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O P U T O Myke Zirrô

O puto

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O PUTO

Myke Zirrô

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Myke Zirrô

O PUTO

Belém – PA

2016

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O PUTO

Nunca foi compreensivo. Pessoas são

seus mistérios. Mas agora, percebe que a

vida não lhe foi tão amarga.

Sofre as dores da hemorroida com o

rabo pingando sangue no banheiro. Sente

saudades da infância e dos causos que sua

tia/avó contava. Falavam de mangueiras,

botos, matintas e as rodas de capoeira na

Praça da República.

Viveu cercado de carinho por todos

os lados e sem querer o tempo passou. A

adolescência veio, e com ela a rebeldia, os

pelos pelo corpo, a imaginação frustrada e

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cheia de inseguranças. Sem esquecer a

“masturbação” diária. Experiência sexual

resumida até os dezesseis. Não que tenha

parado. Andava por ai de perna aberta,

ponta de dedos, quadril pra-frente-pra-trás,

a mão peluda e um braço fortinho. Foi, sim,

criança de muitos predicados.

Olhar para ele e lembrar suas estórias

de bêbado me fazem pensar o quanto a vida

de algumas pessoas é cansativa e

aborrecida, mas não a desse homem, que a

beira da morte tenta ser santo.

Certo dia quando voltava da escola,

uma criatura formidável o chamou. Estava

entre seus dezesseis para dezessete anos e

uma vontade enlouquecida de fazer sexo,

mas sua ansiedade e pressa sempre o

atrapalharam.

-Ei! Psiu! – Ouviu intimidado.

Desconcertado olhou para direita,

olhou para esquerda, não viu porra

nenhuma.

-Aqui em cima, aqui!- gritou-lhe a

voz evangelical.

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Levantou a cabeça bem devagar e lá

estava ela, só com a face à mostra. Nossa,

que coisinha linda, pensou.

Seu rosto empalideceu e o pau ficou

duro dentro da calça.

Precisava de ajuda e a porta estava só

encostada – informou ela.

Perguntou a ele se poderia subir até

lá; como sempre foi um garoto prestativo e

tinha como lema “ajudar não dói”. Decidiu

entrar.

Ao subir as escadas sentiu aquele

cheiro desgraçado de roupa suja, comida

azeda e merda.

- Credo – pensou para si.

Bateu na porta que estava apenas

encostada e lá dentro ouvia-se um barulho

estranho de madeira batendo no assoalho.

- Que porra é essa?! – perguntou-se.

Empurrou a porta que se abriu

espalhafatosamente como um miado de

gato no cio. Porta para dentro o caos, o

apocalipse e o próprio demônio em pessoa.

Era um rostinho de princesa encaixado em

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um enorme saco de entulho. A mulher era

tão grande que havia grandezas em suas

grandezas. O barulho que escutou era a

muleta da desgraçada que pra variar não

tinha uma perna. Não era um pedaço apenas

que faltava, era a porra da perna toda.

A casa era nojenta, mas era grande

como a dona. Da porta onde estava,

enxergava três cômodos e um corredor onde

o resto da casa desaparecia numa imundice

só. Nos cômodos, tinha pouco ou nenhum

móvel. No que pensou ser a sala, tinha uma

estante baixa cheia de revistas de homem

pelado e de frente para janela um sofá

horrivelmente fedido.

Se for faxina, pelo menos não terei

trabalho, aqui não tem nada – pensou

sorridente, já fazendo planos para um

possível pagamento.

Pediu-lhe que esperasse enquanto iria

ao quarto.

Essa moça deve viver aqui sozinha –

pensou ele.

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Será que ela é doente mental? –

perguntou-se esquivando o olhar para o

corredor onde a moça se encontrava.

A aparência da jovem não era das

mais agradáveis, fora a nojeira do lugar, ela

vestia uma camisola de dormir, que acho ter

sido feita com uma toalha de mesa, toda

encardida.

Ela deve mijar e limpar a buceta com

a roupa, só isso explicaria as manchas

amareladas na barra do vestido. Mas atrás,

porra, ela não tem uma banda da bunda,

aquela mancha marrom não pode ser merda.

Não pode dar tanto trabalho limpar uma

banda de bunda – pensou.

Pediu-lhe para aguardar sentado no

sofá, mas o rapaz que já estava preocupado

com as intenções da aleijada-cagona e

possivelmente doida, ficou de pé próximo à

porta.

Porra! Sem condições de sentar nesse

sofá – pensou com um sorriso de nojo no

rosto.

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O rapaz pouco se movia, pois achava

o local pavoroso, tinha medo de respirar

mais forte e acabar tuberculoso.

O sofá fedia como um animal morto.

O garoto já impaciente inclinou a cabeça

em direção ao corredor onde algo estava

sendo arrastado.

- Precisa de ajuda? Perguntou ele.

- Não! - Ela gritou.

- Tem certeza? – ele insistiu.

- Sim – Disse ela.

Seu estomago já estava embrulhado.

Os olhos ardiam, pois o ar do ambiente era

indizível. Sua esperança de arrumar um

trocado o manteve ali de pé, impaciente e

com o rosto em estado de putrefação.

Com impaciência esfregava as mãos

nos bolsos da calça.

Decidiu caminhar até próximo à

janela para avistar a rua e tentar respirar

com menos dificuldade. Então, ela o chama

com um grito escrachado e respirar

sorridente.

- Ei gatinho, vem cá – gritou ela.

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- Me ajuda aqui – gritou de novo.

- Calma – ele respondeu.

Seus olhos apropriaram-se do que

havia nas portas que tanta curiosidade lhe

causou, seus passos e seus olhos

estreitavam juntos o corredor e o que havia

nos quartos onde a moça não estava.

Pensava no dinheiro e no esforço que

teria de fazer para consegui-lo. Esquecera-

se do odor e da moça estranha que o

convidara para o possível, suposto trabalho.

Devagou os olhos e, quase, sem

querer olhar aproximou-se da porta do

quarto. Seus olhos caminharam pelas

paredes do corredor, por ranhuras e

manchas de infiltração. Desceram pela

porta até encontrar o assoalho. Olhos que

em passos bem lentos encontraram as

bordas de um colchão.

Era um colchão de espuma, daqueles

bem antigos, que chega a ser fino de tanto

que foi usado.

O colchão está jogado no chão todo

coberto com redes sem punho, varias redes.

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Não dava para ver os travesseiros, mas a

lombada na parte superior do colchão

mostrava que estava lá. E sobre tudo isso

estava ela. Uma mulher enorme.

Seu corpo parecia uma batata cozida

com a casca. Ela estava nua com as mãos

passeando pelo próprio corpo. A unha do

único pé estava imunda. Havia celulites em

suas celulites. A curiosidade de ver uma

mulher nua pela primeira vez de tão perto

não permitiu que fosse embora.

Seu dorso era inexplicável. As

aureolas de seus seios era o que conseguia

esclarecer aquele enorme emaranhado de

carnes. No seu rosto um sorriso de carência

que o rapaz só entenderia anos mais tarde.

- Vem aqui gato, senta aqui do meu

lado – disse ela com uma voz serena.

- Pra quê? – Disse ele.

- Pra gente se conhecer melhor –

sorriu ela.

- Pra quê? – Perguntou ele

novamente.

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- Pra gente se fazer um carinho. Deixa

de ser bobo, vem cá – suspirou ela.

Já nervoso com a situação começou a

observar o quarto. As paredes estavam

pintadas de rosa. Na janela que fazia fundo

para um quintal enorme e só mato havia

cortinas de tom rosa bebê. O assoalho

estava encerado e as tabuas possuíam duas

cores, uma amarela e uma preta, uma

amarela e uma preta, sempre nessa ordem.

O rapaz nunca havia visto um assoalho tão

bonito. Sua curiosidade não o permitiu ir

embora, então se aproximou um pouco mais

e com um único passo cruzou a porta

passando a verificar o ambiente por dentro.

Em um canto, lá no fundo do quarto

alguns incensos de flores queimando

enfiados em um sabonete azul. No meio da

mesma parede havia uma estante de metal.

Dessas de escritório. Decorada com

toalhinhas de crochê. Que de tão brancas

nem pareciam verdadeiras.

Era uma estante alta com seis

prateleiras ao todo. Na primeira prateleira

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da parte inferior havia lençóis e toalhas,

todos bem dobrados e enrolados como é

feito nos motéis. Tudo bem organizado,

empilhados em formato de pirâmide. Na

prateleira de cima havia vários

brinquedinhos, eram brindes de aniversários

e outros tipos de festas comuns de família,

dessas onde fazem saquinhos de papel e

enchem de porcarias e te dizem: “é uma

lembrancinha da minha festinha”.

Nas duas prateleiras mais acima

estava um festival de bonecas peladas. A

base onde estavam às bonecas era todo

decorado com papel crepom vermelho

frisado e três flores de quatro pétalas feitas

com E.V.A. amarelo com o centro laranja.

Mais acima havia porta retratos de todos os

tamanhos, todos virados para a parede e na

ultima prateleira mais alta havia nada. Nada

que nosso desventurado amigo conseguisse

alcançar com os olhos. Sua curiosidade o

atormentava, pois ao mesmo tempo em que

seu corpo demonstrava um coração com

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medo, sua mente fazia seus olhos

perambularem pelo quarto.

Ela o convidou a aproximar mais e

com alguns passos ele se colocou ao lado

do colchão que também estava todo

perfumado. Atrás dos travesseiros próximos

a parede havia uma caixa de sapato sem

tampa onde estavam guardados uns batons,

algumas amostras grátis de perfumes, um

hidratante de corpo e uma sacolinha de

camurça com alguma coisa dentro.

Devem ser bijouterias – pensou ele.

Seu corpo de pé ao lado do colchão

impunha um zero absoluto, mas seus olhos

vagavam pelo cômodo que destoava com o

resto da casa. Aos poucos percebeu que a

moça que estava deitada já se encontrava

apoiada no braço, quase sentada. Sua mão,

aquela que não a sustentava sentada no

colchão estendia-se em direção ao rapaz

aflito. O perfume que exalava de seu corpo

causava uma sensação de infância. Sua voz

era macia e musical no vazio de seu quarto

tão bem cuidado. Seu rosto e sua voz

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caminhavam lado-a-lado, era a beleza que

completava as cores do ambiente.

Seus olhos sorriam para ele, que já

começava a se embriagar de tesão. Então

sentiu sua mão na dela e seus olhos

avistaram seu toque. Sua mão era macia e

quente. O jovem meio que sem jeito

retribuiu o toque com um sorriso, pensou

em dar um passo para trás, mas havia uma

parede que não abria espaço para sua ação.

Tinha então duas opções: ceder ao convite e

sentar no colchão ou voltar para a porta

pelo mesmo caminho de onde veio.

- Amor, senta aqui comigo – Disse

ela.

Com um ar angustiado ela deitara-se

novamente. Silenciosa ergueu um dos

braços tentando alcançar a caixa de sapatos,

arredou um pouco mais para o alto do

colchão e com as duas mãos retirou de

baixo da caixa uma nota de cinquenta reais.

O coração palpitou, nunca havia

ganhado tanto dinheiro, nem quando foi

assistente de soldador numa oficina

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mecânica onde certa vez teve de meter

solda no pé de um botijão de gás.

Para executar o serviço recebeu um

óculo de praia, uma capa de chuva, uma

bota de pedreiro e quando terminado o

serviço, cinco reais. O dono da oficina

garantiu que aquele material era para sua

segurança. Mas quem liga para isso. Tanto

que o proprietário confiou nele para tomar

conta da oficina. Ficou lá sozinho o dia

todo até terminar de soldar o botijão, feliz

com o credito que recebeu de seu patrão.

As mãos macias da moça o

despertaram das lembranças de seu

primeiro e pouco saudável trabalho

remunerado.

Passou delicadamente os dedos em

sua perna, subindo até o quadril onde deu

um beliscão.

O rapaz que nunca havia passado por

tal situação, tremia como um cachorro

epilético.

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- Senta amor, só vou te fazer um

carrinho – disse balançando os cinquenta

reais.

O corpo não respondia os

pensamentos. As mãos estavam

transpirando. Tinha consciência do que ela

queria e como era esse carinho.

Contar vantagem pra molecada na

escola e bate punheta no banheiro de casa

não dava tanto trabalho – ele pensou.

Encostado na parede pensava numa

tentativa de piada para não parecer tão

constrangido com o momento. Tinha de

fazer alguma coisa.

Ouviu um sorriso brincalhão. Era ela

informando que a calça não conseguia

esconder o quanto já estava animado.

Ela começou a passear com a mão

pelas pernas do moleque que já parecia ter

esquecido onde estava.

O rosto transpirava sem parar. O zíper

da calça foi aberto e uma mão o segurava

carinhosamente. Com certeza não o deixaria

cair e aos poucos seus joelhos foram

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curvando-se deixando a calça descer.

Nunca, tirar as calças lhe deu tanto trabalho

– pensou sorridente.

Não estava à vontade e por esse

motivo não conseguia ter muito a dizer. Foi

quando perguntou:

- Qual seu nome? Disse ele.

Muito irônica ela gargalhou dizendo:

- Pra quê você quer saber isso meu

príncipe? Retrucou ela.

- Não tem importância seu nome.

Meu nome. Tanto faz. Disse ela sorridente.

Em todas as suas bebedeiras ele

sempre se lembrava dessa mesma estória e

de como aquela garota interrompia seus

pensamentos com peidos formidáveis. A

criatura tremia no colchão e caia na

gargalhada cada vez que o rosto do rapaz se

contorcia com a fedentina.

Desculpa amorzinho, eu não

conseguia mais segurar – disse ela com um

rostinho todo fofo.

E para completar, diz gargalhando:

- O que tá preso tem que soltar.

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Então, desvendou o mistério do fedor

que pairava pela casa, mas depois se

perguntou sobre o bizarro sofá que

protagonizava solitário na sala. Tanto faz.

Dali de onde estava com as calças já

no chão e com a tarada o segurando pelo

pau. Seu foco tinha uma onça.

Estava tão focado que nunca

conseguiu lembrar o momento em que

deitou no bendito colchão e nem de tê-la

visto pegar a sacolinha de camurça.

Ela o segurou pelo cabelo, e na boca o

gosto acido de pelos e sabonete. Lembra de

pouco tê-la tocado, mas que mesmo assim

sua respiração era forte e dava coices de

calcanhar em sua costa.

Mandou-o enrijecer a língua e

segurando-o pelos cabelos sacudia sua

cabeça. Sentiu o corpo dela estremecer e se

contorcer. Foi então que ela o puxou para

cima, caminho que fez até seus seios, mas

não era como ela queria. Jogou-o para o

lado e colocou-se sobre ele e entre suas

pernas.

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Garoto! Foi minha primeira vez.

Aquela mulher fez comigo o que nenhuma

outra mulher fez – disse ele com cara de

satisfação.

Fiquei lá deitado embaixo dela,

enquanto ela se esfregava em mim de todo

jeito. Ela pedia para chamá-la de bombom e

me mandou dizer: me fode bombom. Então,

comecei a dizer e quanto mais eu dizia mais

enlouquecida ela ficava. Eu lá embaixo de

toda aquela carne sem conseguir me mexer.

Moveu-se prodigiosamente com a

boca até meu quadril. De repente me senti

um tutano de sopa na boca louca daquela

mulher. Então me empolguei garoto e

comecei a dizer rápido e sem parar:

- Me fode Bombom.

- MefodeBombom.

- MefodeBombom.

- Mefod...

Garoto, cuidado com o que você diz

para uma mulher na cama, principalmente

se é a cama dela. Essa mulher me segurou

pelo quadril. Virou-me de bruços no

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colchão e eu empolgado com a trepada

continuava dizendo: me fode Bombom.

Essa mulher me botou de quatro naquele

colchão e botou a boca e os dedos onde eu

tinha vergonha até de limpar.

O que foi garoto? Não gostou de

saber a estória completa. Vou te dizer

garoto, nunca outra mulher me fez sentir

como a Bombom fez. Então não me olha

com essa cara de machão de cú intacto. Na

época eu me senti violado e não voltei mais

lá, mas no fundo eu adorei. Imagina se eu te

disser o que tinha na sacolinha de camuça.

A última coisa que escutei a respeito

dela é que ela tinha se amigado com um

daqueles cachaceiros que vive nas esquinas

pedindo moedas pra comprar cana. O cara

vendeu a casa que ela morava com ela

dentro. Imagina o desespero no dia do

despejo?

Com um súbito desejo de vingança,

enquanto ele dormia bêbado, ela o arrastou

até a beira da calçada e sentou-o do seu

lado. Muitos disseram que foi acidente,

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outros disseram ter visto tudo, mas no final

o que existia mesmo era um ônibus, um

corpo e uma mulher sem perna chorando de

alegria.

Garoto fecha a boca, pega a minha

pomada de cú na gaveta da cozinha. Não

demora porra!