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piapuru Revista do Programa de Iniciação Artistica - PIÁ 2ª Edição/2014 ISSN 2358-8594 Constelações

Piapuru 2014

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ISSN 2358-8594

Constelações

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Revista do PIÁUma publicação da Divisão de Formação Artística e Cultural

Projeto da Secretaria Municipal de Cultura em parceira com a Secretaria Municipal de Educação

Ano 2 - número 2São Paulo, novembro de 2014

ImpressãoWindgraf Gráfica e EditoraEsta revista foi impressa no papel Off Set 90g nasfontes Akzidenz-Grotesk, Adobe Garamond e BellotaFormato 25 cm x 33 cm72 páginasTiragem: 3 milPeriodicidade: Anual

Programa de Iniciação Artística - PIÁAv. São João, 473 - 6ºandar01035-000 - São Paulo - SPTel. 11 33970166 / 11 33970167

[email protected]

PIAPURU: Substantivo abstrato; Pássaro imaginário que transmuta constantemente seus timbres, cores e formas. Com seu canto, o PIAPURU espalha boas novas e carrega em seu bico sementes raras da flora poética infantil. Possui o dom de não deixar-se engaiolar e seu gorjeio sutil pode ser percebido cada vez que uma ou mais crianças brincam em estado de rito. Repa-rando bem, o PIAPURU está em tudo que é lugar.

Fafi Prado

Arte pássaro Piapuru: Adriano Castelo Branco

As publicações da Divisão de Formação Artística e Cultural são um canal democrático e plural de ideias e pensamentos de agentes culturais. As opiniões e conteúdos expressos nesta revista e nos links que levam a sites externos são de total responsabilidade de seus autores e administradores.

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Prefeitura de São PauloFernando Haddad

Secretaria Municipal de CulturaSecretárioJoão Luiz Silva Ferreira - Juca Ferreira

Secretário AdjuntoAlfredo Manevy

Chefe de GabineteGuilherme Varella

Coordenação de Assessoria TécnicaJoão Brant

Assessores Aurélio NascimentoAirton MarangonGabriel PortelaLaura Belles de MoraesLuciana Piazzon Barbosa de LimaPaulo Roberto Tadeu Menechelli FilhoThais Ruiz

Assessoria JurídicaThomas Américo De Almeida Ross

Assessoria de ComunicaçãoGiovanna Longo

Departamento de Expansão CulturalDiretor GeralEduardo Augusto Sena

Assistência TécnicaRodrigo Marx Matias Cardoso

Assistência JurídicaSilvia Gomes da Rocha di BlasiErika Maren Motta

Divisão AdministrativaMarcelo Rugério Bianchi

Divisão de Formação Artística e CulturalMica Farina

Divisão de ProduçãoSulla Andreato

Divisão de ProgramaçãoRafael Nascimento da Cunha

Núcleo de Contratação de Natureza ArtísticaGiovanna de Oliveira Gobbo

ContabilidadeWalter da Rocha Lima

ComprasFabio Enéas Magri

Departamento PessoalLuiz Peres

InformáticaLorelei Gabriela Castro Lourenço

ManutençãoCid Carlos de Souza

ProtocoloEgydio Bottura Junior

Divisão de Formação Artística e CulturalDiretor de FormaçãoMica Farina

Coordenador AdministrativoIlton Toshiaki Hanashiro Yogi

Coordenação de Ação CulturalPriscila TamisFlávia Giacomini Costa

EquipeMercedes Cristina Rocha SandovalGilmar China Kane Bueno de Souza LeiteIsabella de Souza Rodrigues

Secretaria Municipal de EducaçãoSecretárioAntonio Cesar Russi Callegari

Assessoria Especial / Sala CEU Marta de Betânia Juliano

Assistente Técnico de EducaçãoDaniela do Nascimento Rodrigues

Equipe EditorialComissão EditorialAdriano Castelo Branco, Carla Casado, Carmem Munhoz, Cléia Plácido, Eliane Weinfurter, Fábio Puppo, Fafi Prado, Janete Rodriguez, Pedro Penuela, Recy Freire, Rodrigo Munhoz, Selma Aguiar, Talita Vinagre, Val Lima e Zina Filler

Edição de imagens Val Lima

Design gráficoEditora Mínimas

RevisãoElaine Cuencas Santos

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INSTITUCIONAL

A formação no centro da agenda cultural Juca Ferreira............................................................ 4

EMIA, Vocacional e PIÁ: trajetórias, singularidades e desafios Eduardo Augusto Sena.............................................. 5

O agente público artesão e a cidade em formação Mica Farina............................................................... 6

Ensaio para políticas intersetoriais ou Sobre cultura, saúde e outras políticas de fronteira Priscila Tamis............................................................. 7

Processos artísticos, tempos e espaços: Encontro sobre formação artístico-cultural na cidade de São Paulo Andrea Fraga, Cintia Campolina, Fafi Prado, Flávia Giacomini, Priscila Tamis, Priscilla Vilas-Boas, Suzana Schmidt e Zina Filler ............................................................... 9

EDITORIAL

Revelando constelações Fafi Prado e Zina Filler.............................................. 10

PIÁ: Ações, reflexões e transbordamentos Fafi Prado e Zina Filler.............................................. 11

VERBETES

Abordagem em espiral (no ensino de arte) Fafi Prado................................................................. 12

Ação Cultural Equipe de Formação e Pesquisa................................. 13

Acontecimento Fafi Prado................................................................. 14

Afetos Zina Filler................................................................. 14

Artista absurdo Rafael Domingues e Verônica S. Pereira.................... 15

Artista educador Comissão da Revista Piapuru................................... 15

Bagunça Bruna Rodella......................................................... 16

Boneco Helena Miguel......................................................... 17

Brincadeira Guilherme Melo São Felipe.................................... 17

Cápsulas do tempo Zina Filler................................................................ 18

Cidade Fafi Prado................................................................ 19

Corpo Talita Vinagre........................................................... 19

Crise chinesa Dodi Leal................................................................. 20

Cuidado Recy Freire............................................................... 20

Curiosidade Adriano Castelo Branco........................................... 20

Curriculum Vitae Adriano Castelo Branco........................................... 21

DNA Equipe de Formação e Pesquisa................................ 23

Duplas Comissão da Revista Piapuru................................... 23

Encontro Adriano Castelo Branco........................................... 24

Índice Equipe Comissão da Revista Piapuru.................................. 24

Fantástico Equipe Centro Cultural da Penha............................ 25

Frestas Equipe CEU Parque Bristol..................................... 26

Gesto Artístico Equipe de Formação e Pesquisa................................. 27

Histórias e trajetórias Equipe CEU Jd. Paulistano...................................... 28

Infância Carmen Soares ......................................................... 30

Infantocracia Carolina Bagnara...................................................... 33

Jogo de histórias Equipe CEU Cantos do Amanhecer e Comissão da Revista Piapuru................................. 34

KKKK Verônica S. Pereira.................................................... 36

Lanche Fafi Prado.................................................................. 37

Materialidades Adriano Castelo Branco e Eliane Weinfurter............. 38

Memórias de papel Equipe CEU Jd. Paulistano..................................... 39

Monstros Karina Nakahara...................................................... 40

Morte Verônica S. Pereira................................................... 40

N.D.A. Comissão da Revista Piapuru.................................... 41

Notas processuais Equipe Biblioteca Hans Christian Andersen............. 41

Obsidian Caue Capote Strieder................................................ 42

Paisagem Comissão da Revista Piapuru.................................... 43

Parcerias Renata Casemiro...................................................... 44

Pertencimento Marília Carvalho....................................................... 45

Piática Rodrigo Munhoz...................................................... 46

Processo Fafi Prado................................................................. 47

Pum Selma Aguiar............................................................ 47

Quem? Comissão da Revista Piapuru.................................. 48

Retratos Equipe Centro Cultural da Juventude...................... 49

Revista Kaique Henrique dos Santos Leite e Leo Cunha........................................................... 50

Rua Recy Freire............................................................... 51

Ruptura Bruno César Lopes................................................... 52

Selfie Equipe CEU Guarapiranga..................................... 56

Silêncio Comissão da Revista Piapuru.................................. 57

Sonho Leo Cunha.............................................................. 58

Subversão Rosângela Moraes................................................... 58

Super poderes Carolina Bagnara..................................................... 59

Surpresa Renata Casemiro..................................................... 59

Teias Maria Cecília do Amaral......................................... 60

Transcendência Talita Vinagre......................................................... 61

Ufa! Comissão da Revista Piapuru................................. 62

Vínculos Verônica S. Pereira.................................................. 63

Vivências Adriano Castelo Branco.......................................... 63

www Comissão da Revista Piapuru................................. 64

Xadrez Val Lima................................................................ 65

Y Comissão da Revista Piapuru................................. 66

marco Zero Comissão da Revista Piapuru................................... 67

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São Paulo se consolida como uma das principais capitais cul-turais do mundo. Nos últimos anos, cresceu a oferta de pro-gramação e outras iniciativas artísticas, com forte atuação do poder público na produção, financiamento direto e fomento dessas atividades.

A Prefeitura de São Paulo conta hoje com uma ampla rede de equipamentos culturais. São mais de 200 espaços, como teatros, bibliotecas, centros culturais, CEUs e Casas de Cul-tura, que aliam programação diversa e de qualidade com ati-vidades de formação artística.

No âmbito das ações de formação da Secretaria Munici-pal de Cultura, o papel dos programas PIÁ, Vocacional e a Escola Municipal de Iniciação Artística é estratégico. Esses programas de formação estão em franco crescimento e têm sido fortalecidos, aliando objetivos de iniciação artística com formação de novos públicos. Em 2014, 84 espaços da cidade ofereceram mais de 8 mil vagas para crianças, jovens, adultos e idosos.

Por meio da parceria entre as Secretarias de Educação e Cultura, o PIÁ e o Vocacional vêm ampliando sua rede de atuação, e ganharam força com a retomada, neste ano, da gestão compartilhada dos CEUs. A Secretaria também in-vestiu na reflexão sobre esses processos com a realização do Seminário ‘Processos Artísticos, Tempos e Espaços’.

Ainda no âmbito das novas políticas que estão em fase de implantação, a recente incorporação da primeira infância e da terceira idade são estratégicas para atuar efetivamente no

campo da inclusão. Em parceria com o São Paulo Carinhosa, programa da Prefeitura de São Paulo com foco na primeira infância, as ações para este público devem ser incrementadas no próximo ano. Está prevista também para o ano de 2015 a ampliação das linguagens oferecidas, incluindo literatura, circo, fotografia, moda e cultura digital.

Além de seu objetivo primordial, tais programas de for-mação ajudam também a identificar e apontar demandas e necessidades culturais em diversos pontos da cidade, pois são ações capilarizadas nos territórios, que quando incorpo-radas e transformadas em políticas públicas contribuem para a valorização da pluralidade de manifestações.

A Secretaria Municipal de Cultura pretende seguir no aprimoramento e ampliação de suas atividades de formação, garantindo também reflexão qualificada e avaliação perma-nente de suas iniciativas.

Juca Ferreira

Secretário Municipal de Cultura de São Paulo

A formação no centroda agenda cultural

INSTITUCIONAL

A Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo realiza continuadamente diferentes ações que tem por objetivo fo-mentar o fazer artístico e cultural, propiciar a experimen-tação estética e o desenvolvimento de processos criativos emancipatórios. Realizadas em uma rede de equipamentos públicos espraiada por todas as regiões da cidade, oferecem a um público bastante diversificado vivências e meios que potencializam o desenvolvimento autônomo de seus univer-sos simbólicos. Nesse cenário, o Departamento de Expansão Cultural (DEC), através de sua Divisão de Formação Artís-tica e Cultural, é responsável pela gestão de três importantes iniciativas, portadoras de características distintas, mas que compartilham esses propósitos e cujas ações se direcionam para o seu alcance.

Com uma trajetória que completa 35 anos em 2015, a Es-cola Municipal de Iniciação Artística (EMIA) se consolidou, ao longo desses anos, como umas das mais importantes ins-tituições destinadas ao público infantil na cidade. Desenvol-vida a partir de uma inovadora metodologia, fundamentada na integração das linguagens de música, dança, teatro e artes visuais, e concebida para atuar junto à faixa etária compre-endida entre os 5 e 12 anos, a EMIA ofereceu, em 2014, um total de 1.800 vagas. Durante a gestão da Prefeita Marta Suplicy, em reconhecimento dessa trajetória, e com o obje-tivo de estender para um público mais amplo o acúmulo de vivências que tem palco na EMIA, foi realizado nos Centros Educacionais Unificados o Programa “EMIA nos CEUs”.

Em 2008, a partir dessa experiência, e da atualização de seus princípios conceituais e metodológicos, nasce o Progra-ma de Iniciação Artística – PIÁ, que vem construindo uma trajetória e identidade próprias. Gradualmente implementa-do em diferentes equipamentos públicos desde então, o pro-grama atende atualmente 1.800 crianças em 18 equipamen-tos públicos (Centros Educacionais Unificados, Bibliotecas, Centros Culturais), além do projeto piloto desenvolvido em parceria com a EMEF Brigadeiro Henrique Fontenelle.

Com um percurso singular, que contou com a participação ativa de artistas e atores culturais na sua formulação e desen-volvimento, o Programa Vocacional, que completou 13 anos em 2014, realiza suas atividades em mais de 70 equipamen-tos, localizados em todas as regiões da cidade e responsáveis pelo oferecimento de mais de 4.600 vagas, distribuídas nas linguagens de música, dança, teatro, artes visuais e artes in-tegradas. Resultado dessa capilaridade e alcance, o programa

vem se afirmando como um importante agente articulador das dinâmicas culturais locais, envolvendo tanto indivíduos quanto grupos e coletivos artísticos.

Em conjunto, a atuação dos quase 350 artistas, que anu-almente tomam parte dessas iniciativas, é responsável pelo florescer de novas vocações, vivências e percepções e, impor-tante ressaltar, de uma memória cultural viva da cidade.

Contudo, essa formidável estrutura, reconhecidamente bem avaliada como estratégia de implementação de políticas públicas com foco na iniciação e formação cultural, também precisa enfrentar desafios e lacunas importantes. Primei-ramente, se faz necessário reconhecer que o alcance desses programas ainda é insuficiente para atender a demanda ob-servada pela Secretaria Municipal de Cultura.

A inclusão de novas linguagens, notadamente nas áreas de livro e leitura, bem como a expansão das ações para atendi-mento específico do público de terceira idade e da primei-ra infância nos programas, projetos e ações da Divisão de Formação Artística e Cultural, conformam tópicos que tem sido reiteradamente solicitados nas escutas e diálogos públi-cos realizados pela Pasta.

É igualmente imperativa a necessidade de formulação e desenvolvimento de novos marcos operacionais, aptos a cap-tar a multiplicidade dos atores culturais e as novas formas de organização que as dinâmicas culturais contemporâneas admitem, bem como adequar os programas à modos mais adequados de gestão, que permitam aos artistas e profissio-nais envolvidos lograr melhores condições de trabalho.

O método adequado para romper esses obstáculos e ven-cer esses desafios, acreditamos, deve estar assente no diálo-go constante entre os diferentes atores interessados (artistas, usuários, Poder Público) e na criação de estratégias que con-sideram as premissas que orientam as ações (e aspirações) de cada parte.

Desse modo, é possível admitir que do embate de ideias e proposições seja possível emergir as bases que irão orientar as ações futuras dessas iniciativas que, desde sempre e então, se fortaleceram a partir de uma plataforma que tem como força motriz a ação coletiva e colaborativa, e a interação entre o público e o artista.

Eduardo Augusto Sena

Diretor do Departamento de Expansão Cultural

EMIA, Vocacional e PIÁ:trajetórias, singularidades e desafios

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Um luthier é um artesão. Busca sonoridades. Pesquisa ma-deiras, materiais, formatos e fluxos. Cria e constrói exoes-queletos - prolongamentos dos dedos, dos punhos, do cora-ção que percutem, amplificam, filtram e modulam vibrações no mundo. É também um esteta da pólis. Todos, fundamen-talmente, o são.

Podemos definir o cidadão cultural como um esteta da pó-lis. Um agente público é também um artesão. Que cidade estará construindo o artesão agente público?Diferença como expressão, igualdade como razão

A diferença é matéria prima da expressão cultural. Da dife-rença, identidade e de suas relações nascem as culturas. Di-ferença não é sinônimo de desigualdade como poderíamos imaginar. E igualdade não é massificação. Na vida urbana, cada vez mais urbana e menos vivida, esta pseudo-igualdade, não a de direitos e oportunidades, mas aquela reduzida à hegemonia cultural, sustenta para todos e tudo que é preciso aniquilar para assim, consumir mais.

Uma criança de doze anos já assistiu mais de 20 mil assas-sinatos reproduzidos em telas. Sem perceber, extenuados e excitados, nós adultos capturamos o tempo expressivo das crianças. Nosso filho sonhou com uma heroína com asas de borboleta, ela tinha uma cicatriz no queixo e não vendia do-ces e balas nos faróis. O tema da formação em evolução

Retorno ao artesão agente público. Quais serão os ins-trumentos do amanhã? Michel Serres afirma que o “mun-do mudou tanto que os jovens precisam reinventar a roda”. Missão compartilhada pela formação cultural. Ouvimos, ao mesmo tempo, ecos do pensador italiano Umberto - “algu-mas invenções não podem ser melhoradas”.

Um francês pensou o mundo enquanto raízes, um alemão pensou com espinhos, nós, queremos folhas, flores, odores e cores.

Há cidades dentro da cidade: imensas, invisíveis, um mapa da exclusão. Uma política redistributiva não significa divi-dir mentes e espíritos. Significa outra coisa. Não significa reforçar ou levantar novos muros. Significa conviver. Parece inexistir um único problema público que possa ser tratado individualmente, isolado ou segregado. Precisamos de todos.

A ideia é a integralidade dos indivíduos e populações, alcan-ce, articulação e garantia de direitos fundamentais. A ação é a política de agenciamentos na qual os atores são cada um e todos - agentes públicos na construção coletiva dos espaços, sejam estes equipamentos, ruas, trens, ônibus, praças ou ave-nidas. O método é cartográfico - diálogo, agenciamento de forças e afetos, escrita, planos, ato. O que nos acompanha - experiência e experimentação, sustentadas pela emancipação e voz de seus compositores.

Não se alcança integralidade sem a ousadia da disposição e disponibilidade em criar junto ritmo, espaço, tempo, con-tratempo. Quando integralizamos nossas práticas conceitu-ais e atitudinais nos comprometemos com a diversidade de forças que atravessam um campo e essa é a aposta das polí-ticas intersetoriais. Política de fronteira, que não despedaça nem fragmenta, borra os especialismos, arranja e desarranja, movimenta e sacode as linhas, alinhavando qualidade inten-siva nas parcerias. Afirmamos a transversalização das vidas em acontecimento e do cotidiano da cidade.

Tensionar as certezas é um desvício do olhar de grande uti-lidade. Articular proposições macropolíticas pede uma cons-tante complexificação micropolítica de posturas e olhares. E é assim que a intersetorialidade potencializa nossas ações, tornando-as mais engajadas com as singularidades territo-riais, com as vozes que constantemente nos alcançam e fa-zem passagem. Abrimos interstícios oxigenadores e torna-mos o diálogo uma força ativa de relação para fazer-inventar o que desconhecemos: novas linguagens, novos caminhos e caminhares, novos discursos, novo corpo... deslocar frontei-ras de percepção e afecção.

Tecnologia relacional que dá visibilidade e dizibilidade às diferenças, produzindo responsabilização ética pelos efei-tos que constantemente somos capazes e pelas variações de estilísticas que afirmamos. É a produção de subjetividades e subjetivações, as quais nos implicam histórica e coletiva-mente aos ambientes, às propostas de cuidado, às dimensões democráticas de organização social.

Cidadania cultural, saberes e convivênciaA atualidade da cidade de São Paulo aponta de um lado,

para a ampliação dos tempos e espaços formadores, com mais acesso, participação e diversidade, e do outro, para a insistente manutenção da capitalização dos indivíduos sub-metidos ao jogo mercadológico.

São Paulo se revê nesta gestão que busca avançar superan-do paradigmas culturais opressivos e excludentes que leva-ram seus habitantes a se enclausurarem em seus domínios privados, nos habitáculos de seus carros, e territórios que reforçam guetos e muros.

As políticas culturais do município se revestem de estra-tégias para reverter esta lógica com o resgate e a valorização do espaço público; o fortalecimento do diálogo na constru-ção das políticas públicas e no seu reconhecimento como elemento democrático por excelência; na atualização e na recuperação de iniciativas criativas para a cidade; e na bus-ca de sinergias para o enfrentamento de problemas públicos que emperram a construção de uma cidade mais inclusiva e humana. Mais festiva, alegre e feliz.Práxis - diretrizes da formação artística e cultural para a cidade

Finalizamos assim, recomeçando. Seguimos caminhando em direção diversa daquelas que reduzem a experiência ar-tística e a vivência cultural a seus valores mercadológicos e a sua dimensão eventual. Reafirmamos as diretrizes das nossas políticas de formação com a radicalidade de uma produção artística e cultural para toda e qualquer idade, para todo e qualquer tempo, em todo e qualquer espaço:Promover a formação artística e cultural livre e emancipa-dora;Fortalecer as políticas de cidadania cultural;Democratizar o acesso à formação artística e cultural para todos;Contribuir para as políticas setoriais de formação cultural;Contribuir para a memória cultural da cidade e de suas po-líticas de formação;Estabelecer projetos de formação para formadores.

2014, é primavera em São Paulo.

Mica Farina

Diretor da Divisão de Formação Artística e Cultural

Aqui subjetividade não é compreendida como proprie-dade intimista de um sujeito ou por determinações sociais, mas em conexão rizomática com processos sociais, culturais, tecnológicos, midiáticos, ecológicos, urbanos. Pensamos a subjetividade como processo e não como estrutura: a ideia de interioridade identitária cede lugar à de processualidade e pluralidade em constante transmutação e relação com exte-rioridades, sendo assim processos de subjetivação.

Em 1986 aconteceu no Brasil a 8ª Conferência Nacional de Saúde que, de modo complementar e colaborativo à Or-ganização Mundial de Saúde (OMS), define saúde como “a resultante das condições de alimentação, habitação, educa-ção, renda, meio ambiente, trabalho, emprego, lazer, liber-dade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde”. Neste sentido, a relação dicotômica saúde/doença do para-digma hegemônico do saber biomédico (com o fim ideal de conservação funcional do corpo orgânico), patologizante e quimicoterapêutico, dá lugar ao corpo associado à mente, às emoções, relações socioeconômicas e coletividades. Saú-de, portanto, que não é da unicidade de um órgão, mas da trama também rizomática na qual este estabelece suas re-lações e funcionalidades, desnaturalizando procedimentos que transformam problemas sociais em problemas de saúde.

É neste sentido criativo e ampliado que as políticas de cul-tura e formação artística e cultural estão implicadas com as políticas do corpo, políticas de narratividades, de produção de saúde, subjetividades e territórios geográficos e existen-ciais. Está aí nosso desafio e compromisso, enquanto agentes públicos, enquanto cidadãos.

Este é o intento de uma narrativa dos atravessamentos, da transversalidade das práticas e conceitos - o movimento de uma abertura comunicacional.

Priscila Tamis

Coordenadora de Ação Cultural

O agente público artesãoe a cidade em formação

Ensaio para Políticas Intersetoriaisou Sobre Cultura, Saúde e Outras Políticas de Fronteira

INSTITUCIONAL

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Como um dos marcos da Coordenação de Formação e Pes-quisa no Programa de Iniciação Artística (PIÁ) e no Pro-grama Vocacional o encontro Processos Artísticos, Tempos e Espaços, veio configurar-se como um espaço de conexão, discussão e novos apontamentos, implicados com as dire-trizes de formação da Secretaria Municipal de Cultura. A esta proposta somou-se a participação da Escola Municipal de Iniciação Artística (EMIA) para a construção de um eixo comum. Para a efetivação do encontro, a parceria com o Centro Cultural São Paulo foi de fundamental importância.

O acontecimento teve a oportunidade de fazer impor-tantes articulações entre os programas do Departamento de Expansão Cultural (DEC) - Vocacional, PIÁ e EMIA - bem como as aproximações e interlocuções com as Co-ordenadorias de Bibliotecas, Centros Educacionais Unifica-dos (CEUs) , Centros Culturais e Secretaria Municipal de Educação através dos Departamentos de Orientação Técnica (DOT) de São Paulo.

Realizado entre os dias 5 e 19 de setembro de 2014, o en-contro estruturou-se em diversos momentos.

As Rodas de Conversa “Territórios de Atuação e Cartogra-fias Artísticas”, com a Profa. Dra. Lilian Amaral e Rodrigo Munhoz (PIÁ); “Tempos e Espaços da Experiência”, com a Profa. Dra. Lucia Maciel Barbosa de Oliveira e Tatiana Guimarães (Programa Vocacional) e “Infância e Construção Compartilhada de Saberes”, com o Prof. Dr. Marcos Ferreira e Sandra Cunha (EMIA) foram abertas à participação do público. Com a finalidade de abordar o tema do encontro sob distintas perspectivas pelos pesquisadores convidados, artistas educadores e representantes de equipamentos públi-cos de cultura, as rodas acompanharam os perfis dos convi-dados que expuseram suas dinâmicas próprias em diálogo com proposições artísticas dos programas.

Vivências Artísticas e Compartilhamentos de Processos fo-ram oferecidos pelos artistas dos Programas Vocacional, PIÁ e EMIA em alguns equipamentos públicos da Cultura apre-sentando as pesquisas-ação efetuadas nos respectivos progra-mas e as abordagens artístico-pedagógicas da EMIA. Além disso, aconteceram conversas com os artistas Roberto André e Guto Lacaz e com a Profa. Dra. Patrícia Prado que, por meio de suas experiências, estabeleceram um diálogo com as práticas dos programas e da escola.

Com o intuito de dar voz aos participantes dos programas PIÁ e Vocacional e aos alunos da EMIA, o encontro ofere-ceu um Espaço Expositivo no Centro Cultural São Paulo que abrigou uma instalação áudio visual, performances e outras materialidades dos processos desenvolvidos pelos seus participantes.

Como síntese e memória do encontro Processos Artísticos, Tempos e Espaços está prevista uma publicação em parceria com o CCSP contendo textos reflexivos e registros fotográfi-cos. A distribuição será feita em equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura e Secretaria Municipal de Educação, além de outras instituições culturais da cidade de São Paulo.

Na certeza de termos inaugurado novos tempos e espaços de diálogo entre os programas e as diretrizes das Secreta-rias de Cultura e de Educação, esperamos ter colaborado de maneira efetiva com a discussão sobre formação artístico--cultural na cidade de São Paulo.

Comissão Organizadora do Encontro Andrea Fraga, Cintia Campolina, Fafi Prado, Flávia Giacomini, Priscila Tamis, Priscilla Vilas-Boas, Suzana Schmidt e Zina Filler

Processos artísticos, tempos e espaços:Encontro sobre formação artístico-cultural na cidade de São Paulo

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A comissão da Revista Piapuru 2014 apresenta o segundo número da publicação de trabalhos do Programa de Ini-ciação Artística – PIÁ -, cujo tema é Constelações. Nosso desejo foi o de alçar um voo em busca de um céu pleno de verbetes-estrelas onde várias constelações pudessem ser criadas e imaginadas por cada leitor que delas se apropriasse.

Sabe-se que, desde sempre, os homens observaram o céu, buscando configurações que dessem sentido para a sua exis-tência terrena. Nós, no programa PIÁ, também temos bus-cado e criado, a cada edição do programa, os sentidos que norteiam nossos percursos.

Para estas Constelações, pedimos a todos os participantes do PIÁ - artistas educadores, crianças, jovens, familiares e demais envolvidos – que elaborassem verbetes, traduzindo conceitos, princípios e afetos vivenciados a partir do progra-ma. Palavras-chave que explicitassem, em forma de textos e imagens, um recorte dos fazeres artísticos do programa.

Inspirada em referências como a “Casa das Estrelas”, de Javier Naranjo e “Coleção L’ABCdaire”, da editora Flamma-rion (Paris), esta segunda edição da revista inaugura um for-mato em que diferentes vozes puderam dialogar para além das funções e territorialidades do programa, trazendo um olhar sensível e singular para compor as mais diversas cons-telações.

Processo colaborativoNum programa que busca a cada ano se construir pelas

práticas e singularidades de todos seus participantes a es-colha dos verbetes para a revista também não poderia ser diferente.

As colaborações voluntárias se deram a partir de temas es-colhidos pelos colaboradores que mantivessem relação com os processos do programa, seguindo critérios como a refle-

xão crítica, o caráter lúdico e as poéticas inerentes ao PIÁ, abarcando desde os fazeres artísticos-pedagógicos até as ex-periências vividas como reverberação dos encontros.

O formato adotado buscou contemplar a pluralidade de saberes das pessoas que formam uma rede de convívio com as crianças e jovens no programa, desde o artista educador estendendo-se aos familiares, educadores, núcleos de Ação Cultural, funcionários, pesquisadores e parceiros em geral, aos quais a revista é direcionada.

A comissão esteve aberta durante todo o processo de dis-cussão e seleção do conteúdo e, se num primeiro momento, os artistas participantes elencaram um apanhado de verbetes fundamentais à publicação, no decorrer do processo estes foram se transformando pautados principalmente pela coe-rência com as práticas e compondo um olhar plural, calei-doscópico.

Dentre as colaborações encontramos escritos, desdobra-mentos, aforismos, citações, imagens, registros de processos artístico-pedagógicos, relatos de experiência, diários de bor-do, anotações, depoimentos, artigo e links eletrônicos refe-renciais.

Eis aqui este panorama em direção às constelações. Que traga brilho aos percursos e que nos leve a novos processos artísticos, instigantes pelo seu frescor e pela sua diversidade. Boa Leitura!

Fafi Prado e Zina FillerCoordenação de Formação do PIÁ

Revelando constelações

O PIÁ (Programa de Iniciação Artística) vem se constituin-do ao longo de sua existência como um programa público de características bastante peculiares e cujo foco norteador é o processo artístico. As diferentes linguagens abordadas soma-das às experiências e bagagens dos artistas, formam entre si um conjunto de múltiplas referências, alinhavadas pela ideia da partilha de saberes, da escuta e da participação coletiva.

Como um processo que se metamorfoseia em contato com os que dele participam, o PIÁ pode ser considerado hoje um programa que tem como norte a aproximação entre Infân-cia e Arte, abrindo um vasto campo de pesquisa e atuação transversal e projetando no seu horizonte a importância do cuidado para com a arte como bem cultural.

Em uma constante reflexão sobre os princípios tidos como norteadores do programa - elaborados paciente e generosa-mente pelos artistas que por ele passaram ao longo de seis anos e pelos que continuam somando a ele as suas colabo-rações - surgem a todo momento novos olhares e questio-namentos sobre o que vem a ser hoje a prática da iniciação artística como uma política pública de formação cultural.

Um dos mais importantes significados do PIÁ é o trans-bordamento de seus campos de atuação. Fazer parte do PIÁ como artista educador significa ocupar um lugar ativo para além dos encontros em “sala de aula”. Significa também fa-zer pontes com a educação sobre modos de compreender a infância. Uma boa questão nesse sentido seria: como ecoar as práticas do programa de maneira transversa às múltiplas áreas do conhecimento, para devolver às práticas educativas, por meio da arte, a totalidade que as especialidades separa-ram? Como ativar conteúdos que gerem sentimento de per-tença e autonomia na criança sobre sua maneira de ser e de aprender? O que significa, hoje, neste início de século XXI, numa cidade como São Paulo a proposição de um programa

de iniciação artística para crianças e jovens? Iniciar quem? Infantes? Qual infância? Por meio de quais pedagogias? Em que pensamento sobre arte? E em que âmbitos?

Fazer parte do corpo de artistas educadores do PIÁ sig-nifica ainda fazer ressoar as práticas compartilhadas inter-namente para dá-las a conhecer, como devolutiva à própria construção de novas políticas para o programa. Quais seriam as potências de um programa público, ainda em processo de construção, como o PIÁ? Qual a importância de mantermos o programa vivo e atuante frente as grandes dificuldades de diversas naturezas enfrentadas a cada ano, ao longo de sua vigência? O quanto a construção de um pensamento artís-tico pedagógico sólido e afinado com seus vários contextos pode vir a colaborar como um parâmetro de política pública cada vez mais imbricada na interlocução social?

Movido pela crença na importância de um pensamento artístico que não se separa da vida cotidiana, indício de um modo largo e irrestrito de pensar a formação, o grande méri-to do PIÁ talvez seja a coragem com que seus artistas propõe ao domínio público o exercício de uma cidadania crítica, porém não menos afetiva, tendo a arte como suporte e modo de expressão.

A conquista de um veículo de comunicação como a Revista Piapuru, representa um dos modos de compartilhar as mui-tas inquietações que não cessam de reverberar a cada edição, proporcionando visibilidade, para além das discussões inter-nas do programa, das questões que pertencem a todos nós, potenciais ativadores, envolvidos pelas preocupações acerca do tema da formação artística e da cidadania.

Fafi Prado e Zina FillerCoordenação de Formação do PIÁ

PIÁAções, reflexões e transbordamentos

EDITORIAL

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Abordagem em Espiral (no ensino de arte)

Um dos mais importantes princípios artístico-pedagógicos que fazem parte do material norteador do PIÁ é o da Inter-linguagem. Por ser um terreno de proposições relativamente recentes no campo da arte educação, o PIÁ vem destacando a importância da construção de um pensamento cuidadoso a respeito do tema para que o mesmo possa servir de base conceitual às práticas do programa. Como fazê-lo?A Abordagem em Espiral poderia ser uma estrela-guia: con-siste em uma maneira original de se pensar a arte educação e foi elaborada pela pesquisadora Marina Marcondes Macha-do, hoje docente da Universidade Federal de Minas Gerais. Em linhas gerais, tal abordagem pressupõe:

(...) cultivar um modo de exercer o ensino da arte, em especial a arte contemporânea, enraizado nas formas híbridas; traba-lhar com a integração das linguagens artísticas, miscigenações, misturas e descontornos que permitam a performance, os ha-ppenings, imersões, ambientações, acontecimentos concomitan-tes, experiências artísticas e existenciais; bagunçar um pouco a linearidade das quatro linguagens, que, se trabalhadas de modo integrado, podem tornar-se uma só. (MACHADO; 2012)

Trata-se de um modus operandi, ou seja, uma maneira de abordar o ensino de arte e seu currículo com ênfase nos pro-cessos, biografias, poéticas próprias e contextos antropológi-

cos em detrimento de produtos e de reproduções culturais; trata-se ainda de fazer surgir e valorizar novos modos de re-lacionar a arte e o cotidiano. Sobretudo importa escutar o ponto de vista da criança, o que significa procurar seu olhar e experiência, de seu ponto de vista: isso nos leva a outra no-ção, a de “criança performer”. Será a partir do entendimento das formas relacionais, entre adultos e crianças, que o artista educador vai experimentar formas de ensinar e aprender ba-seadas nos saberes em trânsito, não em parâmetros pedagó-gicos estabelecidos a priori. Isso requer uma grande capaci-dade de observação e cultivo de Diários de Bordo, para que surja uma possível “pedagogia relacional”.O conceito de ensino de arte na abordagem em espiral con-vida a uma mudança de vocabulário que venha a contemplar as artes como âmbitos, e não como campos do conhecimen-to ou linguagens. Teatralidades, Corporalidades, Espaciali-dades e Musicalidades são os termos propostos que, se dis-cutidos e praticados, alargam e redesenham os contornos do teatro, da dança, das artes visuais e da música, propondo novas formas-conteúdo na educação estética contemporâ-nea, sem linearidade: portanto em espiral. Este pensamento advém da filiação da pesquisadora à fenomenologia e sua leitura da criança e dos mundos de vida a partir do filósofo Maurice Merleau-Ponty.

ReferênciaMACHADO, Marina Marcondes. Fazer surgir antiestruturas: abordagem espiral para pensar um currículo em arte. Revista e--curriculum, São Paulo, v.8 n.1 ABRIL 2012. http://revistas.pucsp.br/index.php/curriculum.

Ação Cultural Resumidamente, a noção de Ação Cultural pode ser tradu-zida em uma ação interdisciplinar, pois reúne vários saberes e competências, cujo projeto seja a criação indireta de con-dições para que as pessoas se movam em direção aos seus próprios meios inventivos. O PIÁ sendo um programa público de formação artístico cultural, pode ser compreendido como uma grande ação cultural estendida à cidade de São Paulo, pois em suas ações, busca criar agenciamentos para colocar em contato experi-ências artísticas geradoras de processos e não de produtos. Os disparadores da ação cultural no PIÁ seriam os artistas educadores, por meio de gestos artísticos, vão tecendo junto às crianças, familiares e outros participantes do programa, os desdobramentos das ações.Para além dos encontros com as crianças nos equipamentos, são propostos encontros periódicos com os seus familiares, ações nos próprios equipamentos e no espaço público e ain-da propostas de trânsitos entre outras experiências de cunho artístico-cultural relacionadas com as práticas desenvolvidas pelos artistas educadores.Acredita-se no PIÁ que uma ação cultural verdadeira e po-tente deve reverberar ao longo do tempo como um processo que não se esgota em si mesmo, mas que se traduz em apro-priações diversas e autônomas por cada um dos que venham a participar dela.

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AfetosCapacidade almejada pelos participantes do programa PIÁ de provocar ideias, reações físicas e emocionais em ondas cada vez mais amplas. Para isto é necessário ter em seus cor-pos, mentes, sensibilidades, capacidades e trajetórias espa-ços porosos; quanto mais abertos, mais podem afetar e ser afetados pelas pessoas, cores, ventos, líquidos, propostas e outras substâncias visíveis ou não. Não se sabe exatamente a dimensão e consistência destes elementos afetivos, mas tudo indica que sua presença se faz perceber por uma maior fluên-cia na potência individual e coletiva do programa PIÁ. (Esta potência foi observada e demonstrada por Baruch Spinoza no século XVII na sua obra ‘Ética’). Dizem também que pessoas com esta capacidade são aparentadas aos ‘cronópios’ descritos por Julio Cortazár.

AcontecimentoNo PIÁ, tudo pode acontecer. O que não quer dizer que aconteça de qualquer maneira. Tendo a efemeridade como uma de suas características principais, os encontros entre artistas educadores e crianças no PIÁ, tendem a acontecer de forma original e espontânea, em um ambiente de inven-tividade e colaboração mútua. Essa liberdade, porém, não exclui o olhar atento para o potencial do momento presente.Distintamente de uma programação curricular prévia a se-guir, os processos e formas de expressão que fazem parte do pensamento artístico-pedagógico do PIÁ estão muito mais próximos de uma “pedagogia do acontecimento”, imbuídas do frescor das proposições e da capacidade de escuta para os dizeres, significados e contextos. Da tensão entre as propos-tas de artistas educadores e crianças e dos desejos de experi-mentação de ambas as partes surgem propostas outras que, baseadas nos princípios do programa, resultam na presenti-ficação do encontro. Podemos dizer assim, que a construção artístico-pedagógica segue uma linha de estrutura processual em que os saberes dos seus participantes vão entrar em contato e fazem sur-gir uma terceira via na qual está presente o acontecimento como dinâmica de interação. Em termos artísticos, temos o Happening, que pode ser tra-duzido como “acontecimento”. “É uma forma de expressão artística que, apesar de quase sempre planejada, incorpora algum elemento de espontaneidade ou improvisação que se dá de maneira diferente a cada apresentação (...) além do aspecto de imprevisibilidade, geralmente envolve a partici-pação direta ou indireta do público espectador”.

Artista Educador No PIÁ, todos somos artistas educadores. O que significa ser um artista interessado nas conexões entre a arte e as possibi-lidades educativas que ela oferece. O artista educador atua em estado de porosidade com as crianças e jovens, além das interações que estabelece com as suas duplas de trabalho, as equipes, os espaços, os contextos, os parceiros e as comuni-dades onde o PIÁ está inserido.A tessitura destas relações acontecem em um constante ir e vir, inclusive no que diz respeito às funções que lhe são atribuídas (artista educador coordenador de equipe, artista educador coordenador regional e artista educador coorde-nador de formação e pesquisa). Espera-se de todos eles um olhar que pulse entre o global e o local, entre os macros e os micros territórios de atuação, numa espécie de visão calei-doscópica, que vai focar e colocar em diálogo os modos de ser da infância e as pesquisas artísticas de cada artista inde-pendentemente de sua função. Tanto na escuta generosa, quanto no compartilhamento de processos, o artista educador do PIÁ é o profissional dispos-to a fazer transposições entre linguagens e atualizar-se em direção a uma abordagem contemporânea acerca da arte e da infância.

Artista AbsurdoVivo para o encontro da criança absurda. “Eu sou o artista, me pintem... Como eu não sabia disso antes? Sou mesmo um absurdo!”Rafael Domingues, PIÁ

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Brincadeira

“É melhor fazer sua brincadeira do que já estar pronta sua brincadeira.”Guilherme Melo São Felipe, PIÁ

Boneco

Receita para fazer bonecoIngredientes:Folhas de jornal/Água/Tinta/Cola/Barbante/Pedaços de te-cidos/Palitos de churrasco.

Modo de Fazer:•Rasgue o jornal em pedaços pequenos.•Coloque os pedaços em um recipiente com água e deixe de molho até amolecer.•Bata o jornal com água e cola no liquidificador até formar uma massa grossa.•Coe essa massa e deixe o excesso de água escorrer.•Modele a cabeça do boneco e pinte quando secar.•Cole a cabeça num corpo de pano.•Cole um barbante na cabeça com cola quente e amarre-o no centro de uma estrutura feita de palitos em forma de “X”.•Amarre barbantes nas pernas e braços do boneco e amarre as outras pontas do barbante nas pontas dos palitos em “X”.•Decore como quiser! PRONTO!!!

Bagunça_Onde fico?-Por aqui!_Aonde eu vou?-Onde você quiser!-Posso ir ali?- Pode! -Posso tirar o tênis?_Pode!-Posso deitar no chão?-Pode! -Posso falar?_Pode!- Posso bagunçar então?- Isso! Pode!- PIÁ é bagunça? -PIÁ é bagunça sim!

Mas o que é bagunçar?Espalhar tecidos, jogar confetes, derrubar espumas, escon-der-se em baixo da mesa, colocar a blusa na cabeça e usar o sapato como bola. Amarrar tecidos nas cadeiras e fazer uma cabana, um castelo, um barco ou o que mais imaginar. Enrolar-se no jornal e virar princesa, rei, mago ou um ser misterioso. E de tanto bagunçar, inventar uma história.

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Cápsulas do tempo A expressão ‘cápsula do tempo’ começou a ser utilizada em 1937 para designar recipientes especialmente preparados para armazenar objetos ou informações com o objetivo que os mesmos pudessem ser encontrados pelas gerações futuras.No PIÁ cápsulas do tempo foram construídas pelas equipes de artistas e crianças de cada equipamento com o objetivo de serem encontradas na edição seguinte pelos novos parti-cipantes. Foi uma estratégia para lidar com a vigência inter-mitente do programa (normalmente ele é interrompido por quatro meses entre um ano e outro) e ao mesmo tempo do-cumentar a criação e passagem de artistas, crianças e jovens pelos equipamentos. Cápsulas para serem descapsuladas e transformadas pelo tempo e pelas pessoas.

Corpo CORPOPode muito,ser OUTROSser ele MESMOcom suas passagens, memórias e inscrições.No aqui e agora, no ENTRE do dentro e do fora.Ser, estar, lançar outras sensorialidades.Ser total porque presente, virtual porque futuro e sobrena-tural porque passado.Onde está o corpo?Aqui, ali, acolá.Descobrindo-se livre, cada vez mais, no brincar.CORPO que faz surgir gigantes, bichos e outros seres fan-tásticos, num desdobrar incessante de planos e histórias que, através dele e com ele acontecem.Recorte de experiências , o CORPO é também um “faz de conta” profundo e repleto de necessidade, que faz e desfaz mundos, e, tal como um tapete voador, com suas franjas esvoaçantes PODE sempre nos levar a lugares mágicos e des-conhecidos.

CidadePIÁCIDADE – poemanifesto para megafone.

O PIÁ está na cidade.A cidade atravessa o PIÁ.

O PIÁ é programa público.Pública é a cidade.

O PIÁ é desejo de investigação.A cidade dá as pistas.

O PIÁ é polifônico.A cidade faz o coro.

PIÁCIDADE

A cidade dá a letra.O PIÁ escreve poema.

A cidade educa.O PIÁ também é rua.

Onde a cidade ignora.O PIÁ faz questão.

A cidade, embora agonizante, ainda respira.O PIÁ está na cidade.

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CuidadoCrise ChinesaNão. Isso não é um parênteses inusitado sobre a situação econô-mica dos BRICS. Este verbete é um trocadilho muito en-sinador das coisas da vida. Ele diz sobre os impasses, per-turbações e conjunturas inesperadas que se manifestam nos longos suspiros e coçadinhas de cabeça daqueles que, em determinada situação, já não sabem mais o que fazer!!!Sim.Estamos nos referindo aos momentos difíceis pelos quais passamos todos, artistas educadores, em diversos âmbitos de nossa existência. Seja pelo mundo a fora ou no conforto de nossas moradas, seja entre nossos pares ou íntima e solita-riamente, sempre haverão embaraços. Nessas horas, por não encontrar o chão habitual, visitamos o desequilíbrio e, trôpegos ou não, lançamo-nos ao passo. Isso tudo é a Crise. Mas por que Crise Chinesa?*No mandarim, língua codificada por ideogramas, não há uma grafia específica que indique a palavra crise. Esse con-ceito é construído com a justaposição de dois ideogramas: o de perigo e o de oportunidade.A Crise Chinesa traz ainda outro bonito ensinamento: den-tro de uma só palavra coabitam duas. Assim como ela, den-tro de nós, e de cada coisa, e de cada ser, e de cada sonho, e de cada história, e de cada símbolo, de cada silêncio, existi-rão muitos caminhos. * Augusto Boal, diretor e dramaturgo brasileiro, trouxe o conceito da crise chinesa para o Teatro do Oprimido. Em uma de suas técnicas a crise chinesa é o momento dramático em que uma personagem se vê no auge de um conflito anta-gônico e precisa encontrar saídas.

CuriosidadeForça motriz da investigação e da descoberta. Como é? De onde vem? Como faz? O que acontece? E se...?

Curriculum VitaeO que preciso saber para estar no PIÁ:

tudo o que puder sobre jogos, crianças, brinquedos e surpresas.reinventar as coisas já inventadas e batizá-las sem nomepara que sejam adotadas e vividas.Celebrar o ritual da brincadeira e deixar a mesa posta.Vestir o cotidiano com o ânimo das borboletas e deixá-las.Acolher todos os “tchu tchu tchás” e dar-lhes de comer.Aprender a pular amarelinha no escuro à beira do precipí-cio – & então, renovar a cada dia a entidade do abraço a fim de exercitar o desafiode viver encantado.

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Duplas

Um dos pilares estruturais do programa é ter nos encontros uma dupla de artistas educadores, que compartilham suas trajetórias, técnicas e saberes em diálogo com os desejos, ne-cessidades e olhares das crianças.

Vá até a página 41

[1 + 1 = hibridismo poético]

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Fantástico

Encontro

Acontecimento dialógico entre piazeiros e piazistas* em que se busca uma relação criativa baseada no compartilhamento do desejo poético e no livre exercício da imaginação de cada um, procurando potencializar e desenvolver artisticamente olhares e habilidades lúdicas, imagéticas e práticas, celebran-do a inteireza do indivíduo e a força do coletivo.

*termos cunhados por algumas crianças do PIÁ para designar como piazeiros os artistas educadores e como piazistas os artistas do programa.

Equipe

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Gesto Artístico

Gesto é o nome do cruzamento onde se reencontram a vida e a arte, o ato e a potência, o geral e o particular, o conceito e a prá-tica. Fragmento da vida subtraído do contexto de uma biografia individual e fragmento subtraído de um contexto de neutrali-dade estética. Pura práxis. Nem valor de uso, nem valor de tro-ca, nem experiência biográfica, nem evento impessoal, o gesto é o contrário de uma mercadoria que faz precipitar no momento os cristais desta substância social comum. (AGAMBEN; 1995: 90)

O conceito de gesto artístico como norteador de uma polí-tica pública que pudesse beneficiar público, artista, escola e comunidade surgiu na região norte da França por meio de uma iniciativa autônoma das divisões regionais de ação cul-tural (DRAC) ligadas ao Ministério de Cultura da França. O que se entende por gesto artístico neste contexto são pro-posições cocriadas por artistas de distintas linguagens em diálogo com o público em territórios diversos como escolas, bibliotecas e centros comunitários de cultura.Trata-se de um conceito que em muito se aproxima das prá-ticas do PIÁ, pois ambos partem de um posicionamento po-lítico que valoriza a ação artística como potência de diálogo entre todos os envolvidos. Situados nas fronteiras entre as linguagens artísticas e contrárias à ideia de arte como merca-doria, o conceito de gesto artístico e as práticas dos artistas do PIÁ transbordam para o campo da construção da cidada-nia, pois atuam na contramão da ideia de evento, espetácu-lo, fabricação ou reprodução de modos estabelecidos de arte e cultura. (ANNYCKE)

ReferênciasAGAMBEN, Giorgio. Moyen sans fins. Notes sur la politique (1990-1995).Paris: Rivages, 1995. p.90.

ANNYCKE, François. http://www.en-toutes-lettres.eu/

Frestas

O mistério da vida vive dentro dos buracos. Dos túneis, das fendas, das cavernas, das cabanas de lençol. Por isso, é tão gostoso espiar pelas fechaduras, xeretar gavetas, colar na pro-va, cochichar no ouvido do amigo. Parece que o mundo, quando recortado, fica maior ainda…

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Histórias e trajetórias

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Infância Infância Intempestiva: fogo e águaCarmen Soares

Três mutações vos cito do espírito: como o espírito se torna em camelo, e em leão em camelo,

e em criança, por fim o leão.Nietzsche

Prelúdio:Quando era criança, não tinha uma chuva de verão que

caísse sem que eu não me banhasse nela. Eu e meu irmão, juntos, cada um na sua, calados, curtindo as torrentes das águas, nas costas, na cara, nos cabelos... Exagerávamos, aproveitávamos a sarjeta que virava uma cachoeira ou as go-teiras do telhado que virava o melhor chuveiro do mundo... Nunca tivemos nenhuma doença por causa das chuvas, nem de gripe nem de rato, nem de pele, nem de pulmão, nem de cabeça, nem de nada...

Não passava um inverno na rua onde eu morava em que os adultos não se juntavam, quando a noitinha chegava e faziam uma fogueira. Lembro-me de uma roda grande e, em volta dela, adultos e crianças, todos se esquentando. Às vezes, quase sempre, assávamos umas batatas na brasa. Lem-bro-me de ouvir histórias cotidianas... Eu muito menina, olhava admirada a roda e o fogo... Gostava de no outro dia visitar as cinzas da fogueira e ver os cachorros se esquen-tando no carvão ainda quente. Aproveitávamos os carvões para desenhar nossas amarelinhas, ou simplesmente riscar os muros, o asfalto... Fogo e água estiveram presentes na minha infância. Do fogo, herdei a coragem e a intempestividade e da água, a candura. De ambos, herdei o respeito pelo risco.

Interlúdio:Foi em único dia, mágico de chuva, que as crianças de 05 a

07 anos conheceram ao mesmo tempo a euforia que a chuva desperta no corpo e o aconchego que o calor do fogo traz. O medo, que poderia ter bloqueado tudo desde o princípio, foi quem impulsionou a aventura...

(fim do interlúdio)

Recentemente conheci um autor, Walter Omar Kohan, fi-lósofo e professor na UERJ na área de Educação... Há um texto que ele escreveu, chamado “Infância da educação: o conceito devir criança”, disponível para quem quiser ler na internet (aliás, recomendo), em que ele começa de cara se perguntando o que seria a infância afinal. E, o que é pergun-tar sobre ela. Será que algo de infantil nos atravessa, quando nos fazemos tais perguntas?

Partindo de alguns conceitos de Deleuze, este autor nos chama atenção para pensar a infância como algo à margem, na contra mão do que já existe, uma micropolítica capaz de criar linhas de fugas. Uma infância que ele chamará de minoritária, que seria capaz de fugir às regras de uma defi-nição já há muito pré-estabelecida, a majoritária, aquela que estaria associada ao que já conhecemos em termos de educa-ção para crianças, que pressupõe uma progressão sequencial, cronológica, aquela que ocupa os estatutos e as políticas pú-blicas, os parâmetros e as regras escolares. “As maiorias não se definem pelo número ou pela quantidade, mas porque são um modelo ao qual há que se conformar. As minorias, ao contrário, são potências não numeráveis ou agrupáveis em conjuntos, elas não tem modelo, estão sempre em processo”, diz o autor parafraseando Deleuze. A infância minoritária seria então, aquela capaz de criar fissuras, seria uma infância que permite a existência plena da infância, que se constitui como fluxo, como experiência, revolução, resistência e ins-tauração de novas possibilidades de existir, uma infância de criança-devir.

O termo devir, para Deleuze, seria a instauração de ou-tros tempos que não os cronológicos, por isto o devir seria invenção e não a imitação dos modelos já dados. De modo que devir-criança para Deleuze não seria voltar a ser criança,

mas sim o encontro entre duas pessoas, que provocaria uma terceira coisa entre ambas. No caso do PIÁ, este encontro é feito entre o adulto e a criança, ou melhor dizendo entre dois adultos e uma turma de crianças. Este encontro impulsiona-ria, assim, esta infância minoritária e revolucionária da qual nos fala Kohan, capaz de gerar fissuras e deixar viver a criança e a sua maneira inovadora de se relacionar com as coisas que estão à sua volta.

Epílogo, de volta ao começo: A chuva, o fogo, o novo, o choro e a roda que gira.Estávamos em roda Helena (minha parceira de trabalho)

e eu conversando não me lembro do quê com as crianças, quando de repente ouvimos um grande trovão, seguido de muitos gritinhos agudos e até de um choro de uma delas, que até então tinha muito medo de chuva. Dissemos, para acalmar esta criança: -“É só a voz chuva, vamos lá ver?” Todas foram correndo olhar a chuva. Beatriz, ressabiada, venceu seu medo e foi também. Só olhar não bastou. Primeiro a mão, depois o pezinho, daí a pouco a perna toda, a cabeça e por fim, o corpo todo. A cada ousadia empreendida e não repro-vação de nossa parte, o sorriso ainda mais se abria e os corpos ainda mais se molhavam. E Beatriz no meio, esquecendo por completo aquele medo construído. Não era um dia quente de verão - dias melhores que meu irmão e eu escolhíamos para tomar nossos banhos diários na chuva -, fazia até frio. Se não me falha a memória, foi a última chuva forte que São Paulo viu, antes desse período de dias totalmente secos. Como elas molharam toda roupa, tínhamos uma preocupação para que não ficassem doentes. Decidimos fazer uma pequena simbó-lica fogueira com as velas que tínhamos na sala para aquecer as crianças. Secamos as crianças com alguns panos, pedimos para que elas colocassem as blusas e tirassem as roupas que estavam excessivamente molhadas. Trocamos suas roupas por algumas fantasias improvisadas que tínhamos e deixamos as molhadas “secarem” a luz do abajur, ou ao fogo da vela... En-quanto isto, uma nova descoberta se iniciava. Notável per-ceber que era a primeira vez que as crianças tinham contato com fogo. É possível também pensar que o mesmo se deu para o contato com a chuva.

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Infantocracia

O que vai acontecer quando as crianças tomarem o poder?

Tudo que é prioridade vai importar primeiroNo mercado de trabalho nunca vai faltar:Goleiro, Astronauta e Bombeiro.

E o salário do banco vai cair na banca de figurinha.O morador de rua que não tem casa vai poder dormir na minha.

E pro almoço hoje tem brigadeiro.Eu vou brincar, não vou pensar em dinheiro.E todo pai vai ter que ser sorveteiro.E a mamãe vai me dar beijo o dia inteiro.

O mundo é novo, o sistema é novo e quem mama não vai ter que chorar.Buá, buá….Rá, rá, rá, rá!

O contato com o fogo gerou naquele grupo o que posso chamar aqui de um ritual de iniciação, de entrega, de re-nascimento. De tempos em tempos, uma criança se quei-mava com o choro da vela. Todas, sem exceção, receberam por descuido delas mesmas, como batismo daquele ritual, o choro da vela em sua pele. A resposta que davam era cho-rar, quase que copiosamente. Não adiantava falar para terem cuidado com a vela que se derretia pelo fogo, elas estavam tão eufóricas brincando de pingar o fogo na água, que, de vez em quando, faziam movimentos mais bruscos e acaba-vam se queimando... Desconfiamos que houve proposita-damente um efeito dominó: Talvez, inconscientemente, ou conscientemente, todas quiseram ter contato com aquela ex-periência que ao mesmo tempo era de dor, mas também de coragem em enfrentar seus próprios medos. O contato com o fogo, apesar de suscitar nelas curiosidade e envolvimento, não trouxe este cuidado com o desconhecido e só o choro infantil causado pelo choro da vela em contato com a pele, podia fazer esta ligação, de que era preciso tomar cuidado, porque o fogo aquecia, mas podia queimar... Como nos pa-receu que nunca tiveram aquela experiência do queimar-se com o fogo, incluímos este acontecimento na esfera do dia. Era algo pelo qual aquelas crianças precisavam passar e, se isto podia se dar nesta esfera da ludicidade, da poesia, que bom para elas...

Penso que esses momentos, ou os outros momentos de devir-criança, que os seres humanos envolvidos no PIÁ ins-tauram, talvez estejam muito próximos da educação minori-tário-revolucionária da qual Kohan nos fala, ou da infância sagrada que Nietzsche sugere em seu Zaratustra: o da su-peração de um espírito que carrega ou suporta tudo, para aquele que transcende e instaura sempre um recomeçar de novo, um jogo criativo, uma roda girando e um “sagrado dizer sim”. (NIETZSCHE; 2005: 214). Pode ainda estar longe do que precisa uma cidade como São Paulo ou um país como o Brasil. Pode estar também longe de um ideal de infância, mas é uma centelha que se desprende de um corpo em brasa, uma gota de chuva em tempos de seca como a que temos vivido.

ReferênciasDELEUZE, Gilles. GUATTARI, Félix. Mil Platôs. Capitalismo e Esquizofrenia. Vol. IV. São Paulo. Editora 34, 1997ª.KOHAN, Walter Omar. Infância da educação: o conceito devir crian-ça. In: Lugares da infância: filosofia. DP&A, 2004.NIETZSCHE, Friedrich. Assim falou Zaratustra. In: Os pensadores.

São Paulo. Nova Cultural, 2005.

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uma raposa filhote

buscando o pai cavaleiro solitário

vão todos tentar

castelo da bruxaárvores que ganham vida

mostra a passagem secreta enfeitiçou

piada muito engraçada transformado em espantalho

os três ficam juntos

em um reino distante

sem mais nem menos

poderá nos ajudar

poder de acalmar

cavalo solitário

mais rápido de volta

como guardiões

espantando as pessoas

sentiu sua consciência pesar a maldição

haviam destruído tudo

ainda estavam malvados

decidiram juntos

muitos perigos

um rio de larvas

o lago sem fim

cinco leões

do nada apareceram

muito corajosos

um simples sopro

bruxa e princesa juntas

consertou todo o reino.

na verdade...

como uma das aldeãsum rei tirano

todo o povoado de lá

plano de vingançaconstruir juntos

um mais outro menosum mais pobre um mais rico

a brincadeira era

uma só palavra

a mocinha branca

saudade de príncipe e dragões

animais de pelos fofos

muitas flores.

um príncipe-dragão

“quero namorar com você”

um bafo de leão

muito medo

o meio da floresta

e depois ela voltou

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Jogo de histórias

Instruções:Escolha um ou mais frases e componha uma história. Reconte para alguém.Crie novas instruções.O processo tende a ser infinito.

“Uma raposa filhote está perdida do pai e vai parar no quin-tal da bruxa. Lá, ela encontra o dragão filhote, que decide ajudá-la. Saem buscando o pai da raposa e no caminho en-contram o cavaleiro solitário. Então, ele se junta a eles e vão todos tentar entrar no castelo da bruxa. Mas, eles encontram árvores que ganham vida e os prendem. Então aparece o es-quilo, que joga nozes nas árvores e as árvores ficam fracas e libertam os outros amigos. Depois, o esquilo, mostra a pas-sagem secreta do castelo e eles entram. Encontram o dragão, e o cavaleiro derrota o dragão. Em seguida eles conseguem encontrar a bruxa e conversam com ela. Ela explica que en-feitiçou as outras pessoas, porque achavam que ela é do mal. O esquilo então conta uma piada muito engraçada e a bruxa acaba ficando amiga deles e desfaz os feitiços. Então a raposa encontra seu pai, que tinha sido transformado em espanta-lho e os três ficam juntos”.

Lucas Santos, João Guilherme e Sabrina Santana, PIÁs.

“Em um reino distante moravam dois cavaleiros, quando, de repente, foram atacados sem mais nem menos por quatro dragões. Os dois cavaleiros pensaram: - Quem mandou estes dragões até aqui, para nos atacar?- Só há alguém em todo este reino que poderá nos ajudar, a princesa Alice, que tem o poder de acalmar os animais.Então, os dois cavaleiros partiram em busca da princesa. No caminho, encontraram uma fazenda com um cavalo soli-tário. Os cavaleiros então pegaram o cavalo para chegarem mais rápido no castelo. Foi quando, de repente, a bruxa apa-receu no caminho e transformou os dois cavaleiros e enfeiti-çou o cavalo para levá-los de volta à fazenda, para deixa-los lá como guardiões. Estariam fadados a morarem eternamente na fazenda, espantando as pessoas que chegassem por perto.A bruxa, vendo que a sua maldição tinha causado tudo aqui-lo, sentiu sua consciência pesar e resolver retirar a maldição. Porém, ao chegarem no castelo, percebeu que os dragões ha-viam destruído tudo e que eles ainda estavam malvados.Então a bruxa e os cavalheiros decidiram juntos ir atrás da princesa Alice para que ela acalmasse os dragões. O problema é que até chegarem à princesa, teriam que enfrentar muitos perigos, como por exemplo: um rio de lavas, o lago sem fim e cinco leões que do nada apareceram. Como eram muito corajosos, conseguiram superar os obstáculos e, enfim, che-garam até a princesa, que com um simples sopro acalmou os dragões que voltaram para sua terra. Bruxa e princesa, juntas, lançaram uma magia que consertou todo o reino.A bruxa então explicou tudo o que tinha acontecido e por-que teria mandado os dragões para atacar o reino.Na verdade, antes ela morava no reino como uma das alde-ãs. Um dia um rei tirano expulsou ela, sua família e todo o povoado de lá, por isto ela efetuou este plano de vingança. Depois de toda a explicação, eles decidiram construir juntos um novo reino, sem injustiça de um mais outro menos, um mais pobre um mais rico”.

Júnior da Silva, Mariana Pinheiro, Matheus Felipe e Thayse Renata, PIÁs

Este jogo foi elaborado a partir das seguintes histórias (inspiradas no filme “Príncipes e Princesas” de Michel Ocelot), produzidas por um grupo de crianças do PIÁ,

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KKKKDefinição do principal recurso utilizado no PIÁ.Deve ser usado sem restrição ou racionamento.Uma ginástica facial fantástica que faz bem para a pele, o coração, o pulmão, as vísceras...Recomendado pra todas as idades, o KKKK pode ser feito individualmente, em dupla ou em grupo.Sua falta pode levar até à morte!Se você ainda não usou este recurso hoje, ou caso não consi-ga ativá-lo com facilidade, comece agora:Olhe para a foto acima e imagine o som, o volume, a cor, o movimento e a forma desse KKKK(pausa para contemplação)Obviamente você não vai conseguir identificar a intensidade do KKKK acima. Isso é impossível! Os KKKKs são únicos. Mas, com certeza, o exercício vai ajudá-lo a manifestar seu próprio KKKK.[O mini-estéreo da saúde adverte: O uso contínuo e acentu-ado desse recurso pode ocasionar leves dores no abdômen, que desaparecem com o tempo proporcionando sensação de alívio e leveza]

Lanchea hora do lanche no PIÁ érodinhabrincadeiraencontrogargalhadarespiro

temtoalha improvisadano começoeno finalfutebol com guardanapo amassado

no cardápio vemreceita de vócarinho de mãecuidado de paimiscelânea coletiva

quase sempre temaquele pedacinho oferecidoeaquele tantinho derramado

lanche é puramemóriaafetiva.

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Materialidades

Cadeira(s): Quatro pernas, por vezes com braços, feita de materiais diversos que podem ser madeira, plástico, tecido, espuma, vime, lona... Servem de trampolim para o espaço, transformam-se em ár-vores com galhos que vão até o infinito e em pedras de um rio com peixes dourados.Servem também para saltar, esconder, balançar, deitar, dor-mir e até sentar. E se forem muitas? Ah... então podem virar caverna, cento-peia, aranha, nave espacial. Ponte que leva pro Castelo da Bruxa e dá a volta na Muralha da China.

Tecido:Tecido o que você já foi?Amarrador de brincadeiras e escorregador de chãoPoderia tecido o bolso da calça de JoãoMas servi de alça para um carro de papelãoAo invés de me cortarem para um molde de gravataMe enrolaram em volta de um meninoMe fazendo de casulo de lagartaPoderia tecido faixa para a Igreja da CandeláriaMas junto com galhos e árvoresServi de cabana para tribos imagináriasFui tecido torcidoFui pintado, amarradoFui trançado, divertidoMe espalharam como um rioMe jogaram como chuvaDos meus retalhos fantasiaram as mais belas históriasFadas, bruxas, duendes e vitóriasFui rasgado, cortado e transformadoAi de mim se não fosse parar nas mãos destas criançasQuantos risos, sorrisos, gargalhadas e palhaçadas Teriam sido descartadasComo um saco de retalhos na beira da calçadaAi de mim se não tivesse sido parte do patchwork da ima-ginaçãoAi de mim tecido-sido.só mais um bolso da calça de João.

Memórias de papel

Asa delta: de papel, fingia que era asa delta e estava voando.Aviãozinho: de papel, disputávamos campeonato na rua, de qual avião ia mais longe. Tinha aviãozinho que chegava a atra-vessar o quarteirão; infância sem pai, sem mãe, não tinha tempo para brincar, só trabalhar.Balão: de papel, era presente na festa junina.Barquinho: de papel, colocava na água para ele nadar.Bola: jogava vôlei, ficava na rua até mais tarde; brinquei muito, morava no interior da Bahia e gostava mais de jogar bola com os meninos.Bola de meia: jogava muito até às cinco da tarde.Boneca : não tinha dinheiro pra comprar, fazia de pano; era de papel, fazia também as roupas de papel.Botão de rosa: roubava rosas, pulava muros...Capucheta*: fui dobrando esse papel, até virar algo que lembra uma capucheta.Casinha: imitava os adultos e o que via ao redor.Chapéu: fazia chapéu para as bonecas porque minha mãe fazia chapéu de palha.Envelope: fazia envelopes para cartas de amor das moças da cidade; criada longe da mãe e gostava de escrever cartas para ela, gostava de andar de bicicleta e jogar bola.Flor: gostava de flores desde criança, mão boa para cultivar; retrata mãe guerreira que lutou para criar todos os filhos.Leque: morava na roça, ajudava em casa, fazia panelas de barro.Peteca: jogava e quem errava saia da roda.Pipa: rueiro ou jogava bola, ou empinava pipa.Sanfoninha colorida: era uma criança retraída, observadora, criativa, brincava de fazer a letra mais divertida e bonita em formato de sanfona. A única diversão era a escola, pois onde morava não tinha lazer.

* capucheta é uma espécie de pipa de formato abaulado.

(Memórias de Papel foi uma proposição de vivência poética para os pais e familiares das crianças do PIÁ, em que os partici-pantes contavam as suas memórias de infância por meio de objetos modelados com folhas de papel).

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Morte

Sobre pássaros e morte.Em uma das turmas logo no início do PIÁ, lá estava ele... PIUI, este foi o nome dado ao pássaro, encontrado morto na biblioteca. Nesse dia, nos dedicamos a fazer um enterro digno de um passarinho, cartazes, faixas, caixão e tudo mais. PIUI foi enterrado nos fundos da biblioteca e permaneceu ali por uma semana, até Isaac, um menino de 5 anos, desen-terrá-lo. Inconformado em saber que havia um pássaro en-terrado, toda semana Isaac desenterrava PIUI e vinha antes do início do encontro dizendo o que havia feito. A turma se reunia e decidia enterrar novamente, Isaac concordava e ajudava no enterro. Mas na semana seguinte voltava com a mesma: _ Gente desenterrei o pássaro!Conversando sobre o assunto, resolvemos deixar o pássaro em outro lugar da biblioteca, em um canto mais reservado como um sarcófago. PIUI seria a múmia que ficaria ali por perto, mas Isaac solta no mesmo instante: - Eu vou ficar com medo dessa múmia aqui!E as diversas especulações sobre o pássaro assombrado come-çaram a surgir. A turma de crianças entre cinco e sete anos vai ficando com um certo medo, até que Isaac solta a pérola que tanto guardava: - Gente, mas ele é um pássaro! Não pode ficar aqui na terra desse jeito, tem que colocar ele nas nuvens, né!Saímos procurando nuvens pelo espaço, e enrolado em “nu-vens”, PIUI foi novamente enterrado.- Agora sim, quando acordar vai poder voar de novo. Disse, aliviado, o pequeno Isaac.

Monstros

Substância indefinida. Manifestam-se no corpo em formas variadas e imprevisíveis. Em sua grande maioria, movimen-tam-se correndo com grande rapidez, embora se tenha ob-servado alguns espécimes que rastejam e pulam. Emitem sons estridentes ou estrondosos. Podem ser vistos sozinhos ou em bandos e são exímios caçadores. Reproduzem-se por contágio. Não há, até o momento, ne-nhuma comprovação exata, mas nos relatos existentes, cons-ta que o monstro segura sua vítima, em seguida, ouvem--se vozes em quantidade e intensidade diversas, o corpo da vítima transforma-se e o novo monstro surge. Supõe-se que as vozes tenham algum poder de comando sobre essa transformação. O contágio também pode acontecer sobre certos objetos descartados e já desprovidos de sua forma e função originais. Uma vez que tenham surgido em um local, os monstros tendem a se reproduzir rapidamente, ao longo de muitas semanas.Diz-se que muitos deles têm medo de barata.

Notas processuais

Trajetórias. O que vocês querem fazer? É preciso perguntar, é imprescindível ouvir. Faz parte do processo artístico pedagógico caminhar e estar junto. Olhar com delicadeza a última gota d’água que cai numa bacia e perder-se no movimento daquelas penas ondas.

Acolhimento: Sorrir; Cobertor; Olhar; O que vocês que-rem fazer?; Ser recebido; Disponibilidade; Bonito; familiar; Ouvir; Aconchego; Bacia d’água; Tô aqui; Abraço; Barriga; Colher; Venha.

Escuta: Orelha; Sensibilidade; Roda; Não sei; Silêncio; O que vocês querem fazer?; Fone de ouvido; Ouvido; Respirar; Não quero; Parar; Chuva; Percepção; Era uma vez...; Diz!.

Tempo: Hora; Foi; É uma loucura!; Chegada; O que vocês querem fazer?; (Des)ajuste; Assim; Faz de conta; Respira!...; Hoje; Parei; Tic Tac; Sempre; Acelerado; Quando; Ontem; Dilatado; Aqui e agora; Estar; Presente.

Caminho: Rumo; Bora?!; Com pedras; Nuvens; O que vocês querem fazer?; Fuga; Passos; Perder-se; Estreito; Possibilida-de; Encontrar-se; Trajeto; Estrelas; Terra; Sem saída; Seguir; Flanar; Rio; Fui; Longe.

N.D.A.

O PIÁ - Programa de Iniciação Artística é:Escola.Oficina.ONG.Creche.n.d.a. (nenhuma das anteriores)

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Obsidian

Você só poderá achar essa pedra com a mente.A primeira Obsidiana do mundo foi encontrada em 1849.Primeiro elas aparecem como pedras “normais”.Mudam de forma e de cor.O Cristo “Rebentor” tem duas Obsidianas em cada olho (como nós).A íris é de onde vem a Obsidian.O nome da pedra “Obsidian” foi dado por Marcos Rodri-gues da Silva.Ela pode ser de todas as cores de uma só vez, como um arco--íris e também pode ter uma única cor.Quando você achar uma Obsidian, pegue a pedra com papel ou tecido. Nunca encoste sua pele direto na pedra!!!Vinte e quatro horas depois de encontrada, você pode pegar com as mãos.Ela só pode ser encontrada quando você imagina a sua cor.As douradas são rabiscadas em baixo, com um círculo em cima.A lilás é a da paixão: rabiscada em baixo e com um coração em cima.Rosa é paz e amor.Ela só pode ser encontrada no calor.Ela veio da areia, da terra, da água. É feita com restos de animais e coisas antigas.

Caue Capote Strieder, PIÁ

Paisagem

No PIÁ, a construção da paisagem é uma prática proces-sual constante.

A definição tradicional de paisagem é a de um espaço ter-ritorial abrangido pelo olhar, mas para alguns autores é tam-bém a apreensão do mundo de uma forma individual. A pai-sagem pode ser percebida a partir do componente humano, que vive, transita e se comunica interagindo com o espaço.

Partindo dos CEUs (Centros Educacionais Unificados), Centros Culturais e Bibliotecas Municipais, as paisagens do PIÁ são compostas por territórios variados que vão desde os locais dos encontros nestes equipamentos até a exploração e a ocupação de espaços urbanos, de onde advém um vasto conjunto de culturas, e saberes que afetam diretamente os fazeres artísticos-pedagógicos.

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PertencimentoO raio do pertencimento

Marilia Carvalho

A palavra pertencer vem do latim PERTINERE, “ser pro-priedade de”, de PER, “completamente” mais TENERE, “ter, possuir”. Propriedade, por sua vez, vem também do latim PROPRIUS, “privado, de si mesmo”, derivado da ex-pressão PRO PRIVO, “para o indivíduo”, de onde vem a palavra apropriação.

Talvez o fato de ter se tornado uma pauta constante, a dis-cussão acerca do pertencimento revele uma face dicotômica da relação entre indivíduos e seus lugares . Essa discussão, normalmente, reforça ideias e ideias sobre a busca de uma identidade comum, uma apropriação e identificação do in-dividuo com os espaços e bens simbólicos que fazem parte do seu entorno.

Podemos considerar o que a própria palavra pertencer nos ensina: ser propriedade de, fazer parte. Próprio, de si mes-mo, para o indivíduo. O pertencer pode ser então o lugar próprio do indivíduo ou para o indivíduo. Não necessaria-mente seu lugar físico, de origem ou morada, mas o lugar do qual ele se apropria e que dele também se apropria. Sendo ambos - lugar e indivíduo – próprios, com propriedade, para falarem um do outro, estarem, adequarem-se, moverem-se, modificarem-se, e atribuírem sentidos novos mutuamente.

Tanto falamos em pertencimento que eu, com tão pou-co tempo de PIÁ, há tão pouco tempo me deslocando toda semana da Zona Sul de São Paulo (onde sempre morei) até Sapopemba (a maior avenida da cidade, sempre bom lem-brar...) e descobrindo as logísticas do CEU há tempo sufi-ciente para ainda não ter muita clareza sobre a sua dinâmi-ca… não sei se tenho propriedade para ser mais uma voz a cruzar esses discursos e fazer uso da primeira pessoa do sin-gular na tentativa de minimamente assumir a propriedade dessas palavras e assumi-las como próprias, minhas.

Nunca estive antes nessa “quebrada zica demais” até entrar no PIÁ. De abril até agora, conheço de lá tudo o que há no caminho entre o ponto de ônibus e o CEU. Sei do que vejo através das crianças e suas famílias e com elas. Sei que lá há mais lixo no chão e mais pipas no céu, nos fins de tarde, do que no Jabaquara e que aos domingos tem muita gente com-

prando frutas nas barracas próximas ao hospital. Quatro meses e ainda não tenho o sentimento de per-

tencer a Sapopemba. Talvez porque não pertença. Às vezes, ainda me sinto um corpo estranho dentro do CEU, talvez porque o seja mesmo e o segurança que põe música pra tocar na copa, enquanto comemos nossas marmitas na hora do almoço, até hoje não sabe muito bem o que eu faço lá. Ou talvez porque um bom poema leva anos …

Mas agora, de umas duas semanas pra cá, há no caminho uma mulher capaz de encurtar a volta pra casa às quintas-fei-ras, com o brigadeiro caseiro que vende na porta do CEU. Ela já está até recebendo encomendas e, quanto a mim, o próximo passo talvez seja descobrir seu nome. Vínculos.

Vínculos também necessários para (re)conhecer a equipe com a qual trabalho , o espaço que ocupamos, as ideias que se encontram e também desencontram. Para identificar o que há em comum, para descobrir caminhos. Para que nos-sas ações possam ser próprias, entre nós e Sapopemba …

e um bom poema leva anos!

Quando falamos do pertencimento como acesso , falamos de aproximação, chegar em. Mas o que tenho desconfiado, ultimamente, é que talvez pertencer não seja só chegar em, mas “chegar junto”. Devagar. Repetir, repetir, até ficar di-ferente . Envolver-se . Espaço e tempo para conviver: viver junto, viver com. Se aproximar do que está fora, também… Mas antes conhecer o seu, reconhecer onde cabe, onde quer caber, onde precisa. Estar dentro, com os dois pés e até o pescoço, em vez de ficar pela beirinha com a ponta do de-dão, pra saber se água está boa.

Vamos contornando as ruas, os muros de Sapopemba, a maior avenida de São Paulo, onde vemos, desde abril, cons-truções. Perigo, não ultrapasse. O monotrilho nunca pron-to, as estações inacabadas, a ciclovia sempre sendo pintada, guindastes, poeira, trator. Há um posto de gasolina no meio do caminho. Desde abril, construções. Não sei como era an-tes, não sei se estarei lá

pra ver o que será

depois...

Parcerias

O PIÁ seria inexistente sem as parcerias e também sem as qualidades delas. Um dos significados de parcerias é: reunião de indivíduos para certo fim com interesse comum. Então o que nos permeia e o que atravessa os interesses comuns?

Primeiro acreditamos na arte, na transformação, na di-versidade, na proposta do desconhecido independente de quem venha - pois não nos prendemos às funções e este-reótipos para impor alguma experimentação -. Vivemos a ligação olho no olho, na escuta com o coração, ouvidos e imaginação; no fazer em conjunto, encantado, crítico, lúdi-co, reflexivo e que ainda possa não ser nada disso, podendo desencadear processos artísticos e sociais ou não. Lidamos com a experimentação da escuta de nossos parceiros artistas, crianças, adultos pais e adultos profissionais do equipamen-to que sedia o PIÁ. Mas também temos como parceiros o espaço, a cultura, os materiais disponíveis, os materiais in-disponíveis - isso as vezes é o mais corrente - , o imprevisível, o conhecimento, nossos afetos e desafetos. Todos são nossos parceiros de PIÁ e também de vida.

Essas parcerias nos movem, nos modificam, nos instigam; às vezes, nos exaurem, nos consomem e também nos frus-tram. Mas, por acreditarmos na arte e na transformação, pelo amor ao ser criança e lúdico, por acreditarmos na beleza do fazer artístico investigativo e criativo, por acreditar que, no fundo, o outro sou eu, seguimos sempre em diálogo e escuta com nossas parcerias.

Mas, em nossas parcerias, primamos muito pelo respeito, pelo diálogo, pela autonomia, pela reflexão, pela curiosida-de e envolvimento, além do fazer artístico. O que seria o óbvio em toda relação educacional e artística e que muitas vezes não sai do campo de idealizações, é feito no PIÁ e amplamente discutido e refletido junto aos Artistas e Coor-denações. Isso fomenta e dá suporte ao fazer, mesmo diante das precariedades encontradas. Não são propostas soluções prontas, mas, antes, priorizamos as questões e mantemos a rede de suporte de ação/reflexão/ação. Talvez a qualidade de parceria seja um dos fatores mais relevantes no PIÁ.

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PiáticaPoéticas ou Piáticas para performarUm texto de autoajuda para o AE (Artista-Errante)

As mesmas fronteiras fissuradas que há tempos borram as manifestações artísticas, em razão das urgências que se ex-pandem no mundo contemporâneo, são também aquelas que instauram um “entre”, feito quem curte e compartilha numa rede social. A rede social está dada, enquanto plata-forma de experiências em trânsito, de modo que uma mul-tidão de pessoas disponibiliza uma série de dados que serão atravessados pela percepção alheia. As urgências ocorrem o tempo todo, posto que a timeline da plataforma é como a linha da vida...ininterrupta . As tais urgências são disparadas pelo desejo ou por aquilo em que o “ainda” é uma realidade em curso... é impermanente. Desejar é um lugar por ins-taurar e é esse o lugar onde debruçaremos nossas estratégias de aproximação, de maneira que possamos ativar os nossos respectivos botões de “curtir” e “compartilhar”. Para tanto, será preciso reunir uma série de condições que possibilitem disparar o interesse, afetar e por consequência provocar o fe-nômeno desse encontro. Encontrar é preciso e desencontrar também, visto que o desencontro confere a noção de reali-mentar o desejo, portanto, as condições dadas nunca serão as ideais...serão sempre contextuais. Se a arte contamina-se com a vida, sabe-se também que a aderência entre ambas se desdobra em acontecimento ou sob o (des)encadeamento de processos entre fatores. Se o touchscreen (ecrã tátil) ou inter-face da criança for convidado a se ativar por algum proces-so, logo será indicado por alguma estratégia de aproximação performativa, em que o comportamento se colocará, para além do senso comum ou dos modos de comunicação cen-trados em um caráter específico, como por exemplo, através da linguagem verbal. A estratégia em questão poderá partir da vontade selvagem pelo brincar ,de forma que o brincar é o disparador para a errância... para um percurso impreciso . Quando o brincar encontra uma forma, encontra também um cultivo pela permanência e se torna um fenômeno cul-tural ou brincadeira . Quando a brincadeira se contradiz, quando se deixa perder ou se afasta da aferição... se converte em bagunça, de maneira que, quando a bagunça encontra a brincadeira, vira arte... vira entropia e o que era performa-tivo...torna-se performance. Tudo isso faz parte de um arca-bouço ,de uma poética e como falo de dentro do PIÁ, cha-mo de Piática . É necessário estar atento aos modos criativos presentes no mundo contemporâneo, para instaurar a tal da

zona Piática. Difícil seria conceber um mundo imaginário formado sem trincas, harmônico e alheio às potencialidades presentes nesses (de)sencontros. Fato é que as estratégias po-éticas serão deformadoras, quando os adultos não cederem ao apelo óbvio pela imaginação, por aquilo que representa. Ah, a imaginação... palavra cunhada para designar, grosso modo, tudo aquilo que é inalcançável pelos adultos, sob a realidade concreta dos fatos . Ora, as crianças passam bem sem a tal da imaginação, porque são realizadoras em poten-cial e presentificam o que consideramos ser algo exacerbado da realidade concreta. Dito de outro modo, pode-se afirmar que boa parte dos adultos forjam estratégias que desembo-cam em imaginação... recorrem a símbolos para intermediar o mundo, enquanto as crianças vivem o mundo. No caso específico do PIÁ, o artista está lá durante toda a semana, mais para (co)ncretizar do que para imaginar desejos mú-tuos, de modo que esse desejo será viável, quando a atitude desse artista estiver alinhada ao seu pensar/fazer artístico, so-bretudo quando esse artista não estiver circunscrito à figura do recreador, quando encarar a criança como uma pessoa em franca pesquisa e não como um menor. Os modos de pesquisa de uma criança estão sob os holofotes da vida, por-tanto cabe ao artista ser honesto nesse lugar, uma vez que partilha dessa mesma vida e possui também seus modos de pesquisa. Sendo assim, é possível notar que as crianças espe-ram muita provocação, presença, investigação, colaboração pra botar mais lenha na fogueira nessa interface... zona de afins e afetos. Portanto car@ artista, pergunte-se mais, erre mais, fracasse mais, confie nas incertezas, desvie, desvie sem-pre... não para bater de frente, mas para afirmar a existência de tantas outras realidades.

Processo

O PIÁ vem construindo suas abordagens artístico-pedagógi-cas, baseando-se na lógica do processo, procurando dar pri-mazia à inventividade e à descoberta de modos de expressão que se afastem de parâmetros instituídos. Para tanto, faz-se necessário que durante o processo o artis-ta educador escute cuidadosamente as maneiras de ser da criança, considerando a curiosidade, a investigação e a brin-cadeira como partes fundamentais da pesquisa processual. Tudo aquilo que for pertinente à apreensão sensível do mun-do pela criança e, por vias convergentes, à pesquisa do artista educador, vai servir de matéria para as proposições artísticas.Isto quer dizer que tudo aquilo que está ligado ao aconteci-mento dos encontros passa a agregar-se aos processos como elemento constituinte. Falas, conceitos, estados afetivos, biografias e influências culturais diversas, para citar alguns exemplos, são elementos que servem à composição dos “mo-dos de fazer do PIÁ”, tendo as linguagens artísticas como um suporte para as suas expressões. Os processos vivenciados no PIÁ vêm a ser, portanto, fruto de um olhar voltado para tempos e espaços potenciais atra-vés e para além das linguagens - frestas para o diálogo que, constantemente, a vida estabelece com a arte.

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Tem 2 tipos.Um que faz com todos riam e o outro que faz com que todos corram....menos quem soltou!

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Rua

E se... abríssemos as portas da instituição, não para entrar, mas para sair? E se... o desejo que pulsa dentro: “Vamos brincar aqui fora que é melhor” rompesse as paredes da sala? E se... uma ou duas crianças ganhassem as ruas como guer-reias, para enfrentar a ausência de um ano que nasceu mor-to, vestindo verde e amarelo neste país gerúndio. Estávamos gerúndios também, pensando em como fazer, em como ir. Aí, decretamos o princípio fim, e fomos e fizemos. Um piá na feira, aos berros dos feirantes, embalado pela música do Red Hot Chilli Pepers, cantarolada pela menina de armadu-ra reluzente de sete anos que, provavelmente, não sabe que “How long, how long will I slide?” virou nosso hino, que só faz sentido agora, para lembrar de não mais deslizarmos. E seguimos em busca deste “otherside” do PIÁ, que talvez esteja do lado de fora, ou em outra dimensão do lado de dentro, mas é preciso um outro lado. Demorou, mas agora sim decretamos o fim e começamos a encher a calçada com a sombra das crianças que poderiam estar aqui. E a pequena de armadura reluzente continua cantarolando em outra lín-gua, conectada a um outro lado de tudo.

“é um papel meio duro e várias folhas de papel mole”Kaique, 9 anos

Revista

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Ao longo de seus seis anos de existência, podemos afirmar, com certa ousadia, que o PIÁ é um programa público de iniciação artística de ruptura pedagógica na cidade de São Paulo. Antes de apresentar os elementos que compõem tal característica, buscaremos levantar a explicação do que en-tendemos como ruptura.

Herdamos dos chamados pensadores rebeldes, como Der-rida, Deleuze e Foucault, a compreensão de que talvez não seja mais possível uma receita política de transformação por inteiro da sociedade, mas que vivemos um momento em que podemos transgredir aquilo que é imposto pelo sistema ou pelo mercado. (MARTON) Será por meio desse conceito de trangressão que iremos partir e que explicaremos melhor adiante, relacionando-o com a ideia de ruptura.

Exercitar uma política de transgressão, ou um viável exer-cício de ações de rupturas, parece ser a sina daqueles que estão dispostos a lutar contra um sistema que tem como ob-jetivo final o lucro, a propriedade privada e a meritocracia. Como criar então um programa público de reflexão e cria-ção de processos criativos em meio a este contexto?

A condição de nós, artistas, professores, estudantes, peda-gogos, começa a ser então a de cidadãos criadores de fissuras na cidade. Aqueles que farão de suas ações artísticas e cida-dãs um exercício constante de ruptura dos velhos paradig-mas de organização social, pedagógica e educacional, num constante diálogo ético entre suas práticas e seus discursos.

E isso não parece ser nada fácil de construir!A ruptura aqui como uma maneira de desorganizar, de

romper com as estruturas dominantes, de criar novas formas de organização, de repensar a relação de ensino-aprendiza-gem e, sobretudo, de estar em constante movimento filosó-fico longe da cristalização conservadora. Ou ainda, numa

perspectiva foucaltiana, a ruptura como uma maneira de de-sarticular o poder instaurado sobre os nossos corpos; de di-luir a disciplina, essa arte de dispor em fila e repartir corpos; de “desindividualizar” os corpos; de desestruturar a ideia de controle social; de desregulamentar o tempo da ação huma-na (FOUCAULT). Definitivamente é preciso criar rupturas. Numa tentativa de compor forças para quem sabe obter um aparelho eficiente de construção de si e do entorno. (FOU-CAULT)

Diante desse prisma, entender o PIÁ como um programa de ruptura passa a ser não apenas o exercício diário de um artista educador, mas principalmente o exercício político da arte-educação. Encontrar quais são esses pontos de ruptura, descrevê-los, reorganizá-los, afirmá-los ou não, deve ser uma das importantes ações a serem feitas, e que buscaremos, por-tanto, fazer neste texto.

Ao olharmos historicamente para outros programas públi-cos de iniciação artística, voltados para a criança, é possível notar a constante preocupação com o tecnicismo da arte, com o produto final e com a ideia da infância como uma “passagem” da vida, numa negação dos potentes quereres das crianças. Nesse sentido, um dos primeiros elementos de ruptura do PIÁ vai ser pensar A infância como um grupo social capaz de mudanças históricas, políticas e artísticas. A infância para o PIÁ não será necessariamente uma fase menor da vida, numa visão hierárquica de desenvolvimento humano. A infância vista como uma “categoria na estrutu-ra social que manifesta variações históricas e interculturais” (NASCIMENTO)

As crianças são membros da sociedade, agem socialmente nas famílias, nas escolas, nas creches e, em outros espaços, fazem parte do mundo, o incorporam e, ao mesmo tempo,

o influenciam e criam significados a partir dele. (NASCI-MENTO)

Em consonância com a maneira própria de a criança agir no mundo é que o PIÁ vai buscar no ato de brincar sua po-tência na relação “ensino e arte”. A busca e a afirmação do brincar como uma conduta artístico-pedagógica. O brincar como “fim” e não como “meio”, ou seja, fazer do brincar a própria instauração do processo criativo e não um meio para se chegar à “obra de arte”. Inverter o olhar sobre o brincar, dando a ele os motivos propulsores da iniciação artística, inclusive ampliando a ideia do brincar, não apenas com uma relação direta a brincadeira, mas o brincar enquanto condi-ção e estado de relação com o outro ou com as coisas ou ain-da com os objetos; como a materialização da expressividade não linear da criança, da ação do desejo em movimento, de um “devir” deleuzeano (LARRAURI). O brincar vai ser ati-tude uníssona nas atividades de todas as equipes espalhadas pela cidade no PIÁ. Além disso, o brincar vai reunir em si a transdisciplinaridade proposta pelo Programa, na “mistura” do Teatro, da Dança, das Artes Visuais e da Música. Não é possível determinar no brincar uma das quatro categorias das artes. E, um dos focos de atuação do PIÁ é deixar cada vez mais borrada a linha que define as linguagens, numa tentativa de rediscutir os modos de categorias das artes que a academia historicamente segmentou. E nisso mais um ele-mento de ruptura surge: A iniciação artística por meio da transdisciplinaridade. Um programa público que aposta na iniciação artística com crianças, por meio da não definição do que seria “teatro”, “dança”, “música”, “artes visuais”, ou, melhor dizendo, um jeito único de pensar arte. Um pro-grama público que aposta na discussão contemporânea do que é fazer e produzir processos criativos, contaminados por todas as potencialidades artísticas pré-definidas.

Por pensar a arte contemporânea com crianças de maneira dinâmica, arriscada, disposta ao erro e ao abismo, o PIÁ terá como pressuposto: O artista educador como um constante pesquisador. Será aquele artista disposto a problematizar o presente para o presente. Aquele que explora o caminho, ao mesmo tempo em que caminha. (LARROSA). Não será o detentor do saber nem da razão, mas aquele que duvida dos métodos prontos, que olha sua prática como uma pesquisa em movimento. Que se pergunta frequentemente de manei-ra “ignorante” as perguntas: “O que vês? O que pensas disso? O que fazes com isso?” (RANCIÈRE). Por fim, um pesqui-sador que tem sua atenção voltada para o diálogo-triângulo: adulto (eu), criança e adulto (o outro artista-educador).

Esse formato “triângulo” é também considerado aqui uma das rupturas nos sistemas de iniciação artística dos pro-gramas espalhados na cidade. Portanto, é preciso entender como ruptura As características técnicas do programa. Ou seja, entender como disruptivos em si os próprios meca-nismos interiores do programa que são: uma equipe com-posta por quatro artistas em cada equipamento; a dupla de artistas-educadores (todas as turmas são orientadas por dois artistas educadores ao mesmo tempo); a divisão de faixa--etária (turmas de 5 a 7 anos, 8 a 10 anos e 11 a 14 anos); o número razoável de crianças por turmas (de 15 a 25 crianças por turma); as reuniões pedagógicas semanais; e a função do coordenador-artista-educador (um dos quatro artistas edu-cadores da equipe tem como função a coordenação da equi-pe em articulação com o equipamento e com a Secretaria de Cultura).

A manutenção e garantia dessas características técnicas são fundamentais para o fortalecimento do Programa como ruptura. Será preciso, ao longo dos anos, um olhar delicado sobre essas formas de organização, uma vez que alguma ten-

RupturaO PIÁ como uma ruptura artístico-pedagógica na cidade de São Paulo

Bruno César Lopes

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tativa de desestruturar esses meios pode vir a ser um risco na potência do Programa. Ou seja, o entendimento de que ainda que estejamos sendo potência de ruptura, é necessário estarmos com a base de um aparelho consistente, que seja, sobretudo, reavaliado e reelaborado pelos próprios fazedores desta ruptura: os artistas-educadores do Programa.

Outra ruptura visível é A organização pedagógica do pro-grama realizada por meio de sua experiência, ou seja, uma busca constante de uma sistematização que nasce a partir do fazer, da prática. E que, mesmo sendo “sistematizada”, não tende a ser engessada. Um olhar que vai criar os mo-dos teóricos da iniciação artística, a partir da experiência, na relação com a criança, com o equipamento público e com seus vizinhos. Experiência no sentido que Larrosa nos traz: “A experiência é o que nos passa, o que nos acontece, o que nos toca.” (LARROSA). O PIÁ vai, portanto, ter a audácia de, ainda que com referências muito claras como a EMIA (Escola Municipal de Iniciação Artística), buscar entender sua organização pedagógica por meio de sua própria expe-riência. E diferente do pensamento hegemônico, sobretudo na Educação, que necessita urgentemente de cartilhas e nor-mas, o PIÁ mais uma vez cria uma ruptura ao apostar no desconhecido.

Vale salientar nessa etapa que a disposição em criar uma sistematização pedagógica, a partir de uma ideia de ruptura, acaba criando por si só uma linha de tensão, na medida em que “sistematizar” e “causar ruptura” parecem forças opostas. Mas a defesa que propomos aqui é justamente a busca por este desafio dialético e construtivo para o próprio Programa, como numa disputa entre dois polos de um imã com forças de atração e repulsão num campo magnético.

Além disso, a atuação do programa nas bordas da cidade

faz dele uma proposta de descentralização e irradiação de arte na cidade. Em qual espaço geográfico na cidade esta-mos atuando? A criança e a periferia como potencialidades artístico-políticas. A afirmação do PIÁ na periferia consti-tui já em si uma ruptura na medida em que democratiza o dinheiro público para uma parcela da sociedade que é forçosamente distanciada, geograficamente e socialmente, dos acessos artísticos. Com isso, a junção criança e periferia pode transformar-se numa potência artística, que deflagre a normalidade para combater aquilo que se tornou a falta de programas públicos para infância, e que deixe de ser apenas assistencialista; que faça da própria criação artística seu ins-trumento de luta e denúncia do status quo vigente.

Por essa ótica periférica, apresentamos então o último ele-mento de ruptura já pesquisado, causador das maiores dis-cussões. Aproveitamos para encaminharmos também para algumas reflexões e desafios a serem seguidos pelo PIÁ.

Um programa marginalizado dentro de uma instituição pública. Marginalizado no sentido daquele que esta “à mar-gem”. À margem do sistema, à beira dos programas já bem estruturados e bem financiados. Marginal no sentido de ser desviante em relação a tudo o que se pretende oficial. “De ser o representante de descaminhos culturais e políticos” (COELHO). A ação-piá que incomoda, que muitas vezes perturba a “paz” reinante nos equipamentos públicos; que, assim como a criança, um PIÁ que incomoda, que pergun-ta, que questiona, que não para. Mas como é possível ser marginal dentro da instituição pública? Como é possível, por exemplo, ser marginal dentro de uma Fundação, uma ONG (Organização Não Governamental) ou uma OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público)? Esse talvez seja o maior dilema atual do Programa.

Um programa que recebe dinheiro público para proble-matizar o próprio uso público. Um texto como este dentro da própria Revista do programa. O Estado que proporciona uma política contra sua própria corrente. Até quando tere-mos essa possibilidade de se autocriticar de forma legítima e aberta? Como conviver com essa dialética? Como convi-ver com as incoerências postas dia a dia em nossos fazeres? Como não se institucionalizar dentro da máquina pública?

Para sermos um programa de ruptura, estaríamos fadados a sermos um programa marginal? Teríamos que estar sempre à margem, na borda, na periferia do sistema, para continu-armos criando rupturas? Qual o risco que corremos de con-quistar o “aceite” da máquina pública e, com isso, destruir-mos nossa capacidade de criar rupturas? Quando o “fardo” de ser marginal se tornará orgulho de luta?

Não como resposta, mas talvez como encaminhamento, arriscamos dizer que a influência do olhar da criança possa ser nosso horizonte. Se o que buscarmos for uma prática política que se faz sem líderes, sem representantes, sem apa-relhos, sem instituições, sem burocracias e sem receitas, seria com a lógica da criança e, por meio dela, com a lógica da ruptura que poderíamos continuar a caminhar.

A potência da ingenuidade e da entrega para o abismo como modus operandi político. Ingenuidade no sentido de movimentar-se para dentro de uma situação - sufixo dade - de franqueza extrema – ingênuo -. No âmbito ético da palavra, daquele que encara as relações sem culpa, sem juízo de valor, sem a pretensão do acerto, mas que também não é tolo, nem imaturo e muito menos apolítico. A ação política como criação e invenção. E, criação e invenção as crianças têm muito a nos oferecer.

Por fim, que possamos fortalecer os aspectos de ruptura aqui apresentados e que continuemos a caminhar em busca de novas políticas, que só podem ser feitas através de um questionamento crítico. Questionamento este, amalgamado sempre pela visão, especial e única da criança.

Referências

COELHO, Frederico. “Eu, brasileiro, confesso minha culpa e meu pecado: cultura marginal no Brasil das décadas de 1960 e 1970”. Pág. 19. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2010.FOUCAULT, Michel. “Vigiar e punir: nascimento da prisão”. 20ª edição. Petrópolis: Editora Vozes, 1999.LARRAURI, Maite. “O desejo segundo Gilles Deleuze”. São Paulo: Ciranda Cultural, 2009.LARROSA, Jorge. “O ensaio e a escrita acadêmica”. In: Educação e Realidade. Pág. 101 a 115. Jul./dez 2003. ________. “Notas sobre a experiência e o saber da experiência”. Universidade Estadual de Campinas, Departamento de Linguísti-ca. Pág. 21. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbedu/n19/n19a02.pdfMARTON, Scarlett. “Foucault, Deleuze e Derrida frente à crise”. Disponível em: http://youtu.be/vyPTweS6Cvo. Acesso em: 26 jul. 2014.NASCIMENTO, Maria Letícia Barros Pedroso. “A infância como fenômeno social”. Cultura e Sociologia da Infância. Pág.70 a 82. Edição Especial Revista da Educação, São Paulo 2013.RANCIÈRE, Jacques. “O mestre ignorante – cinco lições sobre a emancipação intelectual”. Pág. 44. Belo Horizonte: Autêntica

Editora, 2011.

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Selfie

Trata-se de um neologismo de origem inglesa, baseado na pa-lavra self-portrait, que significa autorretrato . Selfie serve para designar um retrato de si, geralmente tirado com dispositivos celulares ou máquinas digitais. A palavra em questão teve o crescimento de 17000% em 2013, segundo a equipe de pesquisa do Dicionário Oxford. Pode-se afirmar que no PIÁ, ela tem auxiliado no processo de visibilidade e acionamento de uma série de poéticas. Portanto, se você deseja fazer um Selfie “a la PIÁ”, acesse o nosso Tutorial em: facebook.com/piaguara.

Silêncio

Rod

rigo

Mun

hoz

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Subversão“ Todo dia para ir à escola eu tenho que acordá-lo, mas no dia de ir ao PIÁ, é ele quem me acorda.”(Rosângela Moraes, mãe do Juan Guilherme, PIÁ)

SuperpoderesTodas as crianças têm superpoderes. Mas, o mais poderoso deles é o “Poder Super Pode Super Poder.”E eu fico aqui pensando que se eu não puder com elas; sem elas, posso menos ainda.

SurpresasUm dos termômetros de se estar vivo e não apenas vivendo é ter no mínimo uma surpresa por dia. Um artista educador deve ter no mínimo três. Essa relação de três pra um é a sua disponibilidade de correr riscos, sua habilidade de escuta e sua abertura para o que vem do outro. É uma das suas gran-des diversões.

Sonho

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TeiasTeias que tecem ideias, que contam históriasNum alinhavo de memórias, que vão do dentro ao foraBuscando novos espaços, procurando criançasPara entrar, para brincarPara vir com a genteFazer PIÁ

Teias de um Lugar grande meio vazioDe onde tecemos vários encontros(Re) inventando e (re) brincando, transformando os “nós” do espaço.Criando novas identidades, brincando com sombras, tecendo fios que vão além do material, Tecendo em nós, artistas: conexões.

Teias com sabor de cor e aventuras de imaginação. Tecendo fios de brincadeiras, silhuetas no chão.Corpos que se transformam, ganhando novos traços virando personagens nas paredes onde ar(riscamos), deixando nossas marcas e instalações, provocando em quem passa: uma vontade de brincar, uma vontade de PIÁ

Teias de questões, teias de brincadeiras, teias do vazio?Ah! esse vazio que incomoda, por que não queremos que se acomode...Teias de sabores de dias incríveis, Teias de espera, faltam os “PIÁs” para tecer ...Fios que vão e vem, visíveis e invisíveis, grossos, finos, mé-dios...De todo tipo: silencioso, barulhento... igualzinho aos “PIÁs”, cada qual com seu jeitinho, pois igualzinho nenhum é.Nicole, Vitória, Mateus, Christian, Jheniffer, Kauan ... crianças todas são, mas cada uma com sua invenção, tecendo seu jeito de brincar, trocando fios, costurando ideias, que vão se unindo , se transformando , virando um grande PATCHWORK de retalhos diversos, de todo tipo: divertido, tímido, danado... ah, igualzinho aos “PIÁs”...

TranscendênciaDurante a elaboração de um mapa corporal como forma de expressar o que se é e de como se apresentar ao mundo pelo desenho, foi perguntado a um dos “piazinhos” sobre a es-colha dele em colorir o contorno de seu corpo grafado no papel, metade de vermelho e metade de azul. Ele respondeu:- Porque é assim que eu sou, metade fogo e metade água.Além disso, no lado do fogo (parte em vermelho) ele colou uma pequena asa branca. E, para além do masculino ou do feminino, o que se destacou foi a possibilidade de TRANS-CENDÊNCIA de seu ser. A asa deu o tom: ser o que se SENTE ser. Mesmo que o que se é, aponte para uma divisão do SER em dois (ou muitos?). De um lado AZUL e de outro VERMELHO. Não estar nem de um lado, nem de outro, mas, como uma lâmina, ser o MEIO, capaz de fazer vibrar suas múltiplas ressonâncias em constante criação e harmonia com o UNIVERSO.

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Ufa!

(espaço reservadoparainspiraçõeseexpirações)

Vínculos

“Olá, sou psicóloga do P. e gostaria de saber quanto tempo ele poderá frequentar o PIÁ. Ele gosta muito do grupo e quer ficar por muitos anos.”

V.M. (psicóloga e psicanalista clínica)

(trecho de carta recebida por um artista educador de uma psicóloga que acompanha um jovem participante do PIÁ).

Vivência

Quem te ensinou a nadar? Foi, marinheiro, foi os peixinhos do mar.

Domínio público

Mergulho intenso de sensibilização e integração dos senti-dos, num momento único, em que o ser e estar navegam na rota das emoções e afetos.

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WWW

Xadrez

Facebook do PIA Guarapiranga

maPIÁmento

PIÁ Ceu Cantos do Amanhecer

PIÁ Biblioteca Hans Christian Andersen

PIÁ CEU Lajeado

PIÁ Biblioteca Monteiro Lobato

PIÁ Centro de Formação Cultural da Cidade Tiradentes

PIÁ Biblioteca Álvares de Azevedo

PIÁ Centro Cultural da Penha

PIÁ Biblioteca Narbal Fontes

PIÁ Biblioteca Marcos Rey

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Val L

ima

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marcoZer0

Z é a última letra do alfabeto. Dizem que o zero sozinho nada vale. Mas para um programa coletivo como o PIÁ, que acredita e trabalha pela reverberação constante de suas ações, o Z aqui também pode ser o início de um novo ciclo e o zero, colocado à direita, pode revelar-se como um índice de potência.Finalizar esta publicação com este zero significa, para nós do PIÁ, um marco inicial para tantas outras construções, práticas e conceituais, projetadas ao futuro. Significa mais um ponto de partida deste programa que se renova a cada edição, para continuar a irradiar-se como política pública de formação artística para a cidade de São Paulo e para as pes-soas que aqui habitam. Este marco zero representa o cerne das ideias e dos esforços para que possamos todos inscrever coletivamente as nossas marcas e traçar novos percursos a partir de novas constelações.

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Divisão de Formação Artística e Cultural

Diretor de FormaçãoMICA FARINA

Coordenador AdministrativoILTON TOSHIAKI HANASHIRO YOGI

Coordenação de Ação CulturalPRISCILA TAMISFLÁVIA GIACOMINI COSTA

EquipeMERCEDES CRISTINA ROCHA SANDOVALGILMAR CHINA KANE BUENO DE SOUZA LEITEISABELLA DE SOUZA RODRIGUES

Equipe PIÁ 2014

Coordenadores de FormaçãoFABIANA KLEUFER ADAMO PRADO (FAFI PRADO)ZINA FILLER

Coordenadores RegionaisBRUNO CESAR TOMAZ LOPESFÁBIO AMADEU PUPOJANETE MENEZES RODRIGUESRICARDO ALESSANDRO DUTRA GARCIA

Coordenadores Artístico PedagógicosANA PAULA MOREIRA DE SOUZA

ANTONIO FRANCISCO DA SILVA JUNIOR

BRUNA RODELLA SOARES

CARLA CASADO SILVA

CARMEN PINHEIRO DA SILVA

DANIEL FONSECA DE FREITAS

EDICLÉIA PLÁCIDO SOARES

ELIANE WEINFURTER DOS SANTOS

FABIANA BARBOSA RIBEIRO

ISABELLE BENARD

JULIANA ROSA DE SOUSA

KARIN VIRGINIA RODRIGUES GIGLIO

LEONARDO DA CUNHA BARROS

LIA MANDELSBERG MONTEIRO

RECY MICHELLE CRUZ FREIRE

RENATA CRISTINA CASEMIRO

VALDILANIA SANTANA DE LIMA (VAL LIMA)

VERONICA SILVA PEREIRA

Artistas EducadoresADRIANO GREGÓRIO CASTELO BRANCO ALVES

ALINE ALVES DA SILVA

ANA CECÍLIA PORTO CUNHA COUTINHO

ANA CRISTINA SIMÃO NONATO DA SILVA ANJOS

ANDRÉ SIMÕES DA SILVA

ANDREA LUCIA ROCHA

BEATRIZ HELENA PAIVA MIGUEZ

BELIZA TRINDADE FERNANDES

BUDGA DEROBY NHAMBIQUARA

CAMILA FELTRE

CARLOS ROGERIO EUSTACHIO DA SILVA CUPERTINO AMORIM

CARMEM GUIZILIM MUNHOZ

CAROLINA BAGNARA FERNANDES

DOUGLAS TAVARES BORGES LEAL

ELAINE MARIA DA SILVA

ELISABETH BELISARIO

FABIANA RIBEIRO DA SILVA

FABIO MANZIONE RIBEIRO

FELIPE GREGÓRIO CASTELO BRANCO ALVES

FERNANDO BARROSO DA SILVA

FERNANDO PASCUOTTE SIVIERO

HELENA DE QUEIROZ CONSTANTINO MIGUEL

HENRIQUE RAMOS ÁVILLA

INAJÁ DA CONCEIÇÃO

ISABEL RAMOS MONTEIRO

ÍTALO ALENQUER DE OLIVEIRA

JACQUELINE OSHIMA FRANCO

JÔNATAS DIAS BARBOSA

JOSÉ GUILHERME CARLOS DE ALMEIDA

JULIANA FERREIRA LEME

KALLU BARBOSA DE CAMPOS WHITAKER

KARINA NAKAHARA

LAURA MARQUES DE SOUZA SALVATORE

LUCIANA DE LIMA GABRIEL

LUCILAINE MAISA SAVASSA

LUIS VITOR MAIA

MARCELA DE SOUZA COSTA

MARIA CECILIA AMARAL PINTO

MARIA JULIA SANTOS MINERVINO

MARILDA BIANCHI

MARILIA ALVES DE CARVALHO

MARTINA SANTOPOULOS FACCIOLLI

MARYAH DOS SANTOS FIGUEIREDO

PATRICIA DE ALMEIDA ZUPPI

PAULA FERREIRA BARISON

PAULO RICARDO FERREIRA

PEDRO RODRIGO PEÑUELA SANCHES

RODRIGO MUNHOZ

ROSE MARA DA SILVA

SAMARA APARECIDA COSTA

SARAH DE CASTRO RIBEIRO

SELMA DE AGUIAR

SILVANA DE JESUS SANTOS

SOLANGE DE SOUZA CAMARGO

STELLA DAMARIS BETTONE

STHEFANY SOARES DAMASCENO CAVALCANTI LEAL

SUZANA AKEMI FUJISE

TALITA ALCALÁ VINAGRE

TATIANA EIVAZIAN

TATIANE DA CRUZ CAVALCANTE LUSTOZA

TELMA LAZARO DA GUARDA

VANESSA BIFFON LOPES

Pontos de AtuaçãoBiblioteca Álvares de AzevedoBiblioteca Hans Christian AndersenBiblioteca Marcos ReyBiblioteca Monteiro LobatoBiblioteca Narbal FontesBiblioteca Padre José de AnchietaCentro Cultural da Juventude Ruth CardosoCentro de Formação Cultural Cidade TiradentesCentro Cultural da PenhaCEU Cantos do AmanhecerCEU GuarapirangaCEU Jardim PaulistanoCEU LajeadoCEU Parque BristolCEU Quinta do SolCEU São MateusCEU SapopembaCEU Três PontesEMEF Brigadeiro Henrique Raimundo Dyott Fontenelle

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