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Andre Lemos, 2002
Capa :
Mari Fiorelli
Foto:
fonso
Jr
Ptojeto gnifico e editorac,:ao : Daniel Ferreira da Silva
Revisao: Caren Capaverde
Editor:
Luis ntonio Paim Gomes
Dados Intemacionais de Catalogac,:ao na Publicac,:ao ( CIP
Bibliotecaria Responsavel: Ginamara Lima Jacques Pinto CRB \0/1204
L557c Lemos, Andre
Cibercultura: tecnolog
ia
e
vi
da social na cultura contemporiinea
Andre Lemos. - 7 ed. - Porto Alegre: Sulina, 20 15
295 p
(Colel iio Cibercultura)
ISBN: 978-85-205-0577-9
I. Sociologia. 2. Cultura - Midia. 3. Cibercultura. 4. Tecnologia
da lnformal ilo. I Titul
o
Todos os direitos desta edivao reservados
a
EDJTORA M ERID IONAL LTDA.
Av
Osvaldo Aranha, 440 cj. I
01
Cep: 90035-190 PortoA1egre-RS
Tel: (051) 3311-4082
www.editorasulina.com.br
e-mail: [email protected]
{Janeiro/2015}
COD: 301.243
CDU: 3 16
lMPRESSO NO
BRASILfPRl
NTED IN B RAZIL
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C PiTULO
I
N SCIMENTO
D CIBERCULTURA:
A MICROINFORM TIC
Vamos situar o nascimento da cibercultura no surgimento
da microinformatica na metade dos anos 1970. A cibercultura,
embora a expressao deva muito a cibemetica, nao e, no sentido
exato, correlata a esta ciencia. Antes, a cibercultura surge como
os impactos socioculturais da microinformatica. Mais do que uma
questao tecnol6gica, o ue vai marcar a cibercultura nao e somente
0
potencial das novas tecnologias, mas uma
a t i t u d e ~ e
no mefo
dosa nos- 1970
:-
TnJI.uencia a pela c o f h : _ a
l l t u r
a m ~ r i f a n a
a e j i ~
cOnifao poOeit ec
iiOCrat
ic
o.
(T lema da microinformatica sera:
c
orriputadores para
0
povo-' -
(
computer
to
the people ).
0
advento de
~ y n o g g j ~
9 9
c o m p u t ~ d o r
pode ser explicado
por tres condi9oes
b i s t q r j ~ a s .as
_
s m < i
9
e ~ n i c a ~ o c i
~
e
ol6gica (Breton
6
.
A informatica sera uma ciencia (baseada na
cibernetica) de produyao, organizayao, armazenamento e distribui
yi io automatizada da in formayao, agora traduzida em its (c6digos
binarios tipo 0 e 1). A informatica e, assim, uma forma de aliar o
conhecimento da natureza
as
formas de funcionamento da sociedade
moderna. Cria-se a possibilidade de leitura da realidade, traduzida
pela linguagem digital , automatizando a
informayao.
Como vimos, o mundo da modemidade e o mundo quanti
ficado atraves da matematica e das tecnologias anal6gicas. Aq ui , a
aproximayao matematica, quantitativa e experimental da natureza
e a base do racionalismo analitico e dedutivo modemo, herdeiro de
Descartes. A organizayao sociopolitica e a administra9ao burocratica
e racional da vida social generalizou-se. A cibercultura tern origem
nesse mundo hiperquantificado, hiper-racionalista, que tenta inte
grar, ou melhor, traduzir, e nao mais representar a natureza atraves
das tecnologias digitais. Essa condi9ao tecnica, da qual a cibercul
tura e sua consequencia, e resultante do progresso da matematica e
das ciencias a partir dos meados do seculo XVII .
A forma9ao da microinformatica deve-se ao desenvolvimento
de domfnios cientfficos a partir dos anos 1940: a cibemetica ( 1948),
a inteligencia artificial (1956), a teoria da auto-organizayao e de
99
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i
te rnas (dos anos 1960), a tecnologia de comunica
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Breton, a separavi'io entre a informatica e a cibernetica provem,
talvez, em parte das tomadas de decisao de Wiener hostis a
in
s
ti
tuivi'io militar [ ..]. 0 fundador da cibernetica foi entao marg inal em
relavi'io a tudo que tocava de perto ou de Ionge ao computador [ . ].
Wiener foi [ ] um dos primeiros a se interrogar sabre os desafios
eticos e S US S SOCiais desses novas dominios
208
.
Como explicitado em Cibernetica e Sociedade
209
, Wiener
preve uma estrategia de pilotagem informacional da vida socia
l
A primeira informatica vai ser concebida como uma utopia, cujo
objetivo e a transformayi'iO do homem e da sociedade. A invenyi'iO
de computadores desvincula-se da compreensao sabre que e
homem e
sab
re quais seriam os impactos dessas maquinas em meio
a
sociedade, migrando para 0 desenvolvimento de maquinas que
tratarao (de forma meciinica) a informavi'io - basicamente, calcular
e contar.
Nao
e
a
oa que a maquina chama-se computer - aquele
que conta ; ou ordinateur - aquele que poe
ordem,
automatiza,
classifica. A informatica segue, agora, desvinculada da metafisica
cibernetica, sendo concebida dentro dos idea is modernos de uma
utopia tecnol6gica. Busca-se a transformavi'io e a administravi'io
racional da sociedade. 0 modelo sera um
pool
formado pela IBM ,
militares, universidades e institutos de pesquisa.
Embora
a microinformatica popular s6 surgisse em meados
da decada de
1970,
precursores do que viria a ser a revoluvi'io da
informatica pessoal (e do ciberespa9o) come9avam a pensar em
tornar o
computador
mais amigavel desde os anos
1940.
Nessa
decada o
problema
da informavi'io preocupa os cientistas. Vanevar
Bush, coordenador de pesquisa das forvas armadas americanas,
em
meio a
uma
profusao de informavi'io, inventa uma metamaquina
(nunca realizada) para ajudar
os
cientistas a armazenar e indexar
informa96es nos seus diversos campos de pesquisa, o Memex .
Outros pioneiros, como Engelhart e Licklider, vao
cunhar
no96es
como interface e ambiente de resposta. Doug
Enge
lhart e
sua
equipe
do
Stanford Research Institute (SRI) inventa a interface
WYSIWYG
( what you see
s
what you g t - o
que voce ve e o
que voce tem
)
, o processador de texto , o
mouse
e as
janelas
com
os menus. J.C. R. Licklider, pesquisador em psicologia, vai levar
adiante a ideia de interatividade e
propoe uma relavi'io simbi6tica
entre o homem e o computador.
Como vemos, a persp
ect
iva de interatividade foi discemida
muito cedo. Nos anos 1960, urn real impulso foi dado pelas pes-
1 1
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quisas de Ivan Sutherland como Sketchpad (1963), urn software
onde o usmirio atua diretamente sobre a tela do monitor com uma
light pen. Esse programa abriu o campo da computa
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da informatiza
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A micro informatica vai acentuar a democratiza
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Marc Guillaume
218
vai desenvolver o conceito de espectral idad
para tentar dar conta dos novas mecanismos postos em pnitica pela
tecnologias microeletronicas. Segundo ele, a
rela
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As representavoes programadas e taticas podem
ser
aplica
das aquilo que Guillaume chama de teletechnologies as tecnologias
da informavao e
da
comunicavao. Essas as constituem os pilares
da cibercultura, respondendo a urn desejo de escapar parcial e mo
mentaneamente aos constrangimentos simbolicos da modernidade
e seus funcionalismos totalitarios. 0 proprio sujeito individualista,
filho da modernidade, torna-se urn espectro, porque desaparece para
vagar em uma ordem simbolica que se tornou transparente.A espec
tralidade torna-se urn fenomeno de massa
ja no come9o do seculo
XX, com a difusao dos filmes em salas de cinema, com o radio e,
posteriorrnente, a televisao, hoje entrando em sua fase mais virotica
com a aparivao
da
micro informatica e das redes telematicas. Assim
existe comunicavao espectral quando aqueles que dela participam
a podem fazer ficando eventual, parcial e provisoriamente, sem
nome, sem identidade definida, escapando aos constrangimentos
da
identidade
22
Os indivfduos espectrais reagem a funcionalidade racional e a
homogeneidade de comportamentos, procurando identifica9oes su
cessivas
222
Para Guillaume, o que caracteriza a sociedade pos-modema
e a sensavao dessa subversao pelo anonimato. Deleuze e Guattari, em
outro registro, mostram a espectralidade como desejo individual de se
tomar nomade, imigrante na sua propria cidade, corpo e subjetividade.
Embora os
tres nfveis de avao da tecnica propostos por Guillaume
estejam presentes na contemporaneidade e na cibercultura, parece-nos
que o surgimento da cibercultura deva muito ao nfvel da apropriavao
social,
ao
nfvel tatico. Podemos dizer que a mi ro informatica nao seria
mais culminada pela esperanva utopica [
]mas
ela se aproximaria da
subversao, aqui e agora, pelo seu uso menor
223
.
A ideia de ruptura radical transforma-se em uma mistura de
desconfian9a e de apropriavao (simbolica e quotidiana) das novas
tecnologias. Se nao ha
urn
futuro possfvel , se a historia, com seus
componentes ideologicos (futuro, progresso, razao ), nao tern suporte
social mobilizador, entao, a t'mica safda e tomar nas maos o destino
tecnologico. Essa apropriavao desesperada da tecnologia contem
poriinea e visfvel atraves dos virus de computador, dos hackers da
realidade virtual , do cibersexo, das comunidades virtuais. A historia
da microinformatica mostra que, na sua origem, a cibercultura e
consequencia da atitude social em relavao a informatica.
m 1972, a revista radical People Computer Company
(PCC), do suburbio industrial de Sao Francisco, cria urn banco de
1 6
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dados eletronico urbano acessivel e util a comunidade. urgem
os primeiros BBSs
Bulettin Board Systems).
Bob Albrecht, urn
dos idealizadores, propoe a essa comunidade uma base de dado
disponivel em rede telematica que funcionasse como urn centro
onde crian
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decada de 1970 propunham a informatica para todos, os internautas
da decada de 1990 propoem a conexao genera
li
zada. A microinfor
matica, berc;o da cibercultura, surge na sinergia da qual falavamos
entre a socialidade e as tecnologias digitais. Nesse sentido, o cana
dense S. Proulx vai analisar os movimentos sociais que se formam
em
torno da
mi
croinformatica
par
a mostrar que a informatizac;ao da
sociedade e urn processo social: "Desde o nascimento da microin-
1
ormatica na California no comec;o dos anos 1970, os primeiros
hackers
se associam a urn movimento social que prega a contestac;ao
',do poder do
establishment
que controla a grande informatica"
225
.
Longe de uma racionalizac;ao simples de praticas, a tecnologia e
motor de mitologias e e, nesse se
nti
do, que
C
Miguel vai mostrar que
a pratica da microinfonnatica nao corresponde ao imaginario de
um
a
maquina objetiva, como qualquer objeto tecnico funcional. Ao con-
trario, o computador e portador de urn universo imaginario complexo,
com uma micromitologia propria, sendo visto como
urn
objeto para
doxa , ao mesmo tempo ferramenta de organizac;ao e de administrac;ao
racional da vida social, e objeto sagrado, onde individuos participam
de urn pensamento magi co, de uma hierofania quotidiana. Como afir
ma Miguel, "a pesquisa pennitiu, nesse sentido de confirmar [ .
]que
,
na nossa sociedade, o sagrado crista liza-se de maneira eremera sobre
urn objeto tecnico".
226
As fonnas de interatividade e de interfaces vao
aguc;ar ainda mais essa sacra
li
zac;ao das novas tecnologias.
lnteratividade interface
/ When yo u are interacting with a
comp
ut
er
, you are n
ot
co
nvers
in
g
1
with anoth
er
person . You are exploring another world .
J OHN
W
ALKER
227
A interface grafica e as novas formas de interac;ao homem
maquina foram decisivas para a apropriac;ao social dos microcompu
tadores.
Os
estudos de
r
enda Laurel sobre interfaces e interativida
de mostram bern como as novas tecnologias oferecem possibilidades
para experiencias
cr
iativas e interativas, particularmente na forma
do drama. Ja nos primeiros jogos eletronicos vemos a capacidade
das novas maquinas informaticas
par
a representar "ac;ao no qual
humanos podem participar"
228
H
Como vimos, o presenteismo e a t
ea
tralidade da vida social
ulili zar o potencial das novas maquinas digitai
s
Essa teatra-
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lidade quotidiana sera levada em conta no desenvolvimento da
interface homem-computador
229
A no
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interfaces urn paralelo com o papel do diretor de teatro : Ambos
criam representayao de objetos e ambientes que criam urn contexto
para a
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tecnica, de cunho eletronico-digital, diferente da intera9ao anal6gi a
que caracterizou os media tradicionais.
Experimentamos, todos os dias , formas de intera9ao ao
mesmo tempo tecnicas e sociais. Nossa rela9ao com o mundo e
urna rela9ao interativa em que as a96es variadas correspondem a
retroa96es das mais diversas. Essa intera9ao funda toda a vida em
sociedade. Vamos tratar aqui nao da intera9ao social, mas do que
severn chamando de interatividade (digital) relacionada aos novos
media (em bora esta esteja sempre ligada
a
primeira). Is so pressupoe
delimitar a interatividade como uma a9ao dia16gica entre o homem
e os objetos tecnol6gicos.
A tecnologia e, e sempre foi, inerente ao social. Utilizada
no seu sentido mais amplo, ela e constitutiva do homem e de toda
vida em sociedade. A intera9ao homem-tecnologia e uma atividade
tecnossocial presente em todas as etapas da civiliza9ao. 0 que vemos
hoje, com as tecnologias do digital, nao e a cria9ao da interatividade
propriamente dita, mas de processos baseados em manipula96es de
informa96es binarias.
lnt
r t
iv
de e
i n t e r ~ o
soci l
Urn exemplo quotidiano qu ndo falamos em intera9ao
tecnossocial e 0 transito. 0 fluxo de autom6veis depende de urn
sistema interativo, auto-organizante e participativo. No transito, o
motorista participa de urn processo duplamente interativo: de urn
lado, uma intera9ao com a maquina, que chamaremos de anal6gico-
eletromec{mica
23S
e de outro, uma intera9ao com os carros (mo
toristas) que chamaremos simplesmente de
interar iio
sociaP
A
interatividade e, ao mesmo tempo, uma intera< ilO tecnica (de tipo
analogico-mecanico) e social,_,
0 telefone e urn outro exemplo desse tipo de intera9ao, mas,
aqui, a intera9ao e basicamente social, existindo uma reduzida in
tera9ao
como
terminal, de tipo anal6gico-mecanica. Essa limita-se
composi9ao do numero desejado atraves das teclas do aparelho
(sua interface), sendo a intera9ao
como
outro o que faz do telefone
uma ferramenta convivial, no senti do dado por Illich. Para Illich, o
telefone e urn exemplo de convivialidade, pois nenhum burocrata
podera fixar a priori o conteudo de uma comunica9ao
237
Existe,
com o telefone, uma forte intera9ao social , numa fraca intera9a0
tecnica. Como diz Negroponte, o telefone nao e inteligente (inter
a-
l l
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tivo ), pois
0
que queremos fazer com ele e falar com
0
outro, nao
pegar o telefone, esperar a linha, discar os numeros etc...
238
) Podemos ter como hip6tese (e varios exemplos aparecem a
,cada dia) que a evolw;ao da
relac;;ao
homem-tecnologia vai nesse
sentido, ou seja, no privilegio
da interac;;ao
social e no
mento_progressivo da interatividade tecnica. Vamos em direc;;ao a
. rna i nterface '
:Zero
a-uma simbiose completa, cujo
exemplomaior
e
a
realidade
vlrtiTa1
como veremos nos pr6ximos capitulos.
Se pensarmos sobre o percurso tecnol6gico da televisao,
poderemos ver, com clareza, a evoluc;;ao
da
interac;;ao
tecnica em
urn
aparelho de pouca
interac;;ao
social, embora muitos autores insistam
sobre o carater coletivo e tribal da televisao, principalmente com
a noc;;ao de missa televisiva. Num primeiro momenta, que vou
chamar de interac;;ao nivel 0, a TV e em preto e branco, com apenas
urn ou do
is
canais. A interatividade aqui e limitadaa c;;ao de ligar ou
de desligar o aparelho, regular vo lume, brilho ou contraste. Depois
aparece a TV em cores e outras opc;;oes de canais.
0
controle remo
ta
vai permitir que 0 telespectador possa
zappear,
isto e, navegar
por
emissoes e cadeias de TV das mais diversas, instituindo uma
certa autonomia
da
telespectac;;ao
239
(nivel 1 . zapping e assim
urn antecessor da navegac;;ao contemporanea na
World
id
e
eb
WWW
ou Web).
No
nivel2,
alguns equipamentos invadem a televisao, como
o video, as camaras portateis
ou
os consoles de
jogos
eletr6nicos,
fazendo com que o telespectador se aproprie do objeto TV (para
outros fins, como ver videos ou jogar) e das emissoes (gravar e
assistir ao programa
na
bora que quiser), instituindo
uma
tempo
ralidade propria e independente do fluxo das mesmas. Eno nivel
3 que aparecem sinais de uma interatividade de cunho digital , em
que o usuario pode interferir no conteudo das emissoes a partir de
telefones, fax ou e-mail. No nivel4 , em que estamos atualmente, a
chamada televisao interativa surge, possibilitando a participac;;ao,
via telematica, ao conteudo informativo das emissoes em tempo real
( escolher angulos e cameras, por exemplo) como a experiencia do
Videoway
no Canada
240
,
por
exemplo.
A televisao tradicional permite uma
interac;;ao
com a maquina,
tipo anal6gico-digital (ligar,
zappear ,
sem permitir uma
interac;;ao
direta e mais ampla (que a simples votac;;ao por telefone) com o
conteudo das emissoes, o que seria uma interatividade eletr6nico
digital. Embora emissoes brasileiras como Voce Decide, ou Inter-
112
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cine sejam interativas num sentido lato
24 1
, a interatividade se limita
aqui a uma escolha entre duas ou tn s op96es a partir de ligayoe
telefOnicas. A emissao Hugo (jogo eletronico pela televisao com
manipulayao do personagem central) incorpora elementos de uma
verdadeira V interativa, ja que, a partir das teclas do telefone,
o espectador se transforma em jogador e modifica o conteudo da
emissao, no caso, o resultado do jogo. A televisao digital interativa
pode viabilizar, ao mesmo tempo, intera96es medinico-anal6gica
(com a maquina), eletronico-digital (com o conteudo) e social.
Como exemplo dessa fusao, temos a experiencia da Piazza Virtuale
como veremos a segUir
Assim, alem da interatividade de tipo anal6gico-mecanica
e da intera9ao social, podemos dizer que os novos media digitais
vao proporcionar uma nova qualidade de interayao, ou o que cha
mamos hoje de interatividade digital : uma interayao tecnica de
tipo eletronico-digital correspondendo
a superayao do paradigma
anal6gico-mecanico.
Como vimos, a revoluyao digital possibilita o que chamamos
aqui de uma terceira interatividade, a interatividade de tipo eletronico
digital. Podemos no tar que a interatividade se situa em tres niveis nao
excludentes: tecnico anal6gico-mecanico, tecnico eletronico-digital
e social (ou simplesmente interayao). A interatividade digital e urn
tipo de relayao tecnossocial e, nesse sentido, "urn equipamento ou
urn programa e dito interativo quando seu utilizador pode modificar
o comportamento ou o desenrolar"
242
A tecnologia digital possibilita
r
ao usuario interagir, nao mais apenas como objeto (a maquina ou a I
ferramenta), mas com a informayao, isto e, como conteudo. Jsso vale \
tanto para uma emissao da televisao interativa digital, como para os
leones das interfaces graficas dos microcomputadores, como vimos.
A interayao homem-tecnologia tern evoluido a cada ano
no sentido de uma
relayao mais agil e confortavel. Vivemos hoje
a epoca da comunicayao planetaria fortemente marcada por uma
intera9ao com as informa96es, cujo apice e a realidade virtuaJ2
43
A interatividade digital caminha para a superayao das barreiras
fisicas entre S agentes (homens e maquinas) e para uma interayiiO
cada vez maior do usuario com as informay5es, e nao com objetos.
Epor isso que Manzine fala da interatividade digital como "[ ..]
uma interatividade cujo programa nao esta inscrito na forma fisica
macrosc6pica do objeto, masse encontra gravado nos suportes ele
tronicos ( cuja forma fisica escapa a nossa
escalade
percep9ao)"
244
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Essa nova qualidade da interatividade (eletronico-digital),
com os computadores eo ciberespa
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Internet 0 c i b e r e s p a ~ o planetaria
In cyberspace, there is no need to move about
it
in has leotard like
tea one you possess
in
physical reality. [ ..] Imagine has costume
party at which you adopt not merely has new set
of
clothes, goal
has new leotard, has new voice, and-in has very fundamental and
literal judicious-has identity new.
249
A [ntemet, urn conjunto
de
redes planetarias de base tele
matic
a,
come
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A Internet, como foi a microinforrmitica, ao menos em sua
c o n f i g i l l ~ o atual, nao
eo
resultado somente de uma estrate Ia tecno
cnitica de cima para baixo, mas 0 produto de uma p r o p r i ~ o soCial
Ela age como potencial descentralizadora do podertecnoindustrial
mediatico, abrindo uma rede verdadeiramente aberta e acessivel [ ]
urn ambiente de expressoes onde nenhum governo pode controlar
252
Como exemplos desse ambiente aberto, e de dificil controle, po
demos citar as
i n f o r m a ~ o e s
passadas ao Ocidente pelos estudantes
da
p r ~
Tiananmen na China, ou aquelas sobre o golpe de Estado
na ex-Uniao Sovietica, ou, recentemente, as ideias dos zapatistas
mexicanos, sem contar todo o movimento sobre o direito autoral
(MP3) ou
as
formas de emissao de
i n f o r m a ~ a o
que nao necessitam
mais do poder mediatico chissico. Bruce Sterling mostra que no
caso do golpe na Russia era impossivel para o poder geriatrico do
Kremlin suprimir a
d i s s e m i n a ~ a o
da verdade. Mensagens de fax e
e-mail deixaram a p o s i ~ a o mais informada dos desenvolvimentos
do que a KGB com seu sistema de i n f o r m a ~ a o hierarquico poderia
possivelmente ser
253
.
historia da grande rede
A ideia de unir computadores em rede e desenvolvida por Bob
Taylor, diretor em 1966 do DARPA, Departamento de Projetos de
Pesquisas v a n ~ a d a s da Agencia de Defesa Americana
254
Urn dos
passos fundamentais foi dado em 1969, quando o processador de
mensagens e construido em urn minicomputador na Universidade
da California em Los Angeles (UCLA). Esse foi o primeiro ponto
da entao rede Arpanet
255
m 1980, Darpanet se dividiu em duas
novas redes: Arpanet (cientifica) e Milnet (militar). No entanto,
as
conexoes feitas entre as duas redes permitiram continuar a troca de
c o m u n i c a ~ o e s
eletronicas. Essa interconexao foi chamada de
Darpa
nter et no principio, ou somente Internet, limitada aos cientistas
e militares .
Surgem depois redes cooperativas e descentralizadas como
a UUCP (em UNIX) e a Usenet Users Network) , ja na decada de
1970, para servir a comunidade academica, a sociedade em geral
e depois as
o r g n i z ~ o e s
comerciais. No principio dos anos 1980,
as redes CSNET Computer Science Network) e a Bitnet Because
ts
time to Network)
expandiram ainda mais a Internet. A o r r n ~ o
da rede NSFNET National Science Foundation Network), unindo
6
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21/30
alguns investigadores americanos a cinco centros com supercom
putadores, transforma-se no grande marco da hist6ria da Internet. A
NSFNET substituiu a Arpanet, que desapareceu em man;o de 1990,
e a CSNET, extinta
em
1991 . Hoje a Internet e formada
por
mais
de 8.000 redes, interligando todos os continentes. A Internet nao s6 \
esta em expansao em numero de usuarios, mas tambem em tipos
de aplicac;:oes. Atualmente, o grande projeto e a Internet 2, criada
para ligar, a altas velocidades, centro de pesquisa e universidades
256
.
A Internet, como uma rede de redes, e formada por LANs
Loc
alAr
ea Networkou Redes Locais), MANs
M
etropolitan Area
Network ou Redes Metropolitanas) e WAN World Area Network
ou Redes Mundiais). Essas sao conectadas por redes telefonicas, ,
satelites, micro-ondas, cabos coaxiais e fibras 6pticas, permitindo a
comunicac;:ao com os computadores que utilizam protocolos comuns
(regras e acordos que permitem o vinculo e a comunicac;:ao entre
maquinas diferentes). 0 idioma de computadores na rede Internet
eo
protocolo TCP/IP Transmission Control Protocol/Internet Pro
tocol), desenvolvido nos anos 1970 no Darpa e usado pela primeira
vez em 1983 na Arpanet. 0 interessante a ser ressaltado aqui e que
o TCP/IP foi desenvolvido com capitais publicos sendo, desde
1
sempre, considerado livre, significando que nenhuma companhia
possui seu monop61io. A Netja nasce com este espirito: o TCP/IP
e demais softwares basicos que perm item acessar a grande rede sao
gratuitos e disponiveis em varios servidores ao redor do mundo.
A rede Internet e composta de hierarquias diferentes: as redes
centrais de alta velocidade high-speed central networks) e os back
bones, ou espinha dorsal. Existem redes de nivel medio mid-level
networks) ,
que se ligam aos
backbones
e distribuem a informac;:ao
para
OS
usuarios. Como explica LaQuey, nao existe nenhuma gestao
centralizada da rede: Gente e a palavra operativa aqui. A Internet
parece ser institucional e anti-institucional ao mesmo tempo, mas
siva e intima, organizada e ca6tica. Em urn sentido, a Internet e urn
empreendimento cooperativo ..
257
Toda a organizac;:ao dos computadores da Internet e es
truturada
com dominios
especificos para cada maquina. 0 DNS
Domaine Name System) normaliza nomes dos computadores: edu
(educac;:ao), com ( comercio), gov (governo , mil ( exercito ), org (or
ganizac;:oes) etc. Duas letras-c6digo identificam o pais (normalmente
os EUA nao tern nenhuma terminac;:ao) como fr para a
Franc;:a
,
br para Brasil e assim sucessivamente. Outras redes, que tern
7
7/26/2019 Lemos (2015) - Parte III, Captulo 1 (p. 99-126)
22/30
protocolos de transferencia de arquivo diferentes, fora da Internet,
sao chamadas de outernets. Essas podem ser interconectadas
a
grande rede por e-mail atraves de e-mailgateways ou passarelas
para troca
e
correio eletr6nico. As redes mais conhecidas nesse
genera sao FidoNet, Bitnet, UUCP, CompuServe, America Online
etc. Outro servis;o/rede disponivel na Internet e o network news ou
Usenet. Essa rede e dividida em newsgroups tematicos formados
por artigos onde qualquer pessoa pode participar. Voltaremos a esse
ponto mais adiante quando formos analisar as comunidades virtuais.
A Internet oferece varias ferramentas para a navegas;ao em
seu ambiente, agindo como uma verdadeira incubadora mediatica,
j
que da espas;o para a crias;ao de diversos dispositivos comuni
cacionais, como o correio eletronico e-mail); o programa telnet
que permite a conexao remota a outros computadores ); o FTP files
tr ner protocol -
para transferencia de arquivos, permitindo a troca
de arquivos de forma anonima); o WWW World Wide Web ou Web,
a parte multimidia e mais popular hoje da Internet, que permite a
navegas;ao por paginas de informas;ao homepages, sites) atraves de
links,
lexias hipertextuais que induzem a navegas;ao de informas;ao
em informas;ao, de site em site, de pais em pais atraves de
softwares
como o antigo Mosaic ou os atuais Nestcape, Explorer ou mesmo
o magrinho Opera; os agentes inteligentes,
softwares
que buscam
informas;ao
a
a carte para o usuario como o Archie, WAIS, entre
outros; o IRC, ou Internet Relay Chat, ICQ, Gooey e outros que
permitem o dialogo em tempo real, sincronico entre usuarios . Cada
dia novas ferramentas midiaticas sao incubadas na rede.
Urn dos instrumentos mais interessantes sao
OS
chamados
Agentes Inteligentes.
gentes
Os agentes inteligentes estao em franca expansao, desde ma
quinas de busca que cruzam informas;oes de diferentes servidores
ao redor do mundo ate programas particulares que efetuam pesquisa
para seus usuarios. 0 excesso de informas;ao obriga a construs;ao de
dispositivos que possam auxi
li
ar os usuarios e aprender com seus
costumes. Passaremos, assim, a delegar a urn agente inteligente
eletronico a tarefa de encontrar informas;oes que desejamos.
Alguns programas foram desenvolvidos nesse sentido an
tes da Web e tern hoje uma funs;ao marginal, como o ARCHIE
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(desenvolvido por Paternoster Deutsch na McGill Univer ity m
Montreal), que procura informa
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a casa-escola), nas redes telematicas (ou a casa-enciclopedia), nos
diversos dispositivos de telecompras ( ou a casa-shopping) etc.
c ~ l t u r vai, pouco a pouco, red_
fipinQOJlQSSa
pratica do
e_s_pas o
e do tern
oparticularinente
no que se refere ao novo nomadismo
tecnol6gico e as fronteiras entre o espas;o publico
eo
espas;o privado.
Com os telefones celulares, os fax, os computadores portateis, mo
dem e satelites, estamos em casa o tempo todo. Como disse Barlow
num evento multimfdia em Amsteroa, rii'i"nhacasa e meu e-mail"
258
0 espas;o privado se imbrica no espas;o publico e vice-versa, numa
verdadeira publiciz
as ao
do privado e de privati z
as ao
do publico.
0 tempo real da comunicas;ao instantiinea
eo
espas;o fisico
comprimido e dilufdo na fronteira eletronica do ciberespas;o criam
uma contradis;ao entre o imobilismo da casa e o nomadismo pro
porcionado pelas novas tecnologias. Essas permitem que eu esteja
em qualquer Iugar sempre conectado. Assim, quanto mais a casa
e perfurada por canais que nos unem as infom1as;oes binarias que
nos chegam do mundo, mais nos tomamos nomades, cowboys do
ciberespas;o, armados de maquinas de comunicar (computadores
portateis, celular
wap pagers
celulares,pa/m
computers
.
Podemos,
assim, agir como nomades, num modo de exflio permanente. Mais
uma vez, nao e o espas;o fisico que conta (minha casa real) , mas
o ciberespas;o (meu enderes;o eletronico, minha home
p g
e meu
numero ICQ, meu p ger ..
.
A casa ja e, nas sociedades modern as, uma estrutura porosa,
mesmo que supostamente limitada fisicamente por paredes, portas
e janelas. Essa porosidade e subterriinea, escondida em redes que
nos entregam, diariamente, o fluxo material e informacional do
mundo (radio, TV, esgoto, agua, luz, correio etc). Ao acordarmos
pela manha, deparamo-nos com urn mundo que esta dentro de casa:
eletricidade, esgotos, caixas de correio, ondas de radio e televisao,
telefone. A casa e assim urn hardware, uma ilha, uma especie de
machine avivre, como di zia o arquiteto Le Corbusier.
No entanto, o hardware-casa nao faz
urn Jar
, nao funda o meu
Iugar. 0 meu Iugar nao e
urn
hardware, mas tudo aquilo que me
faz reconhecer esse Iugar como meu. 0
Jar
e assim uma especie de
software da casa,
urn
con unto de c6digos e programas que nos faz
ter a sensas;ao de estar no
chez moi.
0 lar e produtor de sensas;oes
particulares e simb6licas, urn espas;o de rriem6ria, subjetividade e
intimidade. 0 Jar e o nao espas;o da casa. Ritualizado e mftico, o
Jar e a alma da casa e o parafso de nossa individualidade privada.
12
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25/30
E aqui que n6s somos, de uma vez
por
todas, n6s mesmos, qu
nos diferenciamos dos outros, tentamos evitar as interferencias d
espavo publico. Aqui, o tempo nao e mais aquele de
Cronos
linear
e positivo, mas o
Kair6s
circular: o tempo do dia a dia para, dei
xando ftuir o meu tempo . 0 lar caracteriza-se por ser urn espavo '
imagimirio, simb61ico; urn conjunto de pniticas concretas e rituais
imaginarios que fazem de minha casa algo sem igual.
Hoje, com a Internet, o meu lar-casa torna-se o ponto de
aglutinavao de informavao, como uma especie de buraco negro
onde entram, alem das formas tradicionais de captayao de materia,
energia e
informavao, palavras, imagens e sons do ciberespayo. Mas,
aqui, introduz-se uma diferenya fundamental: lar-casa tambem e
urn ponto de disseminayao de espectros e fantasmas pelo ciberes
payo: os agentes inteligentes, programas que circulam buscando
informav5es distantes e precisas, via ciberespayo.
Os agentes vao circular no ciberespayo em busca de infor
mavao personalizada, transformando-o num imenso ecossistema.
Como os cachorros que vao procurar o chinelo dos seus mestres,
os agentes inteligentes, a partir de instruv5es dadas pelo usuario,
realizam diversas tarefas, como buscar urn artigo em urn banco de
dados, passar pedidos de compras, ordenar informavao nos jornais
eletronicos, filtrar discussoes nas conferencias eletronicas, procurar
uma musica, guiar em
urn
servivo eletronico ..
ip rt xto
0 hipertexto mundial que e o ciberespayo fez com que os
produtores culturais mudassem suas formas de concepyao dos
conteudos de seus produtos. Assim, se com o
broadcasting
os
produtores tinham como objetivo realizar uma programavao que
captasse a audiencia de forma homogenea, com os novos
media
digitais interativos o que esta em
jo o
e urn
metadesign
ou seja,
o design de ferramentas, parametros e condiv5es de operavao
que permitem ao usuario final a tarefa de interativamente fazer
design final
25
9
.
Esse
metadesign
deixa livre o utilizador para que
ele participe tambem do processo de concepvao em processos hi
pertextuais com urn CD-ROM ou os sites na
Web
Estabelece-se,
dessa forma, urn processo nao linear de concepyao e de utilizayao
(interatividade) dos conteudos, em que a realizavao da obra, ou da
ayao como diria Laurel, e impossivel sem o usuario. Se nao intera-
121
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girmos com os hipertextos, seja ele urn site ou
urn jogo
eletr6nico,
nada acontece, e a
a
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Dessa forma, a leitura nao e mais, necessariamente, linear. Ia
transforma-se em urn estado de "aten
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contar est6rias, porque o hipertexto sempre coloca uma redefinic;:ao
entre corpo e
espac;:o
269
.
Tecnicamente, o hipertexto e uma forma de or aniz - da
~ c ; _ a o
p o s s i b i l i t d pelos
avanc;:os
dainformatica, traduzindo
se
em
urn conjunto de n6s, ligado por conexoes, permitindo a
explorac;:ao atraves de urn processo de 'leitura-navegac;:ao' nao
linear e associativo, descentralizado e rizomatico
270
Aqui, instala-se
uma sequencia de processos interativos e criativos - advindos das
possibilidades de traduc;:ao
, transforrnac;:ao e passagens atraves de
conexoes multiplas em velocidade. Longe de ser apenas urn novo
suporte tecnico para a
inforrnac;:ao, os hipertextos problematizam as
formas de conceber a
produc;:ao
e apreensao da informa
c a
o e do co
nhecimento, ao mesmo tempo que urn rearranjamento do espac;:o
27
1
Landow
272
vai alem, ressaltando que os hipertextos sao uma
especie de laborat6rio onde as hip6teses levantadas e sustentadas
teoricamente pelos p6s-estruturalistas poderiam ser testadas.
Os
hipertextos permitem o questionamento do pensamento logocentrico
ocidental e afirrnam as ideias de Barthes, Derrida e Foucault sobre
a falencia dos significados de margem, hierarquia e linearidade
273
.
0 hipertexto seria, em outros termos, urn modo de conceber
como pensamos e organizamos o pensamento. Para Landow [ ..]
devemos abandonar sistemas conceptuais fundados nas ideias de
margem, hierarquia e linearidade, e substitui-los por outros de
multilinearidade, n6s, links e redes. Quase todos os estudiosos
desta mudanc;:a
de paradigma, que marca uma revoluc;:ao no pensa
mento humano, percebem a escrita eletronica como uma resposta
para as
forc;:as
e fraquezas do livro impresso
274
.
Landow trata o
hipertexto como uma estrutura sem centro. 0 ponto do
espac;:o
tido
como central (ou de partida) e constantemente atualizado, sendo
permanentemente deslocado . Dito de outra forma, o hipertexto e
urn sinonimo de rede.
Arede hipertextual instaura-se como urn modelo de conexao
generalizada e, nesse sentido, ftanar numa cidade ou navegar por
hipertextos evoca urn mesmo processo: uma relac;:ao descentralizada
e rizomatica com o
espac;:o.
Estabelece-se a interconexao entre o
processo de leitura (relac;:ao entre o corpo eo texto) eo mapeamento
(relac;:ao entre o corpo eo espac;:o ), fund indo as figuras do lei tor (que
segue o mapa) e do escritor (que faz o mapa). Como mostra Landow,
[ ..] ja que sistemas hipertextuais permitem ao leitor anotar urn
texto individual e linkar para outros, ate textos contradit6rios, isso
24
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destr6i uma das mais importantes caracteristicas do texto impre s
- sua separayao e univocalidade. Sempre que colocamos urn text
numa rede de outros textos, reforyamos a sua
x i s t t ~ n c i
como parte
de urn dialogo complexo
7
Todo o sistema hipertextual instaura urn hibrido de leitor e
escritor, de aventureiro e conformista, na figura daquilo que Rosello
chama de Screener. Nao e por acaso que parar diante de
urn
im6-
vel que pertenceu a nossa infiincia, sentir os cheiros e ruidos que
s6 a n6s faz sentido, ou clicar num link que a voce surge naquele
in
stante interessante, parece fazer parte de urn mesmo processo
hipertextual. Assim, da jlanerie do poeta urbano aciber-flanerie
eletr6nica do intemauta nao ha, nesse sentido, muita dist:ancia.
Trata-se de
urn
mesmo processo de metaconstru9ao das estruturas
(urbana e tecnol6gica - o ciberespayo
.
Vagar pela cidade e clicar '
em sites na Internet e, assim, escrever lendo , e deixar marcas a
partir de mapas dados, e imprimir urn trayo no espayo, ao mesmo
tempo maleavel e inflexivo do quotidiano.
0 jlaneur como o navegador de hipertextos eletr6nicos, e
esse personagem para quem o andar nao e necessariamente inten
cional ou objetivo. Ele toma-se observador que olha sem julgar, que
busca a imersao, e nao a compreensao. Ajlanerie no ciberespayo e
nas cidades (como ato de desmesura) permite jogar como espayo
instituido, escrever percursos alem dos textos construidos por suas
macroestruturas. 0 andar do jlaneur e, assim, a to de to mar posse,
de marcar simbolicamente o espayo.
Trata-se mesmo de apropria96es silenciosas, minusculas e
banais do quotidiano, de praticas de subversao intersticial, de possi
bilidades de se locomover escrevendo pequenas hist6rias - forma de
apropria9ao que De Certeau chamou de invenyao do quotidiano
276
Assim, a partir desses gestos, o l neur
eo
ciber-flaneur estariam,
certamente, imprimindo trayOS , deixando marcas (nao e a toa
que somos ca9ados pelas impress6es eletr6nicas que deixamos
na Web, nos cart6es eletr6nicos, nos celulares etc.) . Longe de
uma simples consumayao passiva dos espayos (urbano ou ciber),
estariamos diante de processos de seduyao, de desvio. Tanto a
cidade como os hipertextos sao (des )organizados pela marca ( es
crita) nao linear, indexada a associa96es das mais diversas. Aqui
0 mapa nao e 0 territ6rio .
Os links, ou lexias como propos Barthes, sao obviamente
dependentes de estruturas previas.
o
entanto, essas estruturas nao
2
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sao totalmente determinantes. Como mostra Rosello, quem observa
oficmeur [
]tern
que pensar a
relac;:ao
entre o corpo do viajante eo
mapa, mas tambern o
status
do mapa como uma
rendic;:ao
metaf6rica
do
espac;:o:
o corpo
dofianeur
que nao segue uma rota ou inventa
novos caminhos para urn velho destino, tambem subverte a visao
do espac;:o como uma nave vazia, urn mero receptacula neutro da
rede
277
0 ciberespac;:o, como uma metacidade de
bits
e urn imenso
hipertexto mundial interativo, onde cada urn pode adicionar, retirar
e modificar partes desse texto vivo, escrevendo sua pequena hist6-
ria. A aproximac;:ao
entrefianerie
urbana e navegac;:ao hipertextual
parece estimulante, uma vez que permite a apreensao de ambos os
processos nao em
oposic;:ao
- como sugere uma determinada corrente
critica, a partir da suposic;:ao de irrealidade da experiencia virtual -
mas como continuos. A
c er-jlanerie
pode ser compreendida como
uma forma de ampliac;:ao metaf6rica do fl.anar urbano.
importante ressaltar, tambem, as especificidades de cada
urn dos processos de
fianerie -
ou suas diferenc;:as de escala. Se,
na vida real, a concretude e a materialidade do corpo e do
espac;:o
fisico deterrninam e constrangem a identidade, a
relac;:ao
individuo
mundo e as formas de sociabilidade - e, portanto, afianerie
-
toda
uma outra forma de socialidade ca6tica e fractal , descentralizada,
dispersa e multipla, fundada antes
em
multipersonalidades, em co
munidades sem proximidade e atuando por identificac;:oes efemeras
e sucessivas, exacerba-se a partir dos ftuxos virtualizantes
278
Da
mesma forma, a dimensao de nao Iugar do ciberespac;:o, constituida
a partir das caracteristicas combinadas de aterritorialidade, imate
rialidade, instantaneidade e interatividade, circunscreve a analogia
entre as metr6poles concretas e as mega cidades de bits .