e dos efeitos destes estmulos na variedade de comportamentos.

    O contexto social e fsico, portanto, podem influenciar a percepo que se tem da situao (GROVE; FISK, 1989) na medida em que ambos devem comunicar de forma congruente os valores da organizao, os comportamentos considerados adequados e o papel que os atores sociais ento apresentando (GOFFMAN, 1959), conseqentemente, tendo impacto na formao das impresses sobre as organizaes.

    Para Vergara et al. (2004), compreender como os diretores do espetculo da interao humana, por meio do ambiente fsico da organizao, conduzem o olhar de atores e audincias de modo a guiar e controlar suas mentes questo fundamental, portanto, com o objetivo de elucidar o papel dos estmulos fsicos no processo de formao das impresses, tendo em conta a ocorrncia da percepo seletiva, segue-se a prxima seo.

  • 2.2 O Processo de Percepo e os Estmulos Fsicos

    Pode-se definir percepo como um processo pelo qual, os indivduos organizam e interpretam suas impresses sensoriais com a finalidade de dar sentido ao seu ambiente (ROBBINS, 2005, p.104). Assim, a percepo sobre um mesmo estmulo pode ser diferente para indivduos distintos e ainda, diferente da realidade objetiva. Entretanto, cabe salientar que indivduos se comportam baseados em suas percepes sobre as situaes.

    De acordo com Ittelson (1973) a recepo e o processamento das informaes recebidas do ambiente constituem a rea de estudos designada percepo. Para o autor todo indivduo vive seu dia a dia em relao e como parte de um contexto ambiental e que a cultura e a existncia das pessoas dependem de sua percepo que variar em funo do contexto em que ocorrem.

    Robbins (2005) parece concordar com esta afirmao quando salienta que os fatores que influenciam a percepo podem estar no observador, no alvo ou na situao. Como dito anteriormente aqui ser focado o alvo da percepo representado pelo cenrio fsico e artefatos tangveis.

    Os ambientes fsicos provm mais informaes do que possvel processar (ITTELSON, 1973). Como forma de simplificao, ao avaliar uma situao, os indivduos se utilizam da percepo seletiva que o processo por meio do qual, indivduos selecionam, da multiplicidade de sugestes que so bombardeados, estmulos sobre os quais focam suas atenes (GARDNER; MARTINKO, 1988). Alm disso, quando as pessoas procuram compreender os eventos fazem atribuies sobre o que o deve t-los causado (SCHLENKER, 1980). As atribuies so, conforme afirma Robbins (2005), o julgamento que se faz sobre as aes de um indivduo. Segundo a teoria da atribuio, as causas atribudas aos eventos podem ser consideradas de natureza interna ou externa, sendo as de natureza interna aquelas que esto sob o controle do indivduo e as de natureza externa aquelas que tm causa externa ao indivduo (ROBBINS, 2005).

    Considera-se neste estudo, que o espao fsico pode ser percebido pela audincia como passvel de ser moldado propositadamente para um determinado fim, tendo, portanto natureza interna ao indivduo e estando, dessa maneira, sob o controle do ator que se apresenta. A escolha e exposio dos artefatos podem ser interpretadas como uma ao deliberada, que pode ser repetidamente observada e refora repetidamente as impresses geradas, diferentemente dos comportamentos, que so situacionais (podendo ter causa externa ao indivduo), e temporariamente observveis (ELSBACH, 2004).

  • Conforme afirma Stocker (2002), vive-se em um mundo que usa smbolos para comunicar. Todo o lugar aonde se vai cercado de smbolos e pistas visuais que uma vez presentes encerram informaes aos indivduos de um modo simples e direto. Smbolos so processados do lado direito do crebro, enquanto que palavras e frases so processadas do lado esquerdo. Para a maioria dos indivduos, o lado direito do crebro pode interpretar uma mensagem simblica muito mais rapidamente que o lado esquerdo pode interpretar palavras (STOCKER, 2002). Ento, pode-se inferir que os espaos e os artefatos fsicos so capazes de enviar mensagens aos indivduos mais rapidamente que os discursos proferidos pelos atores, gerando expectativas e definindo comportamentos.

    Segundo Elsbach (2004) os estudos da psicologia ambiental, da identidade organizacional, do gerenciamento de impresses e das primeiras impresses sugerem que artefatos fsicos podem ser usados por membros das organizaes como sinais para afirmar suas identidades. E mais, que diversas caractersticas dos artefatos os tornam teis como smbolos da identidade dos atores, pois se caracterizam como salientes 1, relativamente permanentes, e observveis independentemente de seus expositores. Os psiclogos sociais definem como saliente aquilo que chama ateno, dessa forma se pode inferir que poder ser eleito como digno de ateno especial pela percepo seletiva do indivduo. Os artefatos fsicos so mais salientes em relao aos comportamentos, em funo do seu tamanho, localizao proeminente, novidade e contraste com o entorno, podendo ser visto a distncia e dominar o campo visual da audincia. Dessa maneira, os smbolos fsicos podem ser acessados pela audincia sem a presena ou interferncia do ator, sendo algumas vezes responsveis pela formao das primeiras impresses (ELSBACH, 2004).

    Percebe-se que pistas visuais j existem dentro dos locais de trabalho, mas no tm sido aproveitadas efetivamente. O nvel de limpeza nas fbricas ou nos escritrios e as condies da paisagem, maquinrios e equipamentos so indicadores que dizem as pessoas o que a organizao valoriza e como funciona, sem que seja necessrio dizer-se uma palavra. O trabalho dos lderes ter o controle destes sinais e criar novos sinais que iro claramente comunicar o que se deseja aos funcionrios, fornecedores e clientes (STOCKER, 2002). Baseando-se nestes argumentos segue-se a prxima sesso, que analisar a cultura organizacional e o modo como ela se inscreve nos artefatos e no ambiente organizacional tornando-se tangvel e acessvel aos indivduos, e moldando as impresses dos mesmos sobre as organizaes.

    1 Do original em ingls salient.

  • 2.3 Cultura Objetiva: os artefatos e o ambiente organizacional

    A cultura organizacional tem sido tema de importantes estudos acadmicos no Brasil e no exterior ao longo das dcadas de 80 e 90. No entanto, essa grande quantidade de trabalhos no tem favorecido a convergncia e o consenso com relao ao tema (CAVEDON, 2004).

    A multiplicidade de abordagens tericas e metodolgicas ora se assemelham, ora se complementam, ora se excluem (FERREIRA; ASSMAR, 2002). Smircich (1983) j argumentava que essas divergncias entre as abordagens de cultura organizacional provm das diferenas de pressupostos dos pesquisadores sobre organizao e cultura. De acordo com Ferreira e Assmar (2002) embora a cultura organizacional possa ser analisada sob uma perspectiva mais tradicional e objetivista (vista como uma varivel, algo que a organizao tem), ou sob uma perspectiva fenomenolgica, (tomando-a como uma metfora de raiz, algo que a organizao , levando em conta seus aspectos simblicos e expressivos, enquanto negligencia seus aspectos materiais, tais como economia, resultados, produtividade e eficcia), um grande nmero de autores tm adotado uma perspectiva intermediria que no reduz a cultura a uma varivel, nem a concebe apenas como metafrica. A perspectiva intermediria a adotada no presente estudo.

    Por meio da cultura so compartilhados significados que tornam possvel, aos membros do grupo, interpretar e agir sobre seu ambiente (SCHEIN, 1984). De acordo com Morgan (1996) significados, compreenso e sentidos compartilhados so formas diferentes de se definir a cultura organizacional. Quando se fala sobre cultura, faz-se na verdade, uma referncia ao processo de construo da realidade que permite s pessoas ver e compreender eventos, aes, objetos, expresses e situaes particulares de maneiras distintas (MORGAN, 1996, p.132). Ainda conforme os autores, para se decifrar uma cultura, no bastam os relatos verbais dos indivduos, faz-se necessria uma anlise sobre o modo como as pessoas interagem, como a gerncia age diante das situaes, seus relatrios anuais e suas instalaes fsicas.

    Corroborando o pensamento expresso acima Alcadipani e Almeida (2000) argumentam que os artefatos materiais criados por uma organizao e a disposio fsica dos mesmos, so reflexos do que a organizao . As organizaes criam ambientes com a inteno de enviar mensagens sobre a empresa. Segundo Bowditch (2006, p.226), a cultura organizacional refere-se ao padro compartilhado de crenas, premissas e expectativas mantidas pelos membros da organizao e sua maneira caracterstica de perceber os artefatos

  • e o ambiente organizacional, suas normas, seus papis e seus valores (grifo da autora). Conforme Gagliard (2001) o espao fsico pode ser natural, mas nas organizaes ele est usualmente vinculado a um artefato fsico que se define a seguir: 1. produto da ao humana, cuja existncia independe de seu criador; 2. intencional em essncia (presta-se a um objetivo); 3. percebido pelos sentidos, material. Assim, os aspectos objetivos da cultura so tambm os mais acessveis e muitas vezes exercem mais impacto sobre as pessoas do que os discursos (BOWDITCH, 2006). Para Ittelson (1973) a funo dos ambientes fsicos tanto refletir os valores das pessoas que o habitam quanto atuar como um dos componentes da criao dos sistemas de valores. Smircich (1983, p.345) salienta:

    Vrios pesquisadores argumentam que os artefatos culturais (...) so poderosos meios simblicos de comunicao. Eles podem ser usados para estabelecer a lealdade organizacional, transmitir a filosofia da administrao, racionalizar e legitimar atividades, motivar o pessoal e facilitar a socializao.

    Segundo Schein (1984), a cultura organizacional pode ser classificada em trs diferentes nveis, sendo eles: (a) os artefatos e criaes; (b) valores; e (c) premissas fundamentais. Baseando-se nesta classificao, Bowditch (2006) analisa a cultura organizacional e elabora um modelo (Figura 1) que define a cultura organizacional em cinco diferentes nveis que variam sob um contnuo de subjetividade e acessibilidade.

    Figura 1: Nveis da Cultura Organizacional Fonte: Bowditch (2006, p.229)

  • Conforme Bowditch (2006), a cultura organizacional objetiva refere-se aos artefatos e criaes de uma organizao, estes, correspondem configurao dos espaos fsicos, localizao e decorao do escritrio e at mesmo a frota de carros adquirida para seus executivos. A cultura objetiva est localizada na parte mais externa do esquema representando sua acessibilidade. No centro do esquema encontra-se a cultura subjetiva, de difcil acesso, refere-se aos padres compartilhados de crenas e premissas fundamentais dos membros da organizao. Esses padres e premissas definiro o modo caracterstico com que o grupo perceber o ambiente organizacional, seus artefatos e valores, suas normas e papis tal como existem fora do indivduo (BOWDITCH, 2006). Embora a cultura organizacional no possa ser considerada como um conjunto monoltico e unitrio de idias pode criar a ordem social a partir do caos potencial que permeia a natureza ilimitada do comportamento e da interao humana, afetando variados aspectos da vida organizacional, a partir do modo como define as interaes, a forma de executar as tarefas, o modo de vestir e at o tipo de deciso, polticas, procedimentos e estratgias adotadas (MOTTA; VASCONCELLOS, 2002; CAVEDON, 2004; BOWDITCH, 2006). Os artefatos e o ambiente fsico representam a cultura objetiva (material), entretanto, conforme argumenta Aktouf (1994 apud CAVEDON, 2003) a cultura um complexo coletivo feito de representaes mentais que ligam o imaterial e o material, afirmando ainda, que a imaterialidade simblica se inscreve nas estruturas, mantendo uma relao simblico-material.

    Conforme Dale (2005), nas cincias sociais o conceito de materialidade tem sido influenciado pelo pensamento cartesiano que separa o que pensamento do que matria. Entretanto, materialidade no somente coisas, mas est imbuda de cultura, linguagem, imaginao, memria, no podendo ser reduzida a meros objetos. Para os seres humanos, que fazem parte do mundo material, no possvel manipular a matria sem ser incorporado ou mudado por ela. Consequentemente, examinar a relevncia da materialidade requer navegar entre a realidade do determinismo material e entre o construcionismo social, que reconhece apenas os significados sociais e culturais. Existem muitos debates sobre a necessidade de controlar os recursos humanos, e a imagem organizacional, juntamente com outros fatores materiais de produo. O entendimento do controle organizacional passa por um relevante exame da materialidade, como demonstrado pelas praticas espaciais incorporadas subjetivamente pelos membros da organizao. As histrias da indstria e da economia mostram uma clara coneco entre controle organizacional e materialidade (DALE, 2005).

  • Segundo Low (2003) dentro do campo que estuda o espao e a cultura, o interesse por teorias que incluam o ser como parte integrante da anlise espacial tem crescido. O conceito de espao incorporado refere-se ao local onde a experincia humana toma uma forma material e espacial, e apresenta-se como uma forma de compreender a criao do espao fsico.

    A forma como se desenvolve a criao do espao fsico organizacional, considerando as dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo, matria de interesse desta pesquisa, na medida em que se busca identificar e analisar seu papel na formao das impresses, e portanto, o tema abordado na sesso que segue.

    2.4 Espao fsico: instrumentalidade, esttica e simbolismo

    Embora costume-se associar a idia de organizao imagem de nmeros e burocracias, imagem de pessoas tomando decises, agindo e interagindo no desempenho de tarefas diferentes, mais ou menos especializadas, com um objetivo coletivo (WOOD JR; CSILLAG, 2004). Busca-se neste trabalho perceb-la sob uma perspectiva distinta, a partir do relato que Gagliardi (2001, p.127) faz sobre uma pesquisa de campo que realizou, onde pediu a um funcionrio que descrevesse sua organizao, abaixo reproduzido:

    Para mim, esta companhia aquela droga de porto que passo todas as manhs, correndo, se estou atrasado, meu cadeado cinza em meu vestirio, este mordaz cheiro de ferro e graxa voc pode senti-lo? a superfcie macia das peas que teo instintivamente esfrego meus dedos sobre elas antes de coloc-las de lado - , e..., sim!, aquele pedao de vidro l em cima, em frente, atravs do qual s vezes l est ele avisto uma nuvem passando.

    Para este trabalhador, embora transparea sua viso potica do mundo e da vida, a organizao era um lugar, uma realidade fsica, material. O espao fsico da organizao surge como o retrato mais fiel de sua identidade cultural, representa a viso de mundo, e oferece uma percepo diria desta viso, sendo, portanto, uma testemunha do passado e um guia para o futuro (GAGLIARD, 2001). Clegg e Komberger (2004) refletem sobre arquitetura e administrao e suas mtuas implicaes, criticando a racionalidade cartesiana e argumentando que as organizaes devem ser vistas como um conjunto material e espacial, no apenas como abstraes cognitivas. De acordo com Ittelson (1973), o espao fsico no pode ser passivamente observado, porque representa uma arena para o desenrolar das aes. Ele define a probabilidade de

  • ocorrncia e demanda a qualidade destas aes provendo significados simblicos e mensagens motivacionais, sendo meio que oferece oportunidades de e para o controle ou manipulao. Para o autor as pessoas, apesar das diferenas individuais, parecem organizar respostas perceptivas ao ambiente fsico em torno de cinco nveis de anlise que so: afetivo, orientao, categorizao, sistematizao e manipulao. A primeira resposta ao ambiente fsico afetiva. o impacto direto da situao nas emoes, geralmente direciona as relaes subseqentes com o ambiente dando o tom motivacional e delimitando os tipos de experincias esperadas e buscadas pelo indivduo. Em seguida as pessoas buscaro se orientar dentro do ambiente. Identificando rotas de escape e caractersticas positivas e negativas, incluindo outras pessoas, e resultando em um mapa da situao que prov a base para uma explorao mais detalhada. De posse de um grau satisfatrio de orientao iniciado o processo de desenvolvimento de categorias de anlise e de entendimento. As categorias iniciais partem de eventos nos quais os objetos so identificados e destilados em mais e mais detalhes. Segue-se ento a sistematizao. Coneces causais so identificadas e verificadas. As complexas relaes so gradualmente ordenadas em harmonia. A partir de ento pode ser iniciada a manipulao do espao e dos artefatos, neste processo o indivduo no passivo, ele interage como parte da situao, aprendendo com as intervenes que faz e com suas conseqncias. importante salientar que todos esses nveis de anlise no ocorrem sequencialmente, mas interagem continuamente entre si. Da mesma maneira, a forma como o

    indivduo percebe o ambiente uma funo da atividade que o indivduo executar no espao fsico, incluindo suas estratgias para explorar e conceitualizar o ambiente (ITTELSON, 1973).

    Durante sua apresentao o indivduo se utiliza de um equipamento expressivo que funciona regularmente de forma geral e fixa (padronizada), podendo ser este intencional, ou inconscientemente empregado, ao qual Goffman (1959) denomina fachada. Schlenker (1980) afirma que as pessoas em organizaes investem uma grande quantidade de tempo, esforo e dinheiro estabelecendo estas fachadas. Conforme argumenta Peters (1992 apud CLEGG, KROMBERGER; 2004, p.1095) o gerenciamento do espao pode ser a mais ignorada, e a mais poderosa ferramenta para induzir a mudana cultural, acelerando projetos inovadores, e acentuando o processo de aprendizagem nas organizaes.

    Hofbauer (2000 apud DALE, 2005) produziu uma anlise sobre os dispositivos de poder, em diferentes layouts de escritrios, que vai alm da forma de controle espacial e relata tanto o simbolismo do espao organizacional como a construo do subjetivo, incorporando a

  • experincia dos trabalhadores. De acordo com Vergara et al. (2004) o espao fsico organizacional pode controlar pedagogicamente, de modo coercitivo ou sutil, o olhar dos indivduos, tornando-os dceis, a fim de que propsitos polticos, econmicos e culturais sejam obtidos.

    Para Clegg e Komberger (2004) o espao pode ser pensado como ausncia de presena, como um imenso vcuo, como algo onde o indivduo pode perder-se. De modo alternativo, o espao pode ser pensado socialmente, nos modos como os indivduos no passado e no presente o tm preenchido de significados. O espao recursivo, podendo ser o meio ou o fim das aes que organiza. A experincia espacial pode determinar limites ou possibilitar a construo social (ROSEN et al., 1990 apud CLEGG, KROMBERGER; 2004).

    Alguns pesquisadores da psicologia ambiental, conforme afirmam Mehrabian e Russel (1974), tm estudado os efeitos do ambiente fsico nas reaes emocionais e sobre as interaes sociais. Nos estudos de ambientes hospitalares a recuperao de pacientes, os comportamentos sociais, e a sensao de bem estar tm sido relatadas como funo dos arranjos espaciais dos pacientes, arquitetura, decorao e arranjos da moblia. Esses efeitos da arquitetura e do design de interiores tambm tm sido percebidos em populaes normais, fora do ambiente hospitalar. Analisando outro fator, os autores consideram que o espao fsico pode influenciar na escolha do indivduo entre permanecer explorando o espao ou evit-lo, em funo da quantidade de iluminao, dos rudos, da temperatura, das cores e do arranjo dos objetos. Tambm as formas em que as pessoas e os artefatos esto organizados podero influenciar as percepes e consequentemente a freqncia e a qualidade das interaes (MEHRABIAN; RUSSEL, 1974).

    De acordo com Nguyen e Leblanc (2002), no caso das organizaes de servios, diante de sua natureza intangvel, os clientes so obrigados a basear suas decises em evidncias tangveis, associadas aos servios oferecidos ou aos provedores do servio, tal como o contato pessoal e o ambiente fsico. Do ponto de vista da administrao de servios, contatos pessoais e ambientes fsicos so considerados como os dois elementos cruciais e interdependentes que determinam o sucesso do processo de entrega do servio. Na verdade, se a maioria das avaliaes dos contatos pessoais e do ambiente fsico positiva, a maioria da percepo da imagem corporativa favorvel. Percebe-se que o ambiente fsico, embora no seja a informao mais saliente que mantida na memria do consumidor, pode ter uma forte influncia na performance do contato pessoal, e pode ser projetado para satisfazer as necessidades de marketing e de operaes (NGUYEN; LEBLANC, 2002). Conforme salientam Fitzsimmons e Fitzsimmons (2000) diferenas sutis no projeto das instalaes so

  • importantes e podem influenciar a percepo dos clientes fazendo-os avaliar diferentemente lojas que vendem produtos similares a preos similares. Para os autores a decorao e o layout das lojas, os tipos de iluminao, dos materiais e das cores utilizadas podem tornar o local mais aconchegante, ter efeitos sobre desempenho das atividades e diferenciar as organizaes.

    Segundo Vilnay-Yavetz et al. (2005), pesquisas confirmam que a configurao dos espaos de trabalho afeta sentimentos e comportamentos dos funcionrios, entretanto, os autores consideram que a maioria dos estudos sobre os espaos organizacionais os classificam timidamente, vendo-os, por exemplo, como instrumentais. Entretanto, os autores questionam se essa classificao seria abrangente o suficiente, se no haveria implicaes quanto ao seu apelo esttico, ou quanto aos smbolos de poder. Diante disto, argumentam que a anlise dos ambientes fsicos organizacionais deveria reconhecer trs dimenses concorrentes e independentes: instrumentalidade, esttica e simbolismo, e classificam como imprecisas anlises que abordam apenas uma destas dimenses (VILNAY-YAVETZ et al., 2005).

    Dessa maneira faz-se necessrio delimitar o significado de cada uma delas. Defende-se que cada uma destas dimenses do espao fsico (alvo da percepo) impacta de maneira distinta na formao das impresses dos indivduos (audincia/observadores) e, portanto, deve ser considerada no processo de gerenciamento por parte da organizao.

    2.4.1 Instrumentalidade

    Vilnay-Yavetz et al. (2005) definem a dimenso instrumentalidade pela relao entre as tarefas e o atingimento de metas. Para Baldry (1999) os locais de trabalho so estruturas de e para o controle, estando longe de serem simples containers. Em nome da eficincia, privilegia-se a racionalidade enquanto se combate o caos. As foras de ordem estipulam hierarquias, horrios, cronogramas e mecanismos de controle, dentre eles a manipulao do espao organizacional (VERGARA et. al., 2004). Segundo Davis (1984), a configurao da estrutura fsica de paredes e corredores tende a restringir movimentos e limitar a interao social, moldando o comportamento. A maioria dos encontros entre membros das organizaes no so planejados. Indivduos que tm postos de trabalho prximos tendem a se encontrar mais freqentemente, da mesma maneira, aqueles que esto locados em reas de grande fluxo tendem a se relacionarem com mais pessoas nas organizaes (DAVIS, 1984). Chaney e Lyden, (1996) salientam que quando funcionrios fazem parte de uma equipe de trabalho ou

  • de um projeto devem ser locados prximos uns dos outros de forma a facilitar as interaes. Para Bitner (1992) o cenrio de servios afeta o comportamento de funcionrios e clientes, pois, a evidncia fsica o ambiente onde a empresa interage com o cliente. Para Nguyen e Leblanc (2002), o ambiente fsico de organizaes de servios, pode ser projetado para satisfazer as necessidades de operaes. As necessidades de operao referem-se maximizao da eficincia organizacional. O layout do ambiente deve ajudar a realizao das tarefas tanto de clientes como de funcionrios. De modo geral, empregados desejam controlar seus locais de trabalho, espaos muito abertos, sem limitao de acesso aos clientes podem produzir distrbios fsicos e psicolgicos aos funcionrios, especialmente nos casos em que o encontro de servios ocorre em espaos limitados e mal projetados. Alm disso, como a presena fsica do cliente e sua participao so geralmente necessrias durante o encontro de servio, o cliente espera ter fcil acesso aos espaos e acredita que parte do espao deva ser reservada a ele ou ela, para execuo de seu papel.

    Para Goffman (1959) a atividade oficial deve ocorrer nas vistas da audincia enquanto as atividades secundrias, mas necessrias ao fornecimento da atividade principal, devem ficar escondidas nos bastidores. Da mesma forma o papel que desempenhado pelos atores no palco (cenrio da loja) tem de obedecer a padres ideais sem sofrer interferncias, da execuo de outros papis que devero ser representados de forma privada. A deciso entre o que deve ser visto e o que no deve ser visto pela audincia deveria ser uma deciso tomada com bastante cuidado pelas organizaes de servio. Alm das impresses causadas pela visualizao dos locais de bastidores verifica-se que sua importncia se relaciona a execuo das tarefas, um bom planejamento destes espaos pode interferir no desenrolar das aes, e da entrega do servio.

    Segundo Fitzsimmons e Fitzsimmons (2000) nenhum cliente (audincia) deveria ser submetido a desgastes desnecessrios decorrentes de instalaes precrias e mal projetadas. Para a orientao dos clientes no espao, sinais, smbolos e artefatos podem ser dispostos a fim de comunicar direes, locais, normas de comportamento e expectativas. Estes sinais ajudam o cliente a proceder de forma eficiente e rpida, reduzindo o tempo, tornando o encontro mais amigvel. As necessidades de marketing so relativas criao de um ambiente que influencie as atitudes e crenas dos clientes, e conseqentemente a imagem corporativa (NGUYEN E LEBLANC, 2002). Percebe-se que os aspectos abordados por Nguyen e Leblanc (2002) e Bitner (1992) referem-se ao que anteriormente denominamos instrumentalidade do ambiente fsico.

  • Alm da dimenso instrumental, o espao compreende a dimenso esttica que se refere qualidade do espao fsico organizacional sendo matria da sesso seguinte.

    2.4.2 Esttica

    Tradicionalmente a esttica foi definida como a filosofia do belo sendo o belo uma propriedade do objeto. Entretanto, por influncia de Immanuel Kant os pensadores passaram a subdividir o campo esttico, tornando-se o belo apenas uma categoria do esttico. Nas palavras de Suassuna (1992, p.23) a esttica pode ser definida como:

    A Filosofia da Beleza, sendo aqui algo que, como o esttico dos ps-kantianos, inclui aquele amargor de Goya, a pintura de Bosch e Breughel, o luxuriante, monstruoso e contraditrio barroco, as grgulas gticas, o romntico, as artes africanas, asiticas e latino-americanas, os trocadilhos obscenos de Shakespeare, o trgico, o cmico todas as categorias da beleza e cnones da arte, afinal; e tambm, naturalmente, o belo, nome que fica reservado quele tipo especial de beleza que se fundamenta na harmonia e na medida e fruda serenamente.

    Ratificando o pensamento de Suassuna (1992), Gagliard (2001), afirma que a dimenso esttica no se resume s experincias descritas como bonitas, ou definidas como arte, mas abrange todas as experincias sensitivas, incluindo formas de conhecimento, ao e comunicao. Para o autor, pode-se abordar a experincia esttica por meio do estudo dos artefatos e, embora a questo esttica seja um aspecto normalmente ignorado nos estudos organizacionais, ela na verdade base de outras experincias e formas de cognio, que so objetos de estudos organizacionais e de onde se infere que a experincia esttica tem grande influncia na vida organizacional (GAGLIARD, 2001).

    De acordo com Davis (1984) a dimenso esttica consiste nas caractersticas do espao que definem a qualidade do ambiente organizacional para os empregados. Estudos evidenciam que a aparncia dos espaos fsicos influencia a percepo que se tem de eventos e de comportamentos, inclusive afetando aos funcionrios e aos servios que eles prestam (DAVIS, 1984; FITZSIMMONS; FITZSIMMONS, 2000). A aparncia do espao pode transmitir importantes impresses que podem afetar o recrutamento dos gerentes e dos seus subordinados. Para muitos destes, inclusive, as condies que cercam o espao organizacional podem ser consideradas importantes e at mesmo justificar o interesse por determinadas organizaes. Vale salientar que estas caractersticas estticas sozinhas no tm muito efeito

    (DAVIS, 1984).

  • Gagliard (2001, p.131), baseado na reflexo de que no se podem dissociar as idias e as coisas, pensamentos e aes, esprito e matria (CZARNIAWSKA-JOERGES; JOERGES, apud GAGLIARD, 2001), argumenta que coisas podem representar a materializao de idias e, portanto podem gerar novas idias que tendem a materializar a si prprias em um processo que, apenas quando compreendido em sua totalidade, torna possvel o entendimento da natureza e das formas da mudana social e organizacional.

    Alm das dimenses instrumentalidade e esttica o espao fsico compreende tambm uma dimenso simblica relativa ao status, ao poder, a modernidade e a cultura da organizao e, sendo detalhada a seguir.

    2.4.3 Simbolismo

    Estudar o simbolismo organizacional uma forma de adquirir um amplo entendimento sobre os comportamentos e sobre a organizao. Os locais de trabalho so construes da identidade do indivduo e das experincias organizacionais. Quando definem os espaos as pessoas comunicam sentimentos, emoes no e sobre o trabalho, idias sobre os diferentes papis, atitudes diante dos outros, sentimentos sobre os relacionamentos. A localizao dos artefatos simboliza em que concentrar e o que deve ser visto pela audincia (JONES, 1996).

    Em virtude de serem membros de uma mesma espcie, indivduos so equipados biologicamente a reagir de maneira similar a certas situaes tal como reaes emocionais a premiaes ou punies, ou com forte ou fraca tenso muscular para coisas que ofeream

    grande ou pequena resistncia, e dessa forma eles podem formar significados conotativos para os objetos e para seus smbolos lingsticos, que variam ao longo da mesma dimenso bsica. Estes significados conotativos entram em uma ampla variedade de situaes, e so generalizados, produzindo a base para transposio metafrica (MEHRABIAN; RUSSELL, 1974). A dimenso simbolismo refere-se s associaes simblicas que o espao suscita (DAVIS, 1984), entretanto, no integralmente uma caracterstica do ambiente, e sim reflete um processo de observao, interpretao e intelectualizao de uma experincia ambiental (VILNAY-YAVETZ et al., 2005).

    O estudo dos artefatos permite decifrar e conhecer aquilo que os indivduos no desejam ou no conseguem expressar por palavras, explicitando muito alm das racionalizaes. Ao mesmo tempo em que os artefatos so ilustraes de uma viso de mundo

  • preexistente, eles so tambm ricos em significados inerentes e independentes de seu criador, a re-significao uma constante, os atores influenciam os espaos e so influenciados por eles, recodificando continuamente suas significaes (DALE, 2005).

    De acordo com Baldry (1999) o espao influencia o comportamento por meio das mensagens que envia, as pistas do ambiente reforam o que socialmente definido como apropriado, que significa que o projeto dos espaos em parte um processo de codificao de informaes que sero decodificadas pelos indivduos. A escolha da estrutura, aparncia e layout do espao podem parecer dados fixos, mas so de fato representantes de escolhas e prioridades sociais (BALDRY, 1999).

    Elementos dos ambientes organizacionais, segundo Chaney e Lyden (1996), podem ser manipulados para obteno de impresses de status, poder, formalidade ou informalidade, assim como fornecer sinais sobre a personalidade do indivduo, podendo inclusive criar impresses positivas ou negativas sobre a organizao. As impresses podem ser criadas a partir trs tipos de smbolos: 1. smbolos de poder, tais como bandeiras e imagens de lderes organizacionais; 2. smbolos afetivos, representados por plantas e trabalhos de arte; e 3. smbolos de mrito, como trofus e certificados.

    No caso das organizaes de servio comum o uso de espaos abertos com poucas barreiras, diferentemente das organizaes mais autoritrias que criam maiores barreiras entre os funcionrios e os visitantes. Tambm comum que os arranjos fsicos em uma sala de reunio privilegiem o lugar do lder na cabea de uma mesa retangular e distante da porta, configurando o que se denomina centro do poder. O uso de cores e da iluminao importante para criar impresses sobre a organizao. A quantidade e a qualidade da iluminao tm influencia nas impresses obtidas. A iluminao perifrica resulta em impresses positivas tornando o espao amigvel e amplo. Ao mesmo tempo espaos escuros tm sido vistos negativamente. A aparente organizao dos artefatos de trabalho d a impresso de que o indivduo tem uma boa habilidade interpessoal, um alto grau de realizao e interessado em clientes e servios. Visitantes tambm tm indicado que os espaos demasiadamente arrumados, embora sejam preferidos diante dos desordenados, so vistos menos positivamente que os organizados suficientemente, talvez porque podem causar a impresso de que nada est ocorrendo naquele espao (CHANEY; LYDEN, 1996).

    No que tange ao uso de cores, h uma comum associao dos tons do vermelho com calor e atividade (MEHRABIAN; RUSSELL, 1974) enquanto amplitude e liberdade so associadas ao branco. A exposio de revistas nas reas de espera ou de recepo pode ter um fim funcional de entreter o indivduo que aguarda naquele espao, como tambm pode ter um

  • apelo simblico transmitindo informaes sobre o que a empresa valoriza como sugerem Chaney e Lyden (1996) quando afirmam que importante que haja uma seleo das revistas disponibilizadas para a rea de recepo. Da mesma forma as autoras salientam que o uso de objetos de boa esttica e objetos de arte tm um bom impacto nos visitantes.

    Vergara et al. (2004) argumenta que h uma ntida correlao entre o tamanho e a personalizao do local de trabalho e a importncia do cargo. O tamanho da sala e se h acesso s janelas simbolizam o status do indivduo. Segundo Schlenker (1980), as cores de um escritrio podem ser criteriosamente definidas para alcanar uma determinada atmosfera, da mesma maneira a moblia e a decorao podem ser selecionadas para atingir determinadas impresses. O arranjo dos mveis pode definir o modo como encontros devem acontecer em uma sala. Cada aspecto do espao pode ser, portanto, cuidadosamente controlado para estabelecer uma imagem e reforar uma maneira e uma impresso desejada. O significado das coisas criadas e utilizadas, enfim, das coisas que nos rodeiam refletem nossa personalidade e, alm disso, so uma extenso do eu, num sentido concreto. As coisas tm a propriedade de nos fornecer um feedback (SCHLENKER, 1980).

    Considerando o espao como composto pelas dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo e concentrando as atenes no cenrio como palco proposto para o gerenciamento de impresses buscar-se-, a seguir, entender como a gesto do espao pode auxiliar na gesto das impresses.

    2.4.4 A Gesto do Espao e das Impresses nas Organizaes: uma viso integradora

    Baseando-se nas informaes e nos argumentos anteriormente explicitados em que o espao fsico atua ativamente na definio da situao pela audincia, e consequentemente na formao das impresses, defende-se neste trabalho que a gesto do espao deveria ser considerada uma importante ferramenta para se gerir as mensagens enviadas pela organizao s suas audincias. Assim, este trabalho prope que a formao das impresses e o gerenciamento do espao esto interligados conforme ilustrado na Figura 2, que foi elaborada no decorrer desta pesquisa com base em um esquema definido por Davis (1984) onde o autor demonstra como ocorre o controle do espao fsico das organizaes.

    Este modelo terico foi criado com o intuito de integrar os temas gerenciamento de impresses, perspectiva dramatrgica e espao fsico. Sugere-se que ao controlar o espao

  • fsico, se controla tambm o modo como as interaes se desenrolam no dia a dia organizacional. A Figura 2 apresenta de forma integradora, a gesto do espao e de suas dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo (VILNAY-YAVETZ et al., 2005) influenciando a interao social que ocorre neste espao (MEHRABIAN; RUSSEL, 1974) e a formao das impresses a partir desta interao (SCHLENKER, 1980; GARDNER; MARTINKO, 1998; DEAUX; WRIGHTMAN, 1988; ROSENFELD et. al., 2002), que analisada sob a perspectiva dramatrgica (GOFFMAN, 1959).

    Figura 2: Modelo dramatrgico da relao gesto do espao e das impresses nas organizaes. Fonte: Baseado em Goffman (1959), Mehrabian e Russel (1974), Schlenker (1980), Davis (1984), Gardner e Martinko (1998), Deaux e Wrightman (1988), Rosenfeld et. al. (2002), Vergara, et. al. (2004),Vilnay-Yavetz et al., (2005).

  • Admitindo-se que o gerenciamento de impresses ocorre sob a perspectiva dramatrgica considera-se que as interaes sociais, e neste caso organizacionais, ocorrem dentro de um cenrio, representado na Figura 2 pelo espao organizacional. O espao organizacional funciona no apenas como um invlucro onde as interaes ocorrem, mas como um meio pelo qual so enviadas mensagens que direcionaro e controlaro as interaes (MEHRABIAN; RUSSEL, 1974; VERGARA, et. al., 2004) fornecendo informaes aos atores e audincia representados pela gerncia intermediaria, funcionrios e clientes, guiando suas aes e formando impresses sobre a organizao.

    As informaes enviadas pelo espao organizacional so controladas pelos diretores do espetculo (alta gerncia e arquitetos). A alta gerncia informa suas intenes aos arquitetos, e juntos definem como devero ser utilizados os espaos, e que impresses estes devero causar. Embora o espao possa ser alterado e adaptado interao pelos atores e pela audincia, o controle destes ltimos sobre o espao organizacional mnimo em relao ao controle da alta gerencia e dos que projetam o ambiente, os arquitetos. Muitas vezes, inclusive, as alteraes possveis j esto previstas no projeto inicial, bem antes que os atores do espetculo (funcionrios/clientes) pudessem ocupar o palco das interaes (DAVIS, 1984).

    Dessa maneira os atores e a audincia no tem muita influencia sobre a definio do espao, embora, a seta em pontilhado represente o feedback que pode ocorrer caso quem gere o espao se ocupe em fazer pesquisas relativas s necessidades e ao desempenho das funes e das interaes preliminarmente ou aps o uso do espao.

    O espao organizacional representado por suas trs dimenses (instrumentalidade, esttica e simbolismo) atuando independentemente e simultaneamente sobre seus usurios. Percebe-se que uma dimenso no se sobrepe outra, e mesmo se no lhe for dada devida ateno na definio do espao ela influenciar a interao, podendo at atuar contra os interesses de quem o projetou, inclusive dificultando a interao ou formando impresses indesejveis (VILNAY-YAVETZ et al., 2005). Fica claro que tambm os funcionrios tornam-se parte integrante da audincia quando formam suas impresses sobre a organizao em que trabalham e acabam por transmitir suas prprias impresses aos clientes durante a interao demonstrando, como j foi dito anteriormente, que o individuo pode assumir o papel de ator e de audincia simultaneamente (GARDNER; MARTINKO, 1988).

  • 3 Metodologia da Pesquisa

    Os procedimentos metodolgicos a seguir apresentados tm como objetivo demonstrar quais os meios seguidos para se obter conhecimentos sobre problema de pesquisa proposto e consequentemente para responder a questo norteadora desta investigao, que : qual a relao das dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo na construo dos cenrios e na formao das impresses das organizaes?

    3.1 Delineamento da Pesquisa

    Neste trabalho considera-se adequado a adoo dos mtodos qualitativos de pesquisa tanto para obteno como para anlise dos dados. Considerando que o tema abordado neste estudo um tema complexo, faz-se necessria a adoo de mtodos que faam justia complexidade do objeto estudado e s prticas e interaes dos sujeitos na vida cotidiana. De acordo com Haguette (1987), as metodologias qualitativas so um reconhecimento de que a sociedade constituda de microprocessos, cujo conjunto constitui as estruturas macias, aparentemente invariantes, atuando e moldando a ao social do indivduo. Denzin e Lincoln (2000) consideram que a pesquisa qualitativa consiste em um conjunto de prticas interpretativas e materiais que tornam o mundo visvel ao transform-lo em uma srie de representaes, dentre elas, notas de campo, entrevistas, conversaes, fotografias, gravaes e memrias.

    Segundo Flick (2004) a pluralizao das esferas da vida evidencia a relevncia da pesquisa qualitativa para os estudos sociais. Os pesquisadores sociais tm se defrontado cada vez mais com novos contextos e perspectivas sociais nos quais suas metodologias dedutivas tradicionais fracassam na diferenciao de objetos. Dessa forma a pesquisa parte cada vez mais para as estratgias indutivas, desenvolvidas a partir de estudos empricos, onde o conhecimento e prticas so estudados em termos locais, temporais e situacionais. Para Flick (2004) a escolha acertada dos mtodos e teorias, a adoo e a anlise de diferentes perspectivas, bem como a reflexo dos pesquisadores a respeito de sua pesquisa so aspectos essenciais no processo de produo do conhecimento.

    Esta pesquisa tem inspirao no interacionismo simblico, que conforme Haguette (1987) aloca importncia fundamental ao sentido que as coisas tm, sentido esse que

  • emerge do processo de interao social, no sendo algo intrnseco ao ser. Quanto aos fins, este estudo se prope a ser do tipo descritivo, cujo objetivo caracteriza-se pela descrio das caractersticas de determinada populao ou fenmeno, levantamento de opinies, atitudes e crenas de uma populao, podendo elucidar associaes entre variveis, e determinar a natureza destas relaes, dessa maneira, se aproximando da pesquisa explicativa (GIL, 1999). Para realizar este trabalho adotou-se a pesquisa de campo, mais especificamente o estudo de caso. Conforme afirma Vergara (1998) o estudo de caso pode ser composto por uma ou por poucas unidades, tendo carter de profundidade e detalhamento.

    3.2 Unidades de Pesquisa

    Segundo Merriam (1998) o estudo de caso trata-se do estudo de uma unidade limitada, um fenmeno de determinado tipo que ocorre em um contexto limitado. Para a autora o fenmeno no est intrinsecamente delimitado, ele no o caso, entretanto, dever haver um limite de tempo, de entrevistas, de observaes e de observados. Se o fenmeno no permite definir estes limites, ento no se configura como caso. Nesta pesquisa tem-se o propsito de executar um estudo de mltiplos casos, mais especificamente, trs casos foram abordados. Os casos selecionados foram trs lojas dedicadas ao varejo de moda feminina estabelecidas no Centro de Compras Pao Alfndega, situado na cidade do Recife, estado de Pernambuco, cujo critrio de seleo ser apresentado a seguir.

    Conforme argumenta Stake (1995) o que interessa na seleo dos casos tanto sua singularidade quanto sua generalidade. O estudo de caso no uma pesquisa de amostragem, a principal obrigao do estudo de caso compreender o objeto de pesquisa e no obter generalizaes. O primeiro critrio dever ser maximizar o entendimento. Para Merriam (1998) a identificao de casos ricos em informaes se dar pelos critrios utilizados na seleo dos mesmos. Neste estudo os critrios de seleo foram:

    1. Organizaes que se dedicam a um pblico de classes mdias e altas, supostamente mais exigentes quanto aos espaos fsicos das organizaes que freqentam;

    2. No serem vinculadas s redes de franquias, j que os projetos das lojas pertencentes a franquias j vem definidos pelo franqueador no sendo permitido ao franqueado muita autonomia para definir o espao fsico de sua loja;

  • 3. Ter espaos fsicos mais amplos, onde as reas destinadas aos diversos usos sejam bem definidas (tais como espaos destinados ao uso restrito a funcionrios, reas de atrao como vitrines, locais estritamente funcionais como provadores, etc.) e o uso de recursos fsicos como tecnologia, iluminao, pisos e paredes com tratamento diferenciado o que revelaria uma preocupao com o espao fsico facilitaria a identificao das trs dimenses pesquisadas; 4. Aparente preocupao com a impresso que formam em seus clientes.

    Aps a seleo das unidades de pesquisa partiu-se para a obteno dos dados, no que se constitui o trabalho de campo abaixo descrito.

    3.3 Trabalho de Campo

    De acordo com Denzin e Lincoln (2000) nenhum nico mtodo pode compreender todas as sutis variaes da experincia humana. Consequentemente, pesquisadores qualitativos dispem um grande nmero de mtodos interpretativos interconectados, sempre buscando meios de tornar as experincias que esto estudando mais compreensveis. Nesta pesquisa, foram utilizados como instrumentos para coleta de dados as metodologias visuais, o grupo focal com foto-elicitao e a entrevista em profundidade aliados a observao.

    O uso de variados mtodos de pesquisa denominado por Flick (2004) triangulao, e pode ser uma abordagem que embasar ainda mais os conhecimentos adquiridos por meio dos mtodos qualitativos, ampliando as possibilidades de produo do conhecimento. O termo triangulao advm da metfora da navegao e da estratgia militar que no intuito de localizar a posio exata de um objeto, utilizava vrios pontos de referncia (VERGARA, 2005), bem como da geometria que se utiliza de vrias vistas para definio de um objeto com mais preciso (PAIVA JR. et al., 2007).

    A abordagem visual, conforme argumenta Mendona et al. (2004), uma metodologia que tm origem na sociologia e na antropologia. Por meio desta abordagem o pesquisador, ao estudar um fenmeno social, utiliza imagens como fonte de dados para anlise das interaes sociais. Essas imagens podem ser estticas (fotografias) ou imagens em movimento (filmes e vdeos). Ainda segundo os autores, a incluso de imagens coletadas aos dados obtidos nas pesquisas oferece uma riqueza aos estudos, pois pode proporcionar objetividade e credibilidade aos mesmos, j que a fotografia uma prova tangvel de um determinado fenmeno.

  • A despeito das vantagens e contribuies das fotografias para a pesquisa organizacional, estas parecem estar sendo subutilizadas, e devido ao seu potencial merecem adicional explorao e desenvolvimento. Fotografias, filmes e vdeos constroem aspectos da realidade social por meio de sua representao seletiva de pessoas e eventos, e no apenas gravam passivamente o que lhes aparece diante das lentes. Essas representaes, entretanto, no podem ser consideradas como realsticas dadas s mediaes interpretativas daqueles que se encontram por trs das cmeras (BUCHANAN, 2001). importante salientar que ao adotar esse mtodo de pesquisa, podem-se utilizar imagens existentes ou as imagens podem ser produzidas e analisadas pelo prprio pesquisador (MENDONA et al., 2004).

    No caso deste estudo, a pesquisadora produziu, com autorizao dos proprietrios das lojas, imagens dos ambientes fsicos das organizaes pesquisadas que posteriormente foram analisadas e utilizadas como recurso de foto-elicitao para o grupo focal, j que segundo Flick (2004, p.162) as fotografias permitem o transporte de artefatos e a apresentao destes como retratos.

    A anlise dos dados visuais foi efetuada por meio do que Flick (2004) denomina placa de anlise, estas so formadas por grupos de fotografias juntamente com anlises textuais a elas relacionadas. Dessa maneira, as imagens foram classificadas em categorias e interpretadas. Loizos (2002) afirma que as fotografias podem ser utilizadas para se obter uma informao implcita, entretanto faz-se necessrio o conhecimento sobre o contexto em que foram obtidas. O levantamento fotogrfico foi executado com o auxlio de uma fotgrafa profissional com formao em jornalismo, que utilizou uma mquina fotogrfica profissional e digital, o que permitiu a obteno de imagens de boa qualidade e capazes de expressar as impresses que a pesquisadora considerou mais marcantes e representativas ao conviver com os espaos estudados. Esse levantamento foi efetuado com a permisso dos proprietrios de cada loja que agendaram a data desta coleta de dados, podendo inclusive organizar seus espaos da forma que achassem mais conveniente. A princpio foi sugerido a fotgrafa que fizesse imagens de tudo aquilo que lhe chamasse ateno no espao da loja, sem distines entre o que lhe parecesse uma qualidade ou um defeito. Em seguida foi solicitada uma complementao das imagens quando foi percebida uma carncia de algum item que poderia ser representativo pesquisa. Das 140 imagens obtidas neste levantamento foram selecionadas 40 fotografias consideradas como as mais representativas dos ambientes fsicos, das vises de quando se entra na loja, dos modos de expor os produtos, das cores, da iluminao, dos materiais utilizados, dos provadores, dos caixas, dos espaos de bastidores, e aquelas imagens que representassem as sensaes

  • consideradas mais marcantes pela pesquisadora e que estivessem em consonncia com a obteno de respostas para pergunta de pesquisa. Estas fotografias foram agrupadas por categorias e por loja e posteriormente apresentadas em slides durante o grupo focal. Durante a seleo foram excludas as imagens das vitrines, j que as mesmas poderiam identificar o produto mais claramente, bem como influenciar a anlise dos ambientes por parte das entrevistadas. Ademais, aqui se sugere que sistemtica do centro do poder (quando se configura um espao para empoderar o indivduo) poderia ser transposta para a situao em que o cliente visualiza o produto na vitrine, vendo-o sob um pano de fundo que o prprio espao fsico da loja e, dessa maneira a viso que se tem do produto na verdade a viso de um conjunto composto pelo produto e pelo ambiente fsico da loja. S foram capturadas imagens que estivessem disponveis a qualquer indivduo que visitasse a loja, j que um dos objetivos especficos desta pesquisa verificar a impresso causada na audincia. Dessa forma foram dispensadas as avaliaes dos espaos de bastidores que no fossem acessveis aos clientes. Aps o levantamento dos dados fotogrficos foi dado incio aos processos de seleo dos entrevistados e s entrevistas propriamente ditas. A entrevista qualitativa uma metodologia de coleta de dados amplamente empregada nas cincias sociais (GASKELL, 2002), inclusive considerada por muitos autores como a tcnica por excelncia da pesquisa social devido a sua flexibilidade (GIL, 1999). A entrevista do tipo semi-estruturada, aqui denominada entrevista qualitativa, pode ser realizada com um nico respondente (entrevista em profundidade) ou com um grupo de respondentes (grupo focal) (GASKELL, 2002).

    Quando da seleo deste mtodo duas questes so consideradas centrais por Gaskell (2002): (1) o que perguntar (tpico guia) e; (2) a quem perguntar (seleo dos entrevistados). A definio do tpico guia ser fundamentada em uma combinao de uma leitura crtica e de um reconhecimento de campo, este fruto entrevistas preliminares com pessoas relevantes. Da se justifica a utilizao do grupo focal como um reconhecimento de campo que ir fornecer uma gama de pontos de vista sobre o assunto e que, desta maneira, delinear as entrevistas em profundidade, e de maneira mais ampla, a pesquisa como um todo, j que, conforme Gaskell (2002) existe um nmero limitado de pontos de vista ou posies sobre um tpico dentro de um meio social especfico. Existem inmeras vantagens e limitaes em relao s entrevistas individuais e grupais o que leva alguns pesquisadores a se utilizarem da juno destes dois mtodos (GASKELL, 2002). Grupos focais permitem acesso queles participantes que podem achar interaes face a face assustadoras ou intimidantes. Por criar mltiplas linhas de comunicao, a entrevista

  • em grupo oferece aos participantes um ambiente seguro onde se podem compartilhar idias, crenas, e atitudes na companhia de pessoas de semelhantes etnias, gneros e posies socioeconmicas, por outro lado pode ser uma faca de dois gumes, quando o entrevistado sente-se inibido em uma situao grupal (MADRIZ, 2000). Para Stokes e Bergin (2006) o grupo focal apresenta vantagens tais como, a sinergia entre os participantes, que pode provocar o surgimento de uma grande quantidade de informaes, e um efeito bola de neve gerando pensamentos e idias em cadeia, estimulando o afloramento das vises dos respondentes, oferecendo menor presso sobre o entrevistado do que nas entrevistas individuais e mais espontaneidade pois, como nenhum indivduo requisitado a responder uma questo, encoraja respostas espontneas, quando as pessoas tm um ponto de vista definido, bem como ajudam a eliciar porqu uma questo particularmente saliente para o grupo.

    Quanto s questes estruturais, Stokes e Bergin (2006) salientam que mais fcil para o moderador re-introduzir um tpico que no foi adequadamente coberto, e permite um exame minuncioso, j que pode ser observado por outros membros do grupo de pesquisa. Como desvantagem, pode produzir uma viso de consenso, severamente criticadas dadas s implicaes que o consenso pode significar uma viso que ningum discorda, mas igualmente, ningum concorda. Enquanto o grupo focal capaz de acuradamente identificar questes principais, tambm incapaz de captar a profundidade e o detalhe relatado para estas questes em entrevistas individuais. Entrevistas em profundidade parecem mais apropriadas para situaes de pesquisa, onde h uma especfica e bem definida, questo a ser investigada, e que necessita de um entendimento detalhado (STOKES; BERGIN, 2006).

    Diante dos argumentos acima citados, o grupo focal foi utilizado como meio de orientar a pesquisadora para o campo de investigao e para linguagem deste campo, observando os processos de consenso e divergncia e explorando o espectro de atitudes, opinies e comportamentos. Assim, o grupo focal surge como um mtodo que permitiria uma observao mais aproximada de uma interao, mais influenciada pelas relaes sociais. Esta interao pode gerar sentimentos, emoes, humor, espontaneidade, intuies, e ambiente propcio assuno de riscos, polarizaes de atitudes, um ambiente onde o indivduo leva em considerao a opinio dos outros na formulao de suas prprias opinies (GASKELL, 2002).

    Segundo Gaskell (2002) os moderadores podem utilizar figuras, desenhos, fotografias ou dramatizaes com recursos a fim de estimular idias e discusses. Dessa maneira, j que aqui se procura discutir o espao fsico e suas implicaes no processo de formao de

  • impresses dos atores, considerou-se a utilizao da foto-elicitao como um meio de estimular os respondentes e evocar memrias, inclusive chamando ateno tanto para aquilo que registrado pelo respondente como para aquilo que se mostra ausente na resposta e que, portanto, tambm tem significado, pois sugere que o indivduo no est atento a determinados detalhes que para outros respondentes podem ser relevantes (LOIZOS, 2002). Conforme argumenta Flick (2004), a fotografia tem uma longa tradio na antropologia e na etnografia, e seu uso para fins de pesquisa tem sido adotado tanto como tpico quanto como mtodo. O mtodo da foto-elicitao, aqui destacado, implica em mostrar fotografias para informantes como gatilho (para dar motivo), ou eliciar (extrair, provocar) comentrios e perspectivas sobre as imagens mostradas (BUCHANAN, 2001). Para Harper (2000) o pesquisador pode apresentar um conjunto de imagens para eliciar explanaes nos respondentes. A apresentao de imagens permitiria ao entrevistador diminuir a distncia cultural entre ele e o entrevistado, j que as referidas imagens poderiam ser compreendidas por ambas as partes envolvidas na interao independente do grau de estruturao utilizado entrevista (MENDONA, VIANA, 2007).

    Embora o ponto de saturao deva ser percebido pelo pesquisador quando no houver mais surpresas nas respostas dos respondentes (GASKELL, 2002), neste caso especfico o grupo focal funcionou como reconhecimento de campo, e apenas uma sesso foi considerada suficiente. Entendeu-se tambm que o grupo focal deveria ser realizado com representantes do pblico em geral, que no fossem clientes das organizaes em estudo, e que no conhecessem os objetivos e caractersticas destas organizaes, como meio de obterem-se opinies mais gerais sobre o tema.

    De posse destas informaes preliminares, partiu-se para a entrevista em profundidade representativa da unidade social mnima onde a perspectiva individual se sobressai o que fornece a essa pesquisa uma complementaridade de idias. A partir deste ponto a pesquisa se volta para a realidade do indivduo, explorando a vida dos atores sociais, descortinando detalhadamente suas experincias individuais, suas crenas, escolhas e sentimentos, ao mesmo tempo em que permite uma maior liberdade ao respondente para falar sobre assuntos que possam causar alguma ansiedade na sua relao com a organizao. Para tanto foram entrevistados proprietrios, funcionrios e clientes. No caso de uma das organizaes no foi possvel entrevistar a proprietria, embora a mesma tenha concordado em participar da entrevista, pois como no residia na cidade tentou agendar nas suas vindas a Recife mas teve que desmarcar em funo de compromissos profissionais que se estenderam mais que o esperado.

  • Segundo Selltiz et al. (1967, p.117 apud GIL, 1999) a entrevista bastante adequada obteno de informaes a respeito do que as pessoas sabem, crem, esperam, sentem ou desejam, pretendem fazer, fazem ou fizeram, bem como acerca de suas explicaes ou razes a respeito das coisas precedentes, portanto, podendo auxiliar esclarecendo sobre como se d a formao das impresses e as implicaes que as dimenses instrumentalidade, esttica e simbolismo tm em relao a este fenmeno.

    De acordo com Farr (1982 apud GASKELL, 2002) a entrevista qualitativa uma tcnica ou mtodo que traz a tona outros pontos de vista sobre os fatos alm dos de quem elabora a entrevista sendo assim a porta de entrada do cientista social, que, por meio dos esquemas interpretativos procura compreender as crenas, atitudes valores e motivaes relacionadas aos comportamentos dos indivduos de um determinado meio social. Conforme Gaskell (2002), toda pesquisa com entrevista um processo social, uma interao, um processo cooperativo em que as palavras surgem como meio de troca, e que, neste processo tanto entrevistados como entrevistador, embora de maneiras distintas (GIL, 1999; GASKELL, 2002), fazem parte da produo do conhecimento.

    Durante a realizao das entrevistas em profundidade foi descartado o uso da foto-elicitao pois as interaes ocorreram no espao fsico das lojas. Obviamente as respostas dadas variaram de acordo com o papel social que cada respondente assume em relao a loja, no caso desta pesquisa, os respondentes foram selecionados entre clientes, proprietrios ou funcionrios.

    importante que fique claro que o