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CAO – Crim
Boletim Criminal Comentado - 04/2020
(semana nº 01)
Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Criminais e Institucionais
Mário Tebet
Coordenador do CAO Criminal
Arthur Pinto Lemos Junior
Assessores
Fernanda Narezi Pimentel Rosa
Marcelo Sorrentino Neira
Paulo José de Palma
Ricardo José Gasques de Almeida Silvares
Rogério Sanches Cunha
Analista Jurídica
Ana Karenina Saura Rodrigues
Boletim Criminal Comentado Abril-2020-
(semana nº 01)
2
SUMÁRIO
SUMÁRIO......................................................................................................................................2
MENSAGEM DA EQUIPE DO CAO-CRIM................................................................................................3
ESTUDOS DO CAOCRIM.................................................................................................................7
1-Modelo de inicial da pena de multa..................................................................................................7
2- Passo a passo – Peticionamento eletrônico da Execução da multa e do ANPP................................7
3- Modelo de manifestação sobre o pedido de revogação da prisão preventiva em razão da
pandemia..............................................................................................................................................7
4- Modelo de Portaria - PAA Coronavirus - unidades prisionais...........................................................7
5- Recomendação ao Governo do Estado de São Paulo elaborada pela Promotoria de Justiça de
Direitos Humanos – Saúde Pública.......................................................................................................7
STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM................................. 8
DIREITO PROCESSUAL PENAL:...................................................................................................... 8
1-Tema: Tráfico de drogas. Flagrante. Violação de domicílio. Tema 280/STF. Denúncia anônima.
Fuga isolada do suspeito. Ausência de justa causa. Nulidade de
provas...................................................................................................................................................8
2- Tema: Atraso na instrução em razão de férias da testemunha pode caracterizar excesso de prazo
na prisão preventiva...........................................................................................................................11
3- Tema: Possibilidade de o juízo da execução proclamar a reincidência..........................................13
DIREITO PENAL:...........................................................................................................................14
1-Tema: Art. 241-A da Lei n. 8.069/1990. Grande interesse por material pornográfico. Exasperação
da pena-base. Conduta social ou personalidade. Inviabilidade..........................................................14
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(semana nº 01)
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MENSAGEM DA EQUIPE DO CAO-CRIM
Caros colegas, promotores e procuradores de Justiça.
Inauguramos o BOLETIM SEMANAL para divulgar o relatório da nossa gestão no Centro de
Apoio Operacional Criminal – CAOCRIM e destacar as nossas principais atividades:
a) Publicamos 85 Boletins Informativos Comentados, elaborados sempre com o seguinte critério: i) julgados relevantes e mais recentes; ii) leis penais e processuais penais novas; iii) consultas feitas por colegas ao CAOCrim;
b) Os boletins totalizaram 1.397 páginas, com 168 estudos de casos diferentes e mais de 300 jurisprudências do STF e STJ comentadas;
c) Elaboramos 73 Enunciados, disponibilizados na página eletrônica do CAOCRIM;
d) Emitimos 8 notas técnicas sobre Projetos de Leis em trâmite no Congresso Nacional; inclusive sobre a Lei de Abuso de Autoridade;
e) A equipe do CAOCRIM atendeu vários membros do MPSP:
em 2018, 4 mil atendimentos;
em 2019, foi implementado, de forma pioneira, o atendimento por whatsapp. Ao lado de centenas de consultas por este novo meio, atendemos, ainda, 2.296 colegas pelo telefone fixo;
e em 2020, até dia 13 de Março, 560 membros;
f) Representamos os colegas da Barra Funda, peticionando à Diretoria do DIPO para que juntasse as mídias gravadas nas audiências de custódia, providência até então negada pela Magistrada responsável, mas revertida com a ação do CAOCrim; o objetivo foi viabilizar o reconhecimento fotográfico com a imagem preservada e correspondente com o momento da prisão em flagrante;
g) Depois de realizadas diversas Reuniões de Trabalho com as Promotorias de Justiça Criminais da Capital - Barra Funda; bem como Reuniões de Trabalho no interior: Araçatuba, Araraquara, Bauru, Campinas, Marília, Mococa, Mogi das Cruzes, Mogi Mirim, Jundiai, Piracicaba, Presidente Prudente, Ribeirão Preto, São José dos Campos, São Bernardo do Campo, Ourinhos e Taubaté, fizemos a difusão sobre a Política Criminal idealizada pelo CAOCrim, notadamente no que se refere ao “Acordo de Não
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Persecução Penal”. Foram realizados até o final de Março de 2020 cerca de 1.325 Termos de Acordo de Não Persecução Penal;
h) Foram monitorados, até o presente momento, 233 Recursos em Segunda Instância, a pedido dos Promotores de Justiça, o que antes não ocorria, pois não havia intermediação entre a primeira e segunda instância;
i) Foram monitorados 23 Mandados de Prisões pendentes de cumprimentos, a pedido dos Promotores de Justiça de primeira instância. O objetivo foi dar efetividade ao trabalho das promotorias criminais;
j) Realizamos Workshops, via Skype, sobre os seguintes temas: i) “Acordo de Não Persecução Penal”; ii) “Escuta protegida e depoimento especial” (em parceria com o CAOCÍVEL); iii) “Execução da Pena de Multa”; e iv) “Atualização Legislativa”; v) Investigação Digital; vi) Enunciados sobre Execução Penal; vii) Alterações legislativas do Estatuto de Desarmamento. Atingimos com tais eventos pela internet mais de mil colegas;
k) Promovemos a capacitação de Promotores de Justiça Criminais e seus Oficiais de Promotorias e Analistas Jurídicos sobre “Técnicas Avanças em Investigação de Crimes de Formação de Cartel e Fraude à Licitação Pública”, no dia 27 de setembro de 2019;
l) O conteúdo da capacitação foi disponibilizado como Cartilha na página eletrônica do CAOCRIM;
m) Elaboramos o fluxograma com procedimentos a serem observados na Escuta especial e depoimento protegido; na Execução da Pena de Multa; e na Proteção do Estatuto do Torcedor – ambos disponíveis na página do CAOCRIM;
n) Por meio de Convênio firmado com a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), Secretaria do Estado de Segurança Pública e ENASP, participamos da coleta de mais de 7000 amostras biológicas de DNA de presos condenados por crimes sexuais; sendo que 6000 foram incluídas no banco de DNA do Estado de São Paulo;
o) Após as coletas das amostras de DNA houve confronto com as amostras de vítimas. O resultado foi muito bom: houve 7 coincidências, que possibilitaram o prosseguimento de investigações policiais que estavam sem autoria. O CAOCRIM enviou, no início do mês de setembro/2019, os Relatórios produzidos pelo Núcleo de Biologia e Bioquímica aos sete promotores de justiça responsáveis pelos casos ainda pendentes de conclusão;
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p) Após Reunião conjunta com o Núcleo de Biologia e Bioquímica do Instituto de Criminalística, os Juízes do DIPO e os Promotores de Justiça que atuam nas audiências de custódia da Capital, passamos a realizar a perícia de DNA de presos em flagrante, pela prática de crimes sexuais, nas audiências de custódia. Após gestões deste Centro de Apoio junto a Polícia Científica, o IML da Capital está capacitado para fazer as perícias e as coletas de DNA. Esse Projeto será expandido para outras cidades;
q) Firmamos convênio om a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) e celebramos de Termo de Cooperação Técnica, com vistas à implementação, acompanhamento e avaliação da política de alternativas Penais no Estado de São Paulo, para cumprimento das condições impostas nos Acordos de Não Persecução Penal, nos termos propostos na Resolução 181/2017 do CNMP, alterada pela Resolução 183/2018 (aguarda-se apenas o agendamento da solenidade para assinatura);
r) Obtivemos êxito em representação formulada à CGJ, que modificou seu entendimento constante do Parecer 451/2017-J e revogou os Comunicados CG 573/2016 e 2077/2017, reconhecendo a essencialidade do boletim informativo e/ou atestado de conduta carcerária para análise de benefícios prisionais;
s) Obtivemos o acesso direto, com 30 senhas aos promotores de justiça dos DECRIMs, ao Sistema de Gestão Penitenciária, para obtenção do atestado de conduta Carcerária e Boletim Informativo;
t) Integramos o PROVITA e participamos de suas reuniões, que possibilitaram a proteção de cerca de 90 pessoas – vítimas, testemunhas e/ou réus colaboradores;
u) Desde 2018 estamos em constante tratativa com a Secretaria de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania de São Paulo visando a ampliação para outras regiões do Estado e o fortalecimento do CRAVI – Centro de Referência e Apoio às Vítimas. Houve já implementação em Barueri e Suzano. Em breve, será implantada uma unidade em Pindamonhangaba, com o apoio do GAECO do Vale do Paraíba;
v) Obtivemos com o IMESC a possibilidade de serem realizados Relatórios de Avaliação de Danos Psicológicos em vítimas de crimes de violência doméstica e delitos sexuais;
w) Realizamos, no dia 6 de Dezembro de 2019, no Auditório das Promotorias de Justiça Criminais do Fórum da Barra Funda, Reunião de Trabalho com os Promotores de Justiça dos Tribunais do Júri da Capital e os Delegados de Polícia do DHPP. O resultado do encontro foi a elaboração de uma “Carta de Intenções” a ser cumprida pelas partes envolvidas;
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x) Durante o período de vigência da pandemia e teletrabalho, derivado do estado de calamidade pública provocada pelo novo Coronavírus – COVID 19, o CAOCRIM elaborou:
a. Duas Notas Técnicas sobre o impacto da COVID no Sistema Prisional;
b. Orientação Técnica em Conjunto com o CAO do Consumidor sobre o Aumento Abusivo de Preços;
c. Orientações aos Órgãos de Segurança Pública;
d. Vários modelos de peças jurídicas: i) manifestação contrária ao pedido de revogação preventiva pelo excesso de prazo; ii) manifestação contrário a revogação preventiva por receio de contaminação da COVID 19; iii) Recurso em Sentido; iv) Medida Cautelar Inominada; v) Modelo de manifestação para requerer ao Juiz destinação de Valores ao Fundo Municipal de Saúde; vi) Modelo de Ofício à Prefeitura Municipal para requerer dados e número de conta bancária para envio de recursos obtidos em procedimentos criminais;
e. Apresentamos a Representação da Promotoria de Justiça de Execuções Criminais de Presidente Prudente à Promotoria de Justiça de Direitos Humanos, com a finalidade de ser vedada a transferência de presos, que acolheu integralmente a solicitação e tomou as providências cabíveis junto a SAP – Secretaria da Administração Penitenciária;
f. Elaboramos anteprojeto de lei para alterar o Código Penal e propor nova causa suspensiva da prescrição da pretensão punitiva do Estado
EQUIPE DO CAO-CRIM (gestão 2018-2020).
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ESTUDOS DO CAOCRIM
1-Modelo de Inicial da pena de multa elaborada pelo Dr Felipe Bertolli
Clique aqui
2- Passo a passo – Peticionamento eletrônico da Execução da multa e do ANPP – Elaborado
pelo Promotor de Justiça, Daniel Tadeu dos Santos Mano, 2.º Promotor de Justiça de
Martinópolis, e sua equipe
Clique aqui
3- Modelo de manifestação sobre o pedido de revogação da prisão preventiva em razão da
pandemia
Clique aqui
4- Modelo de Portaria - PAA Coronavirus - unidades prisionais
Clique aqui
5- Recomendação ao Governo do Estado de São Paulo elaborada pela Promotoria de Justiça
de Direitos Humanos – Saúde Pública
Clique aqui
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STF/STJ: decisões de interesse institucional COMENTADAS PELO CAOCRIM
DIREITO PROCESSUAL PENAL:
1-Tema: Tráfico de drogas. Flagrante. Violação de domicílio. Tema 280/STF. Denúncia
anônima. Fuga isolada do suspeito. Ausência de justa causa. Nulidade de provas.
INFORMATIVO 666 STJ- QUINTA TURMA
A existência de denúncia anônima da prática de tráfico de drogas somada à fuga do acusado ao
avistar a polícia, por si sós, não configuram fundadas razões a autorizar o ingresso policial no
domicílio do acusado sem o seu consentimento ou sem determinação judicial.
No caso, as razões para o ingresso no imóvel teriam sido a natureza permanente do tráfico, a
denúncia anônima e a fuga do investigado ao avistar a polícia. Em relação à tentativa de fuga
do agente ao avistar policiais, deve-se salientar que, nos termos do entendimento da Sexta
Turma deste Superior Tribunal de Justiça, tal circunstância, por si só, não configura justa causa
exigida para autorizar a mitigação do direito à inviolabilidade de domicílio.
Deve-se frisar, ainda, que "a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos
preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado,
estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida." (HC 512.418/RJ, Rel.
Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019).
Neste ensejo, vale destacar que, em situação semelhante, a Sexta Turma desta Corte entendeu
que, mesmo diante da conjugação desses dois fatores, não se estaria diante de justa causa e
ressaltou a imprescindibilidade de prévia investigação policial para verificar a veracidade das
informações recebidas (RHC 83.501/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em
06/03/2018, DJe 05/04/2018).
Desta feita, entende-se que, a partir da leitura do Tema 280/STF, resta mais adequado a este
Colegiado seguir esse entendimento, no sentido da exigência de prévia investigação policial da
veracidade das informações recebidas. Destaque-se que não se está a exigir diligências
profundas, mas breve averiguação, como "campana" próxima à residência para verificar a
movimentação na casa e outros elementos de informação que possam ratificar a notícia
anônima.
PROCESSO: RHC 89.853-SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado
em 18/2/2020, DJe 2/3/2020.
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COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
O julgado ora comentado está pacificado na Corte. Sabemos que no tipo penal de tráfico de
drogas (art. 33 da Lei nº 11.343/06) há figuras típicas classificadas como permanentes, ou seja,
nas quais a consumação se prolonga no tempo, admitindo o flagrante a qualquer momento. O
indivíduo que, por exemplo, guarda ou tem em depósito determinada quantidade de droga em
sua residência está continuamente em flagrante delito. Considerando a exceção trazida pelo
art. 5º, inc. XI, da Constituição Federal a respeito da inviolabilidade do domicílio (flagrante
delito ou desastre, prestação de socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial), conclui-
se que o armazenamento de drogas em determinada residência permite a entrada de agentes
policiais independentemente de autorização judicial.
Mas há um problema: nem sempre é possível ter certeza sobre o armazenamento de drogas
em uma residência. Há situações em que os órgãos de polícia judiciária são capazes de
investigar amplamente a movimentação de membros de organizações criminosas e, com isso,
conseguem estabelecer um grau razoável de certeza a respeito da conduta criminosa
permanente. É comum, por exemplo, que policiais em campana observem por dias a
movimentação em imóveis utilizados por traficantes, o que lhes dá segurança para uma
abordagem certeira.
Mas há casos em que a investigação prévia é simplesmente impossível. São rotineiras as
ocasiões em que policiais militares ou mesmo guardas municipais se defrontam com indivíduos
em atitudes suspeitas – normalmente próximos a pontos de venda de drogas – e iniciam uma
abordagem que culmina na vistoria de imóveis residenciais baseada apenas na suspeita de que
nesses locais algo ilícito pode estar sendo armazenado. Isto faz surgir a dúvida: a entrada no
imóvel é legal?
Não há uma resposta a priori, sem que se considerem as inúmeras circunstâncias que
caracterizam um determinado fato. O STJ tem diversos julgados no sentido de que o mandado
de busca e apreensão é prescindível, justamente porque se trata de crime permanente, que
atrai a situação de flagrância:
“1. É dispensável o mandado de busca e apreensão quando se trata de flagrante de crime
permanente, podendo-se realizar a prisão sem que se fale em ilicitude das provas
obtidas. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. 2. No caso, o paciente foi acusado de praticar o
crime de tráfico na modalidade guardar e manter em depósito substâncias entorpecentes,
estando-se diante de ilícito de natureza permanente, o que legitima a medida adotada” (HC
373.388/RS, DJe 1/2/2017).
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“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que tratando-se de crimes de
natureza permanente, como é o caso do tráfico ilícito de entorpecentes, prescindível o
mandado de busca e apreensão, bem como a autorização do respectivo morador, para que
policiais adentrem a residência do acusado, não havendo falar em eventuais ilegalidades
relativas ao cumprimento da medida (HC 345.424⁄SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA
TURMA, j. 18⁄8⁄2016, DJe 16⁄9⁄2016)” (HC 326.503/RS, DJe 15/3/2017).
Mas essa dispensa deve ser fundamentada em evidências de que o crime de fato está
ocorrendo, como, por exemplo, na situação em que a polícia presencia o comércio de drogas
em frente a uma residência e constata que usuários e traficantes a estão frequentando. Se, no
entanto, tratar-se apenas de uma presunção, sem elementos concretos, o próprio STJ vem
copiosamente julgando inválidas as violações de domicílios. Recentemente, o tribunal
considerou ilegal a busca e apreensão em situação na qual, em razão de uma “denúncia”
anônima, uma equipe se deslocou ao local apontado e, ao avistá-la, o indivíduo apontado como
traficante fugiu:
“No caso, as razões para o ingresso no imóvel teriam sido a natureza permanente do tráfico, a
denúncia anônima e a fuga do investigado ao avistar a polícia. Em relação à tentativa de fuga
do agente ao avistar policiais, deve-se salientar que, nos termos do entendimento da Sexta
Turma deste Superior Tribunal de Justiça, tal circunstância, por si só, não configura justa causa
exigida para autorizar a mitigação do direito à inviolabilidade de domicílio.
Deve-se frisar, ainda, que “a mera denúncia anônima, desacompanhada de outros elementos
preliminares indicativos de crime, não legitima o ingresso de policiais no domicílio indicado,
estando, ausente, assim, nessas situações, justa causa para a medida.” (HC 512.418/RJ, Rel.
Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 26/11/2019, DJe 3/12/2019).
Neste ensejo, vale destacar que, em situação semelhante, a Sexta Turma desta Corte entendeu
que, mesmo diante da conjugação desses dois fatores, não se estaria diante de justa causa e
ressaltou a imprescindibilidade de prévia investigação policial para verificar a veracidade das
informações recebidas (RHC 83.501/SP, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em
6/3/2018, DJe 5/4/2018).
Desta feita, entende-se que, a partir da leitura do Tema 280/STF, resta mais adequado a este
Colegiado seguir esse entendimento, no sentido da exigência de prévia investigação policial da
veracidade das informações recebidas. Destaque-se que não se está a exigir diligências
profundas, mas breve averiguação, como “campana” próxima à residência para verificar a
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movimentação na casa e outros elementos de informação que possam ratificar a notícia
anônima” (RHC 89.853/SP, j. 18/2/2020).
2- Tema: Atraso na instrução em razão de férias da testemunha pode caracterizar excesso de
prazo na prisão preventiva
INFORMATIVO 666 STJ- QUINTA TURMA
Com o fim de assegurar que a prisão não se estenda por período superior ao necessário,
configurando verdadeiro cumprimento antecipado da pena, a alteração promovida pela Lei n.
13.964/2019 ao art. 316 do Código Penal estabeleceu que o magistrado revisará a cada 90 dias
a necessidade da manutenção da prisão, mediante decisão fundamentada, sob pena de tornar
a prisão ilegal.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A prisão preventiva pode ser decretada na fase de investigação policial ou quando já
deflagrado o processo penal. Em sentido amplo, pode ser definida como a prisão decretada
antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, e tem significado idêntico a
“prisão processual”, “cautelar”, “provisória” ou “prisão sem pena”. Em um sentido mais estrito,
é disciplinada a partir do art. 311 do CPP.
Há países que limitam expressamente a extensão da prisão preventiva. O Código de Processo
Penal português, por exemplo, em seu art. 215 estabelece que será extinta a prisão preventiva
quando decorridos “quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação; oito meses sem que,
havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória; um ano e dois meses sem
que tenha havido condenação em 1ª instância; um ano e seis meses sem que tenha havido
condenação com trânsito em julgado”. A nossa lei processual, por outro lado, não estipula um
prazo máximo, considerando que as peculiaridades do caso concreto podem justificar
tratamentos e prazos diversos.
Afastada a indicação de um lapso temporal estrito para a duração da prisão cautelar, é
necessário adotar um critério de razoabilidade, pois, por sua natureza precária, a prisão
decretada sem a formação da culpa não pode se estender indefinidamente. Esse critério nos é
proporcionado pelo art. 5º, inc. LXXVIII, da Constituição Federal, segundo o qual “a todos, no
âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios
que garantam a celeridade de sua tramitação” (grifamos).
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A preocupação com a duração razoável do processo a que o acusado responde preso levou o
Conselho Nacional da Justiça a editar a Resolução 66/2009, na qual se impõe que, estando o
réu preso provisoriamente há mais de três meses, com o processo ou inquéritos parados,
cumpre ao juiz (ou ao relator, tratando-se de recurso), investigar as razões da demora,
indicando, ainda, as providências adotadas, a serem, posteriormente, comunicadas à
Corregedoria Geral de Justiça ou à Presidência do Tribunal (no caso do relator). A Lei
13.964/19, alterando o art. 316 do CPP, seguiu o espírito da referida resolução para impor ao
órgão emissor da decisão o dever de revisar a cada noventa dias, mediante nova decisão
fundamentada, a necessidade da manutenção da prisão.
Se, como vimos, não há um prazo específico para a duração da prisão cautelar, a análise do
excesso é feita com base nas características de cada processo. Se a prova se resume à oitiva da
vítima e de uma testemunha, ambas residentes na mesma cidade em que tramita a ação penal,
é razoável exigir que se proceda de forma mais célere do que em uma ação penal em que
devem ser ouvidas dez testemunhas em locais diversos.
Mas, ainda que se justifique a extensão do prazo em razão da complexidade que o processo
revela, é preciso cuidado para evitar excessos. A complexidade não é um fator capaz de
absolver falhas que acarretam a prorrogação do processo para além do razoável dentro
daquele contexto. Recentemente, o STJ concedeu habeas corpus para determinar a soltura de
uma ré presa que aguardava apenas a oitiva de uma testemunha que não pôde ser intimada
porque estava de férias. A ação penal, relativa a um furto de equipamentos médicos avaliados
em oitocentos mil reais, tramitava com a prisão decretada havia oito meses, e, dadas as
circunstâncias, o tribunal considerou presente o constrangimento ilegal:
“[…] Mencione-se, por outro lado, que, com o fim de assegurar que a prisão não se estenda por
período superior ao necessário, configurando verdadeiro cumprimento antecipado da pena, a
alteração promovida pela Lei n. 13.964/2019 ao art. 316 do Código Penal estabeleceu que o
magistrado revisará a cada 90 dias a necessidade da manutenção da prisão, mediante decisão
fundamentada, sob pena de tornar a prisão ilegal.
Necessário, porém, considerar que, cumprido tal requisito, eventual constrangimento ilegal por
excesso de prazo não resulta de um critério aritmético, mas de uma aferição realizada pelo
julgador, à luz dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em conta as
peculiaridades do caso concreto, de modo a evitar retardo abusivo e injustificado na prestação
jurisdicional.
Boletim Criminal Comentado Abril-2020-
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Como visto, a paciente responde, com mais três pessoas, pelo crime de associação criminosa e
furto qualificado, por terem furtado 5 equipamentos endoscópio, 2 equipamentos de
colonoscopia, 1 equipamento de duodenoscopia e acessórios, com válvulas e tampas de
válvulas, material avaliado em cerca de R$ 800.000 (e-STJ fls. 32 e 45).
Ainda, segundo consta dos autos, encontra-se presa desde o dia 23/7/2019, há mais de 8
meses, sem que tenha sido proferida sentença, por crime praticado sem violência ou grave
ameaça. Importa destacar que uma das testemunhas não foi ouvida, um policial, porque estava
de férias, razão pela qual a paciente teve que aguardar presa a nova audiência, contexto que
agravo mais o constrangimento sofrido em razão da excessiva demora na prisão cautelar.
Assim, forçoso reconhecer o excesso de prazo para a formação da culpa”.
3- Tema: Possibilidade de o juízo da execução proclamar a reincidência
STJ- PESQUISA PRONTA
No EREsp 1.738.968, a relatora, ministra Laurita Vaz, consignou: "O STJ firmou entendimento
pela possibilidade de o juízo da execução, ante a ausência de reconhecimento pelo juízo
sentenciante, proclamar a reincidência sem que tal providência acarrete reformatio in pejus".
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A reincidência é circunstância pessoal que interfere na execução como um todo.
Sendo assim, a condição de reincidente, uma vez adquirida pelo sentenciado, estende-se sobre
a totalidade das penas somadas, não se justificando a consideração isolada de cada
condenação e tampouco a aplicação de percentuais diferentes para cada uma das
reprimendas.
O entendimento – que já havia sido aplicado no julgamento do HC 307.180, de relatoria do
ministro Felix Fischer – foi reafirmado no HC 506.275, sob a relatoria do ministro Sebastião Reis
Júnior.
Boletim Criminal Comentado Abril-2020-
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DIREITO PENAL:
1-Tema: Art. 241-A da Lei n. 8.069/1990. Grande interesse por material pornográfico.
Exasperação da pena-base. Conduta social ou personalidade. Inviabilidade
INFORMATIVO 666 STJ- SEXTA TURMA
O grande interesse por material que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito no art. 241-A da Lei n.
8.069/1990, não sendo justificável a exasperação da pena-base a título de conduta social ou
personalidade.
Cinge-se a controvérsia a decidir se o grande interesse em pornografia infantil é motivo idôneo
para valorar negativamente a pena-base do réu, a título de conduta social ou personalidade do
agente que cometeu o crime do art. 241-A da Lei n. 8.069/1990.
Caracteriza o crime do art. 241-A do ECA oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir,
publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou
telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou
pornográfica envolvendo criança ou adolescente (pena de 3 a 6 de reclusão e multa).
Nesse contexto, o dado inerente ao tipo penal não justifica a exasperação da pena-base, a
título de conduta social ou personalidade. O grande interesse por material que contenha cena
de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito
no art. 241-A da Lei n. 8.069/1999. O referido dado já foi sopesado pelo legislador para
criminalizar a conduta e estabelecer severa sanção penal, com o objetivo, justamente, de
proteger a dignidade das crianças e dos adolescentes, pondo-os a salvo de formas desviadas de
satisfação sexual.
PROCESSO: REsp 1.579.578-PR, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por maioria,
julgado em 4/2/2020, DJe 17/2/2020.
COMENTÁRIOS DO CAO-CRIM
A primeira etapa de aplicação da pena privativa de liberdade tem por finalidade fixar a pena-
base, partindo do preceito secundário simples ou qualificado cominado no tipo penal, sobre o
qual incidirão as circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal: culpabilidade,
Boletim Criminal Comentado Abril-2020-
(semana nº 01)
15
antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e
consequências do crime, bem como o comportamento da vítima.
Cada uma destas circunstâncias é baseada em aspectos distintos que envolvem o crime e seu
autor. O aumento da pena nessa primeira fase é justificável apenas nas situações em que as
circunstâncias revelam uma gravidade maior do que o normal. Por alguma das razões
elencadas no art. 59, o fato é mais grave do que o legislador anteviu ao cominar os limites da
pena. Por exemplo, já se decidiu que o policial que comete crime de concussão tem maior
culpabilidade (leia-se: sua conduta é mais reprovável) do que um funcionário público comum
que comete o mesmo crime, tendo em vista que, pela função desempenhada, espera-se que a
população possa confiar mais em policiais do que em outros agentes públicos (STJ, AgRg no
REsp 1.366.683/PR, j. 14/11/2017). Há também decisão que, devido aos severos danos
psicológicos suportados pela vítima de estupros em continuidade, considerou legítimo o
aumento da pena em razão das consequências do crime (STJ, HC 454.044/RJ, j. 04/09/2018).
Ambos os exemplos revelam circunstâncias que exorbitam as elementares dos crimes. A
condição de funcionário público na concussão e o abalo psicológico no estupro já são
considerados na própria composição do tipo, mas há situações excepcionais que tornam mais
graves essas circunstâncias.
No julgamento do REsp 1.579.578/PR (j. 04/02/2020), relativo a crimes de armazenar e
compartilhar material com pornografia infantil, o STJ descartou o aumento da pena-base em
razão da personalidade ou da conduta social de um condenado que, segundo o apurado,
demonstrava “grande interesse” pelo material apreendido em seu poder. Para o tribunal, ainda
que exacerbado, o interesse do agente por imagens ou vídeos de crianças e adolescentes em
cenas pornográficas é inerente às figuras criminosas do ECA, razão pela qual já é considerado
na cominação da pena-base:
“Cinge-se a controvérsia a decidir se o grande interesse em pornografia infantil é motivo
idôneo para valorar negativamente a pena-base do réu, a título de conduta social ou
personalidade do agente que cometeu o crime do art. 241-A da Lei n. 8.069/1990.
Caracteriza o crime do art. 241-A do ECA oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir,
publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou
telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou
pornográfica envolvendo criança ou adolescente (pena de 3 a 6 de reclusão e multa).
Nesse contexto, o dado inerente ao tipo penal não justifica a exasperação da pena-base, a
título de conduta social ou personalidade. O grande interesse por material que contenha cena
Boletim Criminal Comentado Abril-2020-
(semana nº 01)
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de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é ínsito ao crime descrito
no art. 241-A da Lei n. 8.069/1999. O referido dado já foi sopesado pelo legislador para
criminalizar a conduta e estabelecer severa sanção penal, com o objetivo, justamente, de
proteger a dignidade das crianças e dos adolescentes, pondo-os a salvo de formas desviadas de
satisfação sexual”.