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Poemas Animais

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Pós-Graduação em Estudos LiteráriosFaculdade de Letras da UFMGProfa. Maria Ester Maciel Borges

POEMAS SOBRE ANIMAIS

The Jaguar  

Ted Hughes

The apes yawn and adore their fleas in the sun.The parrots shriek as if they were on fire, or strutLike cheap tarts to attract the stroller with the nut.

Fatigued with indolence, tiger and lion. Lie still as the sun. The boa constrictor's coilIs a fossil. Cage after cage seems empty, orStinks of sleepers from the breathing straw.It might be painted on a nursery wall.. But who runs like the rest past these arrives

 At a cage where the crowd stands, stares,mesmerized,

 As a child at a dream, at a jaguar hurrying enragedThrough prison darkness after the drills of his eyes. On a short fierce fuse. Not in boredom -The eye satisfied to be blind in fire,By the bang of blood in the brain deaf the ear -He spins from the bars, but there's no cage to him. More than to the visionary his cell:His stride is wildernesses of freedom:The world rolls under the long thrust of his heel.Over the cage floor the horizons come.

O Jaguar

Ted Hughes ( Trad. Sérgio Alcides) 

Macacos se espreguiçam cultuando pulgas ao sol.Guincham os papagaios, como ardendo, ou gingamFeito putas a fim de atenção e amendoim.Fatigados pela indolência, o tigre e o leão

Jazem imóveis como o sol. O rolo da jibóiaFossiliza-se. Jaula após jaula está vazia, ouFede ao palheiro onde tresanda um dorminhoco.Para pintar num quarto de criança a cena é boa.

Mas quem percorre a ala com os outros atinge A jaula onde uma multidão vem ver, mesmerizadaComo criança sonhando, um jaguar furioso a girarPelo breu da prisão que a broca do seu olhar punge

Num curto pavio feroz. Sem fastio  – Os olhos contentes no seu fogo cegante,Os ouvidos ao surdo tambor do seu sangue  – Revolta-se ante as grades, mas para ele não há

 jaula

Mais do que para o visionário existe sua cela:É seu passo o sertão que a liberdade tem defronte:O mundo rola embaixo do ímpeto de suas patas.No chão de sua jaula se derramam os horizontes.

s. The Hawk in the Rain (1957).

 

DER PANTHER  Rainer Maria Rilke

Im Jardin des Plantes, Paris 

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Sein Blick ist vom Vorübergehn der Stäbeso müd geworden,dass er nichts mehr hält.Ihm ist, als ob es tausend Stäbe gäbeund hinter tausend Stäben keine Welt.

Der weiche Gang geschmeidig starkerSchritte,der sich im allerkleinsten Kreise dreht,ist wie ein Tanz von Kraft um eine Mitte,in der betäubt ein grosser Wille steht.

Nur manchmal schiebt der Vorhang derPupillesich lautlos auf -. Dann geht ein Bild hinein,geht durch der Glieder angespannte Stille -und hört im Herzen auf zu sein. A PANTERA 

Rainer Maria Rilke(Trad. Augusto de Campos) 

(No Jardin des Plantes, Paris)

De tanto olhar as grades seu olharesmoreceu e nada mais aferra.Como se houvesse só grades na terra:grades, apenas grades para olhar.

A onda andante e flexível do seu vultoem círculos concêntricos decresce,dança de força em torno a um ponto ocultono qual um grande impulso se arrefece.

De vez em quando o fecho da pupilase abre em silêncio. Uma imagem, então,na tensa paz dos músculos se instilapara morrer no coração.

 

*

UM BOI VÊ OS HOMENS 

Carlos Drummond de Andrade

Tão delicados (mais que um arbusto) e correme correm de um para outro lado, sempre esquecidosde alguma coisa. Certamente, falta-lhes

não sei que atributo essencial, posto se apresentem nobrese graves, por vezes. Ah, espantosamente graves,até sinistros. Coitados, dir-se-ia não escutamnem o canto do ar nem os segredos do feno,como também parecem não enxergar o que é visívele comum a cada um de nós, no espaço. E ficam tristese no rasto da tristeza chegam à crueldade.Toda a expressão deles mora nos olhos - e perde-sea um simples baixar de cílios, a uma sombra.Nada nos pêlos, nos extremos de inconcebível fragilidade,e como neles há pouca montanha,e que secura e que reentrâncias e queimpossibilidade de se organizarem em formas calmas,permanentes e necessárias. Têm, talvez,certa graça melancólica (um minuto) e com isto se fazemperdoar a agitação incômoda e o translúcidovazio interior que os torna tão pobres e carecidosde emitir sons absurdos e agônicos: desejo, amor, ciúme(que sabemos nós?), sons que de despedaçam e tombam no campocomo pedras aflitas e queimam a erva e a água,e, difícil, depois disto, é ruminarmos nossa verdade.

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FADO DO BOI

Eucanaã Ferraz

I

Perdoai-nos, que em nossas mãosserão castrados. Perdoai-nos, quepor nossas mãos tereis os chifresarrancados e o couro marcadoa ferro quente (sem anestesia, é claro).

Depois, será hora de vos levarà engorda. Eis a vida no campo!aama, estrume, moscas, frio, febre,flato, inseticidas, pestes. Eis

a vida no campo! Perdoai-nos,

que, pra nossa economia,reinventaremos a crueldade e(rima indigesta) a gastronomia,misturando à vossa ração um tantode papelão, jornais (a literatura

não vos fará mal, decerto) eserragem, e cimento (poesiaconcreta, digamos) e estrumede aves (restos de romantismo),

de porcos e um tanto de esgoto.E, assim, mais gordos e- por que não? – mais cultos,havereis de seguir para o abate(apinhados como livros na estante?)se tudo estiver a contento.

Explique-se o verso acima: dentrevós, aqueles doentes demais paramorrer serão deixados no montedos defuntos para que a sede, o frioe a fome façam seu papel (literatura,

ainda). Se tiverdes sorte, no entanto,estareis saudáveis, obesos comodicionários, como enciclopédias,ilíadas e odisséias que serãorasgadas e, por isso, perdoai-nos.

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II

No corredor estreitocada músculo tenta

desesperadamentefugir numa ânsia loucade asas que arremessassem,asas que os arrancassemdali dentre o fedordo sangue, do fedorde mortos, do fedordo sangue que restoudos mortos no seu cômodomínimo, nesse túmulonão de depois da morte,mas de antes, de durante,enquanto golpes cortam,

mutilam olhos, alma,focinhos e, sim, mesmovivos, pelas suas patasde trás erguidos, boisao contrário, os músculosse rompem, arrancadasas pétalas, e facasbeijam-lhes as gargantasque sangram, sangram, sangram.

III

Que nos pergunta o boidesde o antigo Egito?

Que nos pergunta o boidesde o silêncio e sobre este

seu estrume, flor extrema?Que nos pergunta em sua

ronda infinita desdeo dorso de um vaso

sua pergunta redonda desdeo afresco em ruínas desabando

sobre nossa ausência de espanto,sobre nossa fome bestial

e nossos dentes diante do sinalde interrogação? Interroga

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sobre nós talvez, como se dele fôramoso seu mistério, seu tempo, seu espaço,

cerne hostil de sua compreensãodo mundo e de si mesmo.

O boi não nos decifra.Nós devoramos o boi.

(do livro Cinemateca, 2008)

*

A ZEBRA

 Juan José ArreolaTrad. Walter Costa

A zebra leva a sério sua aparência vistosa e, ao se saber listrada, se entigrece.Presa em seu gradeado lustroso, vive no galopante cativeiro de uma liberdade mal

entendida: non serviam, declara, com orgulho, sua índole indômita. Abandonando qualquertentativa de domínio, o homem quis dissolver o elemento indócil da zebra, submetendo-a a visexperimentos de cruzamento com asnos e cavalos. Tudo em vão. As listras e a condição ariscanão se apagam em zebrinos e zébrulas.

Como o onagro e o quagga, a zebra se compraz invalidando a posse humana da ordem dosequinos. Quantos irmãos do cão ficaram, já para sempre, insubmissos, com ofícios de lobo,

protelo e coiote?Limitemo-nos, pois, a contemplar a zebra. Ninguém levou a tais extremos a possibilidadede encher satisfatoriamente a pele. Gulosas, as zebras devoram planícies de pasto africano,sabendo que nem o corcel árabe nem o puro-sangue podem atingir semelhante redondez deancas nem igual finura de cabos. Só o cavalo P rzewalski , sobrevivente da arte rupestre, lembraum pouco o rigor formal da zebra.

Insatisfeitas com sua clara distinção especial, as zebras praticam ainda seu gosto ilimitadopelas variantes individuais, e não há sequer uma que tenha as mesmas listras de outra. Anônimase solípedes, passeiam a enorme impressão digital que as distingue: todas zebradas mas cada umaà sua maneira.

É verdade que muitas zebras aceitam, de bom grado, dar duas ou três voltas na pista docirco infantil. Mas não é menos verdade também que, fieis ao espírito da espécie, fazem issoseguindo um princípio de altiva ostentação.

*

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MONÓLOGO DO MACACO

 José Emilio PachecoTrad. Walter Carlos Costa

Nascido aqui na jaula, eu, babuíno,o primeiro que aprendi foi: o mundo,por onde quer que se olhe, tem

grades e grades.Não consigo ver nadaque não esteja entigrecido por grades.Dizem: há macacos livres.

Eu só viinfinitos macacos prisioneiros

sempre entre grades.E de noite sonho

com a selva ouriçada por grades.

Vivo apenas para ser visto.Chega a multidão chamada gente.Gostam de me atiçar. Se divertemquando minha fúria faz as grades ressoarem.

Minha liberdade é minha jaula.Só morto

me tirarão destas grades brutais.

*

PASSARÊS

Astrid Cabral

Entre folhas secas ou verdescanta ao balcão da janelaum pássaro estrangeiro.

Tal o olhasse sem enxergá-loconheço-lhe o passarêssem jamais decifrar-lhe a voz.

Não é de hoje que me aflige

essa terrível surdeza vedar-me sua mensagem.

Céus, são tantas linguagensque sempre me deixam à margemcega ao que pássaros sabem.

(do livro Jaula, 2008)

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PELICANOS

Wilson Bueno

Os pelicanos são como avis raras, e moram, em seu silencioso coração, as reticências.

Arcar com o severo pesadume do bico é, deles, dos pelicanos, uma insubstituível marca e, decerto modo, um glorioso acinte. Pudessem, não envergariam pela vida afora os bicos comotrombas tristes e nem exibiriam as longas melancólicas pernas feito uma humilhação compulsória.

Ah, guardam, no escuro papo guardam uma esmeralda viva e sonham por nós o sonho oblíquo deque sendo sumamente feios, de físico e de feição, nós, os dois, neste lago merencório,alcancemos soar, quem diria?, perfeitamente escarlates.

Voar não podemos dada a complexidade do corpo contra a magra asa. Assim, jaburu, o nariz e adilatada marca de teu lábio inchado.

*

CE QUE DIT LE COCHON

Jacques Roubaud

Pour parler, dit le cochon,ce que j’aime c’est lês mots porqs: 

glaviot grumeau gueule grommellechafouin pacha épluchuremâchon moche miches chameauempoté chouxgras polisson. j’aime lês mots grãs et porcins:  jujube pechblende pépérecompost lardon chouraverbouillaque tambouille couennenavet vase chose choucroute.Je n’aime pas trop potiron et pas du tout arc-en-ciel.Ces bons mots je me lesfourre sous le groin

et ça fait un pöeme de porq.

(do livro Os animais de todo mundo, trad.Paula Glenadel e Marcos Siscar)

E O PORCO DISSE

Jacques Roubaud

Quando falo, disse o porco,eu gosto é de dizer porqarias:

graxa goela gripe grunhidopaspalho paxá luxaçãoresmungo munheca migalho camelochuchu brejo chiqueiroeu gosto é de dizer pocilgarias:

 jujuba piche comadreestrume toucinho pelancapururuca chouriço guisadoldo chucrute bucho quiabo.Não gosto muito de abóborae muito menos de arco-íris.Essas boas palavras eu viro com o focinho

para fazer um verdadeiro poema de pörqo.