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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – UESPI FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS – FACIME LARISSA DA COSTA GOMES AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS QUE OS ALCOOLISTAS ELABORAM ACERCA DO ALCOOLISMO E DE SEU TRATAMENTO NA CIDADE DE TERESINA – PI TERESINA (PI) 2007

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PIAUÍ – UESPI FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS – FACIME

LARISSA DA COSTA GOMES

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS QUE OS ALCOOLISTAS ELABORAM ACERCA DO ALCOOLISMO

E DE SEU TRATAMENTO NA CIDADE DE TERESINA – PI

TERESINA (PI) 2007

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LARISSA DA COSTA GOMES

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS QUE OS ALCOOLISTAS ELABORAM ACERCA DO ALCOOLISMO

E DE SEU TRATAMENTO NA CIDADE DE TERESINA – PI

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual do Piauí como requisito parcial de avaliação para formação de Psicólogo. Orientadora: Ms. Maria Zilda Silva Soares.

TERESINA (PI) 2007

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LARISSA DA COSTA GOMES

AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS QUE OS ALCOOLISTAS ELABORAM

ACERCA DO ALCOOLISMO E DE SEU TRATAMENTO NA CIDADE DE TERESINA – PI

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção do grau de Psicólogo à comissão julgadora da Universidade Estadual do Piauí – UESPI, da Faculdade de Ciências Médicas – FACIME.

Aprovada em: 25/04/08

BANCA EXAMINADORA

______________________________________________________________

Maria Zilda Silva Soares Universidade Estadual do Piauí – UESPI

______________________________________________________________

Patrícia Rocha Lustosa Universidade Estadual do Piauí – UESPI

______________________________________________________________

Antônio de Barros Araújo Filho Universidade Estadual do Piauí – UESPI

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AGRADECIMENTOS

À minha família pelo apoio e disponibilidade em auxiliar-me;

Ao Johnson por sempre estar ao meu lado disponível para ouvir-me e contribuir no

que podia;

À coordenadora do curso de Psicologia da Faculdade de Ciências Médicas,

Patrícia Lustosa, pelo incentivo e por disponibilizar-me seus livros pessoais para

estudo;

Ao meu amigo Antônio por contribuir de maneira enriquecedora para a realização

deste trabalho;

Às minha amigas Mara Laiana e Rafaella pelo companheirismo e assistência;

Aos locais de realização deste trabalho e às pessoas que se dispuseram a

contribuírem para a concretização do mesmo;

Um agradecimento mais que especial a minha orientadora, Maria Zilda, que

sempre se dispôs a contribuir nesta pesquisa, apoiando-me, esclarecendo dúvidas,

demonstrando paciência, amor e compromisso pelo que se dispõe a fazer. Muito grata

mesmo por tudo.

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RESUMO

O alcoolismo é um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo. Cerca de 10% da população brasileira é dependente do álcool, enquanto um número maior de pessoas enfrenta problemas relacionados ao consumo excessivo. O trabalho objetivou identificar as Representações Sociais elaboradas por alcoolistas em processo de tratamento no município de Teresina–Pi acerca do álcool e do tratamento do alcoolismo. A pesquisa foi exploratória, qualitativa, realizada no CAPS-ad (Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e Drogas) da cidade, numa Clínica Psiquiátrica Privada, em uma das instituições do AA (Alcoólicos Anônimos) e em uma Comunidade Terapêutica. A amostra foi composta por 40 sujeitos, 36 do sexo masculino e 04 do sexo feminino, com idade entre 26 e 67 anos. Para coleta dos dados utilizou-se uma entrevista estruturada. Os dados foram submetidos à Análise de Conteúdo de Bardin (1991). Os resultados se concentraram em dois eixos: o primeiro se refere às representações sociais acerca do uso do álcool que podem ser descritas a partir de duas categorias e suas respectivas subcategorias – a primeira categoria foi “significados do álcool” e suas subcategorias foram “obstáculos no contexto de vida”, “refúgio”, “droga” e “doença”; a segunda foi “sentimentos frente ao uso do álcool” e suas subcategorias foram “sensação de liberdade”, “impotência”, “mal-estar”, “culpa”, “tristeza”. O segundo eixo aborda às representações do tratamento do alcoolismo com quatro categorias e suas subcategorias – a primeira foi “recuperação de ajuda mútua” e suas subcategorias foram “mudança de vida”, “felicidade”, “desenvolvimento da espiritualidade” e “reconhecimento do alcoolismo como doença”; a segunda “reabilitação em comunidade terapêutica” e as subcategorias “recomeço de vida”, “construção da religiosidade” e “harmonia”; a terceira “tratamento clínico psicossocial” com as subcategorias “bem-estar”, “desejo de recuperação”, “possibilidade de reincidência” e “reabilitação fisiológica”; a última categoria foi “atenção psicossocial” e suas subcategorias “tratamento satisfatório”, “vida nova” e “esperança”. As Representações Sociais do uso do álcool elaboradas pelos sujeitos sociais da pesquisa estão mais diretamente ligadas a obstáculos na vida e a ilusão da sensação de liberdade que o álcool possibilita. Em relação ao tratamento os usuários apontaram que o mesmo possibilita mudança de vida, recomeço e bem-estar. PALAVRAS-CHAVE: Alcoolismo. Tratamento. Representação Social.

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ABSTRACT

Alcoholism is a serious problem of public health in Brazil and the world. About 10% of the Brazilian population she is dependent of the alcohol, while a bigger number of people faces problems related to the extreme consumption. The work objectified to identify the Social Representations elaborated by alcoolistas in process of treatment in the city of Teresina-Pi concerning the alcohol and the treatment of alcoholism. The research was exploratória, qualitative, carried through in the CAPS-ad ones (Center of Psicossocial Attention - Alcohol and Drugs) of the city, in a Private Psychiatric Clinic, one of the institutions of AA (Alcoólicos Anônimos) and in a Therapeutical Community. The sample was composed for 40 citizens, 36 of masculine sex and 04 of the feminine sex, with age between 26 and 67 years. For collection of the data a structuralized interview was used. The data had been submitted to the Analysis of Content of Bardin (1991). The results if had concentrated in two axles: the first one if relates to the social representations concerning the use of the alcohol that can be described from two categories and its respective subcategorias - the first category was "meanings of the alcohol" and its subcategorias had been "obstacles in the life context", "shelter", "drug" and "illness"; second it was "feelings front to the use of the alcohol" and its subcategorias had been "sensation of freedom", "impotence", "malaise", "guilt", "sadness". As the axle approaches to the representations of the treatment of alcoholism with four categories and its subcategorias - the first one was "recovery of mutual aid" and its subcategorias had been "change of life", "happiness", "development of the espiritualidade" and "recognition of alcoholism as illness"; the second "whitewashing in therapeutical community" and the subcategorias "I recommence of life", "construction of the religiosidade" and "harmony"; the third "psicossocial clinical treatment" with the subcategorias "well-being", "desire of recovery", "possibility of relapse" and "physiological whitewashing"; the last category was "psicossocial attention" and its subcategorias "satisfactory treatment", "new life" and "hope". The Social Representations of the use of the alcohol elaborated by the social citizens of the research are more directly on the obstacles in the life and the illusion of the freedom sensation that the alcohol makes possible. In relation to the treatment the users had pointed that the same he makes possible life change, recommence and well-being. KEY WORDS: Alcoholism. Treatment. Social Representation.

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LISTA DE TABELAS

1 Distribuição das Categorias e Subcategorias sobre o Alcoolismo...............................51

2 Distribuição das Categorias e Subcategorias dos Tratamentos para o Alcoolismo.....73

LISTA DE QUADROS

1 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre os obstáculos no contexto de

vida em relação ao significado do álcool.........................................................................53

2 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria refúgio em

relação significado do álcool...........................................................................................59

3 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria droga em

relação ao significado do álcool......................................................................................61

4 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria doença em

relação ao significado do álcool......................................................................................62

5 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria sentimento de

sensação de liberdade frente ao uso do álcool...............................................................64

6 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de impotência

frente ao uso do álcool....................................................................................................66

7 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de mal-estar frente

ao uso do álcool..............................................................................................................69

8 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de culpa frente ao

uso do álcool...................................................................................................................71

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8

9 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de tristeza frente

ao uso do álcool..............................................................................................................72

10 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “mudança de

vida” frente à recuperação de ajuda mútua.....................................................................75

11Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “felicidade”

frente à recuperação de ajuda mútua.............................................................................78

12 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria

“desenvolvimento da espiritualidade” frente à recuperação de ajuda mútua..................79

13 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria

“reconhecimento do alcoolismo como doença” frente à recuperação de ajuda

mútua...............................................................................................................................80

14 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “recomeço de

vida” frente à reabilitação em comunidade terapêutica...................................................81

15 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “construção de

religiosidade” frente à reabilitação em comunidade terapêutica.....................................83

16 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “harmonia”

frente à reabilitação em comunidade terapêutica............................................................84

17 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “bem-estar”

frente ao tratamento clínico psicossocial.........................................................................85

18 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “desejo de

recuperação” frente ao tratamento clínico psicossocial..................................................87

19 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “possibilidade

de reincidência” frente ao tratamento clínico psicossocial..............................................88

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20 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “reabilitação

fisiológica” frente ao tratamento clínico psicossocial.......................................................89

21 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “tratamento

satisfatório” frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.............................90

22 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “vida nova”

frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.................................................91

23 Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “esperança”

frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.................................................92

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...................................................................................................................11

2. ASPECTOS BIOPISICOSSOCIAIS DO ALCOOLISMO........................................14

2.1 Complicações físicas do ato de beber excessivamente .............................18

2.2 O alcoolismo e suas implicações no contexto sócio-familiar .......................20

3. CENTROS DE RECUPERAÇÃO DO ALCOOLISMO ..........................................23

3.1 Tratamento Clínico Psicossocial ................................................................23

3.2 Reabilitação em Comunidade Terapêutica ................................................27

3.3 Recuperação de Ajuda Mútua ....................................................................30

3.4 Centros de Atenção Psicossociais .............................................................33

4. PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA .................................................38

5. UM ESTUDO SOBRE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS, O ALCOOLISMO E SEU

TRATAMENTO..........................................................................................................45

5.1 As Representações Sociais do Alcoolismo: Significados e Sentimentos ...51

5.2 Representações Sociais dos Tratamentos para o Alcoolismo ....................72

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................93

7. REFERÊNCIAS.....................................................................................................96

8. ANEXOS ......................................................................................................................... 100

ANEXO A – Doze passos do AA ............................................................................101

ANEXO B – Entrevista Estruturada ........................................................................103

ANEXO C – Termo de Consentimento .......................................................................... 104

ANEXO D – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa ......................................... 105

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1. INTRODUÇÃO

O alcoolismo é um grave problema de saúde pública no Brasil, assim como em

vários outros países. Estima-se que cerca de 10% da população brasileira seja

dependente do álcool, enquanto um número bem maior de pessoas enfrenta problemas

relacionados ao consumo excessivo de bebidas alcoólicas, como, por exemplo,

acidentes de trânsito, situações diversas de violência, perda de emprego entre outros.

Durante muitos anos, o consumo de maconha foi considerado como o primeiro

estágio da dependência química. As recentes pesquisas, porém, descartam essa tese.

O resultado dos estudos e a própria experiência dos médicos demonstram que o

problema começa de outra forma: no consumo exagerado de bebidas alcoólicas (Sales,

2003).

O alcoolismo, segundo a OMS (2001), é uma doença. Ela caracteriza-se por

fases, que vão da social, sem dependência física, apenas dependência emocional, à

fase problemática, com dependência física e emocional. Os efeitos do alcoolismo

acarretam conseqüências funestas no próprio indivíduo, no seio da sua família, no

relacionamento sócio-comunitário, no meio profissional.

Um aspecto bastante preocupante é que o início de uso tem sido cada vez mais

precoce, o que aumenta o risco de evolução para dependência e compromete o

desempenho desses indivíduos na idade adulta. O I Levantamento Domiciliar Brasileiro

realizado em 2001 encontrou prevalências de uso, na faixa etária de 12 a 17 anos, de

48% de álcool (Carlini et al, 2001).

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As conseqüências provocadas pelo abuso do álcool têm se destacado como

importante problema de saúde pública no Brasil e no mundo, desta forma, torna-se

relevante desenvolver estudos que promovam reflexões e propostas de ações acerca

dessa temática.

No Brasil, vive-se hoje uma ampla discussão sobre as diversas formas de

abordagem dos problemas relacionados ao uso de álcool. Essa diversidade nada mais

é do que um reflexo da complexidade, e da gravidade dos problemas relacionados ao

seu uso. Porém, diante dessa diversidade de atuações pode-se diminuir a

incompreensão e viabilizar um diálogo construtivo na busca de objetivos comuns

referentes à compreensão e ações dessa temática.

Observa-se então, a necessidade de ampliar o debate sobre essa temática,

incluindo os alcoolistas nos seus mais diversos tratamentos, procurando, assim, saber o

que pensam, o que argumentam, que discursos estão surgindo, o que sabem sobre o

assunto e como se sentem frente ao uso do álcool e ao tratamento.

Assim, o presente estudo torna-se relevante por procurar enfatizar diversas

formas de manejo e tratamento que enfocam a temática do uso do álcool, bem como

por querer verificar as representações sociais, utilizando a teoria de Moscovici, que os

usuários dos serviços elaboram sobre o álcool e seu tratamento.

A Teoria das Representações Sociais pode ser considerada como um sistema de

interpretação da realidade, organizando as relações do indivíduo com o mundo e

orientando as suas condutas e comportamentos no meio social. Tal sistema de

interpretação se enraíza nas formas de comunicação social, permitindo ao indivíduo

interiorizar as experiências, as práticas sociais e os modelos de conduta. O indivíduo

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consegue, através das representações sociais, construir e se apropriar de objetos

socializados (Perrusi, 1995).

Neste sentido, o presente trabalho propõe contribuir no debate sobre o

alcoolismo e seus tratamentos, vinculando-se à Teoria das Representações Sociais,

enquanto suporte teórico consistente no que tange aos estudos relacionados em âmbito

individual e social. Para tanto, o referido estudo encontra-se estruturado da seguinte

forma:

O primeiro capítulo trata dos Aspectos Biopsicossociais do Alcoolismo, este

pontua de uma forma geral algumas complicações físicas do ato de beber

excessivamente e suas implicações sócio-familiares.

O segundo capítulo aborda os Centros de Recuperação do Alcoolismo onde

foi realizada a pesquisa, os quais são: Alcoólicos Anônimos (AA); Fundação da Paz;

Clínica Gesta e CAPS ad.

O terceiro capítulo – Percurso Metodológico da Pesquisa – destaca o tipo de

estudo, os sujeitos sociais, o campo de investigação, os procedimentos de aplicação

dos instrumentos e análise dos dados.

O quarto capítulo apresenta Um Estudo sobre Representações Sociais,

Alcoolismo e seu Tratamento construídas pelos sujeitos sociais da pesquisa e

encontra-se subdividido em duas partes: a primeira – Representações Sociais do

Alcoolismo : Significados e Sentimentos – e a segunda Representações Sociais

dos Tratamentos para o Alcoolismo.

O último capítulo refere-se às Considerações Finais, ressaltando as

proposições do estudo centrando-se nos objetivos e apontando os elementos sócio-

cognitivos que contribuíram para a construção das representações sociais sobre o

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alcoolismo e seus tratamentos pelos sujeitos sociais. Além de proporcionar uma

abertura para novas questões.

2. ASPECTOS BIOPSICOSSOCIAIS DO ALCOOLISMO

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS, 2001), saúde mental não

significa apenas ausência de transtornos mentais. A própria definição de saúde geral da

OMS contém aspectos relacionados com a saúde mental: “Saúde é um estado de

completo bem-estar físico, mental e social e não simplesmente a ausência de doença

ou enfermidade”.

Segundo Fleitlich-bilyk et al (2004) saúde mental pode, então, ser definida como

um estado de bem-estar no qual o indivíduo percebe suas próprias habilidades,

consegue lidar com os estresses cotidianos da vida, consegue estudar ou trabalhar

produtivamente e é capaz de contribuir para o ambiente familiar e/ou comunitário.

Levando em consideração o conceito acima citado, pode-se afirmar que

alterações do funcionamento da mente que prejudicam o desempenho da pessoa na

vida familiar, na vida social, na vida pessoal, no trabalho, estudos, na possibilidade de

ter prazer na vida em geral são classificadas pela psiquiatria a partir da Classificação

Internacional de Doenças (CID – 10, 1993), como transtornos mentais.

Dentre os diversos transtornos, enfatizados pela CID – 10 (1993), decorrentes do

uso de substâncias psicoativas e em especial do álcool, pode-se citar: intoxicação

aguda; uso nocivo; síndrome de dependência; estado de abstinência sem e com

delirium; etc.

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De acordo com a CID – 10 (1993) a intoxicação aguda trata-se de uma condição

transitória resultando em perturbações no nível de consciência, cognição, percepção,

afeto ou comportamento ou outras funções ou respostas psicofisiológicas (alteração da

fala, descoordenação motora, instabilidade no andar, prejuízos na memória e na

atenção). O uso nocivo refere-se a um padrão de uso de álcool que está causando

dano à saúde. O dano pode ser físico (hepatite, por exemplo) ou mental (episódios de

transtorno depressivo, secundários a um grande consumo de álcool).

A síndrome de abstinência caracteriza-se por um conjunto de fenômenos

fisiológicos, comportamentais e cognitivos, no qual o uso do álcool alcança uma

prioridade muito maior para um determinado indivíduo que outros comportamentos que

antes tinham maior valor; há um desejo (freqüentemente forte, algumas vezes

irresistível) de consumir álcool. Pode haver evidência que o retorno ao uso de álcool

após um período de abstinência leva a um reaparecimento mais rápido de outros

aspectos da síndrome do que o que ocorre com indivíduos não dependentes. O estado

de abstinência com delirium é caracterizado por um estado toxiconfusional breve, mas

ocasionalmente com risco de vida, que se acompanha de perturbações somáticas e

que é usualmente uma conseqüência de abstinência absoluta ou relativa de álcool em

usuários gravemente dependentes. Os sintomas tipicamente incluem insônia, tremores

e medo, além de confusão mental, alucinações e ilusões vívidas (CID – 10, 1993).

Outros estudiosos sobre os transtornos decorrentes do uso do álcool enfatizam

essa questão englobando outros aspectos.

Bertolote (in Ramos, 1997) apresenta uma definição da Organização Mundial de

Saúde sobre a síndrome de dependência do álcool como um estado psíquico e,

também, geralmente físico, resultante da ingestão de álcool, caracterizado por reações

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16

de comportamento e outras que sempre incluem uma compulsão para ingerir álcool de

modo contínuo ou periódico, a fim de experimentar seus efeitos psíquicos e por vezes

evitar o desconforto de sua falta; a tolerância ao mesmo pode ou não estar presente.

Laranjeira (1997) afirma que a diferença entre essa síndrome e o alcoolismo é

que a dependência não seria uma condição de “tudo ou nada” – ou uma pessoa é

alcoolista ou não é –, mas um processo no qual a pessoa ficaria gradualmente, ao

longo dos anos, dependente do álcool. O importante, ainda segundo o autor, é saber

quão dependente do álcool estaria a pessoa; dependência, portanto, seria uma

condição variável ao longo de um continuum de severidade.

Como a dependência do álcool não é uma condição de “tudo ou nada”, é

necessário entender que alguém não precisa ser dependente para apresentar

problemas relacionados ao uso do álcool. Ninguém precisa ser alcoolista ou

dependente para apresentar problemas relacionados ao consumo de álcool.

Laranjeira (1997) destaca ainda vários efeitos causados pela ingestão de

bebidas alcoólicas, que atingem tanto a parte física (hepatite, gastrite, pressão alta,

fraqueza nas pernas, convulsões, quedas freqüentes, etc) quanto psicológica

(nervosismo, irritabilidade, insônia, falta de concentração, etc) e social (perda de

produtividade, brigas freqüentes com familiares e amigo, gastos excessivos, perda de

responsabilidade em relação à família, etc) do indivíduo que faz uso abusivo do álcool.

Segundo Masur (apud Rosa, 2005), o alcoolismo como toxicomania é a tradução

de complexos problemas humanos, psicológicos e sociais. Certas pessoas recorrem ao

uso de bebidas alcoólicas para esquecerem suas dificuldades afetivas, profissionais,

familiares e sociais, acomodando, assim, suas frustrações. Outras bebem,

simplesmente, em busca de diversão ou para acompanharem o grupo em que estão

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17

inseridas. Seja qual for o caso, o que todas as pessoas buscam na bebida é sua ação

euforizante, ocasionando uma desinibição comportamental, aumento das expressões

afetivas e diminuição da autocrítica.

No entanto, o álcool, ainda de acordo com Masur (apud Rosa, 2005), também

traz consigo efeitos desagradáveis como: alterações auditivas e visuais, pensamentos

desordenados, descoordenação motora, maior lentidão dos movimentos e retardamento

dos reflexos. Todos os efeitos fazem parte da dupla ação produzida pelo álcool, a

estimulante e a depressora.

Percebe-se, assim, que o alcoolismo traz graves conseqüências tanto em níveis

orgânicos como psicológicos e sociais.

Por mais conveniente que seja pensar em termos de três dimensões clássicas de

problemas (físicos, mentais e sociais), não se deve esquecer que essas dimensões não

existem em separado na vida real. De modo geral, quanto mais grave a dependência,

maior a probabilidade de ocorrência dos três tipos de problemas associados ao

consumo de álcool (Edwards, 2005).

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2.1 Complicações físicas do ato de beber excessivamente

Dentro de uma abordagem total e equilibrada dos problemas com bebida, o

elemento físico deve ser visto como algo que normalmente tem grande importância.

O consumo de álcool é uma causa significativa de morbidade física e representa

considerável ônus sobre os serviços dos hospitais. Apesar das complicações físicas

serem comuns em qualquer população de bebedores em potencial, a detecção e a

cessação do hábito de beber, se precoces, podem levar à recuperação. Porém, um

continuado beber tem probabilidade de exacerbar o problema relacionado ao álcool e

ameaçar seriamente a vida. As complicações físicas se impõem sobre todos os

aspectos da vida do alcoolista, assim, é irrealista compartimentalizar incapacidades

psicológicas, sociais e físicas (Edwards, 2005).

De acordo com Laranjeira (1997) 50 a 70% dos alcoolistas apresentam

problemas no sistema nervoso. Isso ocorre principalmente devido a uma ação direta do

álcool nas células do cérebro, provocando uma diminuição na memória, na capacidade

de raciocínio complexo, no julgamento de situações difíceis. Muito embora algumas

semanas de abstinência faça com que esses danos no cérebro sejam reduzidos, cerca

de 10% dos alcoolistas sofrerão danos irreversíveis e poderão chegar a desenvolver um

quadro de demência alcoólica.

Pode ocorrer ainda redução nas disposições e atividades, oscilações (às vezes

abruptas) de ânimo, divisão da personalidade, como também uma maior e mais fácil

influenciabilidade e aumento na disposição para assumir riscos de toda espécie

(Rehfeldt, 1989).

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As principais doenças hepáticas são: fígado gorduroso, hepatite alcoólica e

cirrose. Outras doenças que podem ocorrer são a pancreatite crônica, arritmias, infarto,

trombose, hipertensão (Laranjeira, 1997).

Laranjeira (1997), afirma ainda, que a dependência, muitas vezes, começa a

partir do momento em que a pessoa ingere quantidades de álcool capazes de provocar

algum tipo de indisposição – a popular “ressaca” – no dia seguinte. A ressaca é uma

indicação de que a pessoa bebeu mais do que deveria. Existem dois componentes

distintos da ressaca, e o primeiro diz respeito à intoxicação por álcool. O segundo

componente diz respeito ao fato de o álcool ser um depressor do sistema nervoso

central; quando a pessoa bebe muito, fica momentaneamente menos ansiosa,

sonolenta. Quando o efeito do álcool passa, o sistema nervoso não volta imediatamente

ao normal, mas tem uma reação “rebote” a esse efeito depressor do álcool: no dia

seguinte, a pessoa tende a ficar mais nervosa, irritada, com dificuldades para conciliar o

sono. A ressaca, assim, deve-se em parte à falta que o organismo sente do álcool.

À medida que a pessoa tem repedidas ressacas, percebe que parte do

desconforto do dia seguinte pode ser aliviada se recomeçar a beber. É a partir disso

que a dependência pode começar: a pessoa passa a beber não mais por prazer, ou

num ambiente social, mas para aliviar os sintomas de abstinência do álcool (Laranjeira,

1997).

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2.2 O alcoolismo e suas implicações no contexto sócio-familiar

A idéia de complicação social normalmente implica o fracasso em preencher

adequadamente um papel social esperado, seja como membro de uma família,

empregador ou empregado, vizinho ou cidadão respeitador das leis. O resultado pode

ser prejudicial tanto para o indivíduo como para as pessoas à sua volta.

Normalmente há interação de diversos fatores nos processos mediados pelo

álcool que originam danos funcionais. Em um estágio inicial, o excesso de bebida pode

produzir uma ressaca que dificulta a chegada ao emprego, ao passo que a embriaguez

pode afetar a capacidade de administrar as complexidades do trabalho. Mais tarde, os

prejuízos físicos e mentais inviabilizam o trabalho. Em muitos tipos de problemas

sociais relacionados ao álcool, a embriaguez ou intoxicação alcoólica é um fator

mediador central entre o ato de beber e os danos provocados; aliás, o risco de danos é

aumentado quando a embriaguez se torna freqüente (Edwards, 2005).

Ainda segundo este autor, de maneira sutil, o papel central da bebida na vida do

indivíduo e a preponderância de sua dependência ao álcool sobre outros aspectos da

vida talvez signifique que o trabalho perdeu importância para a pessoa e que ela

assumiu o papel de dependente de álcool, condição essa que compete com os papéis

anteriores. É provável que emerja um processo secundário em termos de perda de

reputação e do modo como os outros passam a reagir ao alcoolista e a confirmá-lo no

papel de dependente. Essas reações serão influenciadas pelo conjunto de atitudes

sociais relativas ao beber e à embriaguez e pelas opiniões do grupo sobre as

possibilidades de recuperação do indivíduo.

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As complicações sociais quase inevitavelmente se expandem de modo a

envolver a família e outras pessoas, além de afetar o indivíduo que bebe. Edwards

(2005) lista algumas das principais complicações sociais do ato de beber

excessivamente: família e relacionamentos; problemas no trabalho; moradia;

dificuldades financeiras; condição de indigência; álcool e violência; etc.

Com relação a estas conseqüências apontadas, deve-se salientar aqui que,

segundo Rehfeldt (1989), uma vez alcançada uma abstinência permanente, a grande

maioria dos danos acima citados é reversível em graus que podem chegar ao completo

restabelecimento. É claro que alguns destes processos de restabelecimento podem

levar meses ou anos. Mas na grande maioria dos casos, existem perceptíveis

mudanças positivas já nas primeiras semanas e meses depois da suspensão do

consumo de álcool.

Os problemas relacionados ao consumo de álcool normalmente exercem

profundo efeito sobre a família do bebedor. Em geral, o cônjuge ou companheiro e os

filhos são os que mais sofrem as conseqüências da situação.

De acordo com Edwards (2005) tal envolvimento pode apresentar-se de

diferentes formas: alguém sofrendo o impacto adverso dos comportamentos do

bebedor; a interação familiar na gênese do problema com a bebida; a inútil conivência

ou mesmo encorajamento, por parte dos familiares, do problema da bebida; alguém que

não o alcoolista conseguindo ajudar no processo de recuperação.

O beber de forma excessiva influencia o comportamento do cônjuge, o que

também influencia o comportamento do alcoolista, de modo que se cria uma espécie de

“ressonância comportamental”. Igualmente, os filhos não são apenas recipientes

passivos; pelo contrário, participam ativamente (Edwards, 2005).

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22

Milhões de crianças e adolescentes convivem com algum parente alcoolista no

Brasil. As estatísticas mostram que eles estarão mais sujeitos a problemas emocionais

e psiquiátricos do que a população desta faixa etária não exposta ao problema.

O primeiro problema que se pode citar é a baixa auto-estima e auto-imagem com

conseqüentes repercussões negativas sobre o rendimento escolar e demais áreas do

funcionamento mental. Esses adolescentes e crianças tendem a subestimarem suas

próprias capacidades e qualidades. Outros problemas comuns em filhos e parentes de

alcoolistas são persistência em mentiras, roubo, conflitos e brigas com colegas,

vadiagem e problemas com o colégio (Laranjeira, 1997).

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23

3. Centros de Recuperação do Alcoolismo

Frente a essa diversidade de transtornos e problemas relacionados ao uso do

álcool, atualmente existe uma gama relativamente variada de ofertas de tratamento,

que podem ser resumidas em: tratamento medicamentoso com ou sem internação em

hospital geral, psiquiátrico ou clínicas especializadas; tratamento não medicamentoso

com internação em fazendas de recuperação; tratamento não medicamentoso através

do ingresso em grupos de ajuda mútua (como AA, por exemplo); psicoterapias;

tratamento através de técnicas alternativas como acupuntura, florais, homeopatia e, até

mesmo, a cura através da fé.

Pretende-se aqui, enfatizar as propostas de tratamento relacionadas com o

objetivo do trabalho, as quais são: tratamento medicamentoso com internação em

clínicas especializadas, tratamento não medicamentoso em comunidades terapêuticas,

tratamento não medicamentoso através do ingresso em grupos de ajuda mútua e

tratamento no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS ad).

3.1 Tratamento Clínico Psicossocial

O tratamento medicamentoso com internação em clínicas especializadas oferece

um acompanhamento psicológico aos dependentes químicos, como também,

internações integral ou parcial (Ferraz e Sousa apud Rosa, 2005).

A Clínica Gesta, um dos locais de realização desta pesquisa, é uma instituição

privada que oferece um espaço terapêutico destinado ao atendimento de pessoas, na

faixa etária a partir de 15 anos, que se encontrem passando por crises vitais ou

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24

agudização de quadros neuróticos, psicossomáticos ou psicóticos; ou dependentes de

álcool e outras drogas, visando produzir possíveis mudanças na estruturação de sua

personalidade.

No que se refere aos dependentes de álcool, a clínica tem por um de seus

objetivos favorecer sua recuperação mediante insight terapêutico visando provocar a

conscientização da dependência, quando necessário, mediante o uso de

psicofarmacologia, trabalhar a abstinência, reduzir os danos causados pelo uso da

droga e melhorar a qualidade de vida do usuário.

Quanto a sua estrutura física, a Clínica Terapêutica Gesta está instalada em

casa ampla, dotada de infra-estrutura de conforto e lazer, com área destinada a

atividades ao ar livre e espaços para o funcionamento de oficinas de arte, salas de

grupos, refeitório, consultórios. A Clínica funciona em regime de tempo integral

(internação), parcial (Hospital Dia) e ambulatorial. O período de internação é, em média,

de 15 dias.

Tem capacidade de atendimento para 12 hóspedes, em regime integral e 20

hóspedes em regime de tempo parcial. O ambulatório oferece sessões de psicoterapia

individual e grupal.

A Clínica constitui-se das seguintes atividades, de acordo com seu programa

terapêutico:

Relativas aos Hóspedes:

Atendimento Individual – o hóspede é atendido por seu terapeuta, duas vezes

por semana, para discutir aspectos de sua vida pessoal, familiar e social.

Grupos de Sentimentos – coordenados por um terapeuta, serve como espaço

para abordagem de vivências pessoais e expressão de tensões individuais e

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25

grupais, tendo como finalidade possibilitar aos seus integrantes a verbalização e

o reconhecimento de conflitos e apontar soluções para os mesmos. Funciona

três vezes por semana e incluem a participação de todos os hóspedes.

Grupos Operativos – atividades culturais, de conservação decoração e limpeza e

atividades recreativas.

Grupos de Expressão Corporal e Atividades Esportivas – coordenados por

Educador Físico, têm por objetivo auxiliar o hóspede a tornar-se mais ativo,

desenvolver sua condição física e/ou estimular sua sensibilidade e auto-

expressão, através de técnicas de relaxamento, alongamento, expressão

corporal, dança, yoga. As atividades físicas são estimuladas conforme escolha

pessoal ou programação indicada para cada caso e a não participação nelas

será examinada como sintoma a ser tratado.

Grupos de Reflexão – semanal – desenvolvidos através da apresentação de

filmes, documentários, textos, previamente escolhidos, em comum acordo,

visando à identificação e o reconhecimento de comportamentos inadequados e

sua re-elaboração / modificação.

Oficina de Expressão Artística – coordenada por especialista em artes plásticas;

objetiva estimular a criatividade, a auto-expressão, o fortalecimento do ego, o

processo de ressocialização, iniciando-se sempre a partir de imagens – temas

surgidas do movimento do próprio grupo.

Oficina de Dramatização – coordenada por terapeuta, proporciona ao hóspede

um espaço para expressão de sua história pessoal, sua visão de mundo, suas

angústias, medos, dificuldades emocionais/existenciais, necessidades/carências

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26

afetivas, perturbações psicoemocionais, isolamento social, bloqueios, solidão,

desejos, anseios, aspirações. Tudo isso de forma teatralizada.

Atendimento Familiar – coordenado por um dos membros da equipe técnica,

realizado de forma individual e grupal, com a finalidade de trabalhar os

sentimentos hostis e afetivos, assim como mitos e preconceitos, porventura

existentes, entre os familiares ou responsáveis pelos hóspedes.

Assembléia – com freqüência semanal, coordenada por um membro da equipe

técnica, e presente todos os membros da clínica, terapeutas, pessoal técnico-

auxiliar e hóspedes. Tem como finalidade discutir e equacionar os problemas

relacionados ao funcionamento da clínica.

Específicas aos Hóspedes Dependentes de Drogas:

Grupo Informativo – reunião semanal, coordenada por um terapeuta, para

informações técnicas e discussão sobre drogas e suas conseqüências.

Autobiografia – descrição pelo hóspede dependente de droga, de sua história de

vida e da história de sua dependência.

Grupo Informativo com Familiares – reunião semanal, restrita a familiares dos

hóspedes dependentes de drogas e coordenada por um membro da equipe

técnica, para abordagem de aspectos teóricos e práticos da dependência e sua

relação com o contexto familiar.

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27

3.2 Reabilitação em Comunidade Terapêutica

Outra opção de tratamento são as comunidades terapêuticas. Segundo Queiroz

(2001), grande parte das fazendas de recuperação (ou fazendas terapêuticas) funciona

em regime e vida comunitária, obedecendo a um programa fundamentado na disciplina,

na espiritualidade e no trabalho como recursos terapêuticos. Os membros têm um papel

significativo na administração da comunidade e são responsáveis por toda a

manutenção da vida comunitária.

As comunidades terapêuticas representam um ambiente altamente estruturado,

com limites definidos, tanto morais quanto éticos. Após a saída da comunidade os

membros continuam freqüentando os grupos de apoio e de prevenção à recaída nos

quais os princípios vivenciados durante o período de internação são revistos e

reforçados pelo grupo, acarretando a manutenção do controle e da disciplina adquiridos

na comunidade. Um trabalho de ressocialização para aqueles que ficaram sem trabalho

também faz parte do tratamento em algumas instituições (Queiroz, 2001).

Um exemplo de comunidade terapêutica é a Fundação da Paz (Teresina – Pi)

que é uma instituição sem fins lucrativos e tem por objetivo a prevenção, tratamento e

reinserção de farmacodependentes e alcoolistas. Reconhecida de Utilidade Pública

Municipal e Estadual, idealizada pelo Pe. Pedro Balzi e leigos da Arquidiocese de

Teresina, foi fundada em abril de 1994.

Em 1995 chegou a Teresina – Pi o terapeuta Célio Luiz Barbosa para junto com

a Arquidiocese de Teresina, Pe. Pedro Balzi e leigos da referida Arquidiocese

organizarem um trabalho para ajudar as pessoas usuárias de álcool e outras drogas –

marcando o início da Fundação da Paz. Em 1996 a Fundação da Paz capacita 30

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28

voluntários ligados a Igreja Católica com o objetivo de trabalhar com famílias de

farmacodependentes e alcoolistas – primeira reunião do grupo de apoio às famílias no

espaço cedido pela Arquidiocese de Teresina Vila Operária Centro Leão XIII.

Em 1996 é fundado o grupo de apoio ao dependente químico NATA – Núcleo de

Apoio ao Toxicômano e Alcoolista sob a coordenação do Sr. Carlos Humberto Lopes

Gualter; em 1996 a Fundação da Paz em parceria com o Ministério da Saúde,

Coordenação Nacional DST/AIDS e Ação Social Arquidiocesana elaboram um projeto

para trabalhar com a população em situação de risco e através desse projeto a

Fundação da Paz encaminha duas voluntárias para participarem de capacitação em

grupo de auto-ajuda na cidade de Campinas/SP; em 1999 é implantado o grupo de

apoio às famílias O AMOR VENCERÁ sob a coordenação do Sr. José Damásio de

Oliveira, Quitéria Oliveira e Eneida Medeiros Lustosa.

Em 2000/2001 a Fundação da Paz em parceria com o Ministério da Saúde,

coordenação Nacional DST/AIDS mais uma vez é beneficiada com o projeto de

multiplicadores de voluntários para trabalhar com a população usuária de drogas,

através desse projeto foram capacitados voluntários das cidades de Piripiri/PI,

Timon/MA e Caxias/MA.

A Fundação da Paz é a entidade que é fundamentada em concepções que

defendem o isolamento do indivíduo - adictos - de fatores que podem levá-los à

adicção, e a partir daí realizar um trabalho de conscientização, por meio de

dramatizações, trabalho, cooperação, o que contribui para a vida em coletividade e para

a crença de que cada sujeito tem sua importância para o desenvolvimento das relações

grupais. Assim, busca-se valorizar as características pessoais e o grupo de inserção

dessas pessoas.

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29

A Fundação da Paz é constituída de duas fazendas (Flor de Maria e Terra da

Esperança). Elas possuem normas e regras, que consistem em regras de limpeza e

organização, e para realizar tais funções, os grupos se revezam de modo que todas as

pessoas realizem todas as funções. Há rotinas comuns como as realizadas em casa:

lavar, passar, cozinhar; há o trabalho, e também atividades de expressão como teatro,

em que existem grupos que se apresentam aos outros.

O tempo de permanência no local é de 12 a 21 meses. Os internos trabalham

várias horas por semana para manter a Fazenda em funcionamento e suprindo suas

necessidades mais básicas. Para a filosofia dos Narcóticos Anônimos o trabalho

também faz parte da desintoxicação e ele é chamado de Laborterapia. Esta instituição

segue os 12 passos dos Alcoólatras Anônimos (Vide anexo A).

A rotina dos adictos em recuperação é fechada; eles acordam às 06h da manhã

e vão fazer as orações iniciais do dia, o café é servido após as primeiras orações e

depois vão para a capela. Após essa fase de preparação espiritual para o dia os

internos vão trabalhar (Laborterapia) – 08h. A laborterapia vai até às 11h e depois disso

os internos fazem uma reunião chamada de “Reunião dos Valores”. O almoço é servido

às 12h e de 13h às 16h os internos trabalham. O lanche da tarde é servido das 16h às

17h e após isso é dada uma hora de descanso. O rosário e o terço são rezados das

18h às 19h e o jantar é servido após as rezas. Das 20h às 22h acontecem as

dinâmicas, a “Reunião de Confronto”, a “Reunião dos Passos”, o teatro e toque de

recolher.

A Fundação da Paz trabalha com uma equipe de voluntários capacitados para

trabalharem com as famílias e seus dependentes.

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30

3.3 Recuperação de Ajuda Mútua

Com relação aos grupos de ajuda mútua, eles têm características de grupo leigo

e voluntário, sem qualquer ônus para a comunidade e a sociedade em geral,

concebem-se como uma irmandade ou sociedade que se reúnem em grupos e utilizam

um determinado conjunto de princípios espirituais para encontrar a liberdade da adição

e uma nova forma de vida. Enfatiza o conceito de doença (crônica) da dependência, e a

necessidade da abstinência total para a recuperação do indivíduo. Um exemplo desses

grupos é o AA (alcoólicos anônimos), que foi criado nos Estados Unidos, em 1935, por

dois alcoolistas e é considerado um dos primeiros esforços no sentido de auxiliar o

dependente. Seu funcionamento vem influenciando a maioria das terapêuticas

disponíveis hoje em dia, fundamenta-se nos “doze passos” (Leite, 2002).

De acordo com Edwards (2005) o AA é uma irmandade de homens e mulheres

que compartilham suas experiências, forças e esperanças, a fim de resolver seu

problema comum e ajudar outros a se recuperarem do alcoolismo, uma doença

incurável. Sua proposta é ajudar o alcoólico a parar de beber.

Para ser admitido no AA, não existem taxas nem mensalidades. A única

exigência é o desejo de abandonar a bebida. Ninguém declara endereço ou profissão,

classe social ou poder econômico, ideologia política ou crença religiosa. Analisando,

porém, a composição dos diferentes grupos, conclui-se que todos os extratos sociais

estão neles representados.

Os membros do AA são protegidos pelo mais absoluto anonimato que, além de

preservar a identidade dos alcoólicos, afasta qualquer idéia de projeção pessoal ou de

terceiros que possa contaminar a estrutura da irmandade, regulamentada pelas

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31

Tradições (normas condensadas pelos pioneiros e aprovadas democraticamente que

asseguram a unidade da instituição).

Apesar de não se vincular a nenhuma religião ou seita, nenhum movimento

político, nenhuma organização ou instituição, o AA prega ser impossível vencer o

alcoolismo sem a proteção de um ser superior, de um ente supremo que ajude o

alcoólico a manter a sobriedade.

O propósito primordial é manter seus membros sóbrios e ajudar outros

alcoolistas a alcançar a sobriedade.

Ao chegar ao AA, o alcoólico é recepcionado por companheiros que

abandonaram a bebida há algum tempo, embora todos digam que hoje conseguiram

evitar o primeiro gole. A reunião começa com uma prece encontrada num necrotério

dos EUA, cuja mensagem se encaixa perfeitamente na filosofia da irmandade.

A seguir, têm lugar os depoimentos dos veteranos que, ao expor uma história de

vida muito semelhante à dos recém-chegados, provocam neles identificação profunda.

Depois a palavra é dada aos novatos que farão uso dela se quiserem. Nada é

obrigatório no AA. O primeiro passo para a recuperação é admitir que existe uma

doença, o alcoolismo, porque enfrentar o problema e alcançar a sobriedade só é

possível se houver esforço e empenho pessoal do interessado. Mesmo que haja

recaídas (o alcoolismo é uma doença recidivante), as portas do AA estarão sempre

abertas e os companheiros acolherão o dependente que retorna sem críticas nem

censuras.

Edwards (2005) afirma que o AA proporciona ao indivíduo um conjunto flexível e

coerente de idéias que pode aliviar seus sentimentos de desesperança e explicar a

natureza de seu problema. Ele está sofrendo da “doença do alcoolismo”, descrita

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32

metaforicamente como algo parecido com uma “alergia ao álcool”. Sua constituição é tal

que o fará reagir a esta droga de modo diferente de outras pessoas. Ele nunca poderá

ser “curado”, mas a doença será “detida” caso ele não beba de novo.

A resolução da ansiedade por meio da adoção da filosofia do AA não difere da

conversão religiosa, sendo com freqüência entendida como uma profunda experiência

espiritual (Edwards, 2005).

As reuniões são lideradas por um coordenador diferente a cada dia, a quem

cabe abrir a sessão e organizar a ordem dos depoimentos.

No AA todos são iguais. Não existem chefes. Qualquer decisão, depois de

debatida, é posta em votação e vence a vontade da maioria. Essa organização,

aparentemente anárquica, funciona sem deslizes, porque todos estão imbuídos da

responsabilidade que têm perante si mesmos e o grupo.

O AA não aceita doações de particulares nem de órgãos públicos ou privados.

Não aceita, também, trabalho voluntário. Os encargos ficam todos por conta dos

membros da irmandade composta apenas por alcoolistas. Há três cargos, entretanto,

que podem ser ocupados por não-alcoólicos: presidência da junta de custódio,

tesouraria geral e segunda vice-presidência.

Os Doze Passos de A.A. consistem em um grupo de princípios, espirituais em

sua natureza que, se praticados como um modo de vida, podem expulsar a obsessão

pela bebida e permitir que o sofredor se torne íntegro, feliz e útil. Não são teorias

abstratas; são baseadas na experiência dos êxitos e fracassos dos primeiros membros

de A.A.

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33

3.4 Centros de Atenção Psicossociais

Ao considerar que os serviços extra-hospitalares surgem a partir do aumento das

necessidades da própria população (Bezerra, 2001), entende-se que a política a ser

definida deve efetivar ou viabilizar o acesso das pessoas de fato, assegurando sua

saúde. Assim, ampliar os serviços em saúde mental significa reconhecer o direito que a

população tem de acessar o serviço adequado às suas necessidades.

Emerge nesse processo o “modelo psicossocial”, que considera diversos fatores

como centrais para a configuração das práticas em saúde mental (políticos, biológicos,

psicológicos, sociais) que devem ser conjugados em suas atividades visando à

reintegração social (Costa-Rosa apud Amarante, 2000) bem como um

reposicionamento do usuário, que passa de simples sujeito portador de sofrimento

psíquico para agente da possibilidade de mudanças (Ministério da Saúde, 2004). O

modelo psicossocial constitui, hoje, um novo paradigma nas práticas da saúde mental

presentes nas políticas de Reabilitação Psicossocial e ‘Apoio Psi’ (Costa-Rosa et al

2001). Nesse sentido, novas experiências são propostas, como é o caso dos CAPS.

Foi no contexto de reconceitualizações e reorganizações no campo da saúde

mental que, a partir da instituição do SUS, com princípios de descentralização,

integralidade, universalidade e eqüidade, e com a legalização da reforma psiquiátrica

em 2001, a política pública brasileira passou a contemplar o direito à assistência e

integralidade aos usuários de saúde mental, entre eles aqueles que sofrem dos

problemas com o consumo do álcool e outras drogas (Ministério da Saúde, 2003).

O Ministério da Saúde (MS) desde a década de 80 vinha desenvolvendo tímidas

iniciativas na área do uso indevido de drogas e só em 2003 assumiu a responsabilidade

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34

de intervir nessa área com a efetivação da “Política de Atenção Integral aos Usuários

de Álcool e outras Drogas” (Ministério da Saúde, 2003).

O argumento do Ministério da Saúde sustenta-se na necessidade de

enfrentamento dos problemas oriundos do consumo abusivo do álcool e de outras

drogas, através da organização de uma rede “[...] baseada em dispositivos extra-

hospitalares de atenção psicossocial especializada, devidamente articulados à rede

assistencial em saúde mental ao restante da rede de saúde” (Ministério da Saúde,

2003). Entre estes dispositivos encontra-se o Centro de Atenção Psicossocial para

Álcool e Drogas (CAPS ad) que surge, com esta denominação, a partir do ano de 2002

com a Portaria nº 336, de 19 de fevereiro de 2002 para aquelas pessoas que enfrentam

o problema do uso de álcool e de outras drogas ofertando atendimento diário a essa

população (Diário Oficial da União, 2002).

Os CAPS ad possuem como objetivos não só a oferta de atendimento à

população específica a que se destina o serviço, mas também atividades terapêuticas e

preventivas à comunidade, devendo “impedir o uso de substâncias psicoativas pela

primeira vez, impedir uma ‘escala’ do uso e minimizar as conseqüências de tal uso”

(Ministério da Saúde, 2004). Os CAPS ad propõem que a abstinência não seja o

modelo único a ser considerado e que não se promova o isolamento social do usuário.

Pelo contrário, a defesa de incluí-lo com respeito a suas escolhas no tratamento é o

eixo central que caracteriza a co-responsabilidade e liberdade no cuidar dos usuários

na defesa da vida com a redução de danos (Ministério da Saúde, 2003), enfatizado na

Portaria nº 1.059, de 4 de julho de 2005 (Diário Oficial da União, 2005).

Os CAPS ad devem funcionar com capacidade de atender uma região que

abrigue mais de 70 mil habitantes, prestando uma assistência que compreenda desde o

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35

atendimento individual até o grupal, domiciliar e familiar, as oficinas terapêuticas e as

atividades comunitárias. Tais atendimentos devem ser oferecidos nas modalidades:

intensiva (na qual, em decorrência do quadro clínico do usuário, mostra-se necessário o

acompanhamento diário); semi-intensiva (regime direcionado àqueles que necessitam

de acompanhamento freqüente, sem, entretanto, precisar diariamente) e não-intensivo

(o tratamento que, em função do quadro clínico, pode ocorrer em uma freqüência

menor). Assim, a atuação dos CAPS ad não é isolada, mas constituída num plano

articulado com dispositivos assistenciais em saúde mental, rede básica de saúde,

Estratégia de Saúde da Família, entre outros (Ministério da Saúde, 2003).

Devem ainda, no âmbito de seu território, responsabilizar-se pela organização

da demanda e da rede de instituições de atenção a usuários de álcool e de outras

drogas, bem como ser regulador da porta de entrada da rede assistencial local; em sua

área de abrangência e por delegação do poder local, é sua incumbência coordenar

atividades de supervisão de serviços de atenção a usuários de drogas (Diário Oficial da

União, 2002). Tal atuação deve estar articulada às esferas de controle social (Conselho

Municipal de Entorpecentes – COMEN – e Conselho Municipal de Saúde – CMS). Seu

funcionamento deve ser estruturado para assegurar o acesso da população ao serviço,

possibilitar a formação de recursos humanos, principalmente através de supervisão e

educação permanente junto às equipes da atenção básica e aos profissionais

vinculados aos serviços e programas de saúde mental local no âmbito de seu território

e/ou do módulo assistencial (Diário Oficial da União, 2002).

Quanto à equipe, os CAPS ad devem contar com uma equipe mínima que

integre, ao menos: 1 médico psiquiatra; 1 enfermeiro com formação em saúde mental; 1

médico clínico, responsável pela triagem, avaliação e acompanhamento das

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intercorrências clínicas; 4 profissionais de nível superior entre psicólogo, assistente

social, enfermeiro, terapeuta educacional, pedagogo ou outro profissional necessário ao

projeto terapêutico; e 6 de nível médio: técnico e/ou auxiliar de enfermagem, técnico

administrativo, técnico educacional e artesão (Diário Oficial da União, 2002). Os CAPS

ad partem do princípio que a atenção psicossocial a usuários que apresentem uso

abusivo / dependência de álcool e outras drogas deverá ocorrer em ambiente

comunitário e articulado à rede de cuidados em álcool e drogas e saúde mental

(Ministério da Saúde, 2003).

Os Caps ad devem oferecer atendimento diário a pacientes que fazem um uso

prejudicial de álcool e outras drogas, permitindo o planejamento terapêutico dentro de

uma perspectiva individualizada de evolução contínua. Os Caps ad desenvolvem uma

gama de atividades que vão desde o atendimento individual (medicamentoso, de

orientação entre outros) até atendimentos em grupo ou oficinas terapêuticas e visitas

domiciliares. Também devem oferecer condições para o repouso, bem como para a

desintoxicação ambulatorial de pacientes que necessitem desse tipo de cuidados e que

não demandem por atenção clínica hospitalar.

Os Centros de Atenção Psicossociais (CAPS) são, portanto, dispositivos

assistenciais de comprovada resolubilidade que pode abrigar em seus projetos

terapêuticos práticas e cuidados que contemplem a flexibilidade e a abrangência

possíveis às necessidades específicas a esta atenção específica, dentro de uma

perspectiva estratégica de redução de danos sociais e à saúde (Silveira et al, 2003).

Frente à diversidade de formas de tratamento e manejo dos problemas

relacionados ao uso do álcool, percebe-se, o que Cirino e Medeiros (2006) afirmam, a

necessidade de se mobilizar forças sociais que debatam vivamente as estratégias de

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abordagem desses problemas e que a ausência de consenso é um reflexo, entre outras

coisas, da complexidade dessa prática e da diversidade dos atores.

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4. PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA

Tratou-se de uma pesquisa de campo, descritiva e exploratória, de base

qualitativa e quantitativa que teve como prioridade a fala dos participantes, levando em

consideração os objetivos do trabalho.

4.1 Campo de Investigação

A pesquisa foi realizada em quatro centros de recuperação para usuários de álcool

da cidade de Teresina – PI, os quais são: Alcoólicos Anônimos (AA); Fundação da Paz;

Clínica Gesta e CAPS ad conforme anteriormente exposto.

A escolha dos referidos locais para investigação deve-se ao fato destes

preencherem critérios pré-estabelecidos à realização da pesquisa, ou seja, locais onde

se encontram pessoas que estão se submetendo ao tratamento de recuperação para o

uso do álcool.

4.2 Sujeitos da Pesquisa

A amostra foi constituída por 10 sujeitos sociais para cada instituição, totalizando

40 sujeitos.

4.3 Variáveis sócio-demográficas

As variáveis consideradas influentes para o trabalho foram: sexo, idade, estado

civil, religião e início do consumo de bebida alcoólica.

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A amostra foi composta por 36 pessoas do sexo masculino e 4 do sexo feminino,

com idade variando entre 26 e 67 anos. Com relação ao estado civil, 23 afirmaram ser

solteiros e 17 casados. No que se refere à religião, 28 afirmaram ser católicos, 6 não

tinham religião, 4 eram espíritas e 2 evangélicos. Uma outra variável considerada no

estudo foi o início do uso da bebida alcoólica, que variou entre 12 e 18 anos.

4.4 Instrumentos

Para a realização deste estudo, utilizou-se uma entrevista estruturada,

apresentando um roteiro prévio de perguntas que foram elaboradas de acordo com os

objetivos da pesquisa, conforme abaixo:

1 – O que o álcool significa / representa para você?

2 – O que você sentiu a partir do contato com o álcool?

3 – Como era sua vida social no contato com o álcool?

4 – Qual o significado do seu tratamento para você?

5 – Como você se sente no tratamento?

6 – Como é sua vida agora com o tratamento?

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40

4.4.1 – Entrevista Estruturada

A entrevista é um procedimento usual no trabalho de campo, onde o pesquisador

busca obter informes contidos na fala dos atores sociais. Meio de coleta de informações

sobre um determinado tema científico, através desse procedimento pode-se obter

dados objetivos e subjetivos. As entrevistas podem ser abertas ou não-estruturadas,

quando o informante aborda livremente o tema proposto; estruturadas, quando

pressupõem perguntas previamente formuladas e semi-estruturadas, aquelas que

articulam as duas modalidades (Minayo, 2001).

A entrevista estruturada mantém o foco do problema a ser resolvido de uma

forma dirigida. Este tipo de entrevista adquire detalhes específicos a respeito de

determinado aspecto do problema antes de passar para outros pontos. A entrevista

estruturada pode ser utilizada quando é necessária uma informação específica a

respeito de um tópico estabelecido. As vantagens deste método são: mantém o foco em

um determinado assunto, fornece informações detalhadas e relações estruturadas entre

os conceitos (Minayo, 2001).

Ressalta-se que a entrevista estruturada encontra-se organizada nos anexos

deste trabalho (Anexo B).

4.5 Procedimentos para coleta de dados

Após a escolha dos locais, dos sujeitos e da exposição dos objetivos, a coleta de

dados foi realizada com a aplicação de uma entrevista composta de seis perguntas, que

teve duração média de quarenta minutos. Os dados foram gravados, com a autorização

dos sujeitos da pesquisa, em MP3 Player, sendo analisados posteriormente.

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41

4.6 Análise e tratamento dos dados

Para analisar os dados, primeiramente foi feita uma preparação e uma descrição

de todos os dados obtidos. Para esta etapa utilizou-se etiquetas para identificar cada

relato individual e também foram preparadas listas que relacionassem, segundo um

determinado aspecto, as entrevistas.

Segundo Moura (1998), na interpretação dos dados, pode-se verificar a

congruência dos dados com um modelo teórico prévio, tentar explicá-los de modo

independente da teoria ou prever um modo pelo qual se daria a evolução do fenômeno

no tempo.

E por fim, foi feita uma análise do conteúdo na qual procurou-se encontrar

padrões ou regularidade nos dados obtidos.

4.6.1 – Análise de Conteúdo

Segundo Bardin (1991) a Análise de Conteúdo é definida como:

Um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações (BARDIN, 1991 p. 31).

Do ponto de vista analítico instrumental este conceito foi fundamental para a

compreensão dos dados fornecidos nas entrevistas.

Ele permitiu explicitar e sistematizar o conteúdo das mensagens e a expressão

deste conteúdo, a partir de um conjunto de técnicas parciais e complementares. O

objetivo desta abordagem foi o de efetuar deduções lógicas e justificadas, referentes à

origem das mensagens do estudo.

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42

Este conjunto de técnicas das comunicações visa obter procedimentos,

sistemáticos e objetivos, de descrição de conteúdo de mensagens, indicadores que

permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção /

recepção, variáveis inferidas destas mensagens (Bardin, 1991).

Dessa forma, conforme a mesma autora, pertencem ao domínio da análise de

conteúdo, todas as iniciativas que, a partir de um conjunto de técnicas parciais, mas

complementares, consistam na explicitação e sistematização do conteúdo das

mensagens e da expressão deste conteúdo, com a contribuição de índices passíveis ou

não de quantificação.

Conjunto de técnicas de análise das comunicações que, através de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, visa obter indicadores (quantitativos ou não) que permitem a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e de recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1991 p. 31).

A análise de conteúdo, originalmente, representa o instrumento de pesquisa

empregado para determinar a presença de algumas palavras ou conceitos dentro de

um texto ou conjunto de textos e, a partir da análise dos dados (qualitativa e/ou

quantitativa) e das relações entre eles, com a finalidade de fazer inferências sobre as

mensagens contidas no texto (Bardin, 1991).

Atualmente, de acordo com Vala (1986), a análise de conteúdo é uma das

técnicas mais comuns na investigação empírica realizada pelas diferentes Ciências

Humanas e Sociais. Para este autor, análise de conteúdo é uma técnica de tratamento

de informação, e não pode ser reconhecida como um método. Ela encontra-se

subdividida em algumas modalidades: análise categorial ou temática, análise de

avaliação, análise de enunciação, de expressão, análise de relações e de discurso.

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43

Dentre essas modalidades, a categorial ou temática será utilizada pelo seguinte

estudo. Para Bardin (1991), entre as distintas possibilidades de categorização, a

investigação dos temas é rápida e eficaz na condução de se aplicar a discursos diretos

e simples.

A análise categorial é o tipo de análise mais antiga e na prática a mais utilizada.

“Funciona por operações de desmembramento do texto em unidades, em categorias

segundo reagrupamento analógicos” (Bardin, 1977). A análise categorial poderá ser

temática, construindo as categorias conforme os temas que emergem do texto. Para

classificar os elementos em categorias é preciso identificar o que eles têm em comum,

permitindo seu agrupamento (Bardin, 1977). Este tipo de classificação é chamado de

análise categorial.

De acordo com Bardin (1991), a categorização é uma operação de classificação

de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação e, seguidamente, por

reagrupamento segundo o gênero (analogia). Deste modo, a análise de conteúdo

categorial é alcançada por operações de desmembramento do texto em unidades, em

categorias, segundo agrupamentos analógicos, e caracteriza-se por um processo

estruturalista que classifica os elementos, segundo a investigação sobre o que cada um

deles tem em comum. Ou seja, as categorias são rubricas ou classes, as quais reúnem

um grupo de elementos (unidades de registro) sob um título genérico, em razão dos

caracteres comuns apresentados por estes elementos.

O critério de categorização adotado foi o semântico, por categorias temáticas, de

acordo com seus significados, a partir das significações que a mensagem fornece.

Segundo a autora, a categorização tem como primeiro objetivo fornecer, por

condensação, uma representação simplificada dos dados brutos. As inferências finais

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44

são efetuadas a partir do material reconstruído. Através das relações entre as

categorias, e de suas interpretações, é possível desenvolver explicações e afirmativas

(proposições).

Supõe-se que o processo de decomposição-reconstrução desempenhe uma

determinada função na indicação de correspondências entre o texto analisado e a

realidade subjacente. A análise de conteúdo assenta implicitamente na crença de que a

categorização (passagem de dados brutos a dados organizados) não introduz desvios,

por excesso ou por falta, no material, mas que revela índices invisíveis, no âmbito dos

dados brutos (Bardin, 1991).

5. UM ESTUDO SOBRE REPRESENTAÇÕES SOCIAIS,

ALCOOLISMO E SEU TRATAMENTO

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45

A teoria das Representações Sociais pode ser considerada como uma forma

sociológica de Psicologia Social (Farr, 1994). O conceito é mencionado pela primeira

vez por Moscovici, em seu estudo sobre a representação social da psicanálise,

intitulado Psychanalyse: son image et son public (Psicanálise: sua imagem, seu

público).

Para Moscovici (1994), o conceito de representação social tem suas origens na

Sociologia e na Antropologia, através de Durkheim e Lévi-Bruhl. De acordo com Farr

(2003, p.35) “Durkheim distinguiu os fenômenos entre o estudo das representações

individuais (o domínio da psicologia) e o estudo das representações coletivas (o

domínio da sociologia)”, estava preocupado em estabelecer a sociologia como uma

ciência autônoma, ele acabou defendendo uma separação radical entre representações

individuais e representações coletivas. Segundo ele, caberia à psicologia o estudo das

primeiras, enquanto a sociologia ficaria encarregada de estudar as últimas.

Detalhando explicações sobre as representações coletivas, Alexander (2004,

p.131) diz que “Durkheim propôs, como condição essencial na elaboração do

conhecimento, a formação de conceitos que são repartidos pelos membros do grupo,

com origem nas características da vida na coletividade”. Assim, a função primordial da

representação coletiva seria a transmissão da herança coletiva dos antepassados, que

acrescentariam às experiências individuais tudo que a sociedade acumulou de

sabedoria e ciência ao passar dos anos. O mesmo autor ressalta que é justamente

nessa questão que Moscovici diverge de Durkheim e acrescenta novos elementos à

elaboração do conceito de representação social.

Logo, Moscovici, discorda da transmissão estática e determinista da herança dos

antepassados. Ressalta segundo Alexander (2004, p. 131) que o “indivíduo tem papel

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46

ativo e autônomo no processo de construção da sociedade, da mesma forma que é

criado por ela. Ele também tem participação na sua construção”.

Então, Moscovici cria um novo conceito: a representação social, a qual permite a

articulação do psicológico e do social, inventando uma nova forma de fazer psicologia

social, tornando-as como um instrumento de compreensão e de transformação da

realidade.

As formas em que se apresentam essas representações são atualmente variadas indo desde imagens, sistemas de referência e categoria até teoria sobre os fenômenos que nos rodeiam. Trata-se de uma noção que se coloca na interface do psicológico e do social, configurando-se como um conhecimento espontâneo, ingênuo, senso comum obtido de experiências pessoais, de informações, saberes e modelos de pensar transmitidos socialmente... São resultados das interações existentes entre os indivíduos, quando procuram processar coletivamente um conjunto de informações sobre um dado objetivo social relevante, impregnando-o com os valores e motivações sociais particulares do grupo e concedendo-o de tal forma que ele se torne acessível à comunicação interpessoal. (MOSCOVICI, 1991 apud Mirlene Martins, 1994, p. 125-142).

Sendo elaboradas no âmbito dos estudos das relações sociais, a partir das

trocas e práticas que ocorrem na esfera de um contexto histórico-cultural, as

representações são capazes de, segundo Moscovici, 2003, p. 40, “influenciar o

comportamento do indivíduo participante da coletividade, é dessa maneira que são

criadas, internamente, mentalmente, pois é dessa maneira que o próprio processo

coletivo penetra, como fator determinante, dentro do pensamento individual”.

Outra característica das representações é a de que estas surgem no decurso da

comunicação e da cooperação, ou seja, não são criadas por um indivíduo

isoladamente. Assim, “uma vez criadas, contudo, elas adquirem uma vida própria,

circulam, se encontram, se atraem e se repelem e dão oportunidades ao nascimento de

novas representações, enquanto velhas representações morrem” (Moscovici, 2003, p.

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47

41). Dessa forma, os significados que os grupos constroem sobre um determinado fato

são originados de variações e de elementos adquiridos de uma herança cultural e

histórica.

Para Sá (1995), o processo de representar socialmente emerge da

materialização dos conceitos abstratos, comuns ao grupo, ao mesmo tempo em que

cria um contexto inteligível ao objeto representado ou sua integração cognitiva.

É oportuno destacar que a principal função das representações sociais é tornar o

não-familiar, familiar a ponto de isso modificar condutas coletivas e individuais. “Às

representações sociais cabe realizar o trabalho de elaboração do novo, do estranho, do

não-familiar conferindo-lhe sentido e inteligibilidade”. (Sancovschi, 2007, p.11). E, este

trabalho é feito coletivamente, nas conversações ou comunicações cotidianas.

As representações sociais que nós fabricamos, de uma nação, de um objeto, etc. são sempre o resultado de um esforço constante de tornar comum real algo que é incomum (não-familiar) ou que nos dá um sentimento de não-familiaridade...Depois de uma serie de ajustamentos, o que estava longe, parece ao alcance de nossa mão, o que parecia abstrato, torna-se concreto e quase normal. (MOSCOVICI, 2003, p. 58).

Para assimilar o não-familiar, dois processos básicos podem ser identificados

como geradores de Representações Sociais, o processo de ancoragem e objetivação.

O primeiro refere-se à inserção do que é estranho a um pensamento já existente. “A

ancoragem é um processo que transforma algo estranho e perturbador, que nos intriga,

em nosso sistema particular de categorias e o compara com um paradigma de uma

categoria que nós pensamos ser apropriada” (Moscovici, 2003 p.61).

Um processo de domesticação da novidade sob a pressão dos valores do grupo, transformando-a em um saber capaz de influenciar, pois nos limites em que ela penetrou numa camada social, também se constitui aí num meio capaz de influenciar os outros e, sob esse aspecto, adquire status instrumental. Em suma, a ancoragem é feita na realidade social vivida, não sendo, portanto, concebida como processo cognitivo intra-individual. (MOSCOVICI, 1978 apud Spink, 1993, p. 306).

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Já o segundo, refere-se ao processo pelo qual as representações assumem uma

forma concreta, seja através de imagens produzidas, seja através de objetos. Segundo

Moscovici (2003, p. 61) objetivação é “transformar algo quase concreto, transferir o que

está na mente em algo que exista no mundo físico”.

Para começar, objetivar é descobrir a qualidade icônica de uma idéia, ou ser impreciso; é reproduzir um conceito em uma imagem. Comparar é já representar, encher o que está naturalmente vazio, com substância... Objetivação une a idéia de não-familiaridade com a de realidade, torna-se a verdadeira essência da realidade. (MOSCOVICI, 2003, p. 71-72).

Assim, pode-se afirmar que a história das representações sociais insere-se na

inter-relação entre atores sociais, o fenômeno e o contexto que os rodeia. São

constituídas por processos sócio-cognitivos, têm implicações na vida cotidiana,

influenciando a comunicação e os comportamentos. Desta forma a representação pode

ser considerada como um sistema de interpretações da realidade, organizando as

relações dos indivíduos com o mundo e orientando suas condutas e comportamento no

meio social.

Para compreender melhor o funcionamento do comportamento humano, e o modo como os atores sociais se agrupam, deve-se considerar conjuntamente os afetos, as condutas, a organização, a sistematização de como eles compartilham crenças, atitudes, valores, perspectivas futuras e experiências sociais. (MOSCOVICI, 2003 p. 69).

Portanto, é oportuno ressaltar a importância da teoria criada por Moscovici, pois

é por intermédio do aporte teórico da representação social que se torna possível

“penetrar no cotidiano dos indivíduos, considerando seus valores e identidades

culturais, buscando suas verdadeiras raízes e origens, proporcionando o descobrimento

de aspectos antigos e novos de sua identidade” (Alexander, 2004, p. 130).

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Segundo este mesmo autor, não é todo “conhecimento” que pode ser

considerado representação social, mas somente aquele que faz parte da vida cotidiana

das pessoas, através do senso comum, que é elaborado socialmente e que funciona no

sentido de interpretar, pensar e agir sobre a realidade.

As representações sociais são como sistemas de interpretação que regem nossa

relação com o mundo e com os outros, orientando e organizando nossas condutas.

Elas estão ligadas a sistemas de pensamento mais amplos, ideológicos ou culturais, a

estado de conhecimentos científicos, assim como à condição social e à esfera da

experiência privada e afetiva dos indivíduos.

Desta forma, o alcoolismo bem como suas diversas formas de tratamento pela

ótica da teoria das representações sociais possibilitam a edificação de um

conhecimento socialmente compartilhado; um conhecimento vinculado às construções

sociais influenciadas pelas culturas (atitudes, estereótipos, crenças), pelos grupos e

pelo tempo. Sendo assim, as representações sociais estão estritamente associadas ao

saber do senso comum e, principalmente, elas são produto de uma sociedade

específica.

Levando isto em consideração, a realização do presente estudo teve como pedra

angular o discurso dos alcoolistas que vivenciam ou vivenciaram situações referentes

ao alcoolismo. Tais indivíduos, através dos seus discursos, possibilitaram a realização

do estudo onde se constatou a existência de diferenças nas representações sociais do

alcoolismo e de seu tratamento.

A teoria das representações sociais revela-se um excelente instrumento no

diagnóstico psicossocial nas diversas áreas do conhecimento; neste estudo, ela

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50

possibilitou o entendimento do alcoolismo e de seus tratamentos na interface da saúde

mental e da psicologia social.

Para acessar estas representações sociais, a linguagem possui um papel

fundamental, uma vez que ela é responsável pela codificação das representações que

circulam no contexto social em que o indivíduo se encontra inserido, possibilitando a

articulação destes com a rede de significados sociais. Além do que, ela é responsável

pela manutenção das objetivações comuns que circulam na vida cotidiana.

Com base nestas considerações, este capítulo tem o objetivo de apresentar os

resultados das análises das entrevistas realizadas através da técnica da análise de

conteúdo, que possibilitou a apreensão das representações sociais do alcoolismo e de

seu tratamento elaboradas pelos alcoolistas.

É importante ressaltar que este capítulo foi dividido em duas partes. A primeira

refere-se às representações sociais elaboradas pelos sujeitos sociais da pesquisa

relacionadas ao uso do álcool e a segunda parte, às representações sociais elaboradas

pelos mesmos sobre o tratamento do alcoolismo.

5.1 As Representações Sociais do Alcoolismo: Significados e

Sentimentos

Neste tópico serão apresentados os resultados apreendidos através da técnica

da análise do conteúdo. Destaca-se que a realização das entrevistas enquanto

instrumento de apreensão do conhecimento das representações sociais

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proporcionaram, através das unidades de análise temáticas, a emersão de duas

categorias e nove subcategorias, conforme a tabela 1 abaixo.

Tabela 1: Distribuição das Categorias e Subcategorias sobre o alcoolismo.

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS Nº DE UNIDADES

DE ANÁLISE

CATEGORIA 1

Significados do Álcool

Obstáculos no contexto de vida

Refúgio

Droga

Doença

384 42

38

28

Total 492

CATEGORIA 2

Sentimentos Frente ao Uso do Álcool

Sensação de liberdade

Impotência

Mal-estar

Culpa

Tristeza

79 55

45

21

17

Total 217

Para que os resultados encontrados sejam bem compreendidos, apresentar-se-á

uma discussão referente ao conteúdo de cada categoria e subcategoria, em seguida, os

relatos dos sujeitos descritos em forma de quadros.

A primeira categoria refere-se aos significados do álcool para os alcoolistas.

Nesta categoria emergiram, segundo os relatos dos sujeitos do estudo, quatro

subcategorias as quais são: Obstáculos no contexto de vida, refúgio, droga e doença.

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Na tabela 1, observa-se que a subcategoria Obstáculos no contexto de vida teve

maior destaque com 384 unidades de análise, seguida da subcategoria refúgio com 42,

38 da subcategoria droga e 28 da subcategoria doença.

Desse conjunto de dados é possível observar que o significado do álcool refere-

se a obstáculos no contexto de vida.

Logo abaixo, se apresenta cada subcategoria com suas respectivas discussões.

Obstáculos no contexto de vida

A subcategoria obstáculos no contexto de vida como parte integrante do grupo

dos significados do álcool, ressalta os aspectos relacionados aos possíveis entraves

trazidos pelo álcool no que tange as questões familiares, pessoais e profissionais. Tais

pontos são bastante enfatizados por Masur (apud Rosa, 2005), que afirma ser o

alcoolismo uma tradução de complexos problemas humanos, psicológicos e sociais.

Certas pessoas recorrem ao uso de bebidas alcoólicas para esquecerem suas

dificuldades afetivas, profissionais, familiares e sociais, acomodando, assim, suas

frustrações.

Edwards (2005) afirma que de maneira sutil, o papel central da bebida na vida do

indivíduo e a preponderância de sua dependência ao álcool sobre outros aspectos da

vida talvez signifique que o trabalho perdeu importância para a pessoa e que ela

assumiu o papel de dependente de álcool, condição essa que compete com os papéis

anteriores.

As complicações sociais quase inevitavelmente se expandem de modo a

envolver a família e outras pessoas, além de afetar o indivíduo que bebe. Edwards

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(2005) lista algumas das principais complicações sociais do ato de beber

excessivamente: família e relacionamentos; problemas no trabalho; moradia;

dificuldades financeiras; condição de indigência; álcool e violência; etc.

Diante disso, percebe-se que as representações sociais do significado do álcool

como obstáculo no contexto de vida, elaboradas pelos alcoolistas, estão na interface do

saber do senso comum e saber científico, ou seja, os discursos dos sujeitos se

confundem com as propostas desenvolvidas pelos especialistas.

Em seguida encontra-se o quadro contendo todas as unidades temáticas que

descrevem esta subcategoria.

Quadro 1: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre os obstáculos no contexto de vida em relação ao significado do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE O SIGNIFICADO DO ÁLCOOL

OBSTÁCULOS NO CONTEXTO DE VIDA

“Atrapalha todos os ramos da minha vida (...) minha família (...), meu trabalho

(...), atrapalha minha saúde (...), no meio social (...), atrapalha também a

convivência com meus filhos (...) atrapalha em tudo (...) Eu já perdi um

casamento por conta do álcool (...) eu estou distante dela por conta do álcool

(...) eu passei no vestibular para educação física, nem se quer a matrícula eu fiz

(...) tudo por conta do álcool (...) o álcool fez isso comigo (...) tá acabando com

muitas famílias (...) Chego em casa, claro que não sou bem recebido (...) Então

o que a empresa fez, me mandou embora (...) Tornaram a fazer a mesma coisa

comigo, me mandaram embora (...) a gente vai perdendo a credibilidade a partir

de dentro de casa, dos filhos, dos amigos (...) me deram minha demissão (...) Aí

o álcool, foi o motivo pra minha demissão (...) E o que ela fez, me demitiu, me

jogou na rua (...) Porque o álcool trás várias conseqüências negativas na vida

da família (...) e a gente vai perdendo a credibilidade dos filhos (...) da mulher,

(...) a mulher abandona a gente, (...) os filhos rejeitam também (...) o álcool me

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deixou lá embaixo (...) Eu era casado e me separei (...), tinha meus filhos (...),

minha esposa (...), não foi culpa dela (...) quando eu estou no álcool não tem

dinheiro que chegue (...) Minha família me acha um antipático (...), porque não

tem bêbado bom (...), a gente se transforma (...) Desde o dia que entrei aqui

meu caminhão tá carregado (...) não fui ainda, tudo por causa do álcool (...)

prejudica até meu trabalho (...) Não voltei mais pra mulher (...) ela reclamava

com razão (...), mas era por conta da bebida (...) Hoje eu não tenho ninguém

(...) Com relação à família, o álcool atrapalha muito (...) deixa você triste (...) a

mulher fica a desejar (...), esperando uma coisa, principalmente receber dinheiro

(...), a gente tem um compromisso e estraga na bebida, com outras coisas (...)

Devido eu ter passado por dois acidentes (...) só eu não me alimentar de forma

alguma, isso já é um problema (...) E hoje eu me sinto muito prejudicado com

isso porque meus trabalhos foram todos por água a baixo (...) Muito ruim (...),

principalmente com a família (...) Minha família hoje se sente muito abalada com

isso (...) eu era motorista de caminhão, perdi meu emprego (...)chego lá com

pouco tempo alguém vai saber que eu bebi (...), e não vai entregar um

caminhão, uma responsabilidade (...) influencia na minha vida social (...) de uma

certa forma também influencia no meu desempenho profissional (...) isso muitas

vezes provoca determinados atritos (...) socialmente afetou mais foi essa parte

familiar (...), tanto familiar minha como da família pai, mãe e irmão (...) Alguns

afetou mais outros menos (...) sou separado por motivos vários, mas o principal

foi o álcool (...) Me relacionava muito pouco com as pessoas (...) só com o povo

da bebida mesmo (...) minha família foi cada vez mais se enchendo de mim e se

distanciando (...), hoje vejo que perdi muito (...) Ninguém queria mais saber de

mim (...) todos se distanciaram (...), minha família, (...) meus amigos (...), perdi o

emprego (...) Eu já não queria mais trabalhar (...) Por causa do álcool eu me

afastei dos meus filhos (...) me afastei do meu marido (...) Meus amigos já não

me chamavam pra nada (...) Foi só desgraça (...) eu fui perdendo a capacidade

de me socializar (...) tendo em vista os distúrbio que eu causava do meio para o

fim da bebedeiras (...), simplesmente eu perdia o controle (...) não tinha como

conviver bem (...) na hora em que tomava o primeiro gole, simplesmente as

coisas desandavam (...)Ninguém queria saber de mim (...) Logo as pessoas

acham que a pessoa que bebe nunca tem um poder pra encontrar o caminho

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(...) A pessoa que bebe não tem valor de nada (...), a sociedade aceita, mas

nunca é com os braços abertos (...) Minha família não queria saber de mim (...)

ninguém queria conviver comigo (...) Falavam: “Lá vem àquela bêbada” (...),

“não vamos chamar ela não, ela bebe demais (...) a medida que fui bebendo,

ele foi me trazendo problemas sérios (...) Fui me perdendo (...) fui até detido na

delegacia de polícia (...) Eu era isolado (...), engraçado, eu era isolado (...) meu

ciclo de amizades era muito restrito (...) O álcool me restringia muito (...) eu

fique restrito apenas àqueles ambientes em que eu tinha condição de beber (...)

a minha vida era um caos (...) As pessoas me evitavam nas ruas (...) minha

família já estava me deixando de lado (...) no meu trabalho, eu era tratado como

uma pessoa que não tinha condição de ajudar em nada(...) Ninguém me dava

nem uma atribuição (...) aquele homem que vivia na escória da sociedade (...)

que não tinha mais condição nenhuma de viver (...) que havia perdido o domínio

da vida (...) não mostrava a cara para os vizinhos, pras pessoas (...) Minha vida

social era constrangedor quando eu saia com minha esposa (...), quando era

convidado pra uma festinha, um casamento (...) eu começava a fazer coisas

que não devia (...), terminava era prejudicando as pessoas que me convidava

(...) constrangendo minha esposa (...) e mal tratando até meus amigos (...) o

álcool me acarretou muitos defeitos de caráter e que mesmo sem beber eu já

passei a gostar desses defeitos (...) quando eu bebia eu já admitia que não

podia beber porque eu já tinha na minha consciência que toda vez que eu

bebesse eu sabia que eu ia fazer alguma besteira (...) alguma loucura eu ia

cometer (...) perdemos o domínio sobre nossas vidas (...) eu adquiri muitas

coisas que uma pessoa do bem não pode fazer uso dessas coisas (...) mas daí

a pagar as contas em dias (...) a respeitar a esposa, os filhos (...) o álcool me

levou a maltratar muitas pessoas (...) a minha derrota total (...), a minha perda

de sentido (...), porque o álcool me levou ao fundo do poço (...) Desde o início

ela foi conturbada (...) minha vida se tornou um inferno (...) Então eu não tive

uma vida social muito boa (...), era muita confusão (...), muita discórdia, (...) Eu

comecei a me sentir só (...) então minha vida social foi jogada de lado por mim

mesmo (...) As pessoas não queriam mais conversa comigo (...), já não era

convidado (...), eu era como esse copo descartável, você usa e joga fora (...) E

era um comportamento que não cabia no meio das pessoas normais, eu

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perturbava muito (...) arrumava discórdia com outro (...) eu me afastei das

pessoas (...) eu cheguei aqui um jovem destruído (...), sem nem uma

perspectiva boa de vida (...) eu tinha perdido totalmente a maneira de viver (...),

a minha família já não tinha mais amor por mim (...) tinha era pena (...) eu

cheguei só, sem ninguém (...) eu me excluí (...), eu mesmo me afastei da

sociedade (...), um zero à esquerda (...), um farrapo humano (...) eu mesmo me

afastei porque eu me sentia uma pessoa altamente complexada (...),

abandonado por tudo e por todos (...) mas na verdade eu mesmo que me

afastei (...) tinha garotas que não queriam namorar um bêbado (...) Muitas vezes

eu fui pras festas, mal entrava já era convidado a sair porque eu estava

embriagado (...) no meu caso, acho q isso acontece também com os outros

alcoólatras, ele tem dificuldade de conviver até com a própria família (...) Ele cria

choque com quem mais ele ama (...) Eu perdi o autocontrole da vida (...), o

álcool afetou minha vida quando era bem jovem (...), foi a época em que fui

mais derrotado (...) Minha família já não me agüentava mais (...) meus amigos

me abandonaram (...) fiquei desempregado (...) minha mulher me abandonou

(...) já estava sem paciência comigo (...) Perdi muito com o álcool (...) Eu já não

queria mais trabalhar (...) já não queria não, já não podia mesmo (...) só queria

saber de beber (...) Em casa já não tinha o respeito da minha mulher e dos

meus filhos (...) Vivia pelos bares (...) meus amigos eram os do bar mesmo,

companheiros de bebida (...) Muito prejuízo (...) a pessoa perde família (...),

emprego (...), amizades (...) perde a confiança de muitos (...), perde a alegria de

algumas coisas (...) só tive prejuízo na minha vida (...) brigava bastante (...)

tinha falsos amigos (...) trás tudo de ruim para o ser humano (...) podendo

causar até a morte (...) com o decorrer do tempo, fui aumentando o consumo e

caindo de agradável para péssima minha vida social (...) porque eu gastava

muito , às vezes sem ter (...), comprava fiado pra pagar depois, no fim do mês

(...) Ficava liso mas pagava tudo (...) comprava de novo (...) Como bebia, tirava

minha moral de homem (...) todos os danos causados que houve de

negatividade sobre o quadro social e espiritual e material (...) danos causados

sobre as pessoas em que prejudiquei tanto espiritualmente e materialmente (...)

meus colegas faziam minha caveira para algumas pessoas (...) Meus irmãos

tinham vergonha de mim (...) É uma substância que nos leva a um total

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descontrole da nossa vida (...) provoca o nosso corpo causando vários danos e

distúrbios (...) Foi daí que me causou vários transtornos graves (...) tanto na

minha família como na sociedade (...) que me levou a decadência (...) Eu me

tornei incapaz de solucionar problemas que podiam me trazer benefícios (...) e

que chegou a um ponto em que eu andava praticamente desprezado e

renegado por pessoas tanto da família como outras que estavam próximas de

mim que queriam o melhor pra mim (...) e foi aí que eu comecei a quebrar a cara

e cada vez mais me aprofundar na bebida (...) e me tornei um viciado sem

consciência (...) perdi a noção da sociedade e fiquei sem respeito à vida (...),

sem amor próprio (...), sem dignidade (...), sem respeito ao próximo (...) já

estava me destruindo com as próprias mãos (...), portanto eu não tinha

sentimentos e sim planos e pressentimentos de beber até morrer (...) e tudo isso

me deixou isolado da família (...) sem nenhuma credibilidade na sociedade (...)

foi aí que perdi trabalho (...) e fiquei sem a confiança das pessoas que queriam

o bem para mim (...) Só que quando eu estava bêbado, já não achava mais

amigos, arrumava namoradas (...) passei a ser desprezado e sem valor nenhum

(...). E foi aí que eu passei a roubar (...) vender objetos não só meus como dos

outros (...) ficava nervoso quando não tinha bebida perto de mim (...) Cheguei a

ser preso várias vezes, tudo em conseqüência da droga (...) e foi aí que eu

entrei em uma total degradação humana familiar (...) aonde eu não tinha mais

moral e nem alegria para viver (...) porque já estava com o destino traçado de

beber até morrer porque eu achava que era a melhor solução para minha vida

(...) Foi a minha queda (...) Perdi o respeito próprio (...),perdi a dignidade (...),a

amizade (...) emprego (...), confiança (...), respeito (...) e o mais importante:

carinho (...), amor de parte da família (...) ele não leva ninguém pra lugar

nenhum (...), só para o fundo do poço (...), mas no fundo mesmo (...) E aí de

tanto eu abusar demais elas foram se afastando de mim (...) Praticamente eu

vivia sozinha dentro de casa (...) Elas iam se afastando cada vez mais de mim

(...), aí isso me jogava cada vez mais pra baixo (...) Perdi muita amizade boa

(...), perdi emprego, (...) tudo por causa desse raio da bebida (...) porque desse

tempo pra cá eu não mais trabalhei (...) Muitos da minha família ficaram

decepcionados comigo (...) eu não parei na hora certa, quando minha mulher

me pediu (...) Porque ela mandou eu escolher entre ela e a bebida, eu estava

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sobre o efeito da bebida e escolhi a bebida (...) aí só dava prejuízo, dava não,

dá (...) Se eu começar a beber como eu bebia, aí só dá prejuízo (...)

Praticamente não tinha relação social com ninguém (...), é quase um

desprezado (...), ninguém atende (...), aí vai destruindo a si próprio (...) Nos

últimos anos, tava me prejudicando muito (...), tanto com minha família como

socialmente com os que vivem em torno de mim (...) prejuízo (...) prejuízo

financeiro, com a família (...) pra mim só acabou comigo, moralmente,

fisicamente, em geral (...) eu não tinha essa comunicação que eu tenho hoje

com a vida (...), eu não tava vivendo, eu estava vegetando (...) brigava às vezes

com a família (...) tá com 8 anos que eu tenho essa muleta aqui, foi num

acidente com um ônibus,tudo por causa do álcool (...) me afastei da padaria

(...)”.

Refúgio

A subcategoria Refúgio foi também bastante evidenciada pelos entrevistados,

nela estão presentes aspectos relacionados à fuga dos problemas pelo álcool, sendo

consideradas também, idéias que remetem à ilusão proporcionada pelo uso do álcool.

De acordo com Masur (apud Rosa, 2005) certas pessoas recorrem ao uso de

bebidas alcoólicas para esquecerem suas dificuldades afetivas, profissionais, familiares

e sociais, acomodando, assim, suas frustrações.

Logo abaixo, o quadro contendo todas as unidades temáticas desta

subcategoria.

Quadro 2: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria refúgio em relação ao significado do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE O SIGNIFICADO DO ÁLCOOL

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REFÚGIO

“Eu esqueço meus problemas (...) É um refúgio da realidade, entre problemas

familiares (...) é um refúgio, (...) é uma fulga (...) a gente esquece das desgraças

da vida (...), enquanto ta daquele jeito ta tudo bem (...) Se eu tiver triste com

alguma coisa, por exemplo, em casa, com os filhos, quando eu estou bebendo

eu esqueço, (...) continuo bebendo, desabafando (...) Quando você começa a

beber tudo muda (...), não existe nenhum problema (...) algo que tenta a gente e

nos ilude (...) mas era tudo ilusão (...) hoje vejo que era ilusão (...) eu bebia para

esquecer meus problemas (...) uma sensação que a vida não tem problema (...)

de estar em um mundo imaginário (...) tudo me fazia beber (...), mas era tudo

ilusão (...) eu criava um problema pra poder beber (...) então eu procurava a

solução através do álcool, mas fazia era aumentar o problema (...) o álcool ele

tem o poder muito grande de propiciar uma ilusão de poder (...) uma ilusão de

ser (...) uma verdadeira ilusão que o álcool propicia ao doente alcoólico (...)

quando eu bebia eu sentia uma verdadeira ilusão (...) mas na verdade era pura

ilusão (...) aí que ocorre a ilusão (...) mas hoje vejo que era pura ilusão (...)

quando eu comecei, pra mim era uma diversão (...) tudo que passava na minha

cabeça eu ia descontar no álcool (...) eu só me sentia bem se eu bebesse (...)

se eu não bebesse me sentia isolado (...) vejo que era tudo ilusão minha (...)

motivo de descontração (...) achando que as coisas a serem conquistadas se

tornariam mais fáceis (...) só esquecia se bebesse muito até dormir (...) o

alcoolismo é uma fachada e também uma grande fantasia (...) aonde as

pessoas se ludibriam porque começam a beber pouco (...) no início eu achava

que tudo que via bebida na minha frente era a felicidade (...)”.

Droga

Nesta subcategoria levou-se em consideração a fala dos entrevistados que

enfatizavam o álcool como “coisa ruim”, “maldade”, “negativo”, “destruição”, além,

evidentemente do termo “droga”.

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Durante muitos anos, o consumo de maconha foi considerado como o primeiro

estágio da dependência química. As recentes pesquisas, porém, descartam essa tese.

O resultado dos estudos e a própria experiência dos médicos demonstram que o

problema começa de outra forma: no consumo exagerado de bebidas alcoólicas (Sales,

2003).

Diante do exposto fica evidente, nos discursos dos alcoolistas, muitos aspectos

referentes ao álcool como droga. Eles afirmam que o álcool é a pior droga de todas,

que mata muitas pessoas e representa só maldade e destruição.

Logo abaixo estão as unidades temáticas desta subcategoria (quadro 3).

Quadro 3: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria droga em relação ao significado do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE O SIGNIFICADO DO ÁLCOOL

DROGA

“Uma coisa negativa (...) o álcool é uma droga, apesar de ser lícita (...) só coisa

ruim mesmo (...) só maldade (...) é a destruição (...) de ser uma coisa lícita (...)

destruição (...) um verdadeiro mal (...) tanta coisa ruim (...) pra mim o álcool é

também uma droga (...) eu posso depender dessa droga que é o álcool (...) a

destruição (...) só faz destruir a gente (...) destruição (...) a destruição da vida de

um homem que bebi (...) coisa ruim (...) ruim né (...) que não é bom (...) a

desgraça (...) uma força negativa (...) uma droga (...) a pior droga de todas (...)

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hoje representa uma droga que mata muitas pessoas (...) não usei nenhum tipo

de outra droga, a não ser o álcool mesmo (...) o álcool é uma droga lícita (...) o

mal (...) ele não é tão bom assim (...) então de um certo modo ele também é

ruim (...) pra mim ele representa uma coisa ruim (...) o álcool representa pra mim

um mal (...) é algo negativo que existe na sociedade (...) uma força negativa

(...)”.

Doença

Esta subcategoria refere-se à representação do significado que o álcool

apresenta para os alcoolistas, sendo, portanto, representado também como uma

doença.

É válido ressaltar que esta representação é bastante evidente no grupo dos

Alcoólicos Anônimos, que vêem o alcoolismo enquanto doença incurável.

O alcoolismo, segundo a OMS (2001), é uma doença. Ela se caracteriza por

fases, que vão da social, sem dependência física, apenas dependência emocional, à

fase problemática, com dependência física e emocional. Isso pôde ser bastante

perceptível nos discursos dos sujeitos quando eles afirmavam que o alcoolismo é uma

doença crônica, que não tem cura e é progressiva, que representa uma dependência,

um vício.

Quadro 4: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria doença em relação ao significado do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE O SIGNIFICADO DO ÁLCOOL

DOENÇA

“Hoje é uma doença que devora as pessoas (...) não sabia que existia uma

doença chamada alcoolismo (...) ao passar do tempo tornei-me dependente

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Ainda com relação a essa primeira parte, que se refere às representações

sociais elaboradas pelos sujeitos sociais da pesquisa relacionadas ao uso do álcool, a

outra categoria que emergiu foi a dos Sentimentos frente ao uso do álcool que teve

como subcategorias: Sensação de liberdade; Impotência; Mal-estar; Culpabilização pelo

uso do álcool e Tristeza.

Na tabela 1 (pág.51), representada anteriormente, observa-se que a

subcategoria Sensação de liberdade teve maior destaque com 79 unidades de análise,

seguida da subcategoria Impotência com 55, 45 da subcategoria mal-estar, 21 da

subcategoria culpa e com 17 unidades de análise para a subcategoria tristeza.

Desse conjunto de dados é possível observar que o sentimento frente ao uso do

álcool, segundo o relato dos sujeitos, que teve maior destaque foi o de sensação de

liberdade.

dele (...) uma doença crônica (...) que não há cura (...) difícil de ser admitida

como doença (...) A OMS diz que é uma doença (...) é difícil pra gente acreditar,

mas é uma doença mesmo (...) incurável e progressiva (...) basta eu beber um

pouquinho que eu já estou doente e muito (...) eu fico muito doente (...)

atualmente representa uma dependência (...) compulsão (...) compulsão (...)

uma vontade muitas vezes involuntária (...) compulsão (...) joga muita coisa fora

por conta desse vício (...) é uma dependência (...) então é um vício (...) o

problema já é biológico, (...) psicológico (...) é uma dependência química (...)

vejo que tenho uma doença (...) que não tem cura (...) uma doença que não tem

cura (...) um vício incurável (...)”.

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Logo abaixo se apresenta cada subcategoria com suas respectivas discussões.

Sensação de liberdade

Esta subcategoria refere-se a um dos sentimentos muito enfatizados pelos

sujeitos da pesquisa, que é o de liberdade. Aqui, considerou-se também os discursos

que remetiam a uma das características do álcool, que é sua ação euforizante.

Masur (apud Rosa, 2005) enfatiza muito bem esse aspecto do álcool, afirmando

que o que as pessoas buscam na bebida é sua ação euforizante, que ocasiona uma

desinibição comportamental, um aumento das expressões afetivas e diminuição da

autocrítica.

Esses aspectos são bastante destacados pelos sujeitos da pesquisa quando

afirmam que com o álcool eles se sentem mais poderosos, donos do mundo, mais

corajosos e capazes de tudo.

Posteriormente, o quadro contendo todas as unidades temáticas desta

subcategoria.

Quadro 5: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria sobre o sentimento de sensação de liberdade frente ao uso do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE OS SENTIMENTOS FRENTE AO USO DO

ÁLCOOL

SENSAÇÃO DE LIBERDADE

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“Alegria (...) vou bebendo e fico alegre (...) eu relaxo (...) eu faço mais amizades

(...) eu me solto (...) eu estando alcoolizado, pra mim eu fico rico logo (...) eu

sinto alegria (...) que eu to conversando (...) que eu to tendo contato com as

pessoas (...) aí corre para um bar, toma uma, e aquilo ali levanta o astral (...)

não é que resolva, mas pelo menos aquele não que eu recebi de várias pessoas

(...) alegria (...) fico alegre (...) eu realizo minhas satisfações (...) muitas vezes

um sentimento de depressão leva você a encontrar no álcool uma euforia (...)

que regule aquele momento em que você tá sentindo depressão (...) quando eu

bebia eu me sentia bem (...) alegre (...) poderoso (...) dono do mundo (...) sentia

uma sensação de liberdade (...) achava que tudo eu podia (...) eu sentia

liberdade (...) eu me sentia mais forte (...) mais corajosa (...) sinto uma felicidade

fictícia (...) no momento me sentia feliz (...) me sentia capaz de tudo (...) tinha

vontade de sair pelo mundo e fazer todas as coisas que não tinha coragem

sóbrio (...) por eu ser tímido, quando eu bebia, estava na farra (...) perdia minha

timidez (...) conversava com todas as pessoas que eu via (...) dependendo da

quantidade de álcool sentia alegria (...) felicidade (...) raiva (...) um prazer que

eu tenho durante o consumo dele (...) com muito mais alegria (...) ele me faz ter

bem mais coragem, que não tenho quando estou sóbrio (...) me achava o tal (...)

o todo poderoso (...) que não precisava de ninguém (...) que resolvia tudo

sozinho (...) e que a bebida era apenas uma diversão que não me atingia (...)

quando eu bebia eu me sentia de uma forma em que a maioria das vezes eu

estava com a felicidade nas mãos (...) me tornando violento (...) sem ter medo

das pessoas (...) me sentia alegre (...) me sentia alegre (...) eu bebia só mesmo

por prazer (...) pra mim era como se fosse uma vacina (...) só para calibrar os

nervos (...) bebia de raiva (...) de emoção (...) mais eufórico, (...) talvez mais

agressivo com as pessoas (...) ela me incentiva (...) se achava rico (...) ficava

alegre (...) ficava tranqüilo (...) eufórico (...) pra mim tudo era festa (...) sentia

uma grande liberdade (...) um poder (...) sentimentos de liberdade (...) eu dizia

que eu tinha livre arbítrio (...) que podia ir e vir à vontade (...) eu tinha raiva, (...)

alegria (...) o álcool é um lubrificante social (...) uma maneira das pessoas se

divertir (...) se relacionarem (...) ele é um lubrificante (...) o álcool pra que tá

usando é um caminho muito curto pra felicidade (...) a pessoa quando tá

usando, acha que é feliz (...) que pode muitas coisas (...) e a gente faz muitas

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coisas que não devem ser feitas pela euforia do álcool (...) euforia (...) alegria

(...) prazer (...) uma sensação de euforia (...) bem estar (...) eu comecei a beber

pra me divertir (...) pra ter mais coragem de dançar (...) paquerar as garotas (...)

eu às vezes bebia até pra ir trabalhar porque achava que dava mais energia (...)

o álcool estimula uma certa potência na gente (...) muitas vezes a gente fica

mais corajoso (...) mais apto ao serviço (...) mais capacitado (...) mais inteligente

(...) achava que o álcool me dava mais coragem (...) energia (...) no início até

que eu senti mais energia (...) me sentia livre (...) poderoso (...)”.

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Impotência

Essa subcategoria foi a que teve a segunda maior freqüência nos discursos dos

sujeitos da pesquisa e diz respeito ao sentimento que os entrevistados relataram de ter

dificuldades de deixar o álcool.

Esse sentimento de impotência, de dificuldade de abandonar o uso do álcool

deve-se principalmente a dependência que o mesmo pode causar no usuário. À medida

que a pessoa tem repetidas ressacas, percebe que parte do desconforto do dia

seguinte pode ser aliviada se recomeçar a beber. É a partir disso que a dependência

pode começar: a pessoa passa a beber não mais por prazer, ou num ambiente social,

mas para aliviar os sintomas de abstinência do álcool (Laranjeira, 1997).

Os sujeitos enfatizaram esses aspectos principalmente quando diziam que não

conseguiam parar, que não tinham controle sobre o álcool, que é praticamente

impossível para um alcoólatra parar de beber.

Em seguida, o quadro contendo todas as unidades temáticas desta subcategoria.

Quadro 6: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de impotência frente ao uso do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE OS SENTIMENTOS FRENTE AO USO DO

ÁLCOOL

IMPOTÊNCIA

“Eu não consigo parar (...). Quando eu me distanciei eu tive as recaídas (...), eu

passo poucos dias assim, uns 15 dias (...), mas quando tem um tempinho que

eu vejo assim que dá para tomar uma, (...) eu tomo uma, tomo todas (...) Eu não

me controlo (...), eu sou impotente perante o álcool (...) E aí fico ocioso (...), aí

corro para um bar (...), tomo uma aqui outra ali, (...) aí se torna um alcoólatra

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(...) e eu comecei a ficar dependente (...) no dia em que eu não tomo uma o

homem não é homem (...) não sabe resolver nada (...) não tem iniciativa (...)

pelejo pra deixar (...) já vim pra cá pela 2ª vez, (...) passei 120 dias da 1ª vez

sem beber (...) tornei voltar a beber (...) e não consigo (...). Eu digo: eu não

bebo (...), mas chego na roda de amigos (...) aí depois de beber o 1º (...) passei

120 dias sem álcool (...) e depois comecei a beber (...) como já consegui

algumas vezes (...) o máximo que já consegui (...) quando vem a vontade (...) é

incontrolável esse desejo (...) essa vontade (...) aquela vontade de beber

permanece sempre (...) enquanto não mata o desejo (...) a gente continua

bebendo (...) eu passo até um ano (...) só que quando eu volto (...), eu volto pior

(...) eu não consigo controlar ao todo (...). Em determinados momentos existe

um controle (...), mas chega um limite em que eu perco o controle da situação

(...) já estava novamente bebendo (...) a gente já tem uma compulsão (...) aí não

segura (...) toma um, dois, três (...) eu sei que é difícil (...), é praticamente

impossível para um alcoólatra dizer: eu vou deixar a partir de hoje (...) Mas eu

digo pra mim é praticamente impossível pelo tamanho que é o problema (...)

que vai dominando a pessoa de uma forma que cada vez mais fica difícil de sair

dele (...) um alcoólatra como eu jamais poderá se submeter a ingerir o 1º gole

(...) tendo em vista que perde completamente o controle sobre a bebida (...) me

admitir como impotente perante o álcool (...) admitir que eu tinha perdido o

controle da minha vida. (...) Ele vai dominando a gente (...) e quando menos

esperamos, perdemos o controle sobre a situação (...) quando queremos parar,

o álcool não deixa (...) porque to lutando (...) to guerreando (...) é difícil (...)

agora é muito difícil (...) com o tempo fui perdendo o controle (...) não há no

mundo nenhum homem que controle drogas (...)”.

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Mal-estar

Laranjeira (1997) afirma que a partir do momento em que a pessoa ingere

quantidades de álcool capazes de provocar algum tipo de indisposição – a popular

“ressaca” – no dia seguinte, é uma indicação de que a pessoa bebeu mais do que

deveria. Existem dois componentes distintos da ressaca, e o primeiro diz respeito à

intoxicação por álcool. O segundo componente diz respeito ao fato de o álcool ser um

depressor do sistema nervoso central; quando a pessoa bebe muito, fica

momentaneamente menos ansiosa, sonolenta, etc.

Quando o efeito do álcool passa, o sistema nervoso não volta imediatamente ao

normal, mas tem uma reação “rebote” a esse efeito depressor do álcool: no dia

seguinte, a pessoa tende a ficar mais nervosa, irritada, com dificuldades para conciliar o

sono. A ressaca, assim, deve-se em parte à falta que o organismo sente do álcool.

É importante frizar que aqui se considerou também aspectos dos discursos dos

sujeitos referentes a sintomas físicos e psicológicos (alteração da fala, descoordenação

motora, instabilidade no andar, prejuízos na memória e na atenção, insônia, tremores e

medo, além de confusão mental, alucinações e ilusões vívidas (CID – 10, 1993)

relacionados aos diversos transtornos proporcionados pelo uso do álcool.

Dentre os diversos transtornos, enfatizados pela CID – 10 (1993), decorrentes do

uso de substâncias psicoativas e em especial do álcool, pode-se citar: intoxicação

aguda; uso nocivo; síndrome de dependência; estado de abstinência sem e com

delirium; etc.

Assim, esta subcategoria denominada mal-estar apresentou a terceira maior

freqüência (vide Tabela 1).

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Posteriormente, o quadro com as unidades de análise desta subcategoria,

comprovando o que foi exposto.

Quadro 7: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de mal-estar frente ao uso do álcool.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE OS SENTIMENTOS FRENTE AO USO DO

ÁLCOOL

MAL-ESTAR

“Aquela ressaca (...) eu nas minhas ressacas eu tenho delírios (...), quando eu

vou dormir eu tenho pesadelos terríveis (...) eu vejo coisas perto de mim (...) eu

dou murro na parede (...) a pessoa passa perto de mim eu me assusto (...)

apesar de ter uma insônia danada (...). Só que devido eu não me alimentar de

coisa alguma (...) depois que eu começo a beber, aí eu passo mal (...) passo

mal mesmo (...) de eu não conseguir nem andar (...) a não ser ao meu próprio

organismo que no dia seguinte tá ressacado (...) eu estava desidratado, (...)

desnutrido, (...) com ânsias de vômito (...) eu estava com cerca de 57 quilos. (...)

O alcoolismo dá muita insônia (...) perca de apetite (...) ansiedade (...) quando

passava o efeito do álcool era horrível (...) eu fui tendo apagamentos (...) eu não

sabia como chegava em casa, o que eu fazia (...) eu dormia muitas vezes nos

bares (...) tive o desprazer de amanhecer na calçada (...) que vinha o outro dia

de ressaca (...) às vezes eu não sabia nem o que eu tinha aprontado quando

estava sobre o efeito do álcool (...) veio os apagamentos que é a amnésia

alcoólica. (...) Eu não me lembrava das coisas que eu fazia (...). Há 6 meses eu

bati minha cabeça, me encontraram em casa, todo ensangüentado (...) Quando

acordei, estava no hospital, me deu convulsão com amnésia (...). Antes, o

pouco que eu bebia, me cortava o apetite (...), eu não comia (...) me dava

fraqueza nas pernas (...) foi justamente dessa fraqueza que eu caí e bati a

cabeça. (...) Eu deitava e dormia sem saber nada (...). Hoje eu adoeci (...) cheio

de problema de saúde (...) tudo por causa do álcool (...) e hoje quem vai querer

uma pessoa assim, sou um inválido (...) porque nem caminhar eu posso mais

(...) Comecei a sentir sensações no corpo de tremores, tonturas, (...) confusão

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Culpa

Muitas pessoas desenvolvem o sentimento de culpa ou de arrependimento frente

ao uso do álcool. Isso ocorre principalmente em decorrência das complicações sociais

proporcionadas pelo ato de beber.

A idéia de complicação social normalmente implica o fracasso em preencher

adequadamente um papel social esperado, seja como membro de uma família,

empregador ou empregado, vizinho ou cidadão respeitador das leis. O resultado pode

ser prejudicial tanto para o indivíduo como para as pessoas à sua volta.

As complicações sociais quase inevitavelmente se expandem de modo a

envolver a família e outras pessoas, além de afetar o indivíduo que bebe. Edwards

(2005) lista algumas das principais complicações sociais do ato de beber

excessivamente: família e relacionamentos; problemas no trabalho; moradia;

dificuldades financeiras; condição de indigência; álcool e violência; etc.

Tais aspectos foram perceptíveis nas falas dos entrevistados quando os mesmos

afirmaram sentir vergonha, constrangimento e arrependimento frente ao uso do álcool

principalmente pelas conseqüências proporcionadas pelo ato de beber.

Logo mais, o quadro contendo todas as unidades temáticas dessa subcategoria.

mental, (...) mal estar no estômago (...) e tudo isso me levou a uma fraqueza

tanto física como mental e espiritual (...) passei a ver coisas diferentes na minha

frente – alucinações (...).”

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Quadro 8: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de culpa frente ao uso do álcool.

Tristeza

O álcool traz consigo vários efeitos (agradáveis e desagradáveis), como já foi

exposto e discutido anteriormente. Todos eles fazem parte da dupla ação produzida

pelo álcool, a estimulante e a depressora (Masur apud Rosa, 2005; Laranjeira, 1997).

Juntamente com esses efeitos foi discutido também que o álcool pode trazer

diversas complicações para o usuário, o que foi percebido nos discursos dos sujeitos da

pesquisa, quando afirmaram que sentiam muito sofrimento, uma depressão muito

grande, sentido-se os piores. Diante disso, percebe-se que o sentimento de tristeza

relatado pelos entrevistados comprova o acima exposto.

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE OS SENTIMENTOS FRENTE AO USO DO

ÁLCOOL

CULPA

“Foi culpa minha por causa do álcool (...). Eu me sinto, à vezes, que alguém tem

vergonha de mim (...). Agora eu não vou porque já tenho vergonha (...) pena

que não posso voltar no tempo (...) sinto vergonha (...), um constrangimento. (...)

Mas também sentia culpa. (...) Sentimentos de culpa, (...) no final, somente

arrependimentos. (...) Meus sentimentos em qualquer momento em que me

lembro só me trás rancor e grandes angústias (...) indubitavelmente nunca sairá

da minha mente (...). Sinto o verdadeiro sentimento de culpa por tudo que

causei (...) tanto a minha vida (...) como das pessoas mais próximas de mim (...)

principalmente meus pais (...). Me sentia culpado por não ter me dedicado mais

à família (...) tanto que um casamento de 14 anos acabou por minha culpa. (...)

Se eu pudesse voltar no tempo eu não tocaria nele. (...) Recuperação moral (...)

eu vejo que eu errei (...).”

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Logo mais, o quadro contendo todas as unidades temáticas dessa subcategoria.

Quadro 9: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre o sentimento de tristeza frente ao uso do álcool.

5.2 Representações Sociais dos Tratamentos para o Alcoolismo

Neste tópico serão apresentados os resultados apreendidos através da técnica

da análise de conteúdo. Destaca-se que a realização das entrevistas, enquanto

instrumento de apreensão do conhecimento das representações sociais,

proporcionaram, através das unidades de análise temáticas, a emersão de quatro

categorias e catorze subcategorias, as quais foram expostas na tabela abaixo:

Para que os resultados encontrados sejam bem compreendidos, apresentar-se-á

uma discussão referente ao conteúdo de cada categoria e em seguida, os relatos dos

sujeitos (em forma de quadros).

UNIDADES DE ANÁLISE SOBRE OS SENTIMENTOS FRENTE AO USO DO

ÁLCOOL

TRISTEZA

“Mas quando eu paro, vem aquela depressão (...) a depressão aumenta (...) aí a

pessoa fica numa tristeza danada (...) tristeza (...) tristeza (...) me trás muito

sofrimento (...) depois que passava o efeito eufórico do álcool, eu me sentia

triste, (...) pra baixo, (...) o pior dos piores. (...) Sentia uma depressão muito

grande quando eu participava de uma bebedeira muito pesada (...) Mas já no

final eu já sentia muita depressão, (...) tristeza, (...) angústia (...) Eu me achava

desanimado no serviço durante o estado alcoolizado (...) Me sentia muitas

vezes triste (...) Eu ficava deprimido (...)”.

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Tabela 2: Distribuição das Categorias e Subcategorias dos Tratamentos para o Alcoolismo.

CATEGORIAS SUBCATEGORIAS Nº DE UNIDADES

DE ANÁLISE

CATEGORIA 1

Recuperação de Ajuda

Mútua

Mudança de vida

Felicidade

Desenvolvimento da espiritualidade

Reconhecimento do alcoolismo

como doença

127 31

23

16

Total 197

CATEGORIA 2

Reabilitação em Comunidade Terapêutica

Recomeço de vida

Construção da religiosidade

Harmonia

45 29

21

Total 95

CATEGORIA 3

Tratamento Clínico Psicossocial

Bem-estar

Desejo de recuperação

Possibilidade de reincidência

Reabilitação fisiológica

44 30

15

11

Total 100

CATEGORIA 4

Atenção Psicossocial

Tratamento satisfatório

Vida nova

Esperança

36 33

09

Total 78

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A primeira categoria, apresentada na tabela 2, refere-se à recuperação de ajuda

mútua presente no grupo dos Alcoólicos Anônimos (AA). Nesta categoria emergiram,

segundo os relatos dos sujeitos do estudo, quatro subcategorias: mudança de vida;

felicidade; desenvolvimento da espiritualidade e reconhecimento do alcoolismo como

doença.

Na tabela 2, encontram-se as freqüências das unidades temáticas referentes à

recuperação de ajuda mútua, na qual observa-se que a subcategoria mudança de vida

teve maior destaque com 127 unidades de análise, seguida da subcategoria felicidade

com 31, 23 unidades de análise da subcategoria desenvolvimento da espiritualidade e

com 16 unidades de análise a subcategoria reconhecimento do alcoolismo como

doença.

Logo abaixo, se apresenta cada subcategoria com suas respectivas discussões.

Mudança de vida

Esta subcategoria foi a que teve maior freqüência entre os entrevistados, o que

afirma um dos objetivos do AA que é a mudança de vida. Esta pode ser vista

claramente nas propostas sugeridas pelos alcoólicos anônimos, no que tange seus

princípios e conceitos.

É válido ressaltar aqui que, segundo Rehfeldt (1989), uma vez alcançada uma

abstinência permanente, a grande maioria dos danos proporcionados pelo álcool é

reversível em graus que podem chegar ao completo restabelecimento. É claro que

alguns destes processos de restabelecimento podem levar meses ou anos. Mas na

grande maioria dos casos, existem perceptíveis mudanças positivas já nas primeiras

semanas e meses depois da suspensão do consumo de álcool.

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Em seguida, o quadro contendo todas as unidades temáticas desta subcategoria.

Quadro 10: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “mudança de vida” frente à recuperação de ajuda mútua.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA RECUPERAÇÃO DE AJUDA MÚTUA

MUDANÇA DE VIDA

“É uma vida regular (...), eu regularizei minha vida, (...) voltei a estudar depois

dos 40 anos, (...) to fazendo faculdade e outros cursos (...). To tentando tirar o

atrasado. (...) To retomando isso hoje da melhor forma possível pra ver se

recupero (...) E hoje é diferente (...) Minha vida hoje é de aceitação (...) de

humildade (...) querer bem para as pessoas (...) respeitar o outro (...) pensar não

só em mim, mas nos outros (...) hoje tenho aceitação das coisas que eu não

posso modificar (...) Mudou demais. (...) Hoje sou convidada para as festas (...),

não brigo mais com meu marido como antes, (...) hoje eu to vivendo bem com

minha família, (...) to vivendo bem com meus filhos (...). Agora sou um homem

normal (...) faço tudo que um homem normal faz (...) Meu convívio social

melhorou 100%. (...) Hoje eu tenho meu trabalho, (...) tenho minha residência,

(...) participo de eventos, (...) de organizações, (...) participo de todo tipo de

movimento. (...) Então, minha vida social aumentou bastante depois que eu

parei de beber. (...) E hoje a minha recuperação tem sido total. (...) O programa

de AA é um programa de recuperação da vida, a gente tem um crescimento, (...)

um crescimento em todos os sentidos. (...) Agora, nesse processo eu me sinto

cada vez crescendo, (...) eu sinto como se minha vida tivesse um crescimento,

(...) hoje, tudo que minhas filhas vão fazer, elas conversam comigo, pedem

minha opinião. (...) Então, eu tenho assim uma certa oportunidade de ter essa

condição de ter esse relacionamento. (...) Então, o programa de AA ele me deu

um novo modo de vida. (...) Na minha religião, eu sou mais presente, (...) eu

estou mais disponível, (...) no meu trabalho, (...) na minha comunidade, (...) no

próprio AA. (...) É uma vida normal, (...) tenho minhas responsabilidades, (...)

tenho meus afazeres. (...) Eu hoje eu tenho uma vida diferente. (...) Eu sou um

homem normal, (...) faço minhas obrigações, (...) trabalho em uma empresa

estadual, e lá eu sou consultado, me pedem informações, (...) é uma pessoa

normal. Resolvo as coisas com prudência (...), representa uma mudança de vida

(...) uma mudança de comportamentos. (...) Hoje eu me sinto uma pessoa

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mudada (...) hoje vejo que minha vida mudou (...) minha convivência com minha

família é outra coisa (...). Minha vida agora é diferente (...) é uma luta constante

(...) Foi aqui que eu adquiri a maneira de amar realmente alguém (...) a forma de

me relacionar com alguém, (...) foi aqui que eu aprendi a conviver novamente

em sociedade (...) Aqui eu conheci uma vida que eu não conhecia (...) hoje eu já

readquiri a forma de amar (...) já consegui me casar, (...) tenho filho, (...)

continuo meu emprego. (...) Então o AA me deu uma oportunidade de conhecer

uma vida que eu não sabia o que era viver. (...) Minha vida é uma vida normal.

(...) Tornou-se uma vida normal como a sua: estudo, (...) trabalho, (...) amo, (...)

sofro, (...) tenho responsabilidades, (...). Devolveu a minha dignidade como

homem, como pessoa, (...) devolveu minha credibilidade perante a igreja

católica porque eu era um católico de fachada (...) Eu resgatei uma nova

identidade que eu não tinha (...) Uma vida totalmente levada p/ meu trabalho,

(...) minha família, (...) meu filho. (...) Isso foi que o AA me devolveu, (...) me

devolveu o respeito lá fora. (...) essa credibilidade que eu adquiri lá fora, perante

as pessoas. (... transformação de pensamento, (...) de atitude, (...) então ele

passa a ter uma vida diferente, (...) maravilhosa. (...) Quando a pessoa quer, e

se entrega aos princípios de AA, busca pelo menos tentar praticar, ele tem uma

mudança de vida que é quase 100%. (...) Aqui a gente aprende a conviver com

os amigos, (...) com as pessoas que a gente ñ tinha o dom do relacionamento

com a bebida. (...) Ao chegar aqui, fui começando a aprender a conviver, (...) e

aqui nos AA, a gente começa a conviver com os companheiros (...) e passa a

aprender a tentar mudar essa maneira de ser grosseiro, (...) ser rebelde (...) e aí

a gente passa a viver melhor, (...) em convivência um com o outro. (...) Ah,

minha vida mudou muito. (...) Daí minha vida começou realmente a mudar. (...)

Aconteceu muita coisa boa na minha vida. (...) A gente aprende a superar as

dificuldades da vida, (...) a gente aprende a enfrentar a vida, (...) a buscar os

objetivos (...) e saber resolvê-la. (...) É uma transformação que eu não tenho

explicação. (...) Depois que parei de beber já realizei várias coisas na minha

vida, (...). Aqui eu aprendi a amar, (...) a entender a vida. (...) Então hoje eu

acredito que eu tenho um pouco de equilíbrio, (...) por isso eu acho que a minha

vida é maravilhosa aqui no AA. (...) Com ele percebi que eu tenho sim

esperanças de uma vida melhor (...) e isso já tá acontecendo (...) Hoje tenho

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uma família, (...) casei de novo (...) tenho filhos, (...) emprego, (...) amigos de

verdade (...). Então o AA significa pra mim uma mudança de vida, (...)

esperança de transformação. (...) Cheio de esperança por um mundo melhor

(...) Vejo que a cada dia posso melhorar mais, (...) e ajudar os outros a

melhorarem também (...) Minha vida mudou muito (...) Hoje tenho uma família,

(...) o respeito dela (...) e das pessoas que me cercam (...) sou mais confiante

(...) e venho recebendo os frutos por ter abandonado o álcool. (...) Minha vida

agora depois que entrei no AA é outra. (...) Já reconquistei o respeito da minha

mulher e dos meus filhos, (...) procuro ter uma conduta condizente com os

princípios do AA, (...) sou respeitado pelos meus amigos. (...) To reconstruindo

tudo que o álcool roubou de mim.“

Felicidade

Esta subcategoria foi destacada no tratamento pela recuperação de ajuda mútua,

apresentando a segunda maior freqüência. Isso corrobora com a primeira subcategoria

acima discutida: mudança de vida.

Muitos dos sujeitos da pesquisa enfatizaram sentir felicidade por conseguirem, a

partir da sua recuperação no AA, mudar aspectos de suas vidas que dizem respeito à

família, trabalho e religiosidade.

Nesta subcategoria foi levado também em consideração os discursos que

retratavam sentimentos de libertação frente à recuperação. Muitos dos sujeitos

afirmaram que com esse tratamento agora sim se consideravam pessoas livres e

felizes, sentiam mais prazer em trabalhar e bem consigo mesmas.

A seguir o quadro contendo todas as unidades temáticas desta subcategoria.

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Quadro 11: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “felicidade” frente à recuperação de ajuda mútua.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA RECUPERAÇÃO DE AJUDA MÚTUA

FELICIDADE

“Livre, (...) hoje em dia me considero na verdade a pessoa livre que eu pensava

ser (...) Eu me sinto bem, (...) feliz, (...) eu só me sinto bem dentro do AA. (...)

Feliz demais, (...) muito prazer em trabalhar pelo AA (...) minha auto-estima

aumenta, (...) eu me sinto bem comigo (...). Hoje é a coisa mais importante que

eu tenho (...) readquiri o direito de ir e vir. (...) depois que eu cheguei aqui, eu

readquiri tudo isso. (...) É a solução de todos os meus problemas (...) Então o

AA é a porta da minha felicidade (...) é a porta da salvação (...) me salvou (...)

me tirou do inferno em que eu estava (...) eu me sinto bem, (...) feliz (...) Uma

vida muito promissora, (...) e muito feliz (...) Então eu tive a felicidade depois da

idade madura, depois de 30 anos, (...) eu fico feliz com a vida que eu tenho hoje

(...) muito feliz (...) Minha libertação (...) tenho liberdade (...)”.

Desenvolvimento da espiritualidade

Nesta subcategoria ficou evidente o segundo passo dos Alcoólicos Anônimos:

“Viemos a acreditar que um Poder superior a nós mesmos poderia devolver-nos à

sanidade”. Este retrata o forte sentimento de religiosidade presente neste grupo.

Apesar de não se vincular a nenhuma religião ou seita, nenhum movimento

político, nenhuma organização ou instituição, o AA prega ser impossível vencer o

alcoolismo sem a proteção de um ser superior, de um ente supremo que ajude o

alcoólico a manter a sobriedade (Edwards, 2005).

A resolução da ansiedade por meio da adoção da filosofia do AA não difere da

conversão religiosa, sendo com freqüência entendida como uma profunda experiência

espiritual (Edwards, 2005).

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Quadro 12: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “desenvolvimento da espiritualidade” frente à recuperação de ajuda mútua.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA RECUPERAÇÃO DE AJUDA MÚTUA

DESENVOLVIMENTO DA ESPIRITUALIDADE

“Foi Deus que colocou ele no meu caminho, (...) eu não acreditava em Deus,

(...) aqui no AA eu consigo me concentrar (...) O AA tem a força espiritual (...) Só

Deus pode modificar as pessoas, dentro do AA a gente aprende isso (...) A

gente querendo se esforçar (...) Deus modifica (...) Graças a Deus eu tive uma

oportunidade de encontrar uma solução (...) e graças a Deus eu sou grato (...)

Graças a Deus a minha vida mudou (...) e graças a Deus eu tenho crescido

bastante (...) graças a Deus eu tenho muita vontade de continuar transmitindo a

mensagem de AA (...) Mas é pra mim conseguir e readquirir uma vida espiritual

melhor, (...) me aproximar cada vez mais de Deus (...) E hoje graças a Deus eu

consigo tranqüilamente viver sem beber. (...) O AA não é religião, mas leva o

sujeito a um grau de espiritualidade tão grande (...) que você sente o poder de

Deus perto de você. (...) Depois eu acreditei num Deus (...) voltei a praticar os

princípios religiosos (...) o que é o sentimento mais profundo de Deus (...)

quando Ele quer a gente não tem o direito de impedir (...) Sou um homem que

acredito mais em Deus (...) apesar de não ter religião sou um homem

espiritualizado agora. (...)”.

Reconhecimento do alcoolismo como doença

O primeiro passo para a recuperação, de acordo com os princípios do AA, é

admitir que existe uma doença denominada alcoolismo, porque enfrentar o problema e

alcançar a sobriedade só é possível se houver esforço e empenho pessoal do

interessado.

Edwards (2005) afirma que o AA proporciona ao indivíduo um conjunto flexível e

coerente de idéias que pode aliviar seus sentimentos de desesperança e explicar a

natureza de seu problema. Ele está sofrendo da “doença do alcoolismo”, descrita

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metaforicamente como algo parecido com uma “alergia ao álcool”. Sua constituição é tal

que o fará reagir a esta droga de modo diferente de outras pessoas. Ele nunca poderá

ser “curado”, mas a doença será “detida” caso ele não beba de novo.

A seguir, o quadro contendo todas as unidades temáticas desta subcategoria.

Quadro 13: Distribuição das unidades de análise temáticas sobre a subcategoria “reconhecimento do alcoolismo como doença” frente à recuperação de ajuda mútua.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA RECUPERAÇÃO DE AJUDA MÚTUA

RECONHECIMENTO DO ALCOOLISMO COMO DOENÇA

“Eu vi aqui dentro que eu sou alcoólatra e trato isso com a maior naturalidade

possível, (...) fui vendo que aquilo era normal e eu não precisa ter vergonha de

assumir que sou um doente, (...) afinal de contas se eu fosse um diabético eu

teria que fazer a dieta do açúcar, (...) como eu não sou diabético, sou alcoólatra,

(...) eu tenho que fazer a dieta radical do álcool, (...) eu tenho que evitar o

primeiro gole um dia de cada vez, se eu quiser viver bem. (...) Mas hoje

reconheço como uma doença. (...) Assim como existem pessoas que são

diabéticas, que não podem comer açúcar, (...) existem pessoas que são

alcoólicas e que não podem beber. (...) Quando bebem existe problemas de

alcoolismo, (...) que segundo a OMS fala que o alcoolismo é uma doença. (...)

Foi aonde vim perceber realmente o problema que eu tenho. (...) o alcoolismo é

dito pela OMS como uma doença, (...) uma alergia aliada a uma obsessão

mental, mas o AA vai mais além, (...) ele diz que além de física é também

mentalmente, (...) espiritualmente. (...) Tenho consciência de que sou alcoólatra

(...)”.

A segunda categoria que emergiu nos discursos dos sujeitos da pesquisa refere-

se à reabilitação na comunidade terapêutica. Dela surgiram três subcategorias as quais

são: recomeço de vida, que teve maior destaque com 45 unidades de análise, seguida

da subcategoria construção da religiosidade com 29 unidades de análise e harmonia

com 21 unidades.

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Recomeço de vida

Sobre a subcategoria recomeço de vida é importante frizar que a mesma foi

bastante mencionada pelos sujeitos, o que pode ser explicado pela própria proposta

das comunidades terapêuticas. Segundo Queiroz (2001), grande parte das fazendas de

recuperação (ou fazendas terapêuticas) funciona em regime e vida comunitária,

obedecendo a um programa fundamentado na disciplina, na espiritualidade e no

trabalho como recursos terapêuticos. Os membros têm um papel significativo na

administração da comunidade e são responsáveis por toda a manutenção da vida

comunitária.

As comunidades terapêuticas representam um ambiente altamente estruturado,

com limites definidos, tanto morais quanto éticos, o que contribui para essa

representação das fazendas terapêuticas como recomeço de vida.

Logo após estão as unidades temáticas desta subcategoria (quadro 14).

Quadro 14: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “recomeço de vida” frente à reabilitação em comunidade terapêutica.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA REABILITAÇÃO EM COMUNIDADE

TERAPÊUTICA

RECOMEÇO DE VIDA

“Uma nova pessoa, (...) com a chance de recomeçar a vida novamente, (...) mas

agora de maneira correta, (...) sem os erros de antes. (...) Estou aprendendo a

me comportar, (...) a respeitar os limites que a mim próprio é permitido pela

natureza da vida. (...) a minha esperança de vida nova aumenta a cada dia que

passa. (...) agora sinto que posso conquistar de novo tudo que perdi. (...) vejo a

alegria da minha família por mim (...) estou podendo superar a cada dia que

passo e me renovar como homem. (...) Para mim significa ter o amor da minha

família de volta (...) e voltar à sociedade. (...) Eu me sinto outra pessoa,

totalmente diferente, (...) agora sou responsável com as minhas atividades da

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casa. (...) uma oportunidade de uma mudança de vida para melhor (...) Não me

lembro mais da bebida tem 9 meses (...) eu acho que não bebo mais porque

nem me lembro (...) Para mim significa uma grande mudança de vida. (...)

Sobre meu comportamento, (...) mudanças de atitudes, (...) mudança espiritual,

(...) minha valorização minha e das outras pessoas também. (...) de uma boa

conduta moral para que seja de bom progresso futuramente. (...) há grandes

diferenças o tanto quanto como hoje estou sabendo valorizar a minha vida (...)

reintegração na sociedade (...) saúde corporal (...) para que eu encontre a

felicidade (...) o amor (...) e a paz nesta nova mudança de vida (...) em busca de

novos rumos na minha vida, (...) pois estou aqui com o propósito de encontrar a

melhor maneira de poder viver uma vida digna (...) e que eu possa ter

humildade comigo mesmo de poder compartilhar com o próximo (...) e seguir

esta caminhada de cara limpa (...) e que eu consiga recuperar o meu caráter e

personalidade, (...) e poder mostrar um novo comportamento (...) e realizar os

meus objetivos (...) valorizando a minha pessoa (...) deixar para sempre o vício

(...) para que eu tenha uma total evolução e força para uma nova vida. (...) Hoje

eu tenho a esperança de que algo de bom venha a me acontecer (...) Eu me

sinto um novo homem, (...) cada dia que passa me sinto muito melhor (...) e

tenho certeza que vou conseguir superar esta barreira (...)”.

Construção da religiosidade

Como exposto anteriormente, grande parte das fazendas de recuperação

funciona em regime e vida comunitária, obedecendo a um programa fundamentado na

disciplina, na espiritualidade e no trabalho como recursos terapêuticos (Queiroz, 2001).

Essa espiritualidade foi bastante declarada pelos entrevistados, o que foi

comprovado pelo fato dessa subcategoria ter sido a segunda com maior freqüência. É

válido ressaltar que na comunidade terapêutica em estudo, há a preocupação de se

seguir os 12 passos dos Alcoólicos Anônimos, fato este que explica essa construção da

religiosidade, tão presente no referido grupo.

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Quadro 15: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “construção da religiosidade” frente à reabilitação em comunidade terapêutica.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA REABILITAÇÃO EM COMUNIDADE

TERAPÊUTICA

CONSTRUÇÃO DA RELIGIOSIDADE

“Melhorei espiritualmente, (...) e com a força do meu poder superior (...) Graças

a Deus, (...) graças a Deus tá tudo bem (...) Com fé em Deus eu venço. (...) Foi

a descoberta da minha vida espiritual (...) Foi descoberto sobre meu problema

que era totalmente espiritual (...) Por causa da minha libertação através do meu

poder superior (...) reatar-se uma nova aliança com Deus em afinidades gerais

(...) e principalmente sobre a palavra de Deus (...) reintegração espiritual (...) e

um grande prazer de toda minha vida em viver na sobriedade espiritual (...) na

vida espiritual (...) estou bem espiritualmente (...) buscando uma força muito

maior na capela e nas orações (...) estou conseguindo ver Deus (...) e que esta

caminhada é longa, mas com a ajuda de Deus eu vou superar todas as

dificuldades, (...) com fé em Deus (...) e graças a Deus (...) Ele me deu uma luz

(...) com a minha fé (...) com a ajuda do meu poder superior que é Deus (...) sem

Deus eu não irei a lugar nenhum, (...) porque só existe uma maneira

comprovada de manter-se longe das drogas: e um dia de cada vez a vida

inteira, (...) só por hoje, 24 horas e com Deus no coração.(...) seguir sempre o

caminho do bem, (...) com fé, (...) os momentos de capela, (...) com meditação e

oração tem me ajudado bastante a compreender e encarar a vida, (...) e sei que

vou conseguir, com fé em Deus. (...)”.

Harmonia Nesta subcategoria levou-se em consideração aspectos das falas dos sujeitos

que remetiam à felicidade, bem-estar. Na comunidade terapêutica a qual foi realizada a

pesquisa, ficou bastante evidente a busca por esses sentimentos. Ela é uma entidade

que é fundamentada em concepções que defendem o isolamento do indivíduo de

fatores que podem levá-los à adicção, e a partir daí realizar um trabalho de

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conscientização, por meio de dramatizações, trabalho, cooperação, o que contribui para

a vida em coletividade e para a crença de que cada sujeito tem sua importância para o

desenvolvimento das relações grupais. Assim, busca-se valorizar as características

pessoais e o grupo de inserção dessas pessoas, contribuindo para o desenvolvimento

dessa harmonia.

A seguir, as unidades de análises referentes a essa subcategoria.

Quadro 16: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “harmonia” frente à reabilitação em comunidade terapêutica.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DA REABILITAÇÃO EM COMUNIDADE

TERAPÊUTICA

HARMONIA

“Muito melhor, (...) depois da minha entrada na fazenda eu melhorei muito, (...)

sinto-me bem, (...) melhorou 100%. (...) Sinto uma coisa muito linda dentro de

mim (...) Eu estou com saúde, (...) com apetite, (...) disposição para trabalhar

(...) isso me trás um sentimento de mais tranqüilidade (...) aqui dentro estou

aprendendo mais do que eu próprio imaginava. (...) Eu me sinto muito bem (...)

a minha vida tá muito boa (...) Bem (...) tranqüila (...) Hoje eu me sinto uma

pessoa feliz (...) dedicada no que eu faço (...) Minha vida hoje é feliz (...) viver

em harmonia, (...) hoje posso dizer que me sinto beneficiado pela comunidade

(...)”.

A terceira categoria que emergiu nos discursos dos sujeitos da pesquisa refere-

se ao tratamento clínico psicossocial. Dela surgiram quatro subcategorias as quais

foram: bem-estar; desejo de recuperação; possibilidade de reincidência e reabilitação

fisiológica.

A subcategoria bem-estar teve maior destaque com 44 unidades de análise,

seguida da subcategoria desejo de recuperação com 30, da possibilidade reincidência

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com 15 unidades de análise e com 11 unidades de análise a subcategoria reabilitação

fisiológica.

Bem-estar

Sobre a subcategoria é importante frizar que a mesma foi bastante mencionada

pelos sujeitos sociais, como pode ser percebido na tabela acima. Segundo os relatos,

bem-estar refere-se a todas as manifestações relacionadas à satisfação em estar em

um ambiente agradável, sendo bem tratado e acompanhado por todos os profissionais

lá presentes.

Como mencionado anteriormente a referida instituição está instalada em casa

ampla, dotada de infra-estrutura de conforto e lazer, com área destinada a atividades ao

ar livre e espaços para o funcionamento de oficinas de arte, sala de grupos, refeitório,

consultórios, etc.

Logo abaixo o quadro contendo as unidades de análise referentes a essa

subcategoria.

Quadro 17: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “bem-estar” frente ao tratamento clínico psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO CLÍNICO

PSICOSSOCIAL

BEM-ESTAR

“Eu me sinto bem,(...) me sinto em casa, (...) aqui sou amigo dos funcionários,

(...) eu me sinto bem. (...) É importante. (...) Me sinto bem, (...) as pessoas são

legais, (...) tratam a gente muito bem, (...) é muito bem servido de alimentação,

(...) Tem professor pra física (...), tem doutora pra conversar com a gente

(...),Com o tratamento eu melhoro (...), quando eu to aqui eu me sinto feliz

demais (...), eu não sinto mais dor (...), eu não sinto nada (...). O significado é

muito importante (...). Eu me sinto muito bem(...), diante do colegas (...), eu me

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sinto bem (...), aqui não me dá vontade de beber (...), com o tratamento é bem

melhor (...), eu vim pra cá porque tenho um acompanhamento diferenciado (...),

melhor (...), hoje eu acredito na ajuda que eu posso ter (...). Até então eu to bem

(...), a gente é bem tratado (...), tô me sentindo bem melhor, (...) tô me sentindo

bem, (...) aqui deu pra relaxar, (...) colocar as idéias no lugar, (...) no outro

sentido é que aqui eu senti que eu podia voltar para mim mesmo (...), aqui eu

tenho apenas um companheiro de quarto e lá (Meduna) eu tinha cinco (...), e

aqui eu me senti um pouco mais leve (...), com capacidade para raciocinar sobre

o meu próprio problema (...). Eu senti paz aqui dentro (...), me sinto muito bem

(...). Tem também a questão do trato das pessoas aqui com você (...), elas te

tratam muito bem (...), nunca me faltou nada (...), Me sinto muito bem (...), agora

sim é que eu sou verdadeiramente poderoso (...), e tenho liberdade (...), com a

ajuda dos profissionais daqui (...), tenho me sentido bem melhor (...)”.

Desejo de recuperação

Esta subcategoria refere-se ao sentimento de esperança em relação ao futuro,

ou seja, à aspiração dos sujeitos por uma mudança de vida frente à possibilidade de

abandonar o uso do álcool. Em vários momentos dos discursos dos sujeitos eles

relataram querer se recuperar, acreditando que tem uma solução, tendo força de

vontade e esperança na mudança.

Dessa forma, a subcategoria desejo de recuperação destaca, segundo os

discursos dos sujeitos, os sentimentos de mudança, de renovação. Posteriormente, o

quadro com as unidades de análise desta subcategoria, comprovando o que foi

exposto.

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Quadro 18: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “desejo de recuperação” frente ao tratamento clínico psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO CLÍNICO

PSICOSSOCIAL

DESEJO DE RECUPERAÇÃO

”Me tornar abstêmio (...), eu acredito que dessa vez (...), eu acredito que tenha

uma solução (...), com a força de vontade a gente consegue chegar lá (...), por

isso hoje eu me encontro aqui tentando me recuperar de alguma coisa (...), eu

tento hoje me livra disso (...). E hoje eu to aqui porque eu preciso me livrar (...).

Bora ver (...), eu to tentando (...), espero melhorar ainda mais (...), eu estou

pedindo ajuda de todos os lados (...), do meu lado espiritual (...), da minha força

de vontade (...), das pessoas mesmo me chateando (...), cheguem para me

orientar (...), eu vejo assim como uma equação que eu ainda não terminei (...).

Então eu to me conscientizando de que eu preciso deles e eles precisam de

mim (...), então talvez seja como uma coluna para eu me sustentar (...), eu me

sinto assim, que o tratamento tenha evoluído (...). Ter forças para não cair

novamente (...), aqui tô tendo uma possibilidade de ter mais esperança (...),

uma esperança (...), esperançoso (...), confiante (...), agora já tenho mais uma

perspectiva de melhora (...), confiante (...) e com muita esperança (...)”.

Possibilidade de reincidência

Esta subcategoria apresentou a terceira maior freqüência nos discursos dos

sujeitos da pesquisa. Tal dado pode ser justificado pelos próprios discursos que

enfatizam o fato de muitos dos entrevistados que estavam em tratamento clínico

psicossocial já haviam estado ali outras vezes, além de expressarem seu ponto de vista

sobre a brevidade do tratamento que é, em média, de 15 dias (conforme regimento da

instituição, exposto no referencial teórico).

Abaixo as unidades de análise desta subcategoria, comprovando o que foi

exposto.

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Quadro 19: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “possibilidade de reincidência” frente ao tratamento clínico psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO CLÍNICO

PSICOSSOCIAL

POSSIBILIDADE DE REINCIDÊNCIA

“Eu já vim pra cá cinco vezes (...), eu passo uns dias parado (...), tudo começa

novamente (...), eu saio (...), passo poucos dias sem beber (...), daí começa

tudo novamente (...), quando o negócio está muito pesado aí eu passo dois, três

meses e venho pra cá de novo (...), passo quatorze dias aqui e passo um mês

(...), um mês e pouco sóbrio (...). Já peço que passe uns sessenta dias pra eu

voltar (...), já estou com várias entradas aqui (...). Eu tenho várias internações

(...), cada vez que eu venho muda (...), eu passo uns tempos sem beber (...)”.

Reabilitação fisiológica

No que se refere aos dependentes de álcool, a clínica tem por um de seus

objetivos favorecer sua recuperação mediante insight terapêutico visando provocar a

conscientização da dependência, quando necessário, mediante o uso de

psicofarmacologia; trabalhar a abstinência; reduzir os danos causados pelo uso da

droga e melhorar a qualidade de vida do usuário (conforme regimento da instituição,

exposto no referencial teórico).

Isso pode ser percebido pelos discursos abaixo destacados.

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Quadro 20: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “reabilitação fisiológica” frente ao tratamento clínico psicossocial.

A quarta categoria que emergiu nos discursos dos sujeitos da pesquisa refere-se

ao tratamento no centro de atenção psicossocial. Dela surgiram três subcategorias as

quais foram: tratamento satisfatório, vida nova, esperança.

Na tabela 2, encontram-se as freqüências das unidades temáticas referentes a

essa categoria, na qual observa-se que a subcategoria tratamento satisfatório teve

maior destaque com a freqüência de 36, seguida da subcategoria vida nova com 33 e

com freqüência de 09 a subcategoria esperança.

Tratamento satisfatório

Esta subcategoria retrata o ponto de vista dos entrevistados frente ao tratamento

ao qual se submeteram, demonstrando estarem contentados com os métodos

oferecidos pelo mesmo.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO CLÍNICO

PSICOSSOCIAL

REABILITAÇÃO FISIOLÓGICA

“Eu vim mais pra cá pra me desintoxicar (...), Porque eu me desintoxicando aqui

eu me sinto melhor (...), é muito bem servido de remédio (...), eu tomo os

remédios direitinho (...), os remédios são muito bons (...). Porque a gente

começa a tomar um tipo de remédio (...). Aqui eu consegui recuperar

principalmente a minha parte física eu estava bastante debilitada (...), aqui eu

tomei medicações (...), fui acompanhado pelas medicações (...), é como se eu

tivesse me lavado por dentro (...), me limpando através dos remédios (...), com

ajuda dos remédios (...), como se tivesse me limpado de algo muito sujo (...)”.

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É importante frizar que esta subcategoria foi bastante mencionada pelos sujeitos

sociais e que foram consideradas as falas que retratavam felicidade, satisfação,

contentamento frente ao tratamento.

Logo após estão as unidades temáticas desta subcategoria.

Quadro 21: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “tratamento satisfatório” frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO NO CENTRO DE

ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

TRATAMENTO SATISFATÓRIO

“Significa uma coisa muito boa (...), é tudo para lhe subir (...), me sinto bem (...),

maravilhosamente bem (...), me sinto muito bem (...), eu fiquei muito feliz (...),Me

sinto muito bem (...), me sinto a vontade (...), converso nas palestras feitas pelas

doutoras (...), tem os amigos da gente (...), é um lar praticamente (...), eu

considero como um lar (...). Aqui é como se todos fossem irmãos (...), um dá

conselho aos outros (...), uma luz que encontrei no fim do túnel (...), me sinto

muito feliz em conviver com todos aqui (...), não quero nunca largar disso aqui

(...), eu me sinto muito feliz (...), aqui é ótimo (...), me sinto ótimo (...), eu to

achando bom demais (...), me sinto muito bem (...), as pessoas respeitam a

gente (...), me sinto melhor (...), respiro melhor (...), penso com mais nitidez (...),

Me sinto muito bem (...), agora sim é que eu sou verdadeiramente poderoso (...),

e tenho liberdade (...), justamente por ter conseguido largar o álcool (...). uma

coisa muito boa (...), me sinto muito bem (...), tá bom demais (...)”.

Vida nova

Esta subcategoria teve a segunda maior freqüência entre os discursos dos

sujeitos e refere-se ao sentimento de esperança em relação ao futuro, ou seja, à

aspiração dos sujeitos por uma mudança de vida, uma renovação frente à possibilidade

de abandonar álcool.

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Os CAPS ad propõem que a abstinência não seja o modelo único a ser

considerado e que não se promova o isolamento social do alcoolista. Pelo contrário, a

defesa de incluí-lo com respeito a suas escolhas no tratamento é o eixo central que

caracteriza a co-responsabilidade e liberdade no cuidar dos usuários na defesa da vida

com a redução de danos (Ministério da Saúde, 2003), enfatizado na Portaria nº 1.059,

de 4 de julho de 2005 (Diário Oficial da União, 2005).

Posteriormente, o quadro com as unidades de análise desta subcategoria,

comprovando o que foi exposto.

Quadro 22: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “vida nova” frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO NO CENTRO DE

ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

VIDA NOVA

“Tá melhor (...), to melhorando aos poucos (...), já consegui até um emprego

novo (...), para eu realizar o meu projeto de vida de trabalhar (...), to

descobrindo uma nova vida (...), porque eu quero começar uma nova vida (...),

quero repor algumas coisas (...), é bem melhor do que antes (...) aqui já mudei

muito (...), to muito mudado (...). Minha situação de vida socialmente assim,

mudou (...). Porque eu estando aqui, minha conversa já é outra bem diferente

(...), depois que eu comecei o tratamento aqui eu estou bem melhor (...),

melhorei 60% do que eu tava, (...) Tá mudando (...), aos poucos, mas está

mudando (...). Eu já estou pensando umas coisas mais adequadas (...), meu

pensamento ainda não é 100%, mas é melhor do que quando eu andava

praticamente bêbado (...), Desde que entrei aqui eu fiquei mais ciente de querer

viver (...), eu recebi o apoio de todos, médicos, funcionários, amigos (...). Hoje

faço caminhada (...), gosto de fazer as coisas em casa e hoje em dia eu me

sinto muito bem depois que encontrei o CAPS (...), estou me recuperando (...),

depois que cheguei no tratamento tenho uma religião (...), minha vida agora

mudou muito (...), melhorou bastante (...), recuperar também os bens que eu

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perdi (...), recuperar a família (...), aí eu estou querendo recuperar novamente

(...). Minha vida agora depois que entrei no CAPS é outra (...). Já reconquistei o

respeito da minha mulher e dos meus filhos (...), sou respeitado pelos meus

amigos (...). Tô reconstruindo tudo que o álcool roubou de mim (...)”.

Esperança

Esta subcategoria refere-se à esperança dos entrevistados frente à possibilidade

de abandonar o álcool. Ela está bem relacionada com a anterior, uma vez que ter

perspectivas de abandonar a bebida alcoólica, pode representar uma mudança de vida.

Fazendo-se um paralelo com as representações que os sujeitos sociais têm

acerca do álcool (mostradas anteriormente nesta análise), fica então evidente que o

abandono da bebida realmente implica em uma mudança de vida.

Posteriormente, o quadro com as unidades de análise desta subcategoria,

comprovando o que foi exposto.

Quadro 23: Distribuição das unidades de análise temática sobre a subcategoria “esperança” frente ao tratamento no centro de atenção psicossocial.

UNIDADES DE ANÁLISE ACERCA DO TRATAMENTO NO CENTRO DE

ATENÇÃO PSICOSSOCIAL

ESPERANÇA

“Que eu vou me libertar (...), que eu sei que vou conseguir (...), mas eu vou

conseguir (...), eu vim porque eu quero conseguir (...), eu pretendo continuar o

tempo que for necessário (...), aí entrei na recuperação e estou melhorando (...),

ainda não chegou em 100% ainda, mas vai chegar (...), essa é a quarta

tentativa que eu faço e eu espero que seja a última (...), você mesmo percebe

que você pode conseguir (...)”.

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93

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desta pesquisa revelou que as representações sociais que mais se

destacaram, nos relatos dos sujeitos sociais, em relação aos significados do álcool

foram as que se inter-relacionavam com os obstáculos no contexto de vida, ou seja, as

conseqüências proporcionadas pelo uso do álcool, principalmente nos âmbitos familiar,

pessoal e profissional. Portanto, a idéia de entraves, de empecilhos, foi bastante

enfatizada pelos entrevistados, sendo percebida até mesmo nas demais

representações sobre o álcool (droga, doença, refúgio).

É valido ressaltar que muitas das informações obtidas são concordantes com as

bibliografias consultadas e apresentadas no decorrer deste estudo, especialmente ao

que se refere aos sentimentos declarados frente ao uso do álcool. Como visto nos

resultados, o que muitos buscam na bebida é sua ação euforizante, ocasionando uma

desinibição comportamental, aumento das expressões afetivas e diminuição da

autocrítica. No entanto, o álcool também traz consigo efeitos desagradáveis, também

bastante enfatizados pelos entrevistados (culpa, impotência, tristeza, mal-estar).

Com relação aos ambientes de tratamento em estudo, percebeu-se que na

recuperação de ajuda mútua (AA) a representação que mais foi expressa pelos sujeitos

sociais da pesquisa foi a mudança de vida proporcionada por esse ambiente, sendo

enfatizado, também, outros aspectos como: felicidade, desenvolvimento da

espiritualidade e reconhecimento do alcoolismo como doença.

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94

Na reabilitação em comunidade terapêutica a representação mais evidente para

os entrevistados foi a de proporcionar um recomeço de vida, destacando-se também a

construção da religiosidade e a harmonia proporcionada por esse ambiente.

Com relação ao tratamento clínico e psicossocial, foi bastante enfatizado pelos

sujeitos a sensação de bem-estar, além disso, foi destacado também o desejo pela

recuperação, a possibilidade de reincidência no uso do álcool e a reabilitação

fisiológica.

A representação social dos entrevistados com relação ao ambiente de atenção

psicossocial (Caps – ad) foi a de um tratamento satisfatório, seguida de um local que

proporcionar uma possibilidade de vida nova e esperança.

Percebe-se que apesar desses ambientes apresentarem diferentes objetivos,

bem como diferentes concepções do problema subjacente, eles apresentam também

um objetivo em comum: auxiliar o alcoolista a superar suas dificuldades frente ao uso

da bebida alcoólica e proporcionar-lhes mudanças em suas vidas.

Essa diversidade oferece vantagens e desvantagens que precisam ser

entendidas tanto pelas instituições de apoio quanto pelas pessoas que buscam auxílio.

Devem-se manter esforços no sentido de tentar encontrar a melhor combinação entre o

usuário de álcool e a fonte de ajuda mais adequada a ele.

Frente às dificuldades encontradas e ao trabalho finalizado, a realização deste

estudo possibilitou diversos aprendizados ímpares: os ensinamentos proporcionados

através das leituras realizadas durante a elaboração do trabalho, paciência diante dos

obstáculos encontrados e, principalmente, o contato mais próximo com a história e vida

dos alcoolistas.

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Espera-se que o estudo revele grandes contribuições para a prática cotidiana

dos profissionais que lidam com alcoolistas; para o meio acadêmico que de certa forma

tem um contato muito restrito com essa temática e para os familiares no sentido de

esclarecer dúvidas e proporcionar maior entendimento acerca do alcoolismo.

Pretende-se também que seus resultados auxiliem na articulação do campo da

Saúde Mental com o campo da Psicologia Social, enfatizando a construção do

conhecimento cotidiano, respaldado no enfoque teórico das representações sociais.

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REFERÊNCIAS

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ANEXOS

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ANEXO A

OS DOZE PASSOS DOS ALCOÓLICOS ANÔNIMOS

PRIMEIRO PASSO:

Admitimos que éramos impotentes perante o álcool - que tínhamos perdido o

domínio sobre nossas vidas.

SEGUNDO PASSO:

Viemos a acreditar que um Poder superior a nós mesmos poderia devolver-nos à

sanidade.

TERCEIRO PASSO:

Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida aos cuidados de Deus, na forma

em que O concebíamos.

QUARTO PASSO:

Fizemos minucioso e destemido inventário moral de nós mesmos.

QUINTO PASSO:

Admitimos perante Deus, perante nós mesmos e perante outro ser humano, a

natureza exata de nossas falhas.

SEXTO PASSO:

Prontificamo-nos inteiramente a deixar que Deus removesse todos esses defeitos

de caráter.

SÉTIMO PASSO:

Humildemente rogamos a Ele que nos livrasse de nossas imperfeições.

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OITAVO PASSO:

Fizemos uma relação de todas as pessoas que tínhamos prejudicado e nos

dispusemos a reparar os danos a elas causados.

NONO PASSO:

Fizemos reparações diretas dos danos causados a tais pessoas, sempre que

possível, salvo quando fazê-las significasse prejudicá-las ou a outrem.

DÉCIMO PASSO:

Continuamos fazendo o inventário pessoal e, quando estávamos errados, nós o

admitíamos prontamente.

DÉCIMO PRIMEIRO PASSO:

Procuramos através da prece e da meditação, melhorar nosso contato consciente

com Deus, na forma em que o concebíamos, rogando apenas o conhecimento de Sua

vontade em relação a nós e forças para realizar essa vontade.

DÉCIMO SEGUNDO PASSO:

Tendo experimentado um despertar espiritual, graças a estes passos, procuramos

transmitir esta mensagem aos alcoólicos e praticar estes princípios em todas as nossas

atividades.

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ANEXO B

ENTREVISTA ESTRUTURADA

Dados sócio-demográficos:

Idade:

Sexo:

Religião: Católica ( )

Espírita ( )

Evangélica ( )

Outras ( )

Sem religião ( )

Estado Civil:

Início do consumo de bebida alcoólica:

1 – O que o álcool significa / representa para você?

2 – O que você senti a partir do contato com o álcool?

3 – Como era sua vida social no contato com o álcool?

4 – Qual o significado do seu tratamento para você?

5 – Como você se sente no tratamento?

6– Como é sua vida agora com o tratamento?

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ANEXO C: TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO

Este documento visa solicitar sua participação na Pesquisa “As Representações

Sociais que os alcoolistas elaboraram acerca do alcoolismo e de seu tratamento na

cidade de Teresina – Pi”.

Por intermédio deste termo são-lhes garantidos os seguintes direitos: (1) solicitar,

a qualquer tempo, maiores esclarecimentos sobre esta Pesquisa; (2) sigilo absoluto

sobre nomes, apelidos, datas de nascimento, local de trabalho, bem como quaisquer

outras informações que possam levar à identificação pessoal; (3) ampla possibilidade

de negar-se a responder a quaisquer questões ou a fornecer informações que julguem

prejudiciais à sua integridade física, moral e social; (4) opção de solicitar que

determinadas falas e/ou declarações não sejam incluídas em nenhum documento

oficial, o que será prontamente atendido; (5) desistir, a qualquer tempo, de participar da

Pesquisa.

“Declaro estar ciente das informações constantes neste ‘Termo de Consentimento

Livre e Esclarecido’, e entender que serei resguardado pelo sigilo absoluto de meus

dados pessoais e de minha participação na Pesquisa. Poderei pedir, a qualquer tempo,

esclarecimentos sobre esta Pesquisa; recusar a dar informações que julgue prejudiciais

a minha pessoa, solicitar a não inclusão em documentos de quaisquer informações que

já tenha fornecido e desistir, a qualquer momento, de participar da Pesquisa. Fico

ciente também de que uma cópia deste termo permanecerá arquivada com o

Pesquisador responsável por esta Pesquisa”.

Teresina, ____ de _____________________ de 200__

Participante: _______________________

Assinatura do Pesquisador:

___________________________________

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ANEXO D: APROVAÇÃO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA